Mas será diferente, com homenagens à máscara e à vacina
Carnaval é mais que uma festa. Carnaval é um estado de espírito. Oque está sendo cancelado neste ano é a festa, ou até, em várias cidades, o feriado da Terça-Feira Gorda – segundo a tradição, o último dia em que se pode comer “gordura” antes do jejum da quaresma (aliás, neste ano bem que a terça poderia ser “magra”). De qualquer maneira, festas e feriados se cancelam, se a situação exige. Mas não se cancela um estado de espírito. Neste sentido, teremos Carnaval, sim!
Não me entendam mal. Não estou louca, nem pregando desobediência civil. Autoridades espalhadas pelo Brasil afora foram apenas responsáveis ao tomar medidas que evitem aglomerações desnecessárias. Afinal, se a vacina está chegando, seu efeito mais relevante para a sociedade – a tal imunização coletiva – ainda tardará um pouco.
Minha proposta é que, para começar, façamos um Carnaval diferente, com distanciamento social e com os foliões mais mascarados do que nunca. Mas reside exatamente nesse ponto a oportunidade de brilhar – não um brilho de reluzentes lantejoulas, mas aquele derivado da empatia.
Certa vez, Joãozinho Trinta, o filósofo da avenida, teria dito que quem gosta de miséria é intelectual, pois povo gosta mesmo é de luxo. Se estivesse por aqui hoje talvez completasse a tirada genial, refletindo sobre o que é luxo. Luxo não é necessariamente o dourado dos carros alegóricos, a seda esvoaçante dos costumes, a rica plumagem colorida sobre as cabeças. O luxo de verdade, sua quintessência, é a simplicidade. É por isso que a melhor fantasia para este ano é a máscara – a máscara básica, reutilizável ou descartável, branca, azul ou com a cor e o escudo do time do folião resguardado.
Na minha avenida imaginária visualizo uma comissão de frente em homenagem à vacina. Não a esta ou àquela. Mas às vacinas em geral – a chinesa, a americana, a russa, a indiana, a brasileira. Saúde não tem fronteira, ou não deveria ter. É assim no sambódromo do meu sonho. A evolução da bateria prepara o terreno para o puxador do samba-enredo, que exalta a atuação dos cientistas que trabalhara, incansavelmente durante meses para que hoje pudéssemos nos agarrar na expectativa de deixar para trás a pandemia. E não teria dúvida em fazer o refrão abordando as qualidades humanas dos profissionais da saúde. Depois do que fizeram e continuam fazendo, podem dizer que já sabem a que a existência deles se destinou.
Uma festa é só um ritual. É importante, mas não é fundamental. Mais relevante é o que está sob a fantasia usada no ritual – um brasileiro que quer acreditar num futuro melhor. Neste Carnaval teremos de nos reinventar. Estamos ficando especialistas nisso. Quantas limonadas já não tivemos de fazer com os limões que nos têm sido dados? Somos um povo resiliente. E criativo. E esperançoso. Se não por opção, então por falta de opção. Neste Carnaval vamos mais uma vez demonstrar tais atributos. Façamos como a moça disputada daquele antigo samba: “Quando para o samba / bate palmas, pede bis”. Bata palmas, sim, mas com as mão lavadas – e sem se esquecer dos demais protocolos de segurança, claro.
Empresa israelense produz a primeira córnea artificial e realiza o implante com sucesso em um paciente de 78 anos
A visão é responsável por 80% das informações que recebemos. Jamal Furani, de 78 anos, passou a última década sem receber essas informações: ele ficou cego. No mês passado, o israelense comemorou uma vitória da ciência: graças ao primeiro transplante de córnea artificial da história, Jamal voltou a ver. A cirurgia aconteceu no Rabin Medical Center, em Israel, e ele se recuperou rapidamente: logo após a remoção dos curativos, imediatamente conseguiu ler e reconhecer os familiares que o acompanhavam. A córnea artificial foi produzida por um sofisticado processo de engenharia química em nanoescala que estimulou o crescimento celular e sua integração contínua ao tecido conjuntivo, a parte branca do olho.
O cirurgião oftalmologista Claudio Lottenberg, presidente do Conselho do hospital Albert Einstein e do Instituto Coalizão Saúde, explica que a córnea humana é semelhante à lente de uma máquina fotográfica, onde o foco é ajustado para que a pessoa possa ver com nitidez. “Se há algum problema na córnea, a visão fica embaçada, arranhada”, explica. Segundo a Organização Mundial de Saúde, há trinta milhões de pessoas cegas no mundo devido a problemas na córnea. No Brasil, a fila para o transplante tem mais de sete mil pessoas.
