HONESTIDADE: CARÁTER PESSOAL OU CULTURA DE UMA NAÇÃO?
O que a Psicologia ou a Neurociência podem falar sobre essa questão? Todas as dimensões podem ser descritas como impulsos ou instintos, arquétipos, complexos e tipos de caráter, necessidades ou hábitos.
Existem muitas teorias de personalidade que podem descrever, medir e avaliar cada indivíduo. Cada teoria identifica e descreve aspectos da persona que têm sido submetidos a várias espécies de mensuração. Essas dimensões podem ser impulsos ou instintos, arquétipos, complexos e tipos de caráter, necessidades ou até mesmo hábitos.
O senso comum nos diz que os indivíduos diferem uns dos outros, e assim sabemos que uma pessoa é mais ou menos agressiva do que a outra, através da observação de seu comportamento e de suas atitudes. A leitura do caráter, utilizando sinais externos, pode ser detectada através da fisiognomonia (leitura das micro expressões faciais e corporais, timbre, tom e ritmo da voz, gestos e outros), da grafologia (leitura a partir da caligrafia e alguns pontos específicos de observação) e da psicognomia (leitura do caráter, através do comportamento, atos e atitudes).
As atitudes de um indivíduo, em relação a um objeto ou uma ideia, podem ser deduzidas pela observação de todas as suas relações e todos os seus pensamentos, sobre esse mesmo objeto, por um período de tempo. Admitindo que o resultado seria a tarefa de colecionar informações relevantes sobre ela. Para se ter uma certeza sobre o que se quer descobrir indaga-se o indivíduo, diretamente, sobre um fato a ser investigado e observa sua linha de raciocínio e comportamento para aferir e comprovar o que está sendo averiguado.
Para avaliar as atitudes de um indivíduo, ou seja, sua honestidade e seu caráter, precisamos observar suas reações fisiológicas, incluindo gestos, micro expressões, íris, pulsação, tônus muscular, timbre de voz, para que seja averiguado e comprovado seu estado emocional junto à sua personalidade.
A reação da pupila, tanto a dilatação quanto a constrição, se relaciona com determinado tipo de excitação e intensidade, que deve ser observado com muita atenção.
O processo de formação do caráter ocorre através do processo de identificação dos laços parentais e cumpre a função de aliviar a pressão do recalque e fortalecer o ego. Essa base de reação, na tentativa de proteger o ego, torna o indivíduo rígido e limitado em suas percepções e ações.
Assim, a função da formação do caráter e suas resistências servem para evitar o desprazer, estabelecer e manter o equilíbrio psíquico. O caráter tem relação com a forma com que a pulsão e a frustração serão elaboradas na fase do desenvolvimento sexual.
Embora o termo caráter tenha conotação moral, a sua definição em Psicopatologia seria a soma dos traços de personalidade, a forma como o indivíduo reage em sua trajetória de vida, em suas formas de interação social, aptidões, gosto e vontade.
O caráter reflete o temperamento moldado e inserido no meio familiar, sendo o resultado da história pessoal do indivíduo. Mas o temperamento não deve ser confundido com caráter, pois o primeiro é básico, constitutivo do sujeito, e o último é a reação do indivíduo perante diversas situações, resultante da forma com que equacionou, consciente e inconscientemente, seu temperamento em relação às suas expectativas.
ENERGIA VITAL
Freud dizia que a constituição da personalidade perpassa pela libido, a energia vital que estrutura o desejo inconsciente e as formas como vai lidar com seus conflitos e frustrações.
A personalidade se constitui de três importantes sistemas, segundo Sigmund Freud:
a) ID: é a matriz de onde se originam o ego e o superego, nosso incosciente.
Todo o material herdado geneticamente, desde o nascimento à construção do instinto, opera como o reservatório da energia psíquica, que fornece dados para os dois outros sistemas.
O id se manifesta através do princípio do prazer, lutando para que os instintos primários governem nossa conduta, independentemente das consequências que o prazer desses instintos possa acarretar. O id é considerado, segundo Freud, “a verdadeira realidade psíquica”, porque representa o mundo interno de uma experiência subjetiva, sem nenhum conhecimento da realidade objetiva.
O id não aceita estados tensionais, por isso, quando o nível de tensão do organismo aumenta, como resultado de excitações ou estimulações produzidas internamente, ele descarrega essa tensão de imediato, fazendo o organismo retornar a um baixo nível de energia (princípio do prazer).
