ESTUDO APONTA ORIGEM DA HISTÓRIA DE AMOR ENTRE CÃES E SERES HUMANOS
Análise de DNA indica que os cachorros atuais estão mais próximos dos lobos da era do Gelo
Um levantamento sem precedentes da diversidade genética que existia entre os lobos do fim da era do Gelo acaba de trazer mais pistas sobre as origens da longa história de um amor entre cães e seres humanos.
Os dados indicam que a maioria dos cachorros vivos hoje tem parentesco mais próximo com os lobos antigos que viviam no leste da Eurásia, em locais como a Sibéria, embora outras populações da espécie aparentemente também tenham contribuído para os ancestrais dos bichos domésticos de hoje.
Os resultados, publicados recentemente na revista científica britânica Nature, não chegam a resolver totalmente o enigma da domesticação dos cães, mas trazem uma grande massa de informações novas sobre o tema.
“O conjunto de dados do artigo é bastante impressionante. Temos cerca de 70 genomas sequenciados (ou seja, ‘soletrados’ na íntegra, como o genoma humano atual) ao longo de uma série temporal de 100 mil anos. Isso permitiu que analisássemos uma quantidade enorme de detalhes a respeito de como os lobos evoluíram ao longo desse período. E, claro, um dos aspectos disso é a relação deles com os cães domesticados”, explica David Stanton, pesquisador do Centro de Paleogenética da Queen Mary University de Londres, em comunicado oficial.
Ele é um dos coautores do estudo, realizado por uma equipe internacional com dezenas de cientistas, a maioria europeus.
Os lobos com milhares ou dezenas de milhares de anos que “doaram” seu DNA para estudo têm distribuição geográfica ampla. Seus esqueletos vêm de boa parte da Europa Ocidental, da Rússia; do Oriente Médio, da Ásia Central e da América do Norte.
Defato, os lobos eram uma das espécies de grandes mamíferos mais bem distribuídas pelo planeta no Pleistoceno (a era do Gelo), ponto no qual se assemelhavam aos seres humanos que acabariam domesticando alguns deles.
Essa distribuição geográfica, sinal de grande versatilidade, pode ajudar a explicar o fato de que os bichos não desapareceram no fim desse período, ao contrário do que aconteceu com muitos outros predadores do Pleistoceno, como ursos-das cavernas e dentes de-sabre.
“É impressionante como eles conseguiam se movimentar de forma relativamente rápida e fácil por muitas regiões”, observou Stanton em comunicado oficial.
Outro possível fator chave foi revelado pela análise genômica: a conexão frequente entre as populações de lobos ao longo do tempo. Ao que tudo indica, a reprodução envolvendo diferentes grupos da espécie funcionava como um eficiente “telefone sem fio levando mutações novas no DNA de um canto a outro do hemisfério Norte, principalmente se elas aconteciam na Sibéria.
O território siberiano parece ter sido o lugar que mais “exportava” genes de lobos para as populações lupinas em outros lugares do planeta. Com essa facilidade para se misturar e incorporar novidades genéticas, os bichos podem ter aumentado sua capacidade de se adaptar a novos desafios do ambiente ao longo do tempo.
A situação parece ter mudado de figura para os lobos a partir de 10 mil anos antes do presente, época na qual a agricultura e a criação de animais estava começando em diversos lugares do mundo, com aumento da densidade populacional humana. Isso pode significar que, a partir desse momento, os membros da nossa espécie causaram mudanças ambientais que reduziram o território disponível para os bandos lupinos e impediram que eles continuassem com o contato entre si.
Os dados genômicos também indicam que os ancestrais dos cães vivos hoje ainda faziam parte de uma única “grande família” com os lobos, ao menos no que diz respeito ao DNA, há 28 mil anos.
Essa poderia ser a data para o início do processo de domesticação, o que significaria que os cães passaram a viver com os seres humanos cerca de 20 mil anos antes do que qualquer outro animal. Mesmo assim, os autores do novo estudo observam que o processa pode até ter começado antes disso.
A comparação mais detalhada dos lobos antigos com os membros modernos da sua espécie e os cães revelou ainda que nenhuma população atual de lobos bate com a dos possíveis ancestrais dos cães domésticos.
