TÉCNICA RECRIA PÊNIS ‘DO ZERO’ E PERMITE TER UMA VIDA SEXUAL ATIVA
Cirurgia inovadora é destinada a homens amputados, trans ou com micropênis. Sete já foram submetidos ao método

Era meia-noite de um dia comum de 2012 quando João (nome fictício), de 61 anos, acordou com o latido dos cachorros. Ele saiu da cama para descobrir se alguém tentava entrar em sua casa, localizada na zona rural de uma cidade baiana, e chegou a ver os bandidos de longe, no escuro. Foi quando um deles disparou um único tiro, acertando a virilha do fazendeiro e decepando parte do pênis. A história só teve um desfecho positivo no fim de setembro deste ano, quando ele passou por uma cirurgia de reconstrução peniana desenvolvida por um médico urologista brasileiro.
“Eu fiquei defeituoso. Não conseguia nem urinar. Quase que eu morri, mas agora tudo vai mudar”, disse ele, pouco antes da intervenção. Um dia após o processo, que começou às 15h e terminou por volta de 22h, João disse que não sentiu dor e não via a hora de retirar as bandagens. Ele teve alta dois dias depois da cirurgia, sem nenhuma complicação ou necessidade de bolsa de sangue.
Ao todo, sete pessoas já passaram pelo procedimento inovador criado pela equipe do médico Ubirajara Barroso, chefe do serviço de urologia do Hospital Universitário Prof. Edgard Santos da Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde também é coordenador da disciplina de urologia.
Seis dos pacientes passaram pela Mobilização Total dos Corpos (TCM, na abreviação em inglês) por intermédio do SUS, sendo João o único a realizar a cirurgia de forma particular.
TÉCNICA
Barroso explica que só parte do pênis fica para fora do corpo, tendo uma extensão, não visível, dentro do homem. Em média, a parte que é vista corresponde a 2/5 do órgão e os outros 3/5 ficam fixos na bacia, garantindo a ereção. A ideia de Barroso foi relativamente simples: puxar a parte interna para fora.
“O que fazemos na cirurgia é destacar essa porção do corpo cavernoso do osso e levar tudo para a superfície. É como um iceberg: tem uma porção pequena acima da água e uma grande porção abaixo da água. O pênis pequeno é só a ponta desse iceberg, então nós retiramos a parte de ‘dentro da água’ e colocamos na superfície”, afirma.
Apesar da teoria simplificada, o procedimento não era feito dessa forma pelos médicos. A primeira vez que ele adotou técnica foi em 2019, em um menino que teve o pênis arrancado por um cachorro aos 8 meses de idade.
O caso foi em Itapicuru (BA). O cão da família arrancou o pênis do garoto, que teve o órgão completamente amputado. Por volta dos 11 anos, ele passou pela primeira cirurgia com Barroso.
Utilizando uma técnica anterior ao TCM, o médico recuperou a uretra do menino, que urinava por um orifício. Era a segunda cirurgia do tipo no Brasil e teve sucesso. “Fizemos uma espécie de enxerto de pele para que ele tivesse o aspecto da genitália masculina.”
O segundo a passar pela técnica foi Moacir (nome fictício), que tem transtornos psiquiátricos. Em um surto psicótico, ele arrancou o próprio pênis, sobrando apenas cerca de oito centímetros. Anos após a crise e sob controle, ele procurou o médico na tentativa de recuperar o órgão. Hoje, após o procedimento, o pênis possui 12,5 centímetros e é capaz de proporcionar prazer semelhante ao órgão sem intervenção.
FILA
Atualmente, o Brasil contabiliza mais de 500 casos de amputação de pênis por ano e não há dados concretos sobre o número de homens trans que pretendem fazer cirurgia de redesignação. A fila de espera de Barroso, segundo conta, já está na casa dos milhares, especialmente pelo fato de os procedimentos serem realizados pelo SUS. O profissional reforça que está em contato com diversos urologistas brasileiros.
Conforme José de Ribamar Rodrigues Calixto, da Sociedade Brasileira de Urologia, a expectativa é de que a TCM seja cada vez mais usada em casos ligados a câncer de pênis. Embora possa aumentar e até engrossar o órgão sexual, Barroso só prevê a técnica para diagnosticados com micropênis, câncer peniano, mutilação ou redesignação de gênero.
Segundo o profissional, a maioria dos homens que acreditam ter pênis pequeno normalmente não o tem, sendo desnecessária uma intervenção cirúrgica. “Esses casos nunca foram tratados de maneira a ganhar significativamente no tamanho, mas na vida pessoal”, afirma.

Você precisa fazer login para comentar.