DESVENDANDO A PSICOPATIA – VI
QUAL A DIFERENÇA?
Entenda como se comportam os portadores de outros transtornos de personalidade
As características dos transtornos de personalidade, em geral, aparecem logo na adolescência ou no começo da vida adulta. De acordo com a 5ª edição do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (DSM-5), este tipo de transtorno é caracterizado por uma conduta padrão, em que o indivíduo evidentemente se desvia das expectativas culturais de comportamento da sociedade em que vive. Normalmente, a pessoa acometida é inflexível e, na vida adulta, suas atitudes costumam causar prejuízo e sofrimento às relações sociais.
MAIS COMUM DO QUE VOCÊ PENSA
Segundo um estudo realizado pela NESARC (em tradução livre, Pesquisa Epidemiológica Nacional sobre Álcool e Condições Relacionadas nos Estados Unidos, entre 2001 e 2002, aproximadamente 15% dos adultos norte-americanos (quase 43 milhões de pessoas) apresentavam ao menos um transtorno de personalidade. Uma grande quantidade de pessoas, não? O fato é que, muitas vezes, os portadores desses distúrbios passam despercebidos aos nossos olhos e assim, desconsideramos a existência dos transtornos de personalidade. Por isso, torna-se importante estudar cada um dos dez tipos conhecidos e seus respectivos comportamentos, com o intuito de melhoraras técnicas terapêuticas existentes.
RELAÇÕES DE CONFLITOS
Mas como se comportam os indivíduos com esses distúrbios? Segundo o psicanalista Roberto Rosas, “de um jeito simples, podemos pensar que as pessoas que apresentam transtornos de personalidade são bem pouco funcionais. Na maioria dos casos, observamos certa estagnação no desenvolvimento emocional da pessoa”. Entretanto, nem sempre o transtorno afeta a formação educacional. Por outro lado, as relações sociais podem ser prejudicadas. “Em boa parte dos casos, é marcada por conflitos que, em vez de atenuados, tendem a ser intensificados”, complementa Rosas.
O psicanalista acrescenta que são muitos os transtornos de personalidade e que, atualmente, fala-se muito sobre o borderline. “Se pensarmos por uma perspectiva da psicodinâmica, quem tem transtorno de personalidade costuma ser mais egocêntrico e onipotente. Em outras palavras, é regido por motivações infantis”, acrescenta. Tal característica, de um modo geral, é muito comum entre esses indivíduos.
O diagnóstico é feito por um psiquiatra e o processo costuma ser difícil, cuidadoso e detalhado e, frequentemente, realizado em conjunto com uma equipe composta por outros especialistas como neurologistas e psicólogos.
DIVISÕES
Os distúrbios podem ser classificados em dez categorias. De acordo com o psiquiatra João Jorge, os indivíduos com transtornos de personalidade paranoide, esquizoide e esquizotípica são excêntricos. Já os de personalidade antissocial, borderline, histriônica e narcisista “são pessoas dramáticas, emotivas e erráticas”, explica o especialista. Há ainda os que apresentam o transtorno de personalidade esquiva, dependente e obsessivo-compulsivo, com características ansiosas ou temerosas. Confira, a seguir, as principais características desses transtornos.
BORDERLINE
Os indivíduos com este distúrbio (em maior quantidade, mulheres) costumam apresentar dificuldades em seus relacionamentos íntimos. Por conta da sua autoestima praticamente “zerada”, elas buscam segurança afetiva nos parceiros. Assim, os companheiros tendem a ser sufocados e machucados pelo excesso de sentimento que as pessoas com este transtorno depositam sobre eles.
Os “borders”, como são conhecidos, têm uma visão distorcida de si mesmos, principalmente em relação à aparência física, e possuem muito medo da rejeição. Costumam apresentar humor instável e, por isso, podem se irritar com pequenos acontecimentos, mudando de humor várias vezes ao longo do dia. É possível que tenham acessos de raiva e, depois, se arrependam ou provoquem a “autodestruição”, por exemplo, consumindo álcool ou drogas exageradamente. O distúrbio é logo identificado na adolescência, quando os indivíduos costumam ter a primeira paixão intensa ou a primeira rejeição amorosa.
OBSESSIVO-COMPULSIVO
Regido por uma ideia de que “pode tudo”, a pessoa que apresenta esse transtorno costuma cumprir rituais que criou com o intuito de se proteger contra acontecimentos ruins. “Trata-se de um jeito primitivo de lidar com a angústia. Por exemplo, se eu encostar em todos os postes de rua no caminho de casa ao trabalho, nada de mau me acontecerá. Eu não serei demitido ou não adoecerei”, explica Rosas.
Os acometidos por esse transtorno de personalidade são extremamente perfeccionistas e necessitam ter controle sobre as pessoas que rodeiam. Tal distúrbio se difere do transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) porque o indivíduo não percebe que seu comportamento é problemático e tende a achar que todos ao seu redor estão agindo errado.
Os portadores deste distúrbio são extremamente pontuais, organizados, evitam bagunça e costumam fazer suas atividades profissionais e escolares sozinhos por acharem que outras pessoas irão fazê-las errado. Além disso, também tendem a ser politicamente corretos.
ESQUIZOIDE
Em geral, pessoas com a personalidade esquizoide não apresentam interesse pelas relações sociais, principalmente as mais próximas mesmo que seja com familiares. Normalmente preferem fazer atividades sozinhas e sentem prazer com pouquíssimas delas. Também demonstram indiferença aos elogios ou críticas de outras pessoas, são frios e distantes. Elas preferem realizar tarefas mecânicas ou abstratas como jogos matemáticos ou usar computador. Segundo o DSM-5, o transtorno de personalidade esquizoide é diagnosticado com mais frequência em homens e pode causar mais prejuízos a eles.
HISTRIÔNICA
Emoções que transbordam e uma busca excessiva pela atenção de outras pessoas, o histriônico se sente desconfortável em situações em que não é o centro das atenções. Quando se relaciona com outras pessoas, tende a ser provocativo e sedutor. Para isso, utiliza a aparência física para chamar a atenção de quem está por perto.
O modo de falar impressiona, mas é carente de detalhes. O indivíduo também é influenciado facilmente por outras pessoas e costuma teatralizar suas ações, exagerando nas emoções.
DEPENDENTE
Imagine ter dificuldades em tomar decisões sobre a sua própria vida sem ter muitos conselhos e a confiança de outras pessoas. Parece estranho, porém é uma atitude bem comum de quem sofre com o transtorno de personalidade dependente. Tais indivíduos precisam que outros se responsabilizem pela sua vida e têm dificuldade em expressar opiniões contrárias por medo de perder o apoio de amigos ou familiares próximos.
Eles podem chegar à situações extremas para obter o carinho ou apoio de outras pessoas, mesmo que aquelas atitudes não lhes agradem. Também são muito preocupados em serem deixados sozinhos para cuidarem da própria vida.
PARANOIDE
Segundo Rosas, nas ações paranoides, de maneira geral, “existe uma projeção do conteúdo recalcado da pessoa no outro; ou seja, se sou bom, o outro é mau e trama contra mim. Se eu recalquei uma característica minha, poderei vê-la no outro, quando meu ideal de mim não me permite ter sentimentos hostis. O paranoide vê-se engendrado numa trama de agressões que, pela sua subjetividade, vêm de fora, e não de dentro dele mesmo”. O recalque, então, seria uma maneira de se defender de exigências contrárias à uma atitude que está praticando. Tal transtorno de personalidade aparece no início da vida adulta e tem como características a desconfiança de outras pessoas, tendência a pensar que outros pretendem explorá-lo, prejudica-lo ou enganá-lo, mesmo que não haja evidência concreta disso ou que alguém esteja apenas o elogiando. Por pensar que estão conspirando contra ele, o indivíduo com o transtorno pode atacar amigos ou colegas de trabalho a qualquer momento.
NARCISISTA
Os acometidos pelo transtorno de personalidade narcisista tendem a seguir um padrão de grandiosidade (exagerando em suas realizações e talentos), com a necessidade de serem reconhecidos pelos outros. Costumam se preocupar com o sucesso, beleza ou amor ideal.
Aproveitam-se dos outros para alcançar seus objetivos e não reconhece os sentimentos ou as necessidades de outras pessoas. Os narcisistas também acreditam que são o motivo da inveja dos outros e podem ter atitudes arrogantes.
ESQUIVA
Os indivíduos com esse transtorno têm certa inibição social e sentem que não estão adequados às situações que vivenciam. Também são muito sensíveis às avaliações e comentários negativos que recebem. Por isso, tendem a evitar profissões em que haja contato social por medo de rejeição ou reprovação.
De fato, esquivam se de relações sociais (mesmo amorosas) com receio de serem ridicularizados por enxergarem eles mesmos como desagradáveis ou inferiores aos outros. Só fazem novas amizades se tiverem a certeza de que serão aceitos sem críticas.
ESQUIZOTÍPICA
As pessoas com este transtorno apresentam desconforto em relacionamentos íntimos, comportamento excêntrico e distorções na cognição e na percepção. Tais indivíduos interpretam incorretamente acontecimentos do cotidiano, obtendo deles um significado próprio e específico. Além disso, possuem crenças que influenciam no seu comportamento, como superstições, telepatia ou “sexto sentido”, que não condizem com as normas existentes em diferentes culturas.
A maneira de falar e o pensamento desses indivíduos costumam ser vagos, com metáforas, ou extremamente elaborados. O comportamento e a aparência podem ser classificados como estranhos, excêntricos ou peculiares. Ainda possuem ansiedade social excessiva que não diminui com a familiaridade e tende a estar associada ao medo, ao invés de pensamentos negativos sobre elas mesmas.
É DIFERENTE?
A psicopatia também é um transtorno de personalidade, contudo, possui diferenças visíveis dos outros distúrbios descritos anteriormente.
De acordo com o psicanalista Roberto Rosas, o transtorno antissocial caracteriza-se, basicamente, por atuações destrutivas no âmbito social. São pessoas que não têm empatia, não se importam com a dor ou o prejuízo do outro”. Ainda para o especialista, esses indivíduos não conseguem ver fundamento nas Leis, nem sentido na regulação dos próprios impulsos.
Em comparação com o borderline, por exemplo, enquanto esta é praticamente pura emoção e falta de razão, o antissocial é o contrário, sendo bem racional em tudo o que faz. O antissocial tende mais a usar as pessoas para alcançar seus objetivos do que preocupar-se com o que irão pensar sobre ele. Além disso, não sente culpa pelas suas ações.