UMA DROGA CHAMADA PAIXÃO
Avanços das neurociências e da psicologia nos ajudam a compreender os mecanismos biológicos do amor
Quem já se apaixonou sabe: quando vivemos essa experiência nos transformamos. O amor é capaz de nos levar ao desespero ou ao êxtase. E talvez até à guerra, se considerarmos a história do rapto de Helena e à campanha contra Tróia. Hoje, graças aos progressos das neurociências e da psicologia comportamental, começamos a compreender as bases biológicas profundas e os mecanismos subjacentes ao que se passa em nós quando experimentamos sentimentos de paixão, afeto ou contentamento. As descobertas revelam algumas pequenas surpresas. Examinados do ponto de vista biológico, muitos dos véus românticos que recobrem o fenômeno do amor desprendem-se facilmente. No entanto, um permanece: o do desejo sexual. Quando buscam sua origem, os cientistas logo esbarram numa série de enigmas. Por que desejamos uma pessoa específica? A que se deve o fato de sentirmos paixão ou desejo?
Em primeiro lugar, há que se fazer uma observação. Existe uma diferença fundamental entre o prazer por alguma coisa e o prazer em alguma coisa – ou seja, entre as sensações que temos quando almejamos algo e o que sentimos ao obtê-lo. Especialistas diferenciam aqui o prazer ou desejo apetitivo (por algo) do consumado (em algo). Além disso, desejo e amor não constituem um fim em si mesmos: têm metas biológicas palpáveis e concretas.
O prazer sexual não se desenvolveu visando a satisfação pessoal, mas para encorajar a reprodução. Tampouco as sensações profundas comumente etiquetadas como “amor” podem negar seu pano de fundo biológico: auxiliam no estabelecimento e na manutenção de um vínculo entre parceiros. Esses mecanismos são comandados por estruturas cerebrais particulares e por neurotransmissores. Prazer e amor são, portanto, essencialmente produzidos no cérebro e determinam nosso comportamento em função de um objetivo.
Quando se trata de considerar quem nos desperta a libido, um aspecto fundamental se impõe: orientação sexual depende em primeiro lugar da nossa própria sexualidade. O interesse por uma pessoa não se define apenas pelas características do corpo do outro, mas principalmente por aspectos psíquicos e cerebrais de quem sente a atração. Fundamental importância têm aí os hormônios, e sobretudo os sexuais. Muito antes da puberdade, eles encaminham o desenvolvimento não apenas de nossos órgãos genitais, mas também de partes do cérebro rumo ao masculino ou feminino.
Antes mesmo do nascimento, começam a atuar. Num feto geneticamente masculino, pequenas quantidades do hormônio sexual testosterona chegam ao cérebro no último terço da gravidez, influenciando seu desenvolvimento. Receptores sensíveis a esses hormônios sexuais encontram-se em numerosas regiões cerebrais. Pela determinação do sexo respondem sobretudo receptores hormonais situados no hipotálamo. Quando a testosterona exerce sua influência durante a fase pré-natal crítica, o cérebro será masculino. Na ausência desse hormônio, feminino.
Curiosamente, porém, não é a testosterona em si que surte efeito nesse processo: antes, ela é transformada em estrogênio, em geral conhecido pelos leigos como o hormônio sexual feminino. Fetos geneticamente femininos se protegem dessa ação específica do estrogênio auxiliados pela alfafetoproteína. Durante o desenvolvimento do cérebro, a testosterona interfere num processo natural fazendo com que células nervosas supérfluas sejam descartadas. Graças a essa interferência, morrem menos neurônios, razão pela qual a área frontal do hipotálamo dos mamíferos de sexo masculino é bem maior e mais rica em neurônios. Nos humanos, porém, essa diferença é menor do que, por exemplo, nas ratazanas.
PREFERÊNCIA SEXUAL
O hipotálamo é de especial importância na orientação e no comportamento sexual. Isso se evidencia no fato de as células nervosas do hipotálamo anterior exibirem intensa atividade quando um animal macho se aproxima de um parceiro sexual ou quando copula. Se essa região estiver lesada, o comportamento sexual dos machos no tocante à cópula será prejudicado, ainda que mantenham o interesse em fêmeas.
