Mas o pior é o súbito cansaço de tudo. Parece uma fartura, parece que já se teve tudo e que não se quer mais nada. Cansaço dos Beatles. E cansaço também daqueles que não os são. Cansaço inclusive de minha liberdade íntima que foi tão duramente conquistada. Cansaço de um amar o outro. Melhor seria o ódio. O que me salvaria dessa impressão de fartura – é fartura ou uma liberdade de que está sendo inútil? – seria a raiva. Não um tipo de raiva amorosa que existe. Mas a raiva simples e violenta. Quanto mais violenta, melhor. Raiva dos que não sabem de nada. Raiva também dos inteligentes do tipo que dizem coisas. Raiva do cinema novo, por que não? E do outro cinema também. Raiva da afinidade que sinto com algumas pessoas, como se já não houvesse fartura de mim em mim. E raiva do sucesso? O sucesso é uma gafe, é uma falsa realidade. A raiva me tem salvado a vida. Sem ela o que seria de mim? Como suportaria eu a manchete que saiu um dia no jornal dizendo que 100 crianças morrem no Brasil diariamente de fome? A raiva é a minha revolta mais profunda de ser gente? Ser gente me cansa. E tenho raiva de sentir tanto amor. Há dias que vivo de raiva de viver. Porque a raiva me envivece toda: nunca me senti tão alerta. Bem sei que isso vai passar, e que a carência necessária volta. Então vou querer tudo, tudo! Ah como é bom precisar e ir tendo. Como é bom o instante de precisar que antecede o instante de se ter. Mas ter facilmente, não. Porque essa aparente facilidade cansa. Até escrever está sendo fácil? Por que é que eu escrevia com as entranhas e neste momento estou escrevendo com a ponta dos dedos? É um pecado, bem sei, querer a carência. Mas a carência de que falo é tão mais plenitude do que essa espécie de fartura. Simplesmente não a quero. Vou dormir porque não estou suportando este meu mundo de hoje, cheio de coisas inúteis. Boa noite para sempre, para sempre. Até sábado que vem. E não me respondam: não quero ouvir a voz humana. E se suporto a minha voz se despedindo é porque ela piora de muito a minha raiva.
Só uma raiva, no entanto, é bendita: a dos que precisam.
As bicicletas elétricas aparecem como uma das soluções para o futuro da mobilidade – e as grandes marcas de automóveis não pretendem ficar fora do jogo
O anúncio “bom mesmo é ser minoria”, feito em 1969 pela fabricante brasileira de automóveis Puma, foi a sacada da empresa para exaltar o lançamento do inovador Puma GT 1500. Eram produzidas apenas duas unidades por dia e cada uma delas custava uma pequena fortuna. O sucesso da propaganda fez parte de um processo que mudou a forma como o público enxergava o carro, que passou a ser sinônimo de conquista e status. Meio século depois, o objeto de desejo entrou em declínio: é mais fácil alugar ou usar um aplicativo de transporte do que ter uma despesa de mais de 1 tonelada na garagem. Nesse cenário, outro veículo surge como a solução de luxo para quem quer se locomover no dia a dia: bicicletas elétricas de alta performance, agora produzidas pelas montadoras de veículos automotores.
Os novos modelos de bicicletas vêm com motor elétrico, bateria e equipamentos de última geração, que permitem que o usuário se desloque pela cidade sem fazer muito esforço. Uma nova minoria desfruta dos avanços tecnológicos das electric bicycles, ou e-bikes, bicicletas elétricas fabricadas por multinacionais do setor automobilístico para atender a um nicho de mercado que pode vir a ser um segmento amplo e pujante antes do fim desta década.
