FICAR SEM CELULAR PERMITE NOVO ESTILO DE VIDA E A RETOMADA DE HÁBITOS
Sem telefone desde que teve de cortar despesas ao deixar a casa paterna, jovem teve de se livrar do vício do aparelho e conta que recuperou atividades saudáveis

Em um mundo cada vez mais conectado, Josielle Soares vai na contramão: ela vive há quase dois anos sem celular. “É importante estar conectado, mas não de uma forma em que você se perde para dar conta de tudo”, explica. A decisão veio depois que o antigo smartphone quebrou. Sem dinheiro para comprar outro, ela optou por um novo estilo de vida.
Desde que saiu da casa dos pais e passou a pagar as contas com o próprio salário, Josielle, de 28 anos, aprendeu que seria necessário controlar os gastos. “Eu já queria ficar sem celular e, quando quebrou, a questão financeira foi um ponto importante para mim”, conta ela, que trabalha na rádio universitária da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). A pressão e o estresse do trabalho remoto também foram decisivos. “Os horários ficaram muito bagunçados. Eu recebia demandas às 20h e não conseguia aproveitar o momento de descanso porque estava pensando em trabalho”, diz. A saída foi abandonar o smartphone.
Mesmo que já quisesse levar uma vida menos conectada, Josielle reconhece as dificuldades dos primeiros momentos sem o celular. “Você não sabe exatamente o que é, mas fica com a sensação de que está perdendo algo”, relata. Ela continuou acompanhando as notícias pela televisão e pelo computador, mas isso não era suficiente para suprir a falta do smartphone. “Será que está acontecendo alguma coisa com alguém?”, indagava.
VÍCIO
“Isso acontece porque seu cérebro está sentindo falta do que ele estava acostumado a ter. Ele sente falta do que alimentava o vício”, alerta a neurocientista Claudia Feitosa Santana. De acordo com ela, há uma série de mecanismos e neurotransmissores envolvidos nesse processo de dependência do celular. “É por isso que muitas pessoas não conseguem ter uma vida normal se não tiverem acesso a um smartphone, mesmo que elas queiram”, afirma.
Um estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) revela que no Brasil há mais smartphones em uso do que pessoas. São 242 milhões de celulares, enquanto, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população é de 215,1 milhões de pessoas. “Isso é reflexo de um fenômeno de digitalização da moeda, do trabalho e da educação”, explica Fernando Meirelles, coordenador da pesquisa. Essa digitalização também aparece nos dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua – Tecnologia da Informação e Comunicação (PNAD Contínua TIC), realizada no quarto trimestre de 2021.
O levantamento mostra que a internet está presente em 90% dos domicílios do País e que o celular é o principal dispositivo de acesso em casa, sendo utilizado em 99,5% dos domicílios com internet.
Vivendo desde dezembro de 2020 sem smartphone, Josielle relata que hoje a vida mudou. “Eu voltei para atividades que eu gostava muito e que tinha deixado de lado, como tocar violão. Era a minha terapia”, lembra. “Acho que eu reduzi bastante minha ansiedade e até a possibilidade de depressão”, afirma.

DICAS DE ‘DETOX DIGITAL’ VÃO DO AUTOCONTROLE A DESATIVAR NOTIFICAÇÕES
Os smartphones ganham cada vez mais importância entre as atividades cotidianas. O problema acontece quando seu uso é em excesso. Segundo Felipe Botelho, psicólogo do Grupo de Dependências Tecnológicas do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP), essa sobrecarga física e mental causada pelo uso desequilibrado do smartphone pode afetar a vida offline. “As pessoas passam a sentir uma necessidade frequente de checar o celular e ver as redes sociais”, explica. Para evitar isso, alguns cuidados precisam ser tomados.
RECONHEÇA SEUS COMPORTAMENTOS
“É o primeiro passo”, explica Botelho. Ele garante que é importante observar a forma como nos relacionamos com os smartphones e tentar identificar se essa relação acontece em desequilíbrio. Entre os caminhos para isso, é importante verificar a quantidade de horas dedicadas às redes sociais, se existe alguma dificuldade em deixar o celular longe e em quais momentos o uso do celular é mais intenso.
LIMITE SEU USO
Se identificar excesso, tente definir momentos para usar e não usar o aparelho. Felipe Botelho pondera que esse limite deve acontecer nos momentos livres, visto que as atividades de trabalho e estudo de muitas pessoas dependem muitas vezes dos smartphones.
BUSQUE ALTERNATIVAS
Muitas vezes recorremos ao smartphone quando estamos entediados. Porém, encontrar outras atividades para esses momentos pode ajudar. “É importante que a pessoa avalie o que ela gosta de fazer sem o celular”, sugere o especialista.
DESATIVE NOTIFICAÇÕES
“As notificações são um gerador de ansiedade”, avalia Botelho. De acordo com ele, desativar vai reduzir os estímulos ao uso do smartphone a todo momento. É preciso entender que nem tudo é urgente.
TENTE OUTROS DISPOSITIVOS
Usar o computador, por exemplo, em vez do celular, pode ser uma prática bastante saudável. Ou então optar por assistir a um filme pela televisão. Felipe Botelho explica que essas são mídias consideradas passivas, porque não exigem interações diretas, como o smartphone.
Uma consideração sobre “A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS”
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