AUTOESTIMA AJUDA A DRIBLAR CRUELDADE DO RACISMO NA INFÂNCIA
Crianças falam de partes legais e difíceis de serem negras e empresária lembra por que criou sua marca de bonecas

“Ser negra é algo que vai muito além da cor da pele.” Essa frase é da Gabrielly. Ela tem 13 anos e já entende muito sobre como funciona o mundo em que vive – para o bem, e para o mal.
“Ser negra significa ter que aguentar comentários ofensivos e idiotas, aguentar a desigualdade social, o racismo. É uma coisa que nós negros temos que carregar para o resto da vida”, enumera Gabrielly.
“Mas, independentemente disso, temos que ter orgulho da nossa cor.”
Quando era criança, a empresária Joyce Venâncio tinha uma consciência tão profunda de si mesma quanto a que Gabrielly tem hoje. Ela lembra que, mesmo tendo crescido em uma família que conversava muito sobre preconceitos e crueldades, ainda assim viveu momentos ruins.
“Era difícil enfrentar vários tipos de xingamentos, piadas. O racismo dói demais.” Uma vez, Joyce questionou em casa porque não havia bonecas da mesma cor que a sua. A avó não teve dúvidas: comprou uma cabeça de boneca (branca), revestiu com uma meia-calça tingida, e fez para a neta uma boneca parecida com ela.
Muitos anos depois, Joyce abriu em São Paulo uma loja de bonecas como a que ganhou na infância. Na Preta Pretinha, há brinquedos de todas as cores, mas as bonecas negras são maioria.
Para Joyce, ser negra é maravilhoso. “Eu me amo, gosto de me olhar no espelho. Ser negra é força, coragem, sabedoria. É ter fé, é conquistar.” A Larissa, de 11 anos, acha que uma das coisas mais legais de ser negra é dar entrevistas. “Já fiz uma antes, e agora essa”, disse. “Ser negra para mim é ser uma pessoa muito forte, cheia de conquistas e amor para dar.”
Uma das coisas mais legais que já aconteceram à Barbara, de 11 anos, foi receber elogios sobre seu cabelo. “E a pior coisa foi me sentir excluída em algumas situações de pessoas brancas”, lembra.
“Em uma foto, se você é negra você se destaca mais que as outras pessoas porque você tem uma cor diferente, e às vezes é legal, às vezes não é. Aconteceu uma vez comigo e não gostei”, conta Maria Paula, 11 anos.
Maria Eduarda tem 13 anos e gosta muito de ser negra, mas sabe que há quem não compartilhe desse ponto de vista. “Como os racistas, que acham que nosso cabelo é feio”, explica.
“Tem argumentos horríveis que já falaram pra mim como ‘cabelo ruim’, ‘cabelo de bombril’, ‘cabelo duro’. Ser negra é ser seguida em todo lugar que você entra, se sentir inferior. Um segurança te seguir com medo de você roubar algo.”
Mas, mesmo com o mundo lá fora tão bruto, Maria Eduarda mantém a autoestima. “Minha pele é uma das coisas mais bonitas que existem. Tenho traços lindos que lembram minha cultura, e essa é uma marca que vou carregar até o final da vida”, fala.
Joyce, dona da Preta Pretinha, gosta de lembrar quando se candidatou a miss primavera na escola. Eram 29 meninas concorrendo, e só 3 delas eram negras – Joyce, sua irmã e uma terceira aluna.
“Eu estava muito segura. Ganhei e minha irmã ficou em terceiro lugar. Muitas famílias racistas não aceitaram e mesmo assim foi incrível”, lembra. “É importante você, criança negra, olhar esse cabelo maravilhoso e saber que podemos fazer vários tipos de penteado”, ensina. “É fundamental se gostar, se olhar no espelho, e se enxergar como uma pessoa linda, cheia de potencial.”
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