Uma das novidades do setor vem da Mercedes-Benz: a EQFormula ETeam eBike, lançada no fim do ano passado. Trata-se de um modelo de 17 quilos, alimentado por uma bateria com autonomia de 100 quilômetros, mais do que o suficiente para uma ida e volta da casa ao trabalho. O motor elétrico permite acelerar até 32 quilômetros por hora. A versão mais barata sai por 17.000 reais, mas o modelo top de linha pode custar quase três vezes mais. Já a Peugeot Cycles tem um portfólio bem maior – inclusive pela tradição da marca francesa em bicicletas -, com sessenta modelos disponíveis, metade deles e-bikes feitas com material de alumínio ou de fibra de carbono. O preço varia de 7.700 a 40.000 reais.
A Jeep, por enquanto, tem apenas um modelo elétrico, com duas opções de motor, porém mais potentes que a média de mercado. É quase uma motocicleta com seus dez níveis de assistência no pedal, câmbio de nove marchas e freios a disco hidráulicos de pistão. Dá para ir longe com ela por 31.000 reais. Seguindo por outro caminho, a lendária fabricante de motocicletas Harley-Davidson, que nos últimos cinquenta anos se posicionou como uma marca diferenciada para aqueles que gostam de pegar uma estrada no fim de semana, decidiu criar uma empresa separada, a Serial I Cycle, para centralizar a produção de suas e-bikes. O nome da nova companhia e o design da bicicleta inaugural, com estrutura preta, pneus brancos e detalhes de couro, remetem à Serial Number One, moto mais antiga da Harley-Davidson, inventada em 1903.
Ainda que a substituição completa de um veículo por outro seja impraticável, é fato que as montadoras estão olhando para o futuro próximo. Estudos realizados na Europa apontam que as vendas de bicicletas elétricas devem saltar de 3,7milhões, em 2019, para 17 milhões, em 2030. Se a perspectiva se confirmar, o número total de bicicletas, comuns ou elétricas, vendidas a cada doze meses atingirá a casa de 30 milhões, o que representa mais do que o dobro do número de carros registrados anualmente na União Europeia. O ciclismo é uma das indústrias mais aquecidas do mercado na Europa neste momento e tudo indica que sua expansão para outros continentes é só uma questão de tempo, inclusive no Brasil.
Atualmente, e-bikes fabricadas no mercado brasileiro não aparecem no horizonte e mesmo as versões importadas não chegam pelas concessionárias. Se o consumidor quiser uma para si, precisa importar o produto por conta própria ou se arriscar com terceiros. Márcio Filho, diretor de suporte ao cliente da BMW, dá uma pista do motivo de o Brasil estar um passo atrás da nova tendência: “A procura por bicicletas cresceu nos últimos anos e foi acentuada pela pandemia. Não trouxemos as elétricas para o Brasil ainda porque temos de oferecer uma solução completa de suporte, e precisa haver volume para justificar isso”. A empresa alemã, que produz bicicletas há setenta anos, dobrou as vendas dos modelos convencionais no Brasil no ano passado. Mesmo sem opções elétricas, o mercado no país acompanhou o crescimento mundial, principalmente nos meses de pico da pandemia.
Pesquisa recente do Datafolha revelou que a bicicleta é a preferência de 38% dos brasileiros que não têm carro próprio, à frente de aplicativos como Uber, táxis e transporte público. Depois de muito tempo marginalizados no trânsito, principalmente nas grandes cidades, os ciclistas começam a sentir que bom mesmo é ser minoria. Só falta um pouco de eletricidade.
A ira do insensato num instante se conhece, mas o prudente oculta a afronta (Provérbios 12.16).
