O XIS DA QUESTÃO
Voltar à escola envolve equação complexa – que deve ser encarada
Jamais quis mandar na nossa educação. Agora, muito menos, pois há que decidir a volta às aulas presenciais, assunto delicado e cercado de nuances. Com toda franqueza, temo oferecer conselhos nesse duelo entre permanecer ignorante e aumentar o risco de contaminação e a ruína econômica. Apenas posso definir melhor os contornos do problema. A maior probabilidade de contágio é em um ambiente fechado, com muita gente, onde a permanência é longa. Exatamente assim é uma sala de aula tradicional. Daí a necessidade de ajustá-la a estes tempos. A mortalidade entre jovens é muito baixa. Mas é do nosso conhecimento também que eles contraem o vírus e podem transmiti-lo, mesmo assintomáticos. Serão uma ameaça para pais e avós, professores e funcionários, todos em idades menos blindadas? Na dúvida, os cuidados devem ser redobrados.
Hoje, sabemos, pegar na maçaneta e depois botar o dedo na boca é uma forma possível, mas muito infrequente, de contrair a doença. E que os tais aerossóis se revelaram poderosos vetores do vírus, ainda que uma boa máscara reduza drasticamente o risco. Muito se pode fazer para minimizar os casos da doença dentro das escolas. Mas exige recursos e vontade férrea na implementação. Infelizmente, a disciplina não é o nosso forte. Precisamos aprender a lapidar essa habilidade.
As aulas voltarão, resta decidir quando e como. A pior política seria uma data única para retornarem todos. Alguns lugares, afinal, domaram a pandemia melhor que outros, portanto podem se antecipar com menos risco. E, para cada nível de educação, um calendário próprio para o retorno faz todo o sentido. O ensino superior tem experiência no ensino a distância. Sendo assim, vale arriscar? Em certas universidades americanas, no regresso, os casos explodiram. Ainda assim, em carreiras com muitas atividades práticas, torna-se razoável abrir laboratórios.
No ensino básico, a educação a distância sempre foi desaconselhada. Se existe agora, é por falta de alternativas. Logo, essa turma precisa voltar antes. Muita gente, aliás, se espanta com o péssimo rendimento de metade dos alunos nessa modalidade de ensino. Eu me espanto, isso sim, com o fato de a outra metade estar aprendendo, apesar da improvisação e da falta de meios. Temos, é bom que se frise, uma ótima chance de melhorar a educação, com as lições agora assimiladas. Quanto mais jovem, mais essencial é o contato pessoal. Por isso, as séries iniciais devem voltar mais cedo. Os mais velhos ficam para depois. Seja como for, escolas e alunos mais desprovidos são os grandes perdedores e merecem prioridade no retorno. Algumas crianças, quase sempre as mais pobres, enfrentam imensas dificuldades no ensino a distância. Faltam-lhes organização de estudo, motivação e apoio eficaz das famílias. Isso é agravado pela precariedade do que é oferecido. Para elas, voltar é vital. Soma-se ainda aí o argumento econômico, pois as mães poderão trabalhar fora enquanto seus filhos estiverem no colégio.
Quantos jovens e adultos estarão sob mais riscos ao regressar às aulas? Não há como estimar tais números, mas é inevitável que cresçam, por tudo o que sabemos. Abrir os portões para oferecer melhor educação e permitir o trabalho das mães se faz à custa de mais exposição da garotada. Mas há ganhos nessa equação. Enfim, não gostaria de estar na pele de quem toma essas decisões.
*** CLÁUDIO MOURA CASTRO
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