EU ACHO …

UM GUIA CONTRA CONSPIRAÇÕES

Como castelos de cartas, elas caem se houver permanente vigília

WASHINGTON, DC – JUNE 24: Microsoft principle founder Bill Gates participates in a discussion during a luncheon of the Economic Club of Washington June 24, 2019 in Washington, DC. Gates discussed various topics including climate change. (Photo by Alex Wong/Getty Images)

O tempo de hoje é esplêndido para inventar conspirações. Mas não é difícil pô-las a descoberto. Para ilustrar, tomemos o exemplo do suposto complô para desacreditar a cloroquina, por ser muito barata. Isso abriria o mercado para novas drogas, bem mais caras. No entanto, perguntemos:

1.A biografia dos supostos conspiradores é congruente com as maquinações sinistras a eles imputadas? Bill Gates, por bons anos, é um dos homens mais ricos do mundo. Mas cansou-se de ganhar. Agora só pensa em gastar. Bandeou-se para a filantropia, enterrando fortunas em programas de saúde pública. Que motivação real teria para enredar-se em uma trama com farmacêuticas, militando contra o seu sonho de salvar vidas? O epidemiologista americano Anthony Fauci exibe uma belíssima e longa carreira de pesquisador. É o 12º cientista americano mais citado em estudos. Tem trinta doutorados honoris causa. Pesquisar é sua paixão, está no sangue. Se dinheiro fosse sua prioridade, estaria clinicando, regiamente pago. É inverossímil que se mova por dinheiro.

2. Como os enganadores agiriam para pôr em prática as suas velhacarias? Supostamente, estariam corrompendo governos. E, também, promovendo pesquisas voltadas para desacreditar a cloroquina. Das centenas de periódicos respeitados na área, cada um convoca dúzias de pesquisadores consagrados para recomendar ou não cada publicação. Então, Gates ou Fauci estão indo atrás de contraventores nesse exército de cientistas, para referendar estudos duvidosos, a troco de subornos? Ou para encomendar trapaças científicas?

3. Como manter secreta a conspiração? Trata-se de uma operação com muitos parceiros e que exige amplos fundos para distribuir. Como superar as desconfianças entre as próprias farmacêuticas, comprometendo-se todas elas a acordos sinistros e a irrigar múltiplos bolsos? E isso tudo em uma velocidade estonteante, pois já saíram mais de 7.000 pesquisas sobre o novo coronavírus desde janeiro. Arruína todo o esforço um candidato a suborno que ponha a boca no mundo. Aliás, o próprio Trump adoraria ficar sabendo dessas maquinações, para desvencilhar-se de Fauci. Na prática, com tantos conspiradores, como manter segredos?

No meio das confusões e perplexidades, as pesquisas borbulham, deveras desencontradas. Como domar essa cacofonia em benefício próprio? Duas cabeças brilhantes embarcariam nesse castelo de cartas? Se endossarem tolices científicas, correm sério risco de arranhar a reputação. De fato, inexoravelmente, a ciência vai se desvencilhando dos ruídos e falsos caminhos.

No fundo, a receita para desmascarar uma conspiração é simples. Basta colocar-se no papel de conspirador e planejar o passo a passo requerido da trama. Aplicando as três perguntas que abrem este texto, é possível encontrar caminhos plausíveis para vencer cada etapa? Nessa teoria conspiratória em torno da cloroquina e em muitas outras, não há como soletrar um plano viável. Mas, acima de tudo, cumpre exercitar permanente vigília antes de circular como correta a mensagem recebida. A conspiração só vive enquanto há patetas contaminando uns aos outros.

** CLAUDIO DE MOURA CASTRO

OUTROS OLHARES

O ESPAÇO DAS MULHERES

A histórica missão que juntou a Nasa e a iniciativa privada ilumina uma excelente novidade: a crescente participação feminina em viagens ao cosmo

Não houve, naturalmente, a comoção da pomposa e ensaiada frase de Neil Armstrong, ao anunciar que dera “um pequeno passo para um homem, mas um grande passo para a humanidade”, ao pisar em solo lunar naquele eterno 20 de julho de 1969. Mas no domingo 31 de maio de 2020, às 11h16, horário de Brasília, quando os astronautas americanos Douglas Hurley e Robert Behnken deixaram a cápsula Crew Dragon e entraram na Estação Espacial Internacional (ISS, na sigla em inglês), a 400 quilômetros da Terra, houve ondas de entusiasmo. Foi a primeira e histórica parceria entre a Nasa e a iniciativa privada, por meio da SpaceX, do biIionário sul-africano Elon Musk, atalho para a inauguração de uma nova era de expioração espacial. Nas redes sociais brotaram brincadeiras em torno do sorriso dos dois cosmonautas, que estariam dando adeus à pandemia de Covid-19, ao surto de racismo e de protestos nos Estados Unidos, adeus a tanta coisa de ruim que anda acontecendo aqui embaixo. “O acoplamento está completo”, o aviso de Hurley, transmitido pela internet, soou como senha de alivio.

