PLANTAÇÃO
Cientistas criam, com sucesso, técnicas para combater a calvície

Pesquisadores da Universidade Nacional de Yokohama, no Japão, chegaram mais perto de encontrar uma cura para a calvície. Em laboratório, os cientistas conseguiram criar folículos capilares a partir de células embrionárias de camundongos. Quando implantados nos animais, os folículos geraram os fios com sucesso, e continuaram a funcionar em vários ciclos de crescimento dos pelos. O estudo foi publicado na revista científica Science Advances.
O folículo é uma estrutura em formato de bolsa que fica abaixo da pele, na hipoderme. Dentro dele está a raiz do fio capilar. Cada folículo consegue gerar entre três e cinco fios. Com os resultados animadores, os cientistas acreditam que o método abre caminho para futuros tratamentos de distúrbios que levam à queda de cabelo. Outra possibilidade é que o crescimento em laboratório dispense o uso de animais para testes de produtos químicos.
“O próximo passo é usar células de origem humana e aplicar para o desenvolvimento de medicamentos e medicina regenerativa”, diz Junji Fukuda, professor da faculdade de engenharia biomédica da Universidade Nacional de Yokohama, em comunicado.
Para desenvolver os folículos que serão testados em humanos em laboratório, porém, os cientistas explicam que o processo será um pouco diferente. Em vez de células embrionárias, por questões éticas e de acesso ao material, eles utilizarão engenharia reversa em células-tronco para alcançar as unidades presentes na fase em que o indivíduo ainda é um feto em formação.
“Tem muita água para rolar ainda, porém, entender esse meio complexo de ativações e inativações do folículo, estímulos e inibições, ou seja, como essa orquestra funciona, já é um grande passo na ciência, porque ainda não temos isso 100% definido. Nestes últimos cinco a dez anos, estamos caminhando de forma muito mais rápida, tanto em terapias medicamentosas como celulares e genéticas, então não tenho dúvidas de que em breve teremos opções terapêuticas novas para o tratamento da calvície”, avalia a médica dermatologista coordenadora do departamento de cabelos da Sociedade Brasileira de Dermatologia regional do Rio de Janeiro (SBDRJ), Violeta Tortelly.
Para Natasha Crepaldi, professora da residência em dermatologia da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) e membro da SBD, caso a técnica se mostre eficaz em humanos será de fato uma nova e importante alternativa no tratamento da calvície.
“Será fundamental para elucidar muitas etapas do funcionamento da unidade folicular até então pouco conhecidas e também para a abordagem precoce de casos iniciais em que folículos novos poderão impedir a evolução e para casos avançados de calvície onde não há mais área doadora viável (de outras partes do cabelo) para o transplante. Além disso, dispensará o uso de medicações antes e depois do transplante, já que folículos capilares criados (em laboratório) não terão a resposta genética pré-definida e causadora da calvície”, explica a médica.
Tortelly ressalta que as terapias disponíveis atualmente buscam atacar a causa da queda dos fios e estimular os existentes, porém não conseguem recuperar os que foram perdidos.
A calvície, chamada de alopecia, pode ser de diversos tipos. O mais comum, chamado de androgenética, é relacionado aos hormônios masculinos e por isso tem a maior prevalência entre os homens. Nesses casos, costumam se manifestar já nos 20 anos e se agravar com o tempo. É um quadro hereditário.
“A herança genética é poligênica, isto é, não vem só da mãe ou só do pai, pode ser de qualquer parente próximo. E quanto ao fator hormonal, o que ocorre é que a dihidrotestosterona (a DHT) se liga aos receptores do folículo capilar e faz com que eles afinem e reduzam o crescimento. Os fios então vão reduzindo muito a densidade e afinando, passando de três a cinco fios de cabelo por folículo, para apenas um ou dois fios”, diz Crepaldi.
Outra forma que ganhou destaque por ser o diagnóstico da esposa do ator Will Smith, a também atriz Jada Smith, é a alopecia areata. Nesse caso, é uma doença autoimune, pois o próprio sistema imunológico ataca os folículos capilares, impedindo a produção de novos fios.
O EXPERIMENTO
Os pesquisadores desenvolveram a nova técnica baseada na formação natural dos folículos durante a fase embrionária. Eles explicam que, nesse momento, ocorre uma interação entre a camada mais externa da pele, a epiderme, e o mesênquima, uma espécie de tecido primário que dá origem aos tecidos conjuntivos do corpo, como o cartilaginoso, o ósseo, entre outros.
Durante essa interação, são enviadas instruções para que as células se organizem na epiderme e formem os folículos. Os mecanismos desse processo, no entanto, não eram completamente compreendidos.
O cenário mudou com a chegada dos organoides, considerados um dos maiores avanços científicos das últimas décadas. São conjuntos de células criadas a partir de células embrionárias ou células-tronco para reproduzir características genéticas e fisiológicas de determinado órgão ou tecido do corpo. Com isso, os cientistas conseguem analisar processos e mecanismos no laboratório, desenvolvendo “miniórgãos” ou “minitecidos”.
Eles fabricaram então os organoides de folículos capilares a partir de dois tipos de células embrionárias para reproduzir a interação que ocorre durante o desenvolvimento do feto.
O experimento foi bem sucedido, com os organoides gerando folículos e hastes capilares (parte visível do cabelo) com quase 100% de eficiência. Em 23 dias de cultivo, os fios tinham cerca de 3 mm de comprimento, um feito inédito que comprovou a capacidade de gerar o crescimento de cabelo.
Em seguida, eles adicionaram uma droga estimulante de melanócitos – células responsáveis pela produção da melanina, que dá cor ao cabelo. Assim, a pigmentação dos fios melhorou ‘significativamente’. Por fim, eles transplantaram os organoides nos camundongos, o que funcionou de forma eficiente e em vários ciclos de crescimento dos pelos.
“Isso é importante pois os folículos trabalham em ciclos, então existe a fase de crescimento, a fase de transição e a fase de descanso ou queda dos fios”, explica a professora da UFMT.
ALTERNATIVAS
A forma mais comum de reverter a queda capilar da alopecia androgenética disponível hoje é com o uso de medicamentos. As especialistas explicam que fármacos como a finasterida ou a dutasterida inibem a enzima que transforma a testosterona em DHT, impedindo o processo de miniaturização do folículo capilar e, posteriormente, a queda dos fios.
Outro remédio muito conhecido é o minoxidil, que melhora o fluxo sanguíneo do couro cabeludo. Aprovado para uso tópico, como loção, não funciona para todas as pessoas, nem consegue reverter quedas excessivas. Recentemente, estudos têm apontado que uma versão oral da substância proporciona efeito superior, mas ainda não há aval das agências reguladoras. No caso específico da alopecia areata, relacionada ao sistema imune, um outro medicamento tem se mostrado promissor: o baricitinibe. O remédio recebeu o aval para tratar a doença nos Estados Unidos neste ano, e a mesma indicação já está em análise pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do Brasil.
Além dos tratamentos com fármacos, uma alternativa é o transplante capilar mais moderno, o follicular unit extraction (FUE).
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