MULHERES NO PODER – I
A conquista feminina de postos de liderança é uma realidade. Mas como se comportam aquelas que chegam ao topo? Há indícios de que tendem a privilegiar a colaboração, enquanto os homens costumam favorecer a hierarquia. Será mesmo? Cientistas constatam que a competência feminina costuma ameaçar mais que a masculina

A presença feminina em postos-chave tem se tornado cada vez mais comum – uma realidade impensável há pouco mais de duas décadas – e parece irreversível. Nunca tantas mulheres ocuparam cargos de chefia – tanto no setor público quanto no privado. Na população em geral, essa situação aparece nos resultados das pesquisas: dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que o número de famílias chefiadas por mulheres dobrou em termos absolutos (105%), aumentando de 14.1 milhões em 2001 para 28.9 milhões em 2015. Em termos percentuais, o total de famílias chefiadas por homens diminuiu de 72.6% para 59.5% no mesmo período, enquanto o de famílias lideradas por mulheres subiu de 27.4% para 40.5%.
A conquista de visibilidade e espaço e o aumento de responsabilidades fora de casa ainda são relativamente recentes – e as injustiças, frequentes. Não raro, independentemente do próprio gênero, as pessoas ainda associam o poder a um rosto masculino. Até há poucos anos era difícil encontrar uma mulher que pudesse representar um modelo de liderança. Porém, agora que a situação está começando a mudar, pesquisadores buscam compreender como as mulheres se comportam quando chegam ao poder.
Não raro, mulheres em posição de liderança encontram dificuldade de serem consideradas competentes e ao mesmo tempo admiradas. É o que revelam pesquisas – reunidas sob o título Double-bind – realizadas pela empresa americana Catalyst, com a contribuição da IBM. Foram entrevistadas mais de 1.200 executivas na Europa e nos Estados Unidos. Os dados indicam um dilema estressante para elas: se assumem comportamentos considerados femininos (mostrando-se sensíveis e empáticas. por exemplo), são consideradas “fracas” e menos competentes: se adotam um estilo de liderança masculina (com atitude fria e impositiva), são criticadas por sua dureza, de forma muito mais incisiva do que um homem seria se tivesse o mesmo comportamento. Historicamente, as primeiras executivas costumavam apoiar-se na cultura masculina dominante, eliminando a própria identidade. Essa situação tem mudado, mas parece que ainda é preciso aprender a não dar importância aos julgamentos, aos comentários sobre a aparência e à falta de popularidade.
UMA BOA MISTURA
Muitos estudos analisam a diferença entre valores de homens e mulheres, buscando identificar se, de fato, as mulheres dedicam mais atenção a temas como paz, meio ambiente e educação. A psicóloga italiana Donata Francescato desenvolveu um estudo sobre o assunto, publicado no periódico Psicologia di Comunità. Fez entrevistas com 109 dos 154 parlamentares de seu país e aplicou questionários para identificar características de personalidade e valores. “Queríamos verificar se as mulheres bem-sucedidas na política têm traços predominantemente masculinos, como energia, assertividade, iniciativa, dinamismo e estabilidade emocional”, diz a pesquisadora. Segundo um estudo sobre a Bolsa de Valores francesa publicado no jornal Financial Times, a manutenção dos preços das ações está ligada à presença feminina na direção das empresas. “Uma pesquisa americana também indica que a percepção e a sensibilidade femininas possivelmente reduziriam o risco de desastres em Wall Street. Outras análises mostram ainda que as empresas administradas por mulheres foram menos prejudicadas pela crise mundial”, afirma Francescato. As executivas, no entanto, tendem a ser extremamente exigentes e até cruéis consigo mesmas – e, muitas vezes, têm atitude similar com seus subordinados. E, não raro, encontram em outra mulher aspectos que tanto as incomodam.

UM FARDO, UM PRAZER
Afinal de contas, o que se entende por “poder”? Vale lembrar que o termo tem também dimensões positivas, não voltadas para a opressão e o domínio. Um aspecto importante é o poder sobre si, a capacidade de controle das próprias atitudes, necessidades e desejos, em contraste com regras que a civilização e as relações impõem. Outro aspecto está ligado à capacidade, ao poder fazer, à possibilidade e à autorização (principalmente interna) para escolher e agir. No âmbito social, no entanto, alguma coisa começa a surgir: em geral as mulheres vivem o poder principalmente como um dever e se interessam menos pela própria carreira. Ocupar determinados postos é uma dádiva – e também um fardo. Algo importante a ser considerado é que quem realmente tem poder pode tomar decisões sem prestar contas aos outros, assumindo a responsabilidade pelas próprias ações.
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