Sim, as coisas não andam nada bem no planeta (redondo, sim!) que se vê das escotilhas da ISS, mas há extraordinárias mudanças que precisam ser celebradas – e, sobretudo uma revolução dentro da própria Nasa, afeita a mostrar como o mundo mudou, para melhor, desde que Armstrong caminhou em câmera lenta. A novidade: o programa espacial, que sempre foi maciçamente masculino, agora também é das mulheres.

Douglas e Robert, os dois tripulantes da Crew Dragon, entraram em órbita porque estavam na fila, era a vez deles. Mas a missão poderia ter sido realizada pela engenheira mecânica Karen Nyberge pela oceanógrafa Megan McArthur, ambas astronautas da Nasa – embora Karen tenha se aposentado neste ano. Karen é casada com Douglas e Megan, com Robert. O quarteto se conheceu nos corredores da agência americana, terreno cada vez mais igualitário, menos machista. A estatística ajuda a entender a virada: de 1959 a 1969, 100% das pessoas formadas pelo curso para astronautas da Nasa eram homens. Em 2017, o índice caiu para 55%. Vai longe, portanto, o tempo em que uma personagem popular como Jeannie, do seriado Jeannie É um Gênio, de 1965, se insinuava para o patrão astronauta, o major Nelson, chamando-o insistentemente de “meu amo”. Ficou para trás a figura clássica, hoje deslocada, da mulher de astronauta, a quem bastava estar ao lado do marido em eventos sociais, em paradas militares, em visita à Casa Branca. Não teria espaço o comentário de Buzz Aldrin, um dos três heróis da Apolo 11, a respeito de sua companheira, Joan, morta em 2015: “O futuro lembrará de Joan Archer Aldrin como uma mãe e mulher de fala mansa, que criou três filhos bem-comportados”.

São mães, têm filhos – mas fala mansa, não. No ano passado, a americana Christina Koch bateu o recorde feminino de permanência na ISS, e só retornou depois de 328 dias (a título de comparação, a turma de Musk deve ficar no máximo 120 dias em órbita). O governo americano aposta parte de suas fichas no programa Artemis, que promete pôr a primeira mulher na Lua até 2024. Do ponto de vista da igualdade de gêneros não é, ressalve-se, a vitória final e definitiva, longe disso. Somados todos os cosmonautas que foram ao espaço, apenas 11,5% são mulheres. Na Nasa, somente um terço dos funcionários é do sexo feminino. Há, portanto, uma estrada a percorrer – e são muitas as pedras no meio do caminho, algumas insólitas, quase inacreditáveis.

Os engenheiros da Nasa descobriram, apenas muito recentemente, que todos os estudos de uniformes espaciais tinham sido feitos com base em altura, musculatura e metabolismo de homens, em mais de setenta anos de pesquisas. As mulheres nunca foram incluídas, e corre-se, agora, atrás do tempo perdido. Dentro dos trajes espaciais, os astronautas usam roupa de refrigeração e ventilação líquida. São metros e mais metros de tubos que bombeiam água, de modo a resfriar o organismo. Problema: homens suam mais do que as mulheres e em partes diferentes do corpo. E a Nasa descobriu, talvez tardiamente, mas sempre em tempo, que seria preciso inaugurar uma nova linha de investigação que contemplasse, além da preparação em terra, os efeitos da falta de gravidade na dinâmica feminina – a régua foi sempre masculina. Convém, portanto, prestar atenção em Karen e Megan, e não apenas em Douglas e Robert, os terráqueos que se afastaram um tempinho da pandemia.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 30 DE JUNHO

O ABRIGO DA CASA DE DEUS

Uma coisa peço ao SENHOR e a buscarei: que eu possa morar na Casa do SENHOR todos os dias da minha vida, para contemplar a beleza do SENHOR e meditar no seu templo (Salmos 27.4).