O insensato é alguém emocionalmente destemperado. É um poço de amargura, um protagonista de intrigas e um provocador de contendas. Sua vida é uma ameaça aos que vivem à sua volta. Suas palavras, ações e reações são explosivas. O insensato não tem domínio próprio, só constantes acessos de ira. Por falta de autocontrole, joga estilhaços em todos à sua volta. Porque lhe falta o discernimento, ele fala sem refletir e expõe as pessoas a situações vergonhosas e constrangedoras. As palavras do insensato ferem como espada e provocam contendas entre os irmãos. O prudente, porém, não perde as estribeiras quando é afrontado. Não paga o mal com o mal, mas vence o mal com o bem. Não se destempera quando é agredido com palavras maldosas e atitudes injustas, mas abençoa até mesmo seus inimigos. Não é governado pela carne, mas pelo Espírito, e um fruto do Espírito é o domínio próprio. O prudente tem controle não apenas sobre suas ações, mas também sobre suas reações. Quando é ferido numa face, volta a outra; quando é forçado a ir uma milha, caminha duas; quando lhe tomam a túnica, entrega também a capa. O prudente sabe que aquele que domina o seu espírito é mais forte do que quem conquista uma cidade.
Companhias distribuem ações para reter e atrair talento e alinhar os interesses de acionistas e trabalhadores
Quando Elisangela Florêncio entrou na farmacêutica BD, há 16 anos, passou a investir 0,5% do salário em ações da companhia. Na época, elas estavam cotadas a 70 dólares. Hoje, valem 276 dólares – e Elisangela pagou boa parte de seu apartamento com o investimento. Além dela, quase todos os outros funcionários da multinacional aderiram ao benefício, dos diretores aos auxiliares de produção da fábrica. Apenas 81, do total de 1.600 empregados, ficaram de fora. Pelo programa, cada profissional pode aplicar até 14% do ordenado nos papéis; em contrapartida, a BD complementa o aporte com mais 3%. Por ser de origem americana, as ações são negociadas na Bolsa de Valores de Nova York. “A gente cuida de toda a parte tributária aqui no Brasil (desconto em folha, liquidação de impostos) e faz a remessa do dinheiro para os Estados Unidos”, afirma Elisangela, gerente de recursos humanos da BD para a América Latina. A qualquer momento, os acionistas conseguem aderir ou sacar o dinheiro – para ser usado na compra do primeiro imóvel, num procedimento cirúrgico não coberto pelo plano de saúde ou no pagamento à vista de um MBA, por exemplo. Com isso, a BD espera que o “associado” (como é chamado o trabalhador por lá) se sinta dono da companhia e perceba como seu esforço gera lucro ao negócio – lucro esse que retorna para ele.
Assim como a BD, outras corporações têm adotado um plano de remuneração de longo prazo como forma de reter e atrair talentos; também é um ensaio para alinhar os interesses entre acionistas e funcionários. Estímulos a perder de vista já eram comuns em altos cargos de gestão, sendo que 14% do salário dos presidentes se compõe dessa forma, segundo um estudo feito pela consultoria Mercer no ano passado, com 539 corporações. Agora, a novidade é a popularização desse modelo. “O percentual das empresas de capital nacional que concedem incentivos de longo prazo cresceu até 25% nos últimos dez anos”, afirma Marcelo Ferrari, diretor de desenvolvimento de negócios da Mercer.
Não só aumentou o número de organizações que esquematizam benefícios longínquos como a tendência é que eles sejam estendidos a níveis mais baixos. “Embora ainda sejam poucas as companhias que oferecem incentivo de longo prazo a cargos de gerência no Brasil, esse número dobrou na última década, passando de 10% para 20%”, diz Ferrari.
A stock option (no qual o profissional ganha o direito de comprar ações da corporação, como na BD) é a estratégia mais comum para “amarrar” o profissional por muito tempo, mas outros programas vêm ganhando força. Isso porque a Receita Federal e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) têm considerado a opção de ação como um plano remuneratório – o que obrigaria os empresários a recolher imposto de renda. “Muitas empresas viram que, se não mudassem, poderiam ser multadas e decidiram migrar para outras modalidades”, afirma Ferrari. As adaptações fazem sentido. Uma pesquisa feita pela consultoria Pris mostra que os riscos tributários são a maior preocupação dos executivos de RH quando se trata de recompensa estendida. Em segundo lugar aparece a pouca compreensão dos trabalhadores e o baixo reconhecimento deles em relação ao plano.