Certas experiências durante a gravidez também podem influenciar a orientação sexual dos descendentes. Dentre elas, sobretudo o stress parece desempenhar papel importante. Se uma ratazana em gestação for exposta a stress, o cérebro de seus rebentos machos terá em média menos características masculinas.
Além disso, eles apresentarão com frequência orientação homossexual e exibirão comportamento mais maternal. O motivo é que, por causa do stress, a testosterona se apresentou cedo demais no cérebro. Os descendentes “feminilizados” nem sempre são homossexuais: se criados com fêmeas sexualmente ativas, em geral desenvolvem orientação heterossexual. Isso mostra de forma clara que o comportamento sexual não pode ser explicado apenas pelos hormônios. Ao contrário: fatores hereditários, influências hormonais e experiências individuais e a interação com os outros membros do grupo atuam aí em estreita vinculação.
Como pode, porém, o stress atuar sobre cérebros masculinos, preferência sexual e conservação da espécie? Para a sociobiologia, sob condições de vida difíceis, a feminilização dos cérebros reduziria a taxa de natalidade em uma comunidade, o que possibilitaria oferecer cuidado maior aos raros descendentes.
Essa explicação bem poderia se aplicar aos seres humanos, que têm comportamento sexual em parte desvinculado da meta da reprodução e voltado à obtenção do prazer. Pesquisas realizadas até agora com humanos confirmam as descobertas oriundas dos modelos animais. Também no nosso caso o hipotálamo anterior desempenha papel decisivo no tocante à preferência sexual. Os homossexuais do sexo masculino possuem menos neurônios nessa região do cérebro que os heterossexuais, exibindo, sob esse aspecto, uma estrutura cerebral mais aparentada à feminina. Além disso, também nos seres humanos o stress pré-natal parece conduzir com mais frequência descendentes do sexo masculino à orientação homossexual. Até o momento, no entanto, os conhecimentos adquiridos em relação ao ser humano são escassos e, em boa parte, indiretos. Não admira que suscitem controvérsia – ou mesmo completa rejeição, baseada no argumento de que, nesse âmbito, os resultados de experiências com animais não seriam transferíveis à esfera humana.
Entre tanto, admite-se cada vez mais que existem bases biológicas na preferência por um parceiro de mesmo sexo ou do sexo oposto. Está claro que a formação individual do cérebro desempenha papel tão importante quanto a educação ou a sociedade, e a definição do caminho a trilhar parece ocorrer nos primeiros estágios do desenvolvimento.
DO FLERTE À CÓPULA
Sexo e desejo decerto não são tudo na vida. Para a maioria dos seres humanos, a qualidade do relacionamento com o parceiro possui, no mínimo, importância equivalente. De resto, a atração sexual e o vínculo com o parceiro atendem ao mesmo propósito biológico: assegurar a reprodução da espécie. Um rápido exame de nossos parentes mais próximos nos mostra a multiplicidade de relacionamentos possíveis. Os orangotangos, por exemplo, só se unem para a fecundação e vivem o resto do tempo como eremitas, os gibões são monogâmicos, os gorilas formam haréns e os chimpanzés vivem trocando de parceiro. Entre humanos, encontramos todas essas variações, embora a tendência à monogamia seja predominante. A variedade de tipos de relacionamento aponta para o fato de que o vínculo com o parceiro está sujeito a fortes influências culturais e sociais.
Bases biológicas da monogamia foram encontradas em pequenos roedores que vivem nas pradarias dos Estados Unidos. Estritamente monogâmicos, esses animais preocupam-se bastante com seus descendentes. Mas seus vizinhos que habitam as Montanhas Rochosas, ao contrário, trocam de parceiro com frequência e logo abandonam a prole à própria sorte. A semelhança física e genética entre essas duas espécies é muito grande. Mas dois hormônios presentes no hipotálamo, a vasopressina e a oxitocina, revelam diferenças notáveis entre elas. O roedor monogâmico tem no cérebro um número bem maior de receptores para aqueles hormônios que seu parente promíscuo.
Em geral, a concentração sanguínea desses hormônios aumenta claramente durante a cópula, de acordo com o sexo do animal: nos machos, sobe o nível de vasopressina; nas fêmeas, o de oxitocina. Também nos humanos esses dois hormônios parecem importantes na estimulação sexual, na ereção e na capacidade de orgasmo. Nos homens, o nível de vasopressina no sangue aumenta durante a expectativa sexual, e o de oxitocina, durante o orgasmo. Na mulher, acreditam alguns pesquisadores, a vasopressina reduziria o desejo sexual, e a oxitocina desempenharia seu papel tanto durante a fase do flerte quanto da cópula. Contudo, essas são apenas transposições de resultados experimentais obtidos com animais. As normas sociais, a educação, as expectativas podem prevalecer sobre a influência exercida por um hormônio específico.
Mas e quanto ao vínculo entre os parceiros? De fato, no caso dos roedores, os dois hormônios desempenham papéis importantes também nesse âmbito. O macho das pradarias, de cérebro rico em vasopressina, apresenta vínculo mais forte com sua parceira e se preocupa mais com a prole, ao passo que, nas fêmeas, é antes a oxitocina que estimula o cuidado com a cria. É de supor que o nível hormonal elevado durante o acasalamento ajude a fortalecer o vínculo entre parceiros. Também entre humanos a vasopressina e a oxitocina parecem ter, ao menos em parte, as mesmas funções. Considerando-se o amor como vínculo entre parceiros, teríamos dado aí um primeiro passo para a compreensão biológica desse fenômeno.
Como se articulam, então, o amor e as funções cerebrais? Existem centros de prazer ou neurotransmissores da felicidade? Nesse contexto, o ano de 1954 representa um marco para a pesquisa. Nesse ano, os neurocientistas americanos James Olds e Peter Milner implantaram no cérebro de ratos pequenos eletrodos que transmitiam estímulos elétricos. Os animais gostaram tanto que se detinham constantemente nos lugares em que os cientistas realizavam a estimulação.
Além disso, aprenderam por conta própria a pressionar uma alavanca que lhes proporcionava tais estímulos. O resultado foi que passaram a se estimular milhares de vezes por hora, negligenciando até mesmo suas necessidades naturais – um comportamento que lembra a forte dependência de drogas ou, em certo sentido, o de um ser humano muito apaixonado. A suposição óbvia a que isso conduziu foi que o estímulo elétrico ativava no cérebro um centro de recompensa ou mesmo de prazer.
Muitas regiões do cérebro são sensíveis à estimulação elétrica, mas apenas em poucas áreas o estímulo conduziu os animais ao excesso, o que se verificou sobretudo na lateral do hipotálamo. Não se encontrou aí o suposto centro do prazer: na verdade, a estimulação instigava também feixes de nervos que percorriam toda a região estimulada. Logo um sistema de células nervosas ocupou o centro das atenções – um sistema que se origina no mesencéfalo, percorre a lateral do hipotálamo e abastece com o neurotransmissor dopamina grande parte do prosencéfalo.
Com isso, aumentou o interesse dos cientistas nas funções desempenhadas pela dopamina, que os pesquisadores viam, em parte, como uma espécie de sinal de prazer. Basearam essa conclusão na observação de que sua atividade aumenta quando da prática de todo tipo de ação vinculada a sensações agradáveis-seja quando os animais se autoestimulam com a eletricidade, quando ingerem comida saborosa, quando da copulação ou estão sob a influência de drogas, corno a cocaína, a anfetamina, a heroína ou a nicotina.
Assim como aprendem a se autoestimular, os animais descobrem corno administrar por conta própria essas substâncias, sobretudo quando são injetadas diretamente no sistema de células dopaminérgicas do cérebro. Se esse sistema é experimentalmente desativado, recompensas elétricas, químicas ou naturais deixam de surtir efeito – corno se não existissem sensações de prazer pelas quais os animais seguem repetindo determinada tarefa. Não está claro, porém, se os ratos são de fato capazes de experimentar o prazer na forma como nós o concebemos. Ainda que sejam, isso significaria dizer que os pesquisadores encontraram um centro do prazer, bem como neurotransmissores do prazer? Não é bem assim. Na verdade, a estimulação elétrica do hipotálamo lateral conduz a uma continuada atividade das vias nervosas e simula, assim, antes o prazer – apetitivo – por alguma coisa do que o prazer – consumado – na obtenção do que se queria. Além disso, a dopamina faz com que, já durante as fases de expectativa e de preparação, o organismo oriente seu comportamento para as metas almejadas, aprendendo a utilizar novas informações que prenunciam a viabilidade de alcançá-las.
ORGASMO POR ELETRODOS?
A implantação de eletrodos no cérebro de humanos só é admitida quando da necessidade de intervenção médica, razão pela qual são poucas as pesquisas existentes nessa área. Pacientes que sofreram estimulação elétrica do hipotálamo lateral relatam “sensações difíceis de descrever, como se algo de interessante e excitante fosse acontecer”. Sensações agradáveis verificaram-se também na estimulação de outras regiões do cérebro, como, por exemplo, do septo lateral. As experiências vividas nesses casos foram descritas como um prazer semelhante ao orgasmo. Se um paciente podia se autoestimular nessa região, ele o fazia em grande medida, sem, contudo, atingir o orgasmo de fato.
ATÉ A LOUCURA
Nos últimos anos, com o auxílio dos métodos de diagnóstico por imagem, como a tomografia nuclear ou por emissão de pósitrons, cientistas puderam verificar reações em seres humanos e expandir muitos dos conhecimentos adquiridos em experiências com animais. O estudo dessas imagens identificou uma série de regiões cerebrais que, diante de emoções diversas, revelam intensa atividade. Uma mesma estrutura cerebral pode, no entanto, ser estimulada tanto por sensações agradáveis como por sentimentos indesejados, como o medo. A existência de centros específicos de prazer não pôde até o momento ser comprovada de modo inequívoco.
Experiências com pessoas sexualmente excitadas mediante a contemplação de imagens ou cenas eróticas ou pornográficas revelam fortes mudanças de atividade em diversos pontos do cérebro, especialmente em sua extremidade anterior. O padrão dessas mudanças de atividade é bastante semelhante em mulheres e homens. É de supor que os cérebros masculino e feminino processem sensações de prazer de forma parecida.
Os estímulos e situ ações capazes de provocar em nós sensações de prazer são bastante diversos e variados: um pôr-do-sol, a presença da pessoa amada, o prêmio da loteria, uma boa refeição, sexo ou drogas. Isso propõe tarefas difíceis a nosso cérebro: devemos reconhecer e avaliar as diversas situações, talvez associá-las a alguma lembrança e, então, reagir – com ações, por exemplo. As demandas ao cérebro podem ser, portanto, bastante diferenciadas. Seria de esperar, pois, que também as mudanças de atividade nas diversas áreas do cérebro apresentassem forte diferenciação de um caso a outro. Mas certas regiões cerebrais permanecem ativas durante as situações emocionais mais variadas, o que significa que respondem pelo processamento de sensações de todo tipo.
Aos olhos dos psiquiatras, os tormentos mentais experimentados pelos amantes se aproximam do transtorno obsessivo. Os pensamentos dos apaixonados costumam ser incessantemente dirigidos para o mesmo objeto, uma única preocupação – os amantes não sossegam enquanto o desejo não é saciado.
Interpretaremos aqui essa obsessão usando uma nova perspectiva, propiciada por estudos recentes: biólogos mediram a concentração de substâncias que refletem o funcionamento cerebral e concluíram que elas são alteradas da mesma forma nos amantes e nas pessoas que sofrem de transtornos obsessivos. Amar como um louco, portanto, não seria uma mera figura de linguagem.
A pesquisadora Donatella Marazziti e seus colegas da Universidade de Pisa, Itália, testaram a hipótese de que do amor à obsessão e ao delírio haveria apenas um passo medindo a concentração do chamado transportador de serotonina. Essa proteína está presente no sangue e também no cérebro, onde regula a concentração de serotonina, neurotransmissor que influi no humor e no comportamento. Três grupos de voluntários foram examinados: “normais”, apaixonados há pouco tempo e pessoas com transtornos compulsivos. A constatação: o transportador de serotonina variou de forma análoga nos apaixonados e nos pacientes obsessivo-compulsivos. Como interpretar essa constatação? A serotonina participa da regulação de funções instintivas, como apetite, sono, dor, temperatura corporal e sexualidade. A substância está ligada a transtornos, como dependência, impulsividade e ansiedade, e modula a atividade de conjuntos de neurônios no cérebro, agindo sobre o comportamento do indivíduo. Mediante uma modificação do sistema serotoninérgico a imagem do ser amado transforma-se em obsessão.
No transtorno obsessivo-compulsivo, há preocupação constante. Acreditando, por exemplo, que a porta está mal fechada, a pessoa verifica-a incessantemente. Em neurobiologia, a “crença na porta mal fechada” baseia-se na atividade de grupos de neurônios que são ativados de forma repetida e descontrolada. Suspeita-se que uma cadeia de retroação passando pelo córtex e tálamo reative permanentemente a atividade nervosa do mesmo grupo de neurônios. O papel da serotonina nessa atividade ainda não foi demonstrado, mas, se de fato existir, o caráter obsessivo da paixão seguiria a lógica do eterno retorno das imagens obsessivas.
Entretanto, os pensamentos lancinantes do apaixonado e os transtornos obsessivos se distinguem pelo “grau de certeza” experimentado e pela capa cidade da pessoa de aceder a seus próprios estados psíquicos. No transtorno obsessivo predominam a dúvida (o paciente não se convence de que a porta está fechada) e a introspecção (tem consciência do absurdo de suas ideias obsessivas e sabe que emanam de sua mente). Em certas formas de delírio prevalecem, ao contrário, a certeza (a pessoa está convencida de que alguém a quer mal) e a perturbação das capacidades de introspecção (prevalece a convicção de que tem razão e de que os outros estão errados).
A paixão evoluiria assim entre a obsessão e o delírio: o apaixonado está convencido do valor do ser amado e de seu sentimento, mas sabe que essa ideia é um produto de seu psiquismo. As ideias delirantes se distinguiriam das dos apaixonados pelo fato de que o amante tem consciência de seu tormento: escravo de seu desejo, está consciente disso. A biologia endossa a concepção de que o sentimento amoroso situa-se entre a obsessão livremente consentida e o delírio.
A associação entre obsessão e paixão é confirmada por uma observação fisiológica: a atividade cerebral das pessoas que sofrem de transtornos obsessivo-compulsivos caracteriza-se pela hiperatividade de uma região chamada núcleo caudal, a mesma que é ativada quando os apaixonados pensam no ser amado. Trata-se, portanto, de um novo índice fornecido pelo imageamento cerebral em favor da semelhança entre os dois estados.
Sabemos que o amor também proporciona felicidade e intensa satisfação, ao passo que o transtorno obsessivo é um sofrimento. Onde situar a fronteira? Marazziti e seus colegas estudaram a fase precoce do amor, definida por Stendhal como uma paixão não consumada, restringindo a pesquisa a pessoas perdidamente apaixonadas, mas que ainda não tiveram relações sexuais com o ser amado.
ANTES DO SEXO
Nessa fase de expectativa, a concentração no transportador de serotonina sofre as modificações características dos pacientes obsessivos. Um ano depois (prazo considerado suficiente para a consumação do caso), a medição mostrou que as taxas de transportador de serotonina voltavam a seu nível inicial e a obsessão desaparecia. O amor insano seria uma “patologia” que curamos ao saciá-lo. O paciente obsessivo, ao contrário, jamais se tranquiliza quando a porta é fechada.
Do ponto de vista hormonal, na primeira fase do amor, a obsessiva, são acionados circuitos de neurônios que utilizam a serotonina. Estudos genéticos sugerem que estas redes têm papel inibidor do comportamento, suscitando nos apaixonados formas de amor duráveis e românticas, marcadas pela timidez e caracterizadas por preocupações quase obsessivas em relação ao parceiro, com um envolvimento e uma fidelidade mais acentuadas.
Quando o amado é conquistado, porém, a serotonina cede lugar à dopamina, o “hormônio do prazer”. Os grupos de neurônios que utilizam a dopamina intervêm nos componentes ligados ao prazer e até mesmo naqueles ligados à dependência. Pesquisas evidenciaram um sistema dopaminérgico particular em pessoas que buscam permanentemente aventuras sexuais. Elas têm frequentes variações cíclicas do humor, o que as torna versáteis. Assim um funcionamento que oscila entre esses dois sistemas cerebrais, o da serotonina e o da dopamina, teria o dom de tornar a pessoa intensamente apaixonada e, depois, calmamente satisfeita.
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