A startup israelense CorNeat Vision, responsável pelo produto, já concluiu a fase pré-clínica. Segundo o pesquisador Gilad Litvin, inventor da córnea artificial, órgãos reguladores internacionais como o FDA, nos EUA, exigem que os testes sejam feitos em pelo menos 20 pacientes com acompanhamento com duração de um ano.
O implante de córnea artificial será uma boa opção para os casos onde ocorre a rejeição ou em países com poucas córneas disponíveis para transplantes. “Dispor de um produto sintético que pode substituir o tecido humano é uma grande notícia para milhões de pessoas”, comemora o cirurgião.
O homem bondoso faz bem a si mesmo, mas o cruel a si mesmo se fere (Provérbios 11.17).
Quando fazemos o bem aos outros, somos os primeiros beneficiados. O bem que praticamos aos outros retorna para nós mesmos. A Bíblia diz: Certos de que cada um, se fizer alguma coisa boa, receberá isso outra vez do Senhor (Efésios 6.8). Bebemos o refluxo do nosso próprio fluxo. Colhemos com fartura o que semeamos no campo dos outros. A prática do bem é o melhor e o mais seguro investimento que podemos fazer na vida. O apóstolo Paulo diz que o marido que ama a sua mulher a si mesmo se ama. E Salomão afirma que aquele que faz o bem aos outros a si mesmo o faz. Não é essa, porém, a realidade do perverso. O mal que ele intenta fazer contra o próximo cai sobre sua própria cabeça. Ele recebe a paga de sua maldade. O homem cruel é como um louco que fere a si mesmo. Comete o desatino da autofagia. As flechas envenenadas que ele lança sobre os outros voltam-se contra sua própria vida. A crueldade, antes de destruir seu destinatário, destrói seu remetente. A bondade é um investimento em si mesmo, mas a crueldade é a destruição de si mesmo. Fazer o bem compensa, mas praticar o mal é a mais consumada loucura. O que você tem semeado: o bem ou o mal? Bondade ou crueldade?
Pesquisa exclusiva revela o cenário da diversidade nas empresas brasileiras e traz um alerta: 65% não têm uma estratégia bem definida. Saiba como virar esse jogo
O ano de 2020 foi fortemente marcado pela discussão do racismo. Em maio, a morte de George Floyd, um homem negro asfixiado por um policial em Mineápolis, gerou protestos nos Estados Unidos e manifestações de apoio globais ao movimento Black Lives Matter. A temática foi tão importante que analistas políticos americanos atribuem a vitória dos democratas Joe Biden e Kamala Harris (primeira mulher negra no cargo de vice-presidente) na corrida pela Casa Branca ao voto de eleitores negros – principalmente das mulheres -, que querem mais foco do governo na pauta racial.
No Brasil, a questão veio à tona em diversos momentos. Em setembro, o terna esquentou quando o Magazine Luiza abriu um programa de trainees voltado especificamente para negros para aumentar o número de líderes afrodescendentes na companhia. O projeto recebeu uma enxurrada de elogios – e de críticas -, sendo até chamado de inconstitucional. Mas juízes e procuradores se posicionaram a favor do programa, que seguiu. No final de outubro, a discussão pública voltou quando Cristina Junqueira, CEO da fintech Nubank, declarou no programa Roda Viva, da TV Cultura, que contratar negros era “difícil” e que não era possível “nivelar por baixo”. A fala, vista como discriminatória e distanciada do entendimento da inclusão, gerou tantos feedbacks negativos que a executiva se desculpou, o Nubank fortaleceu sua equipe de diversidade e anunciou um investimento de 20 milhões de reais em programas de combate ao racismo.
Mas foi em novembro, na véspera do Dia da Consciência Negra, que a temática se tornou pauta nacional. No dia 19 daquele mês, João Alberto Silveira Freitas, conhecido como Beto Freitas, foi espancado até a morte por seguranças de uma loja do Carrefour em Porto Alegre (RS). O assassinato impulsionou manifestações antirracistas por diversas cidades brasileiras, levou um grupo de artistas a pintar a frase “Vidas pretas importam” na Avenida Paulista e fez com que o presidente global do Carrefour determinasse a revisão do treinamento de funcionários. Além disso, a varejista criou um comitê externo que vai auxiliá-la em temas de diversidade.