VISÃO DE SÓCIO
Com 86.000 pessoas no Brasil, o banco Itaú oferece incentivos de longo prazo há mais de duas décadas; nos últimos anos, eles sofreram alterações para se adequar às necessidades de mercado, ao momento da instituição e à expectativa dos executivos. “Hoje eu não tenho mais um plano de stock option, mas, sim, um de entrega de ações”, afirma Milena Martins, diretora de recursos humanos do Itaú. A diferença é que, enquanto a stock options permite que o empregado escolha se quer ou não investir na companhia, no segundo caso ele ganha ações como parte da remuneração.
Há regras distintas para dois grupos. O primeiro atende de gerentes para cima, que recebe bônus e um adicional em ações conforme alcança as metas. “Com base nesse reconhecimento, que avalia também como ele entregou, nós outorgamos uma quantidade de papéis, que podem ser diluídos num período de três anos, junto com o pagamento do bônus”, afirma Milena. O segundo é direcionado aos principais executivos e àqueles considerados talentos. “Esse, em especial, foi criado para reconhecer os profissionais que fazem diferença na construção do banco do futuro, que estejam alinhados à nossa cultura e tenham olhar de dono.” O diferencial é que esse grupo recebe um matching share, uma contribuição adicional da própria instituição para comprar ações correspondentes. “Enxergamos esses programas como um instrumento de retenção, alinhamento de interesses, compartilhamento de risco e direcionamento do quadro de funcionários para um objetivo comum”, diz a executiva.
O matching share é usado também pela Henkel, fabricante da cola Pritt e outros produtos. Na multinacional de origem alemã, os empregados, independentemente do nível, podem utilizar até 4% do ordenado mensal bruto para a compra de ações preferenciais. A companhia, por sua vez, entra com um apoio de 33,33% da contribuição do pessoal, que pode vender os papéis três anos após a aquisição. Dos 242 participantes (27% do quadro de trabalhadores da Henkel), 55 são da operação e 66, gerentes e diretores. “Quando um profissional adere a essa política, estabelecemos uma relação longínqua, o que contribui não apenas para a retenção de talentos como também para um forte engajamento das pessoas”, diz Valeria Gladsztein, diretora de RH da Henkel para a América do Sul. Antes de adotar uma estratégia de reconhecimento como essa, o time de RH deve analisar qual é o modelo mais aquedado, a periodicidade da concessão e as regras de carência, além de avaliar o tamanho da companhia, seu estágio de maturidade, a cultura organizacional e até questões legais e operacionais. Também é importante trabalhar a comunicação, para que todos compreendam como funciona o benefício a ponto de se interessar por ele.
ENGORDANDO O POR UINHO
A seguir, o número de salários que os profissionais recebem, em média, com incentivos de Longo prazo no Brasil
MAPA DA MINA
Conheça as modalidades mais comuns de remuneração de Longo prazo no Brasil
STOCK/SHARE OPTIONS
O funcionário recebe o direito (e não a obrigação) de comprar ações. os ganhos são calculados sobre a valorização do capital. Ou seja, se o preço for menor do que aquele previsto no contrato, o beneficiário não terá ganho. a condição mais comum exige a permanência do profissional na companhia por um período predefinido.
INDICADAS PARA:
Companhias que querem alinhar os interesses dos acionistas com os dos profissionais. o funcionário só ganha quando há valorização do capital.
AÇÕES RESTRITAS
São as ações mesmo, não opções de compra. quando a condição de carência é cumprida, por exemplo, os papéis podem ser transferidos para o profissional sem que ele pague nada por eles no resgate. Algumas empresas optam pelo Matching Share, uma contribuição adicional de sua parte, mas exigem dos executivos uma parcela do bônus como contrapartida.
