ESTADO EMOCIONAL COMPROMETIDO
Uma condição frequente na população, entretanto pouco comentada, ainda mais ao pensarmos sobre seu impacto na qualidade da vida sexual, é a incontinência urinária
A incontinência urinária se constitui em um problema de saúde pública, em especial na população feminina. Estima-se nos Estados Unidos que a prevalência de incontinência urinária ocorra em cerca de 15% das mulheres. Em relação à faixa etária, ela pode afetar pessoas com 30 anos de idade ou mais, muito embora seja mais comum após os 40 anos, e significativamente mais elevada entre os 50 e 69 anos de idade; outros países referem índices semelhantes, inclusive no nosso. Sua evolução costuma ser acompanhada por sequelas emocionais e sociais importantes.
Em linhas gerais a incontinência urinária pode ser classificada em:
INCONTINÊNCIA URINÁRIA DE ESFORÇO: perda involuntária de urina durante esforço físico como tossir, espirrar e outras atividades que elevem a pressão abdominal.
BEXIGA HIPERATIVA IDIOPÁTICA: perda involuntária de urina precedida de forte desejo de urinar.
INCONTINÊNCIA MISTA: aquela que combina os sintomas citados anteriormente. A incontinência urinária de esforço é a que tem sido mais relatada e em consequência diagnosticada. Estudos comentam que episódios de incontinência urinária também estão associados à menopausa, obesidade, doenças crônicas, tabagismo e sedentarismo.
Avanços têm ocorrido para a melhor compreensão dessa condição, suas causas, diagnóstico e terapêutica. Embora muitas mulheres sofram por apresentarem queixas de perdas urinárias, somente um quarto delas procura tratamento. A maioria alega sentimentos de vergonha e medo, como sendo os responsáveis por não procurarem tratamento especializado, tanto em fases inicias da perda urinária como nas mais avançadas, nas quais a perda atinge proporções que geralmente causam grande desconforto. As razões para não procurar tratamento para a incontinência urinária têm sido assim descritas: não considerar a perda urinária séria ou anormal, acreditar que a queixa faz parte do processo natural com o avançar da idade, baixa expectativa de existir um tratamento adequado, pouco conhecimento sobre o assunto, carência de centros de saúde disponíveis e capa- citados no manejo dessa problemática, e como procurar ajuda.
Apesar do impacto da incontinência urinária na qualidade de vida não estar diretamente relacionado ao grau da perda urinária, estudos demonstram que mulheres com menor perda têm melhor tolerância com essa situação. Os sintomas urinários podem ser perturbadores, tanto é que essa condição é frequentemente mencionada em estudos que avaliam a qualidade de vida. As alterações provocadas pela incontinência urinária podem repercutir em diversos setores da vida das mulheres, por exemplo: trabalho, relacionamento familiar e com a parceria, prática esportiva, atividades de lazer, entre tantos outros.
A relação entre doenças crônicas e/ ou situações de sofrimento prolongado com o humor e a autoestima é amplamente discutida, e essa associação pode interferir no ciclo de resposta sexual normal, acarretando em disfunções sexuais. O mesmo pode acontecer nas mulheres com incontinência urinária, ou seja, a sua correlação com sintomas depressivos.
Além de os sintomas da incontinência urinária interferirem diretamente na qualidade do sono, a sua existência é acompanhada por sentimentos de vergonha, diminuição da autoconfiança e autoestima – emoções essas comentadas pela maioria das mulheres com queixas de perda urinária. Esses sentimentos refletirão no psiquismo como um todo, portanto a disponibilidade para o engajamento em uma atividade sexual estará comprometida, e não é incomum ouvirmos das pacientes que o desejo sexual e práticas sexuais como a masturbação estão afetados.
Com a finalidade de diminuir as perdas acidentais de urina, muitas mulheres passam a adotar comportamentos de esquiva social; do mesmo modo, não é incomum no relato das pacientes com perdas urinárias mais pronunciadas atitudes de evitar o contato sexual, em decorrência do receio de uma possível situação de constrangimento durante o ato sexual.
É notório que os aspectos emocionais e de relacionamento estão envolvidos na gênese das disfunções sexuais, mas cada mais vez evidências demonstram que as disfunções sexuais femininas estão relacionadas a problemas de origem orgânica, uma vez que a resposta sexual saudável depende da interação entre diversos fatores, como vasculares, neurogênicos, musculares e hormonais.
GIANCARLO SPIZZIRRI – é psiquiatra doutorando pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP.
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