EPILEPSIA – UM PROBLEMA BIOLÓGICO
A escola, responsável pela formação do cidadão, precisa fazer parte das intervenções, quer no aspecto pedagógico ou no socioemocional das crianças que têm a doença
De origem grega, a palavra epilambanei (“surpresa”) é uma condição biológica, que revela um desequilíbrio neurológico manifestado frequentemente na forma de crises convulsivas inesperadas e recorrentes, com grau variável de intensidade e duração.
A convulsão é apenas um dos sintomas da doença, a qual traduz a existência ocasional de uma descarga excessiva e desordenada do tecido nervoso sobre os músculos do organismo. Não é contagiosa e pode surgir em qualquer idade. Ainda que a confirmação desse diagnóstico seja da área médica, através de exames específicos, e que a intervenção, medicamentosa ou cirúrgica, ofereça à grande maioria dos epilépticos uma condição de vida normal, alguns fatores decorrentes podem trazer prejuízos a sua vida escolar, mesmo se sabendo que não há comprometimento cognitivo associado ao quadro, até pelo contrário: a maioria dos epilépticos tem funcionamento normal e acima da média.
A epilepsia é comum a cerca de 2% de nossa população, especialmente na infância, já que nos primeiros anos de vida há mais vulnerabilidade para infecções do sistema nervoso central, e acidentes ocorrem com certa frequência. As crises epilépticas podem ser de diversos tipos, conforme as áreas do cérebro afetadas. Há crises parciais, outras generalizadas, assim como há as chamadas crises de ausência, em que não há uma evidência motora. Os sintomas da epilepsia variam de acordo com os neurônios que estão em estado de hiperexcitação, e em decorrência podem surgir confusão temporária, ausência, movimentos musculares descoordenados e completa perda da consciência. Quando as crises ocorrem apenas em parte do cérebro, elas são chamadas de crises convulsivas parciais, mas quando a hiperexcitação neuronal não se atém apenas a uma determinada região cerebral, ocorrem crises convulsivas generalizadas.
Relatos e registros têm mostrado que nem todo professor está aparelhado para agir no caso de um aluno ter uma crise convulsiva e, decorrente a esse fato, as crianças, os colegas de classe também não têm esse conhecimento e se assustam, pois não fazem ideia do que ocorre com o amigo em crise.
Por isso, o impacto geral é na maioria das vezes marcante para quem assiste a uma convulsão, já que a ideia de morte, aliada aos mitos que envolvem a epilepsia, ainda é grande na atualidade. Pode ser mesmo uma cena impactante se a crise for intensa e a pessoa se machucar na queda. Embora quem tem o ataque epiléptico não padeça de dor física, pode se machucar ao se debater contra uma superfície rígida, pontiaguda.
Mas pior é o mal-estar do ponto de vista pessoal e social: epilépticos em geral relatam vergonha dos colegas, sentem-se vulneráveis a ter outras crises e serem objeto de pena e discriminação. Tornam-se crianças e jovens menos sociáveis, pois a sua condição repercute no aspecto psicossocial, de relacionamento com meio ambiente, tanto na família como na escola e, mais tarde, na vida profissional.
A família toda precisa de orientação e frequentemente essa advém da escola: muitos pais tornam-se superprotetores, ansiosos, permissivos e há um importante estresse familiar permeando, o que aumenta o sentimento de inadequação, dependência, imaturidade do epiléptico. Além disso, nesse contato do professor com a família, informações sobre diagnóstico, medicação e características especiais desse aluno trarão maiores recursos aos profissionais, criando ainda condições de esclarecimento de base científica sobre o que é uma convulsão, o que é a epilepsia e afastar tabus que rondam a doença. Por essa razão, é de extrema importância que os professores saibam o que fazer antes, durante e após a crise.
Conhecimentos científicos específicos sobre o assunto estão em bons sites na internet, em boas revistas e em livros de autores experientes, além de cursos de primeiros socorros que são indispensáveis para quem tem sob sua responsabilidade muitas crianças e adolescentes diariamente.
Sabe-se que mesmo entre os alunos medicados e que não apresentam crises convulsivas típicas na escola, devido ao efeito de algumas dessas medicações e a algumas interrupções na frequência às aulas, podem aparecer prejuízos no processo de aprendizagem devido a uma relativa baixa atentiva, e de memória, um rebaixamento na velocidade de processamento, no desenvolvimento das funções da linguagem, no perceptivo motor e no aprendizado do cálculo.
Se houver surgimento de uma eventual dificuldade de aprendizado ligada à epilepsia, certamente será complicada por fatores de ordem socioemocionais e de ensino-aprendizagem, referente à maneira como a escola desenvolve a inclusão da criança no grupo.
É importante não apenas lembrar que incentivar a criança a elaborar estratégias de aprendizagem adequadas ao seu perfil de aprendiz lhe oferece oportunidade de desenvolver suas habilidades cognitivas e ter sucesso na escola, autoconfiança e motivação. Mas também é preciso estar atento ao fato de que alunos com dificuldades escolares de toda ordem precisam de retorno e reforço mais constante, para que modifiquem sua conduta no sentido da superação.
MARIA IRENE MALUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br
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