Os cachorros estão mais próximos dos lobos que existiram no leste da Eurásia no fim da era do Gelo, de maneira geral. Mas os cães do Oriente Médio e da África derivariam até metade de seu DNA de outros lobos antigos, mais próximos dos que vivem atualmente na parte mais ocidental da Eurásia.
Isso pode indicar que os cães foram domesticados duas vezes, no Oriente e no Ocidente, ou que ocorreu apenas a domesticação oriental, à qual se somaram, mais tarde, cruzamentos rom lobos ocidentais (já que a miscigenação entre lobos e cães é relativamente comum). Ainda não é possível dizer qual dos dois cenários é o mais provável.
País ainda não possui estudo que mostre diferença salarial entre o alto escalão e a base; nos EUA, CEO ganha 351 vezes mais
Apesar dos avanços em termos de governança corporativa no Brasil, ainda não existe por aqui um levantamento estruturado que mostre a diferença entre os salários do alto escalão e o ganho médio dos trabalhadores das companhias. Nos Estados Unidos, o Economic Policy lnstitute já fez esse mapeamento, que deixou evidente o abismo salarial dentro de uma mesma empresa.
O resultado mostrou que, em 2020, os presidentes das 350 maiores empresas americanas ganharam, na média, 351 vezes mais que seu funcionário “médio”. O salário dos presidentes, conforme o levantamento, cresceu 18,9% naquele ano, enquanto o ganho do trabalhador comum avançou só 3,9%. O estudo mostra ainda que, em 1965, essa diferença de salário entre o CEO e o restante da empresa era de 21 vezes. “A pandemia trouxe uma dinâmica importante para o tema, chamando atenção para o distanciamento de salários entre a base e o topo da pirâmide corporativa, em meio a demissões e reduções de salários”, afirma Fabio Coelho, presidente da Alnec, associação que representa investidores nacionais e estrangeiros.
Já o gerente de Pesquisa e Conteúdo do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Luiz Martins, reforça que uma métrica que vem sendo analisada por investidores é exatamente se o crescimento do salário médio dos empregados de uma empresa segue o mesmo ritmo do que o do CEO, mesmo que os valores em si não sejam comparáveis. Ele frisa, contudo, que a análise de um salário de um executivo de uma grande empresa precisa computar uma série de variáveis.
DOIS CASOS
O levantamento também mostra o conjunto dos salários das diretorias. No Bradesco, por exemplo, o alto escalão do banco somou uma remuneração de R$ 818 milhões. Esse montante está ligado ao número de membros da diretoria da instituição: um total de 88 executivos. O maior valor de 2021 foi recebido pelo presidente do banco, Octavio de Lazari: R$ 23,7 milhões.
Outra empresa cuja remuneração da diretoria salta aos olhos, mas que está de fora da lista dos dez maiores, é a da agência de turismo CVC, que ainda tenta se recuperar da crise com a pandemia. A remuneração total da diretoria soma R$28 milhões, sendo que 64% desse valor foram pagos apenas para seu presidente, Leonel Andrade. Procurada, a CVC não comentou.
“Falta transparência sobre os critérios da distribuição da verba global aprovada pelos acionistas em assembleia. Quando analisamos a distribuição pelos dados dos formulários de referência, são constatadas algumas discrepâncias, quase sempre beneficiando administradores ligados aos acionistas controladores”, afirma Renato Chaves, que organizou o estudo. Essa diferença, diz ele, se refere ao salário do presidente de algumas empresas em relação ao restante da equipe de diretores.
Quando abri os olhos pela manhã, não podia imaginar que seria o dia que mudaria a minha vida.
Que seria o dia que conheceria o homem que me faria cometer um crime. O dia que eu me enxergaria no espelho pela última vez. O dia que descobriria que estava grávida. O dia que encontraria um envelope lacrado, com uma carta remetida a mim 20 anos antes.
(Que dia foi esse? Quem está falando?)
É apenas um exercício de criação. Iniciei a crônica com uma frase fictícia e demonstrei os desdobramentos que ela poderia ter. Uma vez escolhido o caminho a seguir, uma história começa a ser contada, que pode ser longa ou curta, verdadeira ou fantasiosa. Bem-vindo ao mundo encantado da escrita.