O rei Davi viveu dias de grande aperto. Seus inimigos não lhe deram descanso. As circunstâncias eram medonhas. O medo tentou assentar-se no trono de seu coração. Nessas horas, Davi reafirmava a confiança em Deus como sua fortaleza. Não temia os malfeitores que se levantavam contra ele, nem mesmo os exércitos que declaravam guerra contra seu povo. Nessa turbulência externa, Davi orava a Deus e pedia e buscava uma única coisa: o privilégio de morar na casa de Deus para meditar e contemplar a beleza do Altíssimo. Ele sabia que, no dia da adversidade, Deus era poderoso para ocultá-lo em seu pavilhão. Sabia que Deus é quem o exaltava sobre seus inimigos. Sabia que Deus ouvia seu clamor e respondia às suas orações nas horas mais escuras de provação. Sabia que, mesmo que seu pai e sua mãe viessem a desampará-lo, Deus o acolheria. Sabia que Deus não o entregaria nas mãos de seus inimigos, que astuciosamente levantavam contra ele falsas testemunhas e cruelmente o atacavam. Davi termina o Salmo 27 fazendo uma confissão pessoal: Eu creio que verei a bondade do SENHOR na terra dos viventes (v. 13) e também uma exortação pública: Espera pelo SENHOR, tem bom ânimo, e fortifique-se o teu coração; espera, pois, pelo SENHOR (v. 14).

GESTÃO E CARREIRA

A NOVA CORRIDA DO OURO

A crise econômica gerada pela pandemia fez com que o metal atingisse valor recorde. O efeito colateral é sentido na Amazônia

Com a crise econômica mundial deflagrada pelo coronavírus, mais do que nunca os investidores olham para o ouro como um ativo seguro e estável. Em abril, a cotação da onça troy, medida utilizada na negociação da commodity, equivalente a 31 gramas, atingiu mais de 1.750 dólares. E o maior valor desde o final de 2012. A tendência é que o ouro continue valorizado, em razão dos distúrbios financeiros causados pela pandemia. O Brasil já vem sentindo os efeitos da disparada do preço do ouro – para o bem e para o mal.

Entre janeiro e abril deste ano, as exportações da commodity somaram 597 milhões de reais, 80% do total obtido em 2019. Só em abril as empresas do setor pagaram 353 milhões de reais em impostos ao governo, 66% mais do que no mesmo mês do ano passado. Até agora, o Pará, rico em ouro e outros minérios, é o líder absoluto na corrida pelo metal no país, agravando velhos problemas. ”Muitos garimpeiros atuam de forma ilegal na região, desmatando a floresta e poluindo os rios”, diz Sérgio Leitão, diretor do Instituto Escolhas, que desenvolve estudos econômicos sobre questões ligadas ao meio ambiente.

Mais de 30 milhões de toneladas de ouro por ano são comercializadas ilegalmente apenas na região do Rio Tapajós, em Mato Grosso e no Pará, de acordo com o Ministério Público Federal (MPF). São mais de 4,5 bilhões de reais em recursos não declarados. Neste ano, com a valorização do ouro, o garimpo desordenado está aumentando na Amazônia, assim como a sonegação fiscal. ”Milhares de garimpeiros chegaram recentemente a áreas de mata densa”, afirma Leitão.

A exploração do ouro geralmente é feita na beira dos rios, onde há mais depósito do metal. Não escapam nem áreas protegidas, como unidades de conservação natural e terras indígenas. Em algumas delas, como a reserva indígena Kayapó, no Pará, já foi observado um aumento de mais de 10% na área de garimpo em março deste ano, em comparação a fevereiro, de acordo com o MPF e a Polícia Federal, que tem feito operações na região. ”A preocupação é que haja um desmatamento ainda maior na Amazônia, não só no Brasil, mas também em outros países da região”, diz o peruano Pedro Tipula, coordenador do Instituto do Bem Comum, organização voltada para a conservação do meio ambiente. ”Precisamos melhorar a fiscalização da atividade mineradora para que isso não aconteça.” É mais um efeito inesperado da pandemia.

