COMPORTAMENTO DESMOTIVADOR
Críticas e comparações não indicam novos caminhos, não ajudam a melhorar a performance nem tornam crianças e jovens mais fortes e determinados para enfrentar e superar as próprias frustrações.
Comparar é, de modo geral, relacionar sejam coisas animadas ou inanimadas, concretas ou abstratas, da mesma natureza ou que apresentem similaridades, para conferir as semelhanças ou diferenças que entre elas existem.
Constitui uma das operações mentais mais importantes, que nos permite desenvolver a aprendizagem e adquirir conhecimentos e comportamentos cada vez mais complexos, fazer escolhas inteligentes e instrumentaliza-nos a sermos capazes de optar por aquilo que nos favorece.
Assim, é desejável que se aprenda a comparar e que se ensine às crianças a usar essa ferramenta mental que pode ser um guia seguro em diversas situações desafiadoras ao longo do desenvolvimento: quem não compara, não classifica, e quem não classifica, não analisa, não sintetiza, não compreende, não transfere saberes e competências a novas situações.
Mas nem sempre a comparação é de ordem objetiva, principalmente se falamos sobre relações humanas, em que a subjetividade é um campo comprometido por experiências passadas e pelo viés da personalidade de cada um.
Nas relações humanas, quando a comparação é realizada sob emoções descontroladas, acaba por servir de estopim para o surgimento de muitos percalços no desenvolvimento de valiosas habilidades latentes, que terminam por se perder. A comparação nesse caso torna-se uma crítica não construtiva e fonte de sofrimento emocional, que se desdobra em baixa autoestima e problemas comportamentais em adultos e principalmente nas crianças.
O ser humano é de natureza física, mental e emocional intricadas, possui características individuais, que constituem seu diferencial no mundo e o distinguem do outro sem que perca, entretanto, a humanidade que o une aos semelhantes, como espécie, esteja em qual cultura estiver.
Pode-se dizer que é nessa complexa inter-relação entre as semelhanças e diferenças das pessoas, adultas e crianças, que se embasa boa parte dos desafios educacionais em todos os aspectos e níveis em que se pratica, desde o familiar ao acadêmico, ao social, ao mundo profissional, entre outros que as pessoas vão estabelecendo durante o desenrolar da vida.
Um cuidado maior se deve ter quando as relações são familiares e se dão entre pais, professores e crianças, pois é a partir dessa fase inicial que se desenvolverão as potencialidades de cada um ou se criarão barreiras ao seu crescimento saudável.
É inevitável nós adultos pensarmos em termos de comparação, até porque muito do que aprendemos foi e é construído mentalmente por comparação e exclusão. Quando se trata de objetos ou situações quantificáveis, objetivas, em geral só obtemos vantagens usando dessa operação mental tão estudada pela Psicologia e pela educação. Mas nos relacionamentos familiares, na educação infantil, a questão passa por importantes crivos como a motivação, a frustração, as expectativas e o potencial de cada um.
A frustração, por exemplo, que advém da diferença entre nossa pretensão e o resultado obtido, deve ser compreendida pelo adulto sob um olhar pessoal e não na relação com o outro, principalmente se tratando de crianças que são seres em desenvolvimento e para quem críticas familiares são parâmetros poderosos. Uma derrota inesperada, notas baixas, uma repetência já anunciada, uma decepção que seja mal trabalhada pela família pode implementar uma imagem negativa que a criança projetará de si mesma, de sua capacidade pessoal para o desempenho escolar, por exemplo.
O papel que os adultos exercem em relação aos filhos não é, de forma alguma, o de aplaudir sempre, elogiar sem motivos, mas o cuidado deve ser semelhante ao fazer críticas e comparações
com outros, especialmente quando as suas próprias aspirações pessoais não forem atingidas pelos filhos.
Não se pode projetar mentalmente e exigir, na prática, que teremos em casa um campeão esportivo ou o aluno com as melhores notas da classe, e cobrar isso de nossos filhos. Devemos incentivá-los a alcançar o seu melhor, através do estímulo ambiental, da oportunização de experiências valiosas, da motivação, da atenção diária, do apoio material e emocional, e depois receber com tranquilidade o resultado de seu esforço, sem elogios vazios, sem frustrá-los ou magoá-los, através de comparações com nossos padrões pessoais ou com a performance de outras crianças. Devemos ter em mente que comparações negativas causam mágoas, ressentimentos, marcas importantes e indeléveis, especialmente quando são oriundas da opinião das pessoas que mais amam e querem agradar nesse mundo: seus pais. A própria desmotivação escolar, muitas vezes, se origina nas comparações entre irmãos ou mesmo coleguinhas, feitas de modo pouco adequado pelos adultos. É necessário haver um referencial positivo, sim, mas guardado o respeito pelo potencial particular e por fatores ligados à individualidade e à história de vida de cada um, sob o risco de gerar um sentimento de inadequação pessoal altamente impactante em novas tentativas de acerto.
A crítica, que é produto da comparação mal dirigida, leva a um movimento de afastamento entre pais e filhos: enquanto os primeiros, decepcionados e frustrados nos seus desejos pessoais se lastimam, os segundos sofrem duplamente a derrota, por si mesmos e pelos seus familiares que frustraram, gerando culpa, medo, desânimo.
A experiência mostra que adultos frustrados que desejam alcançar através dos filhos seus próprios sonhos perdidos criam tuna cadeia infinita de fracassados. Mas também nos ensina que adultos equilibrados fazem críticas positivas e comparações motivadoras aos filhos, estimulam e apoiam as crianças a se empenharem sempre e apontam para a importância de serem bem-sucedidas na medida de suas potencialidades, no que particularmente desejam e têm habilidades pessoais.
MARIA IRENE MALUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br
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