Convém que a primeira frase seja cintilante. A partir dela, o leitor será fisgado ou não. Exemplo clássico: “Todas as famílias felizes se parecem; cada família infeliz é infeliz à sua maneira”, início do romance Anna Karenina, de Tolstói. Arrebatador. Uma vez aberta a janela do pensamento, a mágica acontece: o leitor é puxado para um local em que nunca esteve, é deslocado para um universo que poderá até ser hostil, mas certamente fascinante, pois novo. Talvez não se identifique com nada, mas será desafiado a enfrentar sua repulsa ou entusiasmo. Não estará mais em estado neutro. A neutralidade é um desperdício de vida, uma sonolência continua.
A crônica tem o mesmo dever: o de jogar uma isca para o leitor e atraí-lo para o texto. Gênero híbrido (literário/ jornalístico), encontrou no Brasil a sua pátria. Somos a terra de Rubem Braga e Antonio Maria, para citar apenas dois gênios entre tantos que fizeram da leitura de jornal um hábito não só informativo, mas prazeroso e provocador. Se eu fosse citar todos os colegas que admiro, teria que me estender por meia dúzia de páginas, mas só tenho essa.
A crônica é um gênero livre por excelência. Pode ser nostálgica, confessional, lunática, poética. Pode dar clicas, polemizar, elogiar, criticar. Pode ser partidária ou sentimental divertida ou perturbadora, à toa ou filosofal – é caleidoscópica, tal qual nosso cotidiano. Ao abrirmos os olhos pela manhã, nem imaginamos que uma miudeza qualquer poderá nos salvar da mesmice, nos oferecer um outro olhar, mas assim é. Todos nós vivemos, por escrito ou não, uma crônica diária. Hoje, antes de adormecer, você já estará um pouco transformado.
O burnout materno, segundo especialistas, é um reflexo social, no qual as mães se sentem solitárias e sobrecarregadas dentro e fora de casa. Exigir menos de si mesma pode ajudar – mas receber apoio é essencial
Quando o seu filho Antônio nasceu, em 2012, Bel Junqueira, na época com 27 anos, sentia-se potente. “Eu era uma mãe leoa, achava que daria conta de tudo sozinha.” Mas, com o passar do tempo, se percebeu sobrecarregada e solitária nas tarefas e alvo de julgamentos da família. Na sua rotina, não havia espaço para o lazer e eram grandes as dificuldades para conciliar o trabalho de mãe com o de fotógrafa autônoma. “Eu não sabia que seria tão difícil e percebi que havia algo errado comigo. Eu estava infeliz e exausta.”
Em 2017, procurou uma psiquiatra, que avaliou que ela estava com burnout materno, síndrome caracterizada pelo esgotamento físico e/ou mental da mãe. “Ela recomendou que eu pedisse ajuda para cuidar do meu filho, encarasse a maternidade de forma mais leve e prescreveu um medicamento antidepressivo”, conta. Seis anos depois, Bel não se sente mais exausta. “Consigo me acolher. Digo para mim mesma: hoje eu dei o meu melhor.”
Apesar de ser reconhecido por psicólogos e psiquiatras – embora não por todos –, o burnout materno não é considerado uma doença mental, mas um agrupamento de sintomas. O termo, que ganhou popularidade nos últimos anos, foi criado por uma associação ao burnout, síndrome provocada pelo estresse crônico no trabalho, uma doença ocupacional.
“A sobrecarga de tarefas de cuidado exercidas pela mãe, que são invisibilizadas e sem pausa, podem custar a sua saúde, que entra em colapso. Geralmente acontece com mulheres que se exigem ou são pressionadas a dar conta de tudo e não têm com quem dividir essas tarefas”, diz a psicóloga perinatal Juliana Tfauni. Segundo ela, a irritabilidade e a perda de prazer no cuidado dos filhos são sintomas do burnout materno. A esse quadro se podem somar transtornos como a depressão e a ansiedade generalizada. Uma pesquisa feita pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP- USP), em parceria com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, apontou que 63% das mães entrevistadas demonstravam sintomas depressivos durante a pandemia por causa da sobrecarga de tarefas.
EXAUSTÃO
Sem ajuda nos cuidados do filho, Fernanda Urbano, de 29 anos, chegou a ponto de não conseguir levantar da cama por exaustão, no ano passado. “Dava 200% do meu tempo para o meu filho e me esquecia de mim. Parecia que o esforço nunca era suficiente”, conta. Em vez de receber ajuda, foi alvo de críticas de familiares.
Do pai da criança, o apoio era quase nulo, o que levou à separação do casal. “Ele só ajudava se eu pedisse muito.” Por recomendação da pediatra do filho, Fernanda buscou uma psiquiatra, que identificou o burnout materno. A síndrome desencadeou uma depressão, que levou a uma fibromialgia. “Ela me deu um medicamento, indicou um psicólogo e pediu que eu encontrasse formas de descansar.”
Desde então, Fernanda priorizou a sua saúde: faz caminhadas todos os dias com o filho de 2 anos e vai à academia duas vezes por semana. Não se sente mais sobrecarregada. “Hoje sei que preciso de um tempo para mim e isso não é egoísmo.” Faz psicoterapia, não se culpa quando as coisas saem do controle, dispensou os perfis de “mães perfeitas” no Instagram.
A mulher que está sofrendo de burnout materno ouve com frequência, da própria mãe, de mulheres mais velhas, que elas davam conta de tudo, segundo a psiquiatra Patrícia Pipper. “As pessoas de outras gerações precisam entender que o cenário mudou. Antes havia uma rede familiar de apoio mais estruturada e as mulheres não entravam no mercado de trabalho como hoje. Além disso, a maternidade não é vista como o único lugar de realização da mulher”, pondera.
Para se ter uma ideia da carga horária das mães, um estudo com mulheres americanas calculou que elas trabalham em média 98 horas por semana – mais que o dobro de um emprego formal. A psiquiatra Patrícia observa que se atribui à mulher o papel de quem desempenha o cuidado em nome do amor. “Espera-se que ela cuide de toda gestão que envolve o filho, o que é extenuante. Obviamente, as mães falham nessa tarefa, quando lhes recai a culpa, pois associam a falha à falta de amor ou a ser uma mãe ‘ruim’.”
Segundo a psiquiatra, o burnout materno é um reflexo social. “As mães estão adoecendo por conta da solidão, do desamparo e da fragilização dos vínculos humanos, além da rigidez dos papéis de gênero”, diz Patrícia. Por isso, o tratamento não inclui necessariamente medicamentos, mas mudanças na dinâmica da família como um todo e de laços de apoio, como creche e outros ambientes.
CULTURA
Para fomentar discussões na sociedade sobre a saúde mental materna, Patrícia criou o movimento Maio Furta-cor. “O problema não se resolve dentro dos consultórios, mas mudando a cultura acerca da maternidade e dos papéis de gênero”, adverte. Neste sentido, políticas públicas são essenciais. “Precisamos de creches de qualidade, segurança alimentar, seguridade social e licenças paternidade e maternidade condizentes com a parentalidade.” Para avaliar se uma paciente tem Burnout materno, a psiquiatra leva em conta o histórico de saúde mental e os arranjos familiares, assim como o contexto social e o suporte que essa mãe tem ou lhe falta. Ela pede exames de laboratório apenas quando há queixas de sintomas físicos, para descartar anemia, doenças de tireoide e falta de vitaminas. “Na saúde física é possível notar queda dos cabelos, emagrecimento ou ganho de peso, alterações no sono. Emocionalmente, essas mulheres sentem irritabilidade, por vezes agressividade, permeadas por tristeza, e isso vai minando a maternidade e a relação com o bebê.”
O burnout materno vitimiza também as crianças dessas mães que sofrem da síndrome, observa a psicóloga Josie Zecchinelli, do Instituto Maternidade Consciente, que capacita profissionais de saúde para dar assistência a mães e famílias. “Numa situação de exaustão, o corpo entra no modo sobrevivência. Isso acarreta um prejuízo no desenvolvimento da criança e na relação entre mãe e filho, pois há um distanciamento emocional não consciente.” Segundo a psicóloga, estudos mostram que o burnout materno aumenta os níveis de negligência e violência contra a criança. “Na realidade de cada mãe, é preciso pensar em caminhos múltiplos para lhe trazer alívio. A sobrecarga não é um problema individual, mas social, cultural e familiar.”
A dificuldade de conciliar a maternidade com a vida profissional levou a escritora Nana Queiroz, de 36 anos, ao burnout materno em 2019. “Sentia que estava em dívida com o meu filho, sempre falhando, então não me permitia dormir ou descansar. Quando ele dormia, minha mente entrava em turbilhão. Dava uma sensação de falta de ar”, descreve. Ela voltou a trabalhar quando o filho tinha cinco meses e se alimentava exclusivamente da amamentação. “Ele era apegado a mim, mas eu queria aumentar minha produtividade no trabalho para mostrar que não devia nada como profissional.”
Até que Nana teve uma pane: no trabalho, não conseguia mais nem ler seus e-mails e não parava de chorar. Foi ao psiquiatra, que identificou o burnout e prescreveu 20 dias de licença, além de um medicamento. “Tive uma sensação de fracasso.”
Mas como acolhimento da família, dos amigos e da empresa, Nana pôde conciliar os dois papéis. Um colega ofereceu uma mentoria, para ajudá-la a fazer uma lista de tarefas e descartar as menos importantes. “Eles sugeriram que eu fizesse pausas para dormir depois do almoço. Percebi que trabalhar uma hora descansada era melhor do que duas horas morrendo de sono.” As mudanças fizeram diferença: depois de alguns meses, Nana foi promovida e criou coragem para ter o segundo filho. “Essa cura coletiva foi boa para todos os envolvidos.”
Mas, de forma geral, o mercado de trabalho é cruel com as mães brasileiras: após 24 meses, quase metade das mulheres que tiram licença-maternidade está fora do mercado de trabalho, um padrão que se perpetua inclusive 47 meses após a licença, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de 2016. A maior parte das saídas do mercado de trabalho das mães se dá sem justa causae por iniciativa do empregador.
PAPEL DO PAI
Uma maior participação do marido no cuidado dos filhos e da casa também contribuiu para a qualidade de vida de Nana. “A divisão de tarefas era um problema. Eu achava delicado chamar a pessoa que amo para essa conversa difícil. Então fizemos algumas sessões de psicoterapia de casal. Não precisei mais ser a gerentona da casa, que tinha de pedir para ele as coisas.” Em seu livro Os Meninos São a Cura do Machismo, Nana sugere às mães que mostrem para a família que a felicidade delas importa. “De maneira amorosa, explico para eles que não são o centro de tudo. Uma mãe feliz é uma lição de feminismo para as crianças.”
Quando o pai da criança não é tão participativo, um bom caminho é dizer a ele abertamente o que sente, em vez de delegar as tarefas, segundo Cássia Cardoso Pires, psicóloga clínica que atende individualmente ou em casal. “Dessa forma, a conversa tem mais chance de dar certo, pois a outra pessoa se compromete a fazer algo, sem imposição”, explica. Uma das autoras do livro Pais!!! Onde Foi Que Acertei? Uma Conversa Entre Psicólogas e Pais, Cássia sugere que a família faça as tarefas da casa de forma lúdica, pois com a exaustão tudo vira obrigação e deixa de ser prazeroso.
Ter uma expectativa realista do comportamento de um bebê ajuda os casais a evitar a hiper vigilância e a frustração, que podem levar ao burnout parental, explica o pediatra especializado em neonatologia Carlos Eduardo Correia, o Cacá. “Os pais ficam excessivamente vigilantes e perdem a confiança em sua capacidade de cuidado com o bebê quando não percebem que o choro dele é uma comunicação, não um problema físico ou consequência de algum erro dos pais. O choro não deve ser considerado um indicador de qualidade do cuidado.”
Uma licença paternal mais longa também contribuiria para formar mais pais potentes e desconstruídos. “Falta um ambiente social que permita que eles se relacionem entre si a respeito desse assunto, algo que ainda traz dificuldade aqui no Brasil. É uma política pública que promove uma transformação social, observada nos países que adotaram a licença paternal estendida”, diz o pediatra.