Todos esses episódios mostram um movimento forte da sociedade brasileira na luta pela igualdade de direitos e deixam claro que as empresas serão cada vez mais cobradas quanto à pauta da inclusão. Foi nesse contexto que surgiu a pesquisa O Cenário Brasileiro da Diversidade e Inclusão, primeiro levantamento de práticas de D&I do tipo no país. O estudo é fruto da parceria da Revista Você RH com a consultoria Mais Diversidade e ouviu cerca de 300 empresas de diferentes setores. Nesta reportagem especial, compartilhamos os resultados do relatório pioneiro.
BOAS INTENÇÕES, MAS FALTA AMARRÁ-LAS
Um sinal positivo de que a diversidade está ganhando importância no mundo corporativo é que, mesmo em um período de crise global, 97% das empresas pretendem manter ou ampliar o orçamento da área em 2021. “Isso é muito significativo. Demonstra que as companhias não olham para o tema porque está na moda, mas porque está trazendo resultados para o negócio”, afirma Thiago Roveri, líder de pesquisas da Mais Diversidade e responsável pela condução do estudo. “A diferença de 15 anos atrás, quando começamos a trabalhar o assunto no mercado, para cá é que a agenda deixou de ser acessória e passou a ser prioritária”, complementa Ricardo Sales, sócio fundador da Mais Diversidade.
Mesmo com dinheiro disponível, falta às empresas pensamento estratégico sobre a temática. Segundo nosso levantamento, 65% das cornpanl1ias não têm uma estratégia que direcione suas práticas – o que resulta em ações soltas sem eficácia comprovada. Péssimo para os negócios. Para mudar esse quadro, é preciso entender que a diversidade está relacionada a outros aspectos além da responsabilidade social. “As empresas ganham no desempenho financeiro e na qualidade das entregas. Fora do Brasil há, inclusive, uma tendência de alguns investidores reforçando a importância de acrescentar a letra D, de ‘diversidade’, na sigla ESG [environmental, social and governance}, um indicador de comportamento sustentável”, diz Cristina Kerr, CEO da consultoria CKZ Diversidade e professora na Fundação Dom Cabral.
As multinacionais são as mais maduras nas práticas e 90% delas, segundo nosso estudo, adaptam suas ações para a realidade brasileira. O que dá margem para duas interpretações. políticas globais trazem assertividade, mas demonstram que há pouca proatividade das filiais nacionais em puxar o assunto, fazendo apenas pequenos ajustes nas diretrizes. “Lógicas culturais e de relação entre indivíduos se dão a partir de uma dimensão local. Mesmo que orientações da matriz estabeleçam a necessidade de políticas para a diversidade, isso não significa que vão se concretizar se o ambiente for hostil e preconceituoso”, afirma Márcio José de Macedo, professor e coordenador de diversidade da escola de negócios da FGV.
PRÁTICAS FORMALIZADAS
Na esteira da falta de estratégia vem o fato de que, segundo nosso estudo, 71% das empresas não têm ou estão construindo uma política de D&I, e apenas 26% adequaram suas práticas já existentes de RH a questões de diversidade. Ao contrário do que possa parecer, formalizar as ações de inclusão não é mera burocracia, e sim o indicativo de que aquilo faz parte dos valores da companhia – e que será levado em conta na hora de contratar, promover e desenvolver os funcionários, por exemplo. “As regras do jogo ficam claras e os empregados entendem como devem se portar. É importante”, diz Thiago. Além do mais, isso garante que a pauta será perene e não ficará restrita à visão de mundo de diretorias ou presidências específicas.
Há diversas formas de criar uma política de diversidade, mas revisar as práticas da empresa é um bom primeiro passo. O RH pode ajudar nesse sentido, sendo a primeira área a fazer essa análise. Envolver pessoas de diferentes cargos e setores em um workshop sobre condutas inclusivas também é uma boa ideia. Além disso, não se pode esquecer a comunicação: quanto mais o tema é debatido internamente, mais se torna parte do dia a dia. Infelizmente, a maioria das companhias só compartilha os resultados de diversidade com líderes seniores e a área de recursos humanos.
