RECUPERAÇÃO DA BALADA
Maturidade é escolher cada vez mais o programa do final de semana, o passeio, a companhia.
Eu estou na faixa dos 50 anos. Minha esposa, na faixa dos 40. Não podemos nos sacrificar à toa. Uma festa vai mobilizar o nosso fôlego, o nosso esforço, o nosso condicionamento físico. Deve ser aquela senhora festa, já que demandará muito de nosso tempo útil para a reabilitação.
Não estamos na fase de acordar com enxaqueca, mas sem cabeça mesmo. Toda ressaca custa caro, requer cuidados médicos.
Caminhar infinitamente explode os sapatos. Dançar sem parar é capaz de atacar a coluna. Excesso de bebida desidrata ao máximo.
Regressar para casa às sete da manhã, depois dos galos, depois dos cachorros, entra no rol de proezas maritais. Foram poucas as vezes em que nos aventuramos até o fim da madrugada, e inesquecíveis pelos efeitos colaterais do cansaço.
A vida muda de perspectiva conforme a sua geração. Há exceções, mas a regra etária continua mandando.
Quando você tem 18 anos, nem precisa dormir para se recuperar de uma balada. Emenda programas, acumula convites. Parte de um lugar menos povoado para outro lotado e mais charmoso. Jamais abrevia a turnê enquanto está na luta contra a solidão. Troca o sol pela lua. E ainda reúne condições para namorar até o meio-dia, na hipótese de encontrar uma companhia para a sua loucura.
Quando você tem 2S anos, precisa dormir uma hora para se recuperar de uma balada. É aquela cochiladinha revigorante. Consegue participar do almoço familiar como se nada tivesse acontecido. Lembra-se de tudo o que viveu, sem blecautes e lapsos da amnésia alcoólica.
Quando você tem 30 anos, precisa de um dia para se recuperar de uma balada. Algo da sua essência se transforma. Não é mais eufórico como antes, não grita como antes ao localizar um conhecido no tumulto, não canta desesperadamente e de olhos fechados como antes, não ocupa o centro da pista como antes para coreografar passos e dancinhas da moda. Prefere conversar e povoar os cantos, os corredores. Deseja, inclusive, uma cadeira para se sentar e realiza paradas estratégicas.
Quando você tem 40 anos, precisa de dois dias para se recuperar de uma balada. Se a diversão foi na sexta, passará de molho sábado e domingo. Só voltará a viver na segunda. Estará estragado para o resto do lazer. A boemia se assemelha a uma virose: derrubará você na cama.
Quando você tem 50 anos, precisa de uma semana para se recuperar de uma balada. Sente mais prazer em voltar para casa do que em sair de casa. Planeja, previamente, o horário de retorno. Se, na juventude, você saía escondido do lar para a festa, agora você sai escondido da festa para o lar. Não se despede de ninguém, para não correr o risco de ser persuadido com o bordão “é muito cedo”.
Quando você tem 60 anos, precisa de um mês para se recuperar de uma balada. É um evento que exigirá sessão de fisioterapia mais do que turnos sucessivos de repouso. O ideal é dispensar o Uber ou o táxi e ir dentro do Samu. Assim a ambulância já fica estacionada na porta do inferninho para uma emergência.
CARPINEJAR
Você me deu uma idéia, fazer isso nas férias!
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