REDE DE APOIO
As tarefas relacionadas ao cuidado, exercidas principalmente por mães, são um trabalho não remunerado, uma realidade que conflita com a fantasia criada na gravidez, observa a psicóloga Rafaela Schiavo, fundadora do Instituto Mater Online. “O burnout materno pode surgir quando a maternidade real não condiz com a idealizada”, diz.
Ter uma rede de apoio é um fator de proteção para os pais, mas atualmente há um afastamento da “aldeia” que ajudava no cuidado das crianças, explica a psicóloga. “Antes a tia, a avó, a vizinha ajudavam. Hoje as famílias estão isoladas nos apartamentos e os familiares estão distantes. O resultado é que a mulher assume essas tarefas e não tem tempo para dormir, pentear o cabelo, viver.”
Por conta da romantização da maternidade, as mães têm vergonha de admitir que estão exaustas. Por isso, os grupos de apoio voltados a elas são importantes, na visão de Christelle Maillet, de 41 anos, criadora do Mães com Humores, canal voltado à saúde mental materna. Ela é mediadora dos grupos de apoio gratuitos, voltados a mães e futuras mães com depressão ou transtorno bipolar – fatores de risco para desenvolver burnout materno.
“Acolhemos as mães que relatam suas dificuldades e que podem estar à beira do burnout materno por meio da escuta empática, de palavras acolhedoras e da troca de experiência e de dicas que mostram que ela não está sozinha”, conclui.
NÃO ENTRE EM PANE
PARCERIA
Após o nascimento do filho, pais e mães precisam mudar a dinâmica da relação, reforçar a comunicação e selar “combinados”. Os pais devem estar inseridos na dinâmica de cuidados dos filhos e da casa.
BAIXE AS EXPECTATIVAS
Não existe uma receita de maternidade ideal. As mídias sociais de mães e pais “perfeitos” podem colaborar para uma autocobrança insalubre.
DELEGUE
Peça e aceite ajuda. Assumir dificuldades não é sinal de fracasso ou de que não é boa mãe.
AJUDE
Familiares e amigos podem se colocar à disposição. Quando um bebê nasce, as atenções se voltam para ele e a mãe pode ser esquecida. Perceba as necessidades dessa mãe.
BUSQUE SUA TRIBO
A solidão é uma queixa comum, e grupos de apoio são uma opção. O PSI Brasil Apoio ao Pós-Parto é voltado a gestantes e pais com filhos de até um ano. O Mães com Humores mantém grupos com foco em mães com depressão e transtorno bipolar
Pesquisa levanta debate sobre medicamentos usados para tratar a doença
Um novo artigo aponta que não há evidências suficientes para confirmar a associação direta entre baixos níveis de serotonina e o desenvolvimento da depressão. A conclusão do estudo repercute em questões sobre o tratamento do transtorno psiquiátrico, já que antidepressivos atuam com base nessa compreensão.
A serotonina, popularmente chamada de “hormônio da felicidade”, é um neurotransmissor que atua em diversas áreas do corpo humano, como humor e sexualidade. Para pessoas com quadro depressivo, foi descoberto que medicamentos – chamados de inibidores de recaptação da serotonina – que atuam no aumento dessa substância tiveram efeitos positivos no tratamento da doença.
Esses resultados benéficos resultaram em uma percepção de que baixos níveis de serotonina seriam uma importante causa da depressão. O que a nova pesquisa sugere é que não há evidências suficientes para definir isso.
O artigo foi publicado na revista Molecular Psychiatry. Ele é uma revisão sistemática – análise de outros estudos prévios – e é composta por 17 dessas pesquisas que já haviam sido realizadas.
Os autores observaram, com base no resultado das outras investigações, que nem todos os pacientes com depressão apresentavam baixo nível de serotonina. Ou seja, o quadro depressivo estaria associado a outros fatores.