Foi justamente pensando em transparência que o Grupo Sabin, do setor de medicina diagnóstica, criou um documento que concentra as políticas de diversidade e inclusão. Dessa forma, fica bem claro para todos os 6.000 funcionários o que deve ser feito, o que não será tolerado e que o assunto é levado a sério. “Somos uma empresa fundada por duas mulheres, e diversidade é um valor compartilhado por quem cresceu aqui. Temos 77% de mulheres no quadro e 74% da liderança formada por elas”, diz Lídia Abdalla, CEO do Grupo Sabin. Manter esse entendimento numa companhia que está em expansão desde 2012 adquirindo outras empresas pelo país é um grande desafio. Afinal, ao comprar uma organização, é necessário entender mais sobre a nova população. Por isso, o Sabin usa censos demográficos para mapear quem são seus funcionários e criar metas. “Fazemos isso há quase dez anos para conhecer a fundo nossas pessoas e estabelecer quais programas trariam mais valor ao nosso público”, diz Lídia. “Programas e políticas estruturadas são importantes para passar adiante e reafirmar, especialmente para os que estão chegando, que essa é uma agenda importante.” A mais nova ação de diversidade do Sabin é atrair profissionais com mais de 55 anos por meio de um programa de recrutamento exclusivo para esse público. “O mercado está deixando para trás essas pessoas que têm tanta experiência”, diz a CEO.
E A ESTRUTURA?
O estudo aponta certa profissionalização do setor de D&I: cerca de 65% das companhias afirmam ter uma área, ou algum tipo de estrutura que pauta o tema. No entanto, apenas 25% dos profissionais atuam de maneira exclusiva, e a maior parte das empresas não vê como prioritária a criação de um setor de diversidade internamente.
A principal justificativa das companhias que não possuem um setor para tratar a agenda de inclusão é falta de orçamento – no entanto, se a pauta fosse prioritária, os recursos provavelmente seriam alocados. “Não existe lucro sem investimento. É preciso clareza de aonde se quer chegar e consistência nas práticas para alcançar o objetivo. Algum dinheiro é necessário e, para isso, deve haver uma mudança de mentalidade”, diz Márcio, da FGV. Mas existem saídas. “Sugiro que uma pessoa do RH fique focada nisso. Não é o ideal, mas é preciso que alguém acompanhe as métricas. O que não é medido não melhora”, diz Cristina, da CKZ Diversidade.
Ter uma área, no entanto, não resolve todo o problema. E pode até criar outros. Isso porque a existência de um departamento corre o risco de estimular um pensamento equivocado de que a inclusão é uma responsabilidade só daquela área, enquanto deveria ser uma pauta geral da organização. Além disso, é problemático o pensamento mágico de que montar a área irá resolver todos os desafios. “Ter dez pessoas que não são levadas a sério não determina o sucesso”, explica Ricardo, da Mais Diversidade. Novamente a questão estratégica vem à tona como crucial.
O Itaú Unibanco é um exemplo de empresa que conseguiu tornar sua estrutura de diversidade e inclusão relevante – e se destacou nessa categoria em nossa pesquisa. A instituição tem uma equipe de sete pessoas dedicadas ao assunto, e todas as áreas da companhia, com cerca de 87.000 empregados, têm funcionários que dividem suas funções com pautas de D&I – atuação que é devidamente orientada pela gerência de diversidade. Assim, o tema torna-se um valor amplo e de responsabilidade compartilhada. “Temos vários momentos de inserção do assunto ao longo do ano”, diz Camila Udihara, superintendente de diversidade e experiência do colaborador do Itaú.
Atualmente, o foco do banco está em dois grupos: mulheres e negros. Embora a instituição tenha 60% de funcionárias, a representatividade cai dez pontos percentuais a cada nível hierárquico. No caso dos afrodescendentes, o índice é baixo, e apenas 23% dos empregados se declaram assim. Para melhorar os indicadores, há revisão de critérios de seleção de novos empregados (como o fim da exigência de inglês, de idade-limite e de universidades específicas nos programas de estágio e trainee), mentoria para mulheres e negros, treinamento sobre vieses inconscientes e letramento racial para a chefia – projeto que está na agenda de 2021. “Há dois anos batíamos na porta das áreas para conquistar aliados. Hoje eu não dou conta de atender as lideranças que querem ter profundidade sobre o assunto. É uma construção lenta, mas muito possível”, explica Luciana Campos, gerente de diversidade e empreendedorismo do Itaú Unibanco.