INDICADAS PARA:
Companhias que preferem oferecer um ganho mínimo ao funcionário, mesmo que os títulos não valorizem no período. A vantagem é o poder de retenção.
AÇÕES POR DESEMPENHO
A diferença dessa modalidade para a de ações restritas é que as condições de carência estão atreladas ao desempenho da organização, do mercado e/ou do beneficiário. Para que o profissional receba sua parte, precisa cumprir metas.
INDICADAS PARA:
Empresas com forte filosofia de “ganhe pela entrega”, em que há distinção de contribuição coletiva e individual. A principal vantagem é que só há ganho se o objetivo traçado for alcançado, garantindo que não haverá distribuição meramente em função de um mercado acionário favorável.
PLANOS DE OPÇÕES FANTASMA
Conhecidos também como Share Appreciation Rights, são parecidos com as Stock Options. A diferença está na forma de pagamento: enquanto nas Stock Options ocorre a transferência de papéis, no caso de opções fantasma o resgate é em dinheiro. caso o título desvalorize e fique abaixo do preço de exercício, não há liquidação.
INDICADOS PARA:
Companhias de capital fechado. de acordo com a legislação atual, a tributação de Stock Options e opções fantasma é a mesma, já que, por serem liquidadas em dinheiro, são considerados uma forma convencional de remuneração. Como o resgate é em dinheiro, o beneficiário não chega a ser “acionista” da empresa e, portanto, pode não ter aquele sentimento de dono.
PONDERAÇÕES
Veja as principais preocupações das empresas em relação aos planos de incentivo de Longo prazo
Processos inconscientes podem influenciar nas decisões mais simples de nosso dia a dia. A ciência estuda se é possível deter esses comportamentos
Apesar de não agir em uma área específica do cérebro, segundo o mestre em psicologia social Rodrigo Vieira, o inconsciente gera interesse pelo fato de “influenciar nossa racionalidade sem que estejamos cientes disso”. Sendo assim, de certo modo, ele é capaz de assumir o controle em boa parte das nossas tomadas de decisão. Assustador, não?
Como muitos estudos e pesquisadores apontam, apenas uma pequena parcela do cérebro trabalha de maneira consciente, cerca de 10% – alguns chegam a comparar o órgão com um iceberg, sendo a sua ponta visível a porção de processos realmente conscientes.
Ainda assim, foi possível entender como funciona, por exemplo, o processamento de informações em nosso cérebro, que é dividido em duas partes. Pelo menos, é o que aponta uma concepção do pesquisador israelense Daniel Kahneman, publicada em seu livro Rápido e devagar – Duas formas de pensar, de 2002.
Kahneman estudou esse processo durante cinco décadas. Apesar de relativamente nova e desconhecida por boa parte das pessoas, essa teoria tenta desvendar o funcionamento do cérebro. “O chamado sistema 1 é mais afetivo, automático e rápido. Já o segundo, conhecido como sistema 2, caracteriza-se por ser mais racional, controlado e lento”, descreve Rodrigo Vieira.
E é o primeiro que mais se relaciona com nosso inconsciente e, principalmente, nossas atitudes implícitas. Isso tem forte influência dos ancestrais, que precisavam estar atentos a qualquer ameaça por questão de sobrevivência. “O sistema 1 é o responsável por nossas avaliações não controladas, e sua ação se associa à atividade no sistema límbico do cérebro. Trata-se de um mecanismo adaptativo e de um tipo de funcionamento que nos permite decodificar o mundo sem consumo excessivo de energia psíquica”, explica Rodrigo. O profissional também comenta que esse sistema age de maneira automática e pode interferir nas tomadas de decisão em muitas situações do dia a dia.
AÇÕES RÁPIDAS
Em nossa rotina, dependendo da situação, somos exigidos a tomar decisões imediatas ou a longo prazo. Por exemplo, para comprar um smartphone novo, você pode pensar por dias e avaliar qual a melhor opção. Por outro lado, em outros momentos, necessitamos fazeres colhas em pouquíssimo espaço de tempo.
Assim como o processamento das informações, essas ações instantâneas são divididas em duas categorias. “A primeira é uma reprodução presente aprendida a partir de uma situação passada”, pontua o psicólogo Bayard Galvão. Nesse caso, os reflexos são resultado de uma aprendizagem, ou seja, alguma ocasião já vivenciada anteriormente.
O segundo conceito pode causar certa confusão com o primeiro. “É aquele em que a pessoa pensa e toma a atitude rapidamente, mas não percebe o que pensou ou sentiu”, diferencia Bayard. O profissional ressalta que isso é fruto de ações rápidas. Por exemplo, em uma quase colisão de trânsito, tal possibilidade faz com que atitudes sejam tomadas em até 0,2 segundo. Portanto, não necessariamente a pessoa passou por algo semelhante antes, mas, por já ver coisas relacionadas, criou base para a reação momentânea.
Em ambos os casos, nota-se a presença (e relevante influência) da memória. “Toda decisão inconsciente se baseia no que foi aprendido no passado. No que se refere à motricidade ou sentidos, é mais fácil apontar que parte do cérebro é responsável. Mas, em termos de memória, hoje se sabe que várias regiões do sistema nervoso estão envolvidas, como cerebelo, amígdala e hipocampo”, complementa Bayard.
POR TRÁS DAS ATITUDES
Para chegar até o momento de agir, começamos a criar nossa bagagem desde criança e absorvemos inúmeros pontos relacionados a questões sociais. “As decisões implícitas se sedimentam desde os primórdios de nossa socialização, quando ainda somos bem jovens, e tomam-se costumes mentais irresistíveis”, indica Rodrigo. O psicólogo ainda cita que essas normas se consolidam em nosso repertório sobre o mundo, embora não tenhamos a capacidade de questioná-las. O pré-julgamento também está diretamente relacionado com essa questão, já que, muitas vezes, a avaliação ocorre quase instantaneamente. “O que é belo ou feio, por exemplo, não passa de perspectiva, mas, quando um padrão de beleza é enraizado ao longo do desenvolvimento, torna-se um referencial sólido. Portanto, ao avaliar um objeto como bonito ou não, a ativação mental de modelos pré-estabelecidos acontece de forma muito natural e veloz”, frisa Rodrigo.
Bayard reitera que nossos sentimentos atuais são consequências do que ocorreu no passado. Contudo, as impressões que temos de algo ou alguém são utilizadas tanto para o bem quanto para o mal. “O ideal, quando possível, é julgar o presente e tomar decisões sobre ele com base na sabedoria e no questionamento de hoje, não do que já foi. O conceito de usar o passado para tomar decisões no presente pode perdurar os mesmos erros ao longo da vida inteira”, alerta.
O PODER DA CULTURA
Não, aqui não falamos sobre filmes ou livros e a maneira como tais obras agem sobre nós. Na verdade, abordaremos o ambiente em que somos criados, já que ele influencia grande parte das concepções que levaremos para quase toda a vida. “A cultura se reflete no modo de funcionamento de um povo, seja na esfera pública ou privada, e é assimilada, geralmente, sem esforço. Em relação à beleza, por exemplo, nota-se que os paradigmas podem variar em diferentes culturas. E, por mais que haja variações individuais nos modos de percepção, as representações de uma cultura sempre servirão como parâmetro”, esclarece Rodrigo.
A absorção de princípios pode vir da mãe ou do pai (que, muitas vezes, possuem aspectos diferentes), dos professores, da música, entre outros fatores que fazem parte do nosso dia a dia. “As pessoas acreditam no que veem e ouvem das suas fontes culturais antes de saberem questionar. Depois, contestam tudo o que for diferente do que aprenderam a acreditar”, pontua Bayard.