Também foi visto que a utilização de métodos para reduzir a serotonina em indivíduos sem a condição não resultou em um quadro depressivo. As conclusões reiteram que os baixos níveis de serotonina não são necessariamente uma causa da depressão. Rogério Panizzutti, médico psiquiatra e professor do Instituto de Psiquiatria (Ipub) da UFRJ, afirma que é importante identificar outras razões que podem ter relação com o desenvolvimento da doença. “É uma explicação meio simplista de que o problema da depressão é a queda da serotonina”, diz Panizzutti.
Panizzutti, que não é um dos autores da pesquisa, afirma que existem antidepressivos que atuam em outros neurotransmissores, como na dopamina, indicando que existem outras substâncias envolvidas na doença. “Todos [esses remédios] têm um desfecho similar que é o tratamento da depressão.”
Além disso, Christian Dunker, psicanalista e professor do Instituto de Psicologia da USP, aponta que é necessário entender o desenvolvimento da depressão por outras frentes que não somente na busca de um biomarcador que explicaria o quadro depressivo. “Se impôs a ideia de que a depressão não tinha nenhuma relação mais profunda com a forma de vida”, afirma Dunker, que é autor do livro “Uma biografia da depressão” e não assinou a nova pesquisa. Essa visão, no entanto, passou a ser questionada. O psicanalista explica que algumas pesquisas da neurociência apontaram que existe uma interação entre cérebro e a ambiente que a pessoa vive. Dessa forma, a depressão não seria um fenômeno estritamente biológico, mas envolveria outras questões do indivíduo e do meio que o cerca. Ele considera que a pesquisa é importante por abrir um leque de possibilidades no estudo da depressão e também de outras psicopatologias.
Além de concluir que faltam a evidências para confirmar a relação causal entre serotonina e depressão, a pesquisa reitera que é necessário entender melhor os mecanismos dos inibidores de recaptação dessa substância.
Um dos pontos é que, como o desenvolvimento da depressão não necessariamente são os baixos níveis do neurotransmissor, os inibidores não estariam agindo diretamente na causa da doença.
Os autores também pontuam que um estudo analisado na revisão sistemática observou uma diminuição de serotonina com a utilização a longo prazo dos antidepressivos. Por isso, seria necessário o desenvolvimento de novas pesquisas para entender de forma mais nítida os efeitos desses medicamentos no tratamento da doença e como eles agem no organismo humano.
Os pontos ainda são objeto de debates. Para Dunker, as dúvidas sobre os mecanismos dos antidepressivos podem gerar dúvidas do resultado dos medicamentos. “Como não sabemos como eles funcionam, pode ser que estejam funcionando sobre causas ou efeitos secundários”, diz.
Panizzutti reitera que remédios atuantes em outros neurotransmissores também ocasionam efeitos positivos no tratamento da doença. Para ele, isso seria um indicativo de que “provavelmente não é que todos estes sistemas de neurotransmissores estão com defeito na depressão, mas sim que, alterando a ação deles, se consegue um efeito antidepressivo”.
Ou seja, mesmo não atuando diretamente na causa da doença, esses medicamentos ocasionam uma melhora do quadro clínico do paciente, diz Panizzutti. “Isso é o que importa para a pessoa que está sofrendo.”
Marcelo Feijó, que não assina o estudo e é professor do departamento de psiquiatria da EMA (Escola Paulista de Medicina) da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), explica que as ações do remédio realmente ainda são passíveis de pesquisa. “Não temos todo o conhecimento do que [o inibidor] produz dentro do cérebro.”
Uma explicação inicial da ação desse tipo de medicamento era de que ele resultaria no aumento da serotonina no organismo por inibir a recaptação da substância. Feijó, no entanto, explica que novas pesquisas apontam outros mecanismos para entender os benefícios dos inibidores.
“Algumas pesquisas falam que [o aumento da serotonina] é apenas o começo da mudança”, resume.
No entanto, essa falta de conhecimento sobre o mecanismo não seria um indicativo de que eles não funcionariam, afirma o professor. “O risco de um estudo como esse é falar que as medicações que mexem no sistema da serotonina não seriam eficazes.”
Feijó explica que pesquisas já indicaram a eficácia do antidepressivo, embora possa variar para cada paciente em razão da depressão ser uma doença multifatorial.
"Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva. Convertam-se! Convertam-se dos seus maus caminhos!" Ezequiel 33:11b
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