AFINIDADE COM EFICIÊNCIA
Embora a maior parte das empresas afirme ter iniciativas de diversidade e inclusão, 2/3 não têm um programa implementado ou estão no processo de construí-lo. Isso significa, novamente, que as ações estão sendo desenvolvidas sem direcionamento. “O tema tem que estar atrelado à estratégia do negócio para conseguir permeabilidade e resultados. A ausência de governança sólida traz dificuldades para que a pauta ganhe robustez e espaço para diálogo com o corpo executivo”, diz Thiago, da Mais Diversidade. O problema de ter projetos pontuais, explica Regina Madalozzo, coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero do Insper, é a falta de eficácia. “Fazer as pessoas pensarem no assunto por duas horas é o que se ganha com ações ou palestras soltas. Se quer realmente algo que dê resultado, tem que ter consistência.”
Um exemplo dessa desconexão aparece nos grupos de afinidades. Nosso estudo mapeou que eles existem em 61% das companhias, mas que 50% operam sem um programa de D&I que possa orientá-los. “A ineficiência dos grupos é um desafio das empresas. Isso acontece porque muitos surgem espontaneamente, com a melhor das intenções, mas não sabem o que fazer. Sem direcionamento estratégico, eles perdem sua razão de existir e se tornam um problema”, diz Ricardo, da Mais Diversidade.
Os comitês de afinidades que dão certo passam por uma escala de evolução. Começam como um fórum de troca de experiências, evoluem para o que se chama internacionalmente de employee resource groups (que têm como objetivo ajudar a empresa a avançar naquela discussão específica), e se transformam em business resource groups (com a meta de ajudar o negócio no desenvolvimento de novos produtos e serviços com base em um olhar diverso).
No Brasil, a maior parte dos times ainda está na primeira etapa de desenvolvimento. “A troca de experiências é muito relevante, mas não pode ser o único objetivo das pautas dos grupos de afinidades. É preciso fazer algumas perguntas: os grupos têm direcionamento para trabalhar? Eles sabem o que eu espero deles? Eles têm objetivos? Esse esforço está sendo reconhecido?”, explica Ricardo.
Na Chubb, empresa multinacional do setor de seguros com 800 funcionários e um dos destaques na categoria Governança. de nosso estudo, os grupos de afinidades estão evoluindo. Eles começaram como a maioria: espontaneamente. Em 2018, estavam focados em compartilhar vivências e procuraram o RH para endereçar as ações, junto do qual criaram o Comitê de Diversidade. No ano seguinte, organizaram as ações por pilares (gênero, étnico-racial, pessoas com deficiência e LGBT+) e passaram a ter governança. Ou seja, metas, agenda definida, gerentes ou diretores que patrocinam as ações, executivos do C-Level que atuam como embaixadores e apoio do líder de diversidade e inclusão da empresa – mais de 30% da companhia faz parte da iniciativa. Tudo isso fez com que a equipe se tornasse um employee resource group e uma referência para as ações da companhia na América Latina. “A diversidade está no dia a dia das pessoas e, quanto mais envolvidas, mais elas se tornam agentes de mudanças”, diz Rafael Potenza Ramos, líder de diversidade e inclusão da Chubb que acumula a função de coordenador de treinamento e desenvolvimento da multinacional.
A LINGUAGEM DA LIDERANÇA
Quando o assunto é investimento em diversidade, nosso levantamento mostra que a principal prioridade dos profissionais da área é sensibilizar a alta gestão na temática – o que faz todo o sentido. “É a liderança que banca a decisão de incluir, contagia a empresa e faz a mudança acontecer. Sem sensibilizá-la, dificilmente o assunto ganhará relevância”, diz Ricardo.
Claro que essa aproximação é desafiadora e muitos erros são cometidos nesse processo, entre eles deixar de lado a linguagem que mais conecta com o C-Level: os resultados. Por isso, o que funciona melhor no convencimento da liderança é montar um business case com pesquisas que demonstrem como a D&I gera valor ao negócio (aumento da inovação e dos lucros são indicadores sempre presentes nos estudos do tema feitos pela consultoria McKinsey) e com exemplos de boas práticas de outras companhias do mesmo setor ou com os mesmos desafios (as companhias que se destacam costumam ser abertas para benchmarking).
Cristina Kerr, da CKZ, vai além e sugere levar um CEO que seja aliado da causa para conversar com a liderança da empresa. Esses passos ajudam, também, a encontrar diretores que fiquem mexidos pelo assunto e se tornem influenciadores. “Quando bem cuidada e munida de informação, essa pessoa sensibiliza os pares”, diz Regina, do Insper.
No Grupo Pão de Açúcar, que conta com aproximadamente 100.000 funcionários, a liderança abraça o programa de diversidade desde 2017, quando foi lançado exatamente por causa de uma semente plantada pela alta gestão. Na quela época, uma diretora fez um treinamento externo sobre o assunto, se sentiu tocada e levou a discussão para dentro de casa – a partir daí surgiram grupos de afinidades e demanda do topo para criar políticas de diversidade. “A presidência e o board sempre quiseram ser pioneiros em levantar essa bandeira e são pessoalmente defensores da causa”, diz Susy Yoshimura, diretora de sustentabilidade e compliance do GPA. Como há uma cobrança que vem do topo, a varejista atrela, desde 2016, as métricas de inclusão (como número de mulheres na liderança e contratação de PCDs) à remuneração variável da chefia – algo raro nas companhias, como revela nosso levantamento, que mostra que apenas 35% das empresas fazem esse tipo de conexão. “Temos o Casino como nosso controlador europeu, e essa agenda é mais madura por lá, então fomos fortemente estimulados a fazer isso. Mesmo sem uma área específica na época, já enxergávamos a diversidade como uma estratégia de ESG”, explica Susy.
De lá para cá, os indicadores melhoraram no Grupo Pão de Açúcar: atualmente há 50% de mulheres no quadro – 33% em cargos acima de gerência – e 47% das vagas de estágio foram preenchidas por afrodescendentes em 2020. Além disso, práticas como mentoria para negros, adoção de crachá com nome social para pessoas trans e obrigatoriedade de haver mulheres na linha sucessória dos cargos ele diretoria revelam cuidado com o tema. E tudo isso reflete diretamente na satisfação dos empregados com a empresa. Tanto que, na última pesquisa de engajamento do GPA, o item “ambiente propício à diversidade e respeito” foi o que teve mais favorabilidade dos funcionários.
Está aí uma demonstração objetiva de como o tema está tocando as pessoas e deve, mais do que nunca, se tornar prioritário nas empresas – indo muito além de hashtags em redes sociais.
EM QUAL GUARDA-CHUVA
As áreas de D&I têm vários reportes, mas a maior parte está sob o RH, o que diminui o peso estratégico. “O movimento global é responder ao presidente, o que dá poder para influenciar diretoria e conselho”, diz Thiago Roveri, líder de pesquisa da Mais Diversidade.
PARA FICAR DE OLHO
A pesquisa revela algumas tendências para quem trabalha com diversidade, e chama atenção a vontade das empresas de atuar para incluir pessoas que já passaram pela cadeia
CADA SETOR, UMA REALIDADE
As empresas participantes se dividem em 23 ramos de atuação diferentes, e eles revelam que a temática não é tratada de maneira homogênea
consumo excessivo e desregulado de melatonina cresce entre brasileiros durante a pandemia
O publicitário Adam Smith, 33 anos, viu seu problema de insônia se agravar quando a pandemia do novo coronavírus sacudiu sua vida. Natural de São Paulo, mas morando em Lisboa, Portugal, desde 2018, em um ano ele perdeu quase todos os clientes de sua agência de publicidade, viu seus vínculos sociais desaparecerem à medida que as restrições de circulação aumentaram e deixou de viajar, um de seus hobbies. Da janela de seu apartamento em Odivelas, área metropolitana da capital portuguesa, as noites se transformaram em dias. O sono vinha quase por exaustão, muitas vezes quando o sol já havia nascido. Os problemas para dormir não eram inéditos na vida do publicitário. Desde a adolescência, sempre enfrentou crises de insônia. Nesses casos, recorria aos tradicionais remédios de tarja preta como Rivotril, clonazepan e diazepan. Ao perceber que havia certa dependência, decidiu trocar os medicamentos pela melatonina, que considera “mais natural”. Chegou à substância por intermédio de amigos e começou com uma mistura de melatonina e ervas calmantes. Nesse processo todo, não ouviu um médico. Vai na tentativa e erro.
Uma pesquisa inédita, feita pelo Instituto do Sono com 1.665 pessoa revelou que 55,1% alegaram piora no sono durante a pandemia. A principal queixa é a dificuldade para dormir (66,8%), mas houve aumento em diversos tipos de obstáculos para uma noite revigorante. Os relatos de problemas ocorrendo pelo menos uma vez por semana aumentaram. Entre os principais deles estão a falta de disposição ou entusiasmo, recorrência de pesadelos, demora demais de 30 minutos para conseguir pegar no sono e acordar no meio da noite ou muito cedo. Para os entrevistados, as causas estão relacionadas à pandemia mesmo: “Mais preocupações devido à situação” (75,1%), “mais tempo de tela (celular, computador, TV)” (64%) e “mais tempo dentro de casa” (54.1%).
Já o estudo Relato de tristeza/depressão, nervosismo l ansiedade e problemas de sono na população adulta brasileira durante a pandemia de Covid-19, com 45.161 pessoas, indica que 43,5% relataram início de problema de sono preexistente agravado. Participaram pesquisadores da Universidade estadual de Campinas (Unicamp), Universidade de São Paulo (USP), Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), e Universidade Federal de Sergipe (UFS). “A ansiedade relacionada a uma situação atípica, o medo de infectar, a falta de oportunidade, da prática de atividade física, a irregularidade da rotina e, por fim, a alimentação inadequada foram as principais causas do aumento de transtorno de sono em minha prática clínica. Quem já era predisposto desenvolveu um distúrbio, e quem não era foi premiado com algum em certas situações”, afirmou o psiquiatra e médico do sono Caio Bonadio, criador da plataforma digital Caio no Sono.
A melatonina é produzida pelos organismos de plantas e animais. É conhecida como o hormônio do sono, mas é mais do que isso: é uma das principais responsáveis pelo ciclo biológico de quase todos os seres vivos, usada no ritmo circadiano que regula a atividade física, química, fisiológica e psicológica do corpo humano. Pode ser encontrada em alguns alimentos como leite e cereja. No entanto, a quantidade que poderia ser absorvida pela via alimenta é muito pequena para ter resultado terapêutico.
A substância induz todas modificações necessárias para o repouso, como sono, jejum e redução da atividade cardiovascular, da pressão, da frequência cardíaca e até da temperatura corpórea. Enquanto faz isso, durante a noite, prepara o organismo para o despertar. Assim que a produção cai, os hormônios da glândula adrenal sobem, o sistema nervoso muda, e o indivíduo desperta. É uma ação complexa. “Ela é uma pista química importante para nosso relógio biológico funcionar corretamente. Interage com diversos outros centros produtores de sono, localizados no cérebro. É um importante regulador de nosso ciclo sono-vigília. Além disso, tem outras funções, como a ação antioxidante”, explicou Bonadio.
Nos últimos anos, o consumo do medicamento aumentou pela facilidade da compra no exterior e pela liberação do uso em alguns países. No Brasil, porém, a melatonina não pode ser vendida, nem com receita médica, em drogarias comuns, apenas em farmácias de manipulação. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) disse que não há registro de nenhum medicamento com a substância no país, que já recebeu petições de empresas interessadas, “mas até o momento as análises não foram concluídas”. A demora é criticada pelo médico José Cipolla Neto, professor de fisiologia humana na USP e pesquisador da melatonina no Laboratório de Neurobiologia da mesma universidade. Segundo ele, há farmacêuticas que aguardam há anos a decisão da Anvisa e já existem mais de “30 mil trabalhos sobre o tema”. Em sua opinião, a venda deveria ser liberada no país desde que sob a exigência da receita.
De acordo com o médico e pesquisador, há alguns grupos que podem ser muito beneficiados por uma reposição de melatonina, desde que prescrita por um médico – como idosos, já que a produção cai com a idade -, mulheres na menopausa, diabéticos, indivíduos com mal de Parkinson, autismo ou outra doença neurológica e, por fim, patologias do sono, como quem tem “atraso de fase” (sono que começa e acaba mais tarde que o normal), ou sono dessincronizado. Mas a primeira coisa que tem de ser dita é que só toma melatonina quem precisa. Ela não é inócua, pode trazer malefícios se for mal administrada. Ninguém vai à farmácia e toma hormônio tireoidiano à toa. É um problema sério para quem toma de forma inadvertida”, afirmou Cipolla Neto. “O cara toma 10 miligramas de melatonina à noite. Só que isso vai ficar no organismo até as 2 horas da tarde do dia seguinte. Dorme bem, mas bagunça a fisiologia inclusive podendo levar a um estado de resistência à insulina e pré-diabetes.
Nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, o consumo é liberado, e medicamentos com melatonina podem ser encontrados em farmácias e supermercados, já que são rotulados como suplementos. Não há nem a necessidade de receita médica. Adam Smith, por exemplo, comprou na farmácia em Lisboa uma caixa com 21 comprimidos por cerca de 19 euros. Quem volta de viagem pode trazer na bagagem, desde que haja prescrição médica, o mesmo valendo para a importação.
Os médicos defendem que a prescrição clínica é fundamental para definir a dose, a formulação certa (liberação rápida ou lenta) e a hora correta para que a melatonina seja tomada. E, depois, deve ser feito o acompanhamento para ver não só se a pessoa está dormindo melhor, mas também se não há sonolência durante o dia, assim como verificar se não há alterações cardiovasculares ou de insulina. Cipolla Neto explicou que um adulto jovem precisa de 0,1 miligrama de melatonina. Mas o que se vende é, no mínimo 0,3 miligramas, sendo extremamente comum nos EUA encontrar dosagem de 5 miligramas, 10 miligramas e até 20 miligramas. E existe uma máxima na administração: não se toma a melatonina para depois ir jantar, porque o hormônio prepara o organismo para o jejum. “Tomar melatonina significa: começou o repouso. A pessoa deve estar preparada para dormir, num ambiente calmo, sem alimentação.”
O mais comum, no entanto, é encontrar pessoas que usam a substância sem acompanhamento médico. A representante comercial Camila (nome alterado para preservar a identidade) começou a tomar melatonina quando viajava com uma amiga, usuária frequente, para o Litoral Norte de São Paulo. Gostou tanto que mandou fazer numa farmácia de manipulação da capital, sem que fosse exigida receita. Achou que efeito não era mesmo e decidiu comprar importada pela internet. Apesar de não sofrer de insônia, disse que toma o medicamento quando está muito ansiosa e preocupada com problema pontuais ou “para dormir gostoso”.
É exatamente contra esse tipo de situação que o psiquiatra Caio Bonadio alerta. “A melatonina não deve ser usada sem orientação médica. Alguns efeitos colaterais possíveis são pesadelos, dores abdominais, diminuição do nível de alerta durante o dia, fadiga e dor de cabeça. Mas o grande problema mesmo é a automedicação, situação na qual o paciente nem sequer sabe seu diagnóstico ou se existe mesmo a indicação do uso do hormônio. O grande contra do uso indiscriminado da melatonina é que o paciente acaba demorando demais para procurar ajuda e, quando procura, o problema já está muito complexo, o tratamento fica mais caro e há mais chances de complicações no longo prazo.”
Às vezes, em vez de ajudar a reverter essa situação, a melatonina pode atrapalhar. A produtora de cinema Patrícia Aguiar, de 31 anos, nem gosta de tomar remédios, mas viu na melatonina da irmã uma opção “natural” para ajudá-la a dormir quando eslava com os horários desregulados pelas filmagens noturnas. Na primeira vez, ela dormiu mal e teve pesadelos, mas, como havia ingerido álcool, achou que a culpa era da bebida. Tentou outra vez. “Depois fiquei toda desregulada e decidi tomar a melatonina de novo para evitar um remédio mais forte. Até me ajudou a cair no sono rápido, não fiquei horas rolando na cama, mas tive vários pesadelos, depois acordava e tinha de voltar a dormir. Não descansei, o sono não foi reparador, pelo contrário”, contou. “Quando conversei com um médico, ele me disse que é um efeito colateral do remédio mesmo e que não deve ser tomado desse jeito.”
Bonadio é taxativo: a melatonina não é indicada para o tratamento da insônia. Na medicina do sono, é indicada para pessoas que têm transtorno do ritmo circadiano, as chamadas “doenças do relógio biológico”. Ou seja, antes de tomar comprimidos para suportar a pandemia, é preciso identificar o que está atrapalhando o sono. Só então dá para saber se a melatonina é mesmo o remédio certo. Para todas as pessoas que não têm tido seu merecido descanso, o especialista aconselha procurar ajuda. “Não faça automedicação. As medicações para o tratamento da insônia são seguras e eficazes, desde que sejam prescritas por um profissional habilitado. Além disso, é prudente rever maus hábitos de sono, como sedentarismo, uso excessivo de telas no período noturno, má alimentação, falta de estímulos noturnos e diurnos corretos, falta de rotina de sono, dentre muitos outros.”
"Tão certo como eu vivo, diz o Senhor Deus, não tenho prazer na morte do ímpio, mas em que o ímpio se converta do seu caminho e viva. Convertam-se! Convertam-se dos seus maus caminhos!" Ezequiel 33:11b
Você precisa fazer login para comentar.