Para evitar a dor ou mesmo obter prazer, o id comanda dois processos: ações reflexas (reações inatas como piscar, que reduzem a tensão) e o processo primário (tenta descarregar a tensão, formando a imagem de um objeto para remover essa tensão, por exemplo, apresentando a um indivíduo com fome uma imagem mental de um alimento desejado, denominada “realização do desejo”).
b) EGO: considerado o mediador entre o id e o É mais direcionado para o exterior, sendo assim é a partir da formação do ego que começamos a pensar sobre as consequências práticas daquilo que fazemos e os problemas que podem ser gerados através de nossos atos.
Podemos dizer que o ego obedece o princípio da realidade e opera através do meio secundário (pensamento realista, no qual o ego formula um plano para satisfação da necessidade e, logo após, testa-o com algum tipo de ação, para saber se irá funcionar ou não). Como exemplo, o indivíduo faminto pensa sobre onde e como conseguir encontrar seu desejo (alimento) e segue para o local a fim de se sentir realizado.
O ego controla a ação, seleciona as características do ambiente e decide quais instinto s serão satisfeitos e de qual modo.
c) SUPEREGO: considerado o representante internalizado dos valores tradicionais, conforme foram interpretados pela criança através dos ensinamentos obtidos dos pais.
É chamado de força moral da persona, representando o ideal mais do que o real, buscando muito mais a perfeição do que o prazer propriamente dito. Ele se desenvolve em relação às recompensas e punições impostas pelos pais. Para obter as recompensas e evitar os castigos, a criança aprende a conduzir seu comportamento imitando o dos pais.
Suas funções se destacam em inibir os impulsos do id, persuadir o ego a substituir objetivos realistas por moralistas e, finalmente, buscar a perfeição. De modo que o id pode ser imaginado como o componente biológico da realidade, o ego como o componente psicológico e o superego como um componente social, perfazendo assim a junção da personalidade do indivíduo que funciona como um todo e não em partes.
SISTEMAS DIFERENCIADOS
Para Carl Jung, a formação da personalidade consiste em vários sistemas diferenciados:
a) EGO: mente consciente.
Nele constituem-se as memórias, os sentimentos e pensamentos conscientes.
b) INCONSCIENTE PESSOAL: consiste em experiências que um dia foram conscientes, mas que se tornaram reprimidas, esquecidas ou ignoradas, porque foram experiências fracas para deixarem impressões marcadas no consciente do indivíduo.
c) COMPLEXOS: grupo de sentimentos, pensamentos, percepções e memórias do inconsciente pessoal. Por exemplo, o indivíduo, cuja personalidade é denominada pela mãe, tem um forte complexo materno. O que a mãe diz terá sempre grande valor em sua mente.
d) INCONSCIENTE COLETIVO: considerado o reservatório de traços de memória latentes, que foram herdados de um passado ancestral. Também chamado de resíduo psíquico do desenvolvimento humano, acumulado de experiências de repetidas gerações. O indivíduo não se recorda das imagens de forma consciente, porém herda uma predisposição para reagir ao mundo da forma com que seus ancestrais faziam. Sendo assim, a teoria estabelece que o ser humano nasce com muitas predisposições para pensar, entender e agir de certas formas.
É a base herdada, de toda a estrutura da persona, onde são construídos o ego, o inconsciente pessoal e todas as aquisições pessoais. A persona, segundo Jung, é a máscara adotada pelo indivíduo nas relações sociais.
e) ARQUÉTIPOS: forma universal de pensamento (ideia) que contém um grande elemento de emoção, criando imagens correspondentes à realidade. O conteúdo arquetípico é trazido do inconsciente para a consciência quando transformado nas histórias que são contadas.
Na Psicologia do indivíduo, os instintos são fatores impessoais, de caráter mobilizador, que se encontram afastados do limiar da consciência; os arquétipos entram com a simbologia da representação, perfazendo uma analogia entre o imaginário e o real.
f) PERSONA: máscara adotada pelo indivíduo em resposta às tradições sociais e suas necessidades internas. É a personalidade pública, ou seja, aqueles aspectos apresentados ao mundo, que fazem contraste com a persona existente por trás da fachada social.
g) ANIMA: arquétipo feminino no homem.
h) ANIMUS: arquétipo masculino na mulher.
