LIBERDADE

Houve um diálogo difícil. Aparentemente não quer dizer muito, mas diz demais.
– Mamãe, tire esse cabelo da testa.
– É um pouco da franja ainda.
– Mas você fica feia assim.
– Tenho o direito de ser feia.
– Não tem!
– Tenho!
– Eu disse que não tem!
E assim foi que se formou o clima de briga. O motivo não era fútil, era sério: uma pessoa, meu filho no caso, estava-me cortando a liberdade. E eu não suportei, nem vindo de filho. Senti vontade de cortar uma franja bem espessa, bem cobrindo a testa toda. Tive vontade de ir para meu quarto, de trancar a porta a chave, e de ser eu mesma, por mais feia que fosse. Não, não “por mais feia que fosse”: eu queria ser feia, isso representava o meu direito total à liberdade. Ao mesmo tempo eu sabia que meu filho tinha os direitos dele: o de não ter uma mãe feia, por exemplo. Era o choque de duas pessoas reivindicando – o quê, afinal? Só Deus sabe, e fiquemos por aqui mesmo.

*** CLARICE LISPECTOR