ELE E ELA – COMPLETUDE OU CONFORTO?
Homens e mulheres diferem no comportamento porque uma parte importante tem suas raízes na cultura, na educação, na vida social, e tudo o que fazemos acontece a partir de determinação cerebral.
Estudos neuropsicológicos constatam que as diferenças existem entre homens e mulheres e não são exclusivamente culturais. Os pesquisadores de Harvard descobriram que determinadas partes do córtex frontal, envolvido em funções cognitivas importantes, são proporcionalmente mais volumosas em mulheres do que em homens, assim como partes do córtex límbico, envolvido nas reações emocionais. Outra região do cérebro que difere anatomicamente entre os sexos em sua resposta ao estresse, e o hipocampo, estrutura essencial para o armazenamento de lembranças e para o mapeamento espacial do ambiente. Essas divergências anatômicas podem estar ligadas à diferença no modo como homens e mulheres se comportam: os homens tendem a se orientar estimando a distância e sua posição no espaço, enquanto as mulheres se orientam observando pontos de referência.
Seguindo nas comparações entre estruturas cerebrais, o aumento na densidade do córtex auditivo feminino pode estar relacionado ao melhor desempenho em testes de fluência verbal. Essas características não representam mais capacidades, mas a maneira como a estrutura do nosso cérebro se desenvolve. Existe a capacidade de reagir de maneira diferente à violência, o que não quer dizer, obviamente, que as mulheres não possam ser agressivas.
Em relação à inteligência emocional, a situação não é diferente. A inteligência emocional pode ser entendida como a capacidade de se conhecer para lidar bem consigo mesmo e, da mesma forma, conhecer e lidar bem com o outro, nos relacionamentos sociais, familiares ou profissionais. Dessa forma, trata-se da capacidade de conciliar as emoções e a razão, de modo a facilitar esse equilíbrio fundamental na habilidade de trabalho em grupo ou para ouvir nossos próprios sentimentos.
As mulheres apresentam melhor desempenho em relações humanas e tendem a se sobressair em empatia e proteção. Por outro lado, os homens têm mais facilidades na independência e nas habilidades matemático-espaciais. A região parietal inferior do córtex no hemisfério esquerdo é maior nos homens, privilegiando as habilidades mentais de raciocínio matemático, conforme foi verificado no cérebro de Albert Einstein e de outros físicos e matemáticos.
Foi descoberto, no entanto, que o cérebro das mulheres processa a linguagem verbal nos dois hemisférios simultaneamente, enquanto os homens só processam a linguagem verbal no hemisfério esquerdo. Como consequência dessa descoberta, na Universidade de Yale percebeu-se que os homens e as mulheres usam estratégias diferentes para desempenhar as funções cognitivas. Se de um lado eles têm força corporal para competir, elas conseguem vantagens sociais através da argumentação e da persuasão.
É interessante, ainda, que existe um feixe de fibras nervosas ligando os dois hemisférios cerebrais, sendo esse o ponto essencial do desenvolvimento intelectual. Esse feixe é maior nas mulheres, que acessam várias partes do cérebro para resolver determinado problema, enquanto os homens pensam com regiões mais específicas do cérebro, podendo ter respostas mais sintetizadas e objetivas, menos analíticas.
Atualmente, em virtude do acentuado desenvolvimento tecnológico, as relações sociais transformam-se em sua essência, provocando um descompasso na construção identitária do sujeito pós-moderno, que aumenta velozmente a sua interação com a máquina enquanto, inversamente, diminui seu contato com o gênero humano, dificultando o exercício da chamada inteligência emocional porque se dedica mais ao computador que ao conhecimento de si, enquanto pessoa.
Segundo Foucault (1926-1984), o estudo da sexualidade deve centrar-se nos discursos do desejo, explorando as palavras, a linguagem e os símbolos.
Desse modo, a sociedade se constrói nas relações afetivas, familiares, educacionais e profissionais. Sem dúvida, é na família que a identidade da mulher e do homem recebe as primeiras programações culturais. A divisão dos papéis entre o casal para a educação dos filhos reflete os valores e as crenças da instituição familiar. Cada família tem regras e valores próprios. É comum no Ocidente que as meninas, ainda no berçário, ganhem brincos e recebam um laço de fita na cabeça logo após nascer. Os meninos são comemorados sem esses detalhes. Assim, daquele momento em diante, instala-se um aprendizado que deverá fazer parte da identidade feminina ou masculina, num contexto social. A identidade é produto social e reflexo do olhar do outro, ou seja, de como o outro nos percebe, porque o autoconceito se forma a partir das informações que se recebe.
Para Foucault (1926-1984), que enfatiza o papel do poder na evolução do discurso em sociedade, as contradições podem ser vistas como um princípio organizador. O conjunto de traços contraditórios fundamenta os discursos que na atualidade se desdobram em diversos temas sobre os sexos, no qual a mulher é associada ao dilema entre carreira e maternidade, à culpa, à angústia, à incompletude, convergindo para uma identidade em crise, enquanto o homem segue competindo pelo poder e domínio, porém liberado para se emocionar, fazer tarefas caseiras e demonstrar afetividade.
Enfim, o crescimento do número de mulheres em lugares anteriormente ocupados apenas por homens deverá contribuir para o aumento considerável de valores como compreensão, solidariedade e aceitação de diferenças, contribuindo para um mundo mais justo e inclusivo, que abrace a diversidade de gênero.
LUIZA ELENA L. RIBEIRO DO VALLE – é psicóloga, doutora em Ciência no Departamento de Psicologia Social (USP/SP). Mestre em Psicologia Escolar e Educacional (PUC-Campinas), MBA Executivo em Psicologia Organizacional (AVM-Brasília), extensão em Gestão de Pessoas (FGV). Formação em Coaching (Lambent), especialização em Psicologia Clínica (CFP) na linha Cognitivo –Comportamental, consultora em Psicopedagogia, autora de livros.
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