O homem apreende a natureza da mulher através de sua anima, e a mulher apreende a natureza do homem por meio de seu animus. Mas a anima e o animus podem levar a desentendimento e à discórdia, se a imagem arquetípica for projetada sem consideração pelo real caráter do parceiro, ou seja, se um homem identificar sua imagem idealizada de mulher com uma mulher real, ele pode se desapontar quando perceber que as duas nunca serão idênticas.
i) SOMBRA: são os instintos animais que os humanos herdaram em sua evolução. Representa o lado animal da natureza humana. É responsável pelo surgimento de pensamentos e ações desagradáveis reprimidos no inconsciente pessoal.
j) SELF: considerado a meta da vida, a busca incessante que raramente é alcançada; a totalidade plena. O self é a realidade psicológica. Cada indivíduo possui uma imagem do divino em seu íntimo, é uma imagem interior particular, influenciada pela cultura e pelo meio onde está inserido, sendo o centro regulador da psiquê. O encontro com essa imagem leva ao processo de individuação, que consiste em desempenhar seu papel único na sociedade, desde o nascimento até a morte.
PLATÃO E KANT
A Neurociência estuda a origem do comportamento humano e revelou que esse embate é tão antigo quanto a própria civilização. Platão a Kant, grandes observadores do comportamento e de suas facetas, descobriram motivações através de lacunas introspectivas, como uma causa direta que interfere em cada modo de ação.
Atualmente, os neurocientistas dividem o cérebro em três regiões importantes, de acordo com sua fisiologia, funções e desenvolvimento. A região mais primitiva, o cérebro reptiliano, responsável pela autopreservação e agressão, onde residem as emoções mais primitivas, as mais agressivas, sem qualquer empatia, em que o prazer é quem comanda esse domínio. O cérebro reptiliano exerce simplesmente a ação imediata de atender a vontade.
Na segunda região mais importante, destaca-se o sistema límbico, responsável pelas respostas emocionais, comportamento instintivo e de extrema importância para a formação do caráter do indivíduo. Dentre as principais estruturas do sistema destacam-se:
- HIPOCAMPO: armazenamento da memória. TÁLAMO: responsável por integrar os sistemas sensorial e motor. HIPOTÁLAMO: regula as funções do sono, da libido, do apetite e da temperatura corporal. AMIGDALA: responsável pela formação e manutenção das emoções. Uma lesão nessa região seria desencadeada por uma redução na capacidade de detecção do medo, diminuição da emocionalidade, e seu estímulo leva a um estado de ansiedade, medo e atenção aumentada.
- GIRO DO CÍNGULO: localizado logo abaixo do corpo caloso. Coordena odores e visões agradáveis de emoções vivenciadas. O cérebro controla a fisiologia em seu ritmo cardíaco, pressão arterial, apetite, sono, vigília, libido e até mesmo o sistema imunológico, que ocorre pela ação dos neurotransmissores.
- ACETILCOLINA: inicia a contração muscular e estimula a secreção de certos hormônios. No cérebro participa do despertar, raiva, agressividade, sexualidade, sede…
- DOPAMINA: responsável pelo controle dos movimentos, postura, humor e sensação de frio e calor.
- NORADRENALINA: controla a reação de luta ou fuga, gerada pelo estresse.
- SEROTONINA: regula a temperatura, sono, apetite e humor. Uma desordem nessas ações pode conduzir à depressão e ao suicídio.
A ação desses neurotransmissores produzirá variadas reações psíquicas e orgânicas, que prontificarão o indivíduo para se defender ou atacar.
FRENOLOGIA
A frenologia, fundada pelo dr. Gall, era tida como uma ciência da observação e análise cranial. Buscou analisar o caráter do indivíduo em parceria com a criminologia, no intuito de descobrir reações na formação moral do analisado. FRENOLOGIA
As observações da anatomia científica, em diversas reações humanas e também nos animais, foram comparadas à frenologia com êxito, no desenvolvimento dos lobos temporais, onde os instintos destruidores e selvagens formam a parceria da agressividade.
A frenologia propunha uma leitura analítica do caráter, suas disposições e aptidões, diagnosticando a estrutura da individualidade em suas respectivas dosagens. Essa ciência explica que o caráter nativo poderá mudar pela repetição de atos voluntários, opostos à tendência hereditária, ou seja, desde que o crânio atinja seu pleno desenvolvimento e a impulsividade procure controlar o autodomínio de suas escolhas, tecendo um elo entre o ideal e o projetado, no percurso até a formação do caráter.
Dr. Gall esforçou-se por demonstrar através da anatomia comparada, em suas dissecações anatômicas, que o cérebro era o órgão material do pensamento humano, como um instrumento da alma, onde o ambiente físico integra, modifica e molda o ser humano. Demonstrou que as ideias impregnadas do meio em que se vive operam indiretamente nas modificações do caráter do indivíduo.
Freud foi o precursor da descoberta do inconsciente e analisou casos em que o mundo fascinante e fantasioso da mente, oriundos de fantasias, desejos, lapsos, chistes e impulsos não controláveis, permitiu descobrir grande parte dos transtornos mentais não como doenças somáticas, mas como alterações pontuais na nossa mente, onde o inconsciente mente cada detalhe na tentativa de ocultar um desejo reprimido.
Não podemos nos esquecer que Freud foi o primeiro a discorrer sobre os traumas emocionais, os conflitos mentais, as lembranças escondidas na mente … O caso de Anna levou Sigmund Freud a iniciar os estudos sobre a estrutura da mente e revelar os caminhos do inconsciente. Em meados de 1980, diversos estudos indicavam a grande influência do inconsciente, onde os indivíduos ainda não percebiam as razões de como se sentiam, comportavam e julgavam as outras pessoas.
FUNÇÃO PROTETORA
Na Psicologia freudiana, o caráter age como função protetora do nosso ego real contra os perigos internos e externos, limitando a mobilidade psíquica da personalidade. Essa função protetora forma uma espécie de couraça de caráter, cuja finalidade é proteger o nosso ego verdadeiro dos perigos internos e externos. É essa couraça, suportada pela censura que impomos a nós mesmos, que acaba frustrando o choque entre as exigências pulsionais e as do mundo externo. Daí ser a crítica exagerada a nós mesmos perniciosa em relação à autoestima. Quando a criança se desenvolve de maneira saudável, se os impulsos foram parcialmente gratificados e reprimidos de maneira equilibrada e as ações sofridas são incorporadas ao ego real, este se torna forte e integrado, voltado para a realidade do dia a dia. Dessa forma, o ego resulta fortalecido, mas precisa-se ter o cuidado de saber educar o ego real a ponto de não afetar o ego verdadeiro ou espiritual, tudo no sentido de manter um equilíbrio harmônico entre os dois.
A riqueza do cérebro está relacionada à sua capacidade de receber, armazenar e elaborar informações para que o indivíduo possa interagir socialmente, demonstrando lisura de caráter em suas ações e atitudes para com o próximo.
A Neurociência investiga as relações entre o indivíduo, em suas funções psicológicas, buscando respostas para seu comportamento através de seu caráter, nas inter-relações sociais, a fim de percorrer a trajetória organizada em sua formação genética, para desvelar sua personalidade interior. Sabemos, então, que a honestidade está vinculada à formação do caráter, e que o pilar fundamental para a construção desse elo se encaixa nas primeiras referências parentais, em que as emoções desencadeiam vínculos significativos…
AS PRIMEIRAS OBSERVAÇÕES DO CÉREBRO EM PLENA AÇÃO
O primeiro sinal de que o cérebro poderia ser realmente observado em plena ação surgiu no século XIX, quando alguns cientistas perceberam que a atividade nervosa provocava alterações no fluxo sanguíneo e também nos níveis de oxigênio. William James. em seu livro Os Princípios da Psicologia. em 1890. referendando o psicólogo Mosso, registrou a pulsação do cérebro em pacientes com sérias lacunas no crânio, resultantes de cirurgias cerebrais. Ele observou que as pulsações, em determinadas regiões, aumentavam durante a atividade mental e percebeu que essas alterações se originavam das atividades neuronais daquelas regiões. Assim, concluiu que a chave para identificar qual parte cerebral estava em funcionamento era observar as células nervosas ativas e o aumento da circulação local devido ao acúmulo de oxigênio das células.
ARQUÉTIPOS
Podem ser definidos como o primeiro modelo ou imagem de alguma coisa, antigas impressões a respeito de algo. Trata-se de um conceito explorado em inúmeras áreas de estudo, como Psicologia, Filosofia e psicognomia. Arquétipo, na Psicologia Analítica, significa a forma imaterial na qual os fenômenos psíquicos tendem a se moldar. Jung utilizou o termo para se referir a estruturas inatas que servem de matriz para a expressão e o desenvolvimento da psique.
CLÁUDIA MARIA FRANÇA PÁDUA – é psicóloga, criminóloga, perita judicial grafotécnica. Especialista em Criminologia pela PUC e Acadepol/MG. Autora do livro: O Criminoso e Seu Juízo…Existe Prazer em Matar…??? e prefaciadora do livro Criminologia Comparada, de Gabriel Tarde. Presidente do Núcleo de Estudos Pens’Arte & Ponto Criminal. Pesquisadora da área de Inteligência Criminal. Palestrante, escritora, comentarista criminal e conferencista na área de Criminologia, Fisiognomonia, Psicognomia e Inteligência Criminal.
E-mail: pontocriminal@gmail.com
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