Além disso, o psicólogo cita que a falta de autoavaliação é muito recorrente, já que poucos indivíduos costumam analisar a própria cultura. Com isso, não há mudanças das características principais e, quando ocorre certa reflexão, surgem as famosas crises existenciais.
CRIANÇA X ADULTO
“As crianças não têm maldade”. Quase todo mundo já deve ter ouvido essa frase quando algum pequeno soltou uma frase sem papas na língua e deixou todo mundo sem jeito. Segundo Rodrigo, isso ocorre porque na infância não há a submissão aos padrões de desejabilidade social e, por isso, tornam-se comuns avaliações sobre algo ou alguém quando o desejável seria, de certo modo, disfarçá-las. “Nesses casos, o que existe é uma ligação entre o padrão aprendido, implícito e ativado automaticamente, e sua expressão transparente ou explícita”, complementa.
Conforme o tempo vai passando, desenvolvemos uma maior capacidade de credenciar alguns pensamentos como inadequados para determinadas situações. “Mas isso não acontece apenas porque as pessoas escondem suas visões reais. À medida que amadurecemos intelectualmente, podemos, de fato, desenvolver concepções contrárias àquelas que absorvemos historicamente”, ressalta Rodrigo.
Contudo, isso não quer dizer que tal processo seja simples, muito pelo contrário. Rodrigo afirma que as avaliações automáticas devem continuar existindo e podem se tornar difíceis de controlar. “Por exemplo, sabe-se que o sistema 1 está repleto de conteúdo afetivo; sendo assim, como anular racionalmente reações espontâneas de nojo e aversão? Na psicologia social, entende-se que cabe aos indivíduos fazerem uso de suas aprendizagens posteriores para minimizar o efeito desses conteúdos”, aponta. O profissional indica que isso pode ocorrer de duas maneiras: coibindo-os internamente de forma sistemática ou, simplesmente, evitando comportamentos discriminatórios.
MEIOS DE IDENTIFICAÇÃO
Há diversas maneiras de estudar as atitudes de um indivíduo. Rodrigo explica que, para identificar as explícitas, podem ser utilizados “questionários ou escalas cujas respostas são usadas para avaliar as dimensões do fenômeno”. Contudo, as características intrínsecas são capazes, de certo modo, de mascarar as reais ações. Para “burlar” tal mecanismo, os profissionais tentam desviar a atenção dos pacientes de inúmeras formas, como sobrecarga mental ou perguntas menos diretas.
Por outro lado, para identificar as questões menos expostas, há a possibilidade de utilizar o teste de associações implícitas, conhecido como IAT (lmplicit Association Test). “Nesse caso, os respondentes geralmente apresentam maior dificuldade para associar grupos minoritários a conceitos positivos, revelando uma atitude implícita negativa”, descreve Rodrigo. Contudo, o profissional demonstra certa cautela com os resultados obtidos nesse teste, já que não necessariamente o indivíduo irá traduzir seus pensamentos em comportamentos discriminatórios.
É POSSÍVEL REVERTER COMPORTAMENTOS DISCRIMINATÓRIOS?
Atualmente, não existe uma fórmula eficaz para alterar completamente o que age no sistema 1 (mais afetivo, rápido e automático). “A psicologia social vem propondo meios relativamente frutíferos de redução de preconceito, como a promoção de contatos colaborativos e não hierarquizados entre membros de diferentes grupos para que as avaliações entre eles sejam otimizadas,” explica o mestre em psicologia social Rodrigo Vieira. Já o psicólogo Bayard Galvão indica dois caminhos para atenuar os preconceitos e atitudes implícitas:
*** “Tentar se colocar no lugar do outro, com valores, cultura e a história”;
*** “Aprender a respeitar o direito de o outro valorizar, aparentar ou ser o que quiser, não necessariamente valorizando o que ele valoriza”.
"Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva. Convertam-se! Convertam-se dos seus maus caminhos!" Ezequiel 33:11b
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