VIL METAL

As seis regiões onde houve mais aumento do garimpo ilegal na Amazônia. O tamanho da bola vermelha equivale ao tamanho de cada área destacada, em km2

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

DE BEM COM O LUTO

Bloqueios psíquicos e depressões explicam-se muitas vezes, pelas perdas não vivenciadas. Deixar fluir a tristeza é permitir-se um processo saudável de elaboração dos fatos

A vida é uma sucessão de batalhas. Em algumas obtemos sucesso. Já em outras ocasiões, a perda é inevitável. Perder faz parte da nossa rotina. O problema é lidar com isso. Como aceitar a falta de um ente querido, de uma condição financeira anterior ou da cidade na qual crescemos? Infelizmente, não foi descoberta uma fórmula mágica para a felicidade eterna. Não há truques ou ensinamentos capazes de nos prevenir contra o sofrimento. A única opção válida e eficiente é superar a dor, aceitar perder e seguir em frente. É um processo longo e pungente… inevitável. Viver, dar-se conta do que se perdeu e, apesar de tudo, sobreviver.

Por mais difícil que aparente ser, esse processo é de extrema importância à continuidade da vida. Bloquear a dor, “esconder o problema embaixo do tapete” ou camuflar esses sentimentos pode parecer válido enquanto sofremos. Mas o perigo está justamente aí. Ao não elaborar a perda no momento em que ela acontece, estamos apenas adiando a dor. Ao fingir que não existe o problema, nos prendemos à falta, e ficamos com o sofrimento para sempre.

Em meio a tantas perdas diárias, as pessoas tendem a entrar em processo de luto. “No senso comum, utilizamos a expressão em relação à perda de um ente querido. No entanto, em termos psicológicos, o luto vai muito além da morte física, embora, evidentemente, também a inclua” esclarece a psicóloga e Doutora em Psicologia pela Universidade de São Paulo (USP), Lilian Graziano.

Professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, Lilian explica que o luto é um processo de tristeza que ocorre em resposta a uma perda significativa, seja ela no âmbito emocional, financeiro ou físico. Considerando que as perdas são rotineiras em nossas vidas, o processo de luto é intrínseco ao desenvolvimento psíquico saudável, pois com ele enfrentamos a perda e, consequentemente, evoluímos emocionalmente.

Mas nem todos conseguem enxergar a perda com olhos positivos. Há aqueles que não se permitem sofrer, “o que invariavelmente acaba lhes gerando problemas emocionais, dentre os quais a depressão” completa a psicóloga ressaltando que o erro está em acreditar que ao evitar a dor tudo será mais fácil. “Ao fugir do sofrimento gerado pela perda, a pessoa acaba sofrendo muito mais e, o pior, por muito mais tempo”.

Mas como realmente enxergar a importância da elaboração do luto? Um exemplo podeajudar. Lílian conta que teve um paciente que aos nove anos perdeu seu pai, vítima de uma doença grave que praticamente mutilou seu corpo, uma vez, que gradativamente vários de seus membros foram amputados. Um dia após o falecimento do pai, sua mãe, com a intenção de poupar o sofrimento do filho, perguntou se o garoto preferia ter o pai vivo, mas sofrendo em um leito de hospital, ou longe, porém descansando.

Sem muito entender o porquê da pergunta, o garoto optou pela segunda opção, pois não queria o sofrimento do pai. A mãe então disse que ele não deveria chorar, pois seu pai estava “descansando”. E a criança ouviu a mãe e não chorou a morte do pai. Os anos passaram, o menino cresceu, se casou e formou sua própria família. Um dia sua esposa quis saber o motivo da morte do sogro. Sem obter resposta do marido, foi verificar com a sogra.

Por intermédio da esposa, o garoto, agora já um homem, ficou sabendo a real história sobre a morte do seu pai. Todos os sentimentos de perda e culpa vieram à tona. “Esse paciente foi elaborar o luto da perda do pai na terapia, já com quarenta anos de idade” comenta a psicóloga. Passaram décadas até ele conseguir viver a perda do pai, chorar a morte. “Uma curiosidade é que o paciente foi procurar auxílio com a mesma idade que o pai veio a falecer”. Guardar este luto atrapalhou o serviço de paternidade do paciente, que devido ao conteúdo emocional mal elaborado, não conseguia ter um relacionamento mais íntimo com seu próprio filho.

SAÍDA PARA A DOR

Uma alternativa para elaborar o luto é vivenciar não apenas a tristeza, mas também demais sentimentos que possam estar presentes na perda, entre eles a culpa, o arrependimento, a saudade, o remorso etc. “Costumo dizer a meus pacientes que em certos momentos da vida precisamos chegar ao fundo do poço, porque é apenas no fundo dele que conseguiremosapoiar as mãos para nos impulsionarmos em direção à saída’ afirma Lilian. A elaboração do luto é mais complexa do que aparenta ser. A fim de explicar este processo o psicólogo Luís Antônio Pereira cita a psiquiatra norte americana Elisabeth Kubler­ Ross, a qual afirma que existem sete estágios de agonia do luto. “O primeiro é o choque da notícia; o segundo é o estágio da negação; o terceiro é a revolta ou raiva pelo que aconteceu; o quarto é o estágio da tristeza ou depressão; o quinto é o estágio dos regateios/barganhas; o sexto é à aceitação e, por último, vem a reorganização/adaptação/esperança” completando que nem rodos os enlutados passam por todos os estágios.

Devido à particularidade de cada ser humano, há diferentes formas de se lidar com a perda. Alguns gostam de falar com amigos sobre o sofrimento, outros procuram consolo em remédios e bebidas, há ainda os que preenchem qualquer espaço de tempo com atividades distintas a fim de não pensar no que perderam, ou substituem o que foi perdido por algo novo.

Em contrapartida, há pessoas que não tem necessidade de falar sobre o ocorrido, mas nem por isso deixam de lidar com os sentimentos, comportamento descrito por Jung como o tipo introvertido. Conforme explica o psicólogo clínico e professor de Psicologia da UniversidadeCatólica de Santos, também Mestre em Educação pela mesma universidade, Luiz Antônio Cancello, este comportamento não é totalmente compreendido nos tempos atuais. “O problema é que essa configuração de personalidade parece não ter lugar na sociedade atual, onde precisamos ser alegres, agressivos e comunicativos”.

Hoje, a sociedade impõe um ritmo brutal de vida. Não se pode parar por um segundo. “Vivemos na era do ‘Prozac’ (antidepressivo). Temos a obrigação de estar sempre felizes”, ironiza Cancello enfatizando que não há tempo para ficar de luto. “Se você ficar dois dias em casa, já aparecem vinte pessoas te ligando querendo te chamar pra sair, pra se distrair”.

APRENDENDO COM A MORTE

Basta estar vivo para morrer. A morte é a única certeza da vida. Viver é, enfim, morrer. Eis algumas das muitas frases prontas que utilizamos para se conformar com a ideia de que, um dia, tudo chegará ao fim. As pessoas não mais serão. “Eu não mais se­ rei este corpo”. Mesmo assim, com toda a certeza de que a morre existe para todos, as pessoas a temem e tentam burlar esta etapa final da evolução humana.

A morte é vista na sociedade contemporânea como a maior perda emocional a ser enfrentada. A vilã, aquela que arranca de nós toda possibilidade de vida. Impulsionadas pelo pavor de chegar ao término de tudo, as pessoas buscam por caminhos rumo à eternidade. Todos querem viver para sempre, ou ao menos, se prender a ideia de que não morrer é algo viável.

O avanço tecnológico que presenciamos confirma a cultura de negação à morte. Até 1950, a média de vida não passava de 50 anos. Hoje em alguns países, principalmente as mulheres, chegam a 80 anos de vida. “Os cientistas negam, mas a ciência no imaginário popular tem nos fornecido uma certa aproximação à ideia de imortalidade”, afirma Cancello. Esta falsa noção de que poderemos viver eternamente dificulta a aceitação da morte e elaboração do luto quando alguém próximo vem a falecer.

“Podemos falar que a morte tem uma vantagem evolutiva para os evolucionistas, que faz parte da existência dentro do existencialismo, e podemos citar a elaboração do luto dentro da Psicanálise. Você pode falar em que linha for. Mas acho que todos vão concordar que o fim faz parte da vida, e que hoje a gente recusa a tristeza”, pontua o psicólogo existencialista.

Também em relação à morte, Lilian Graziano afirma que “embora todos estejamos sujeitosà morte e saibamos disso num nível racional, são muitos os que conduzem suas vidas sem trazer essa verdade para o nível emocional”. Um dos motivos é que a morte é encarada como sinônimo de dor, e sofrer é uma heresia dentro da cultura ocidental, que supervaloriza o prazer a qualquer custo. “A consequência disso é que ‘deixamos esse assunto pra lá’ e vamos ‘tocando nossa vidinha’ da mesma forma medíocre de sempre”, completa.

Ao negar a morte, começamos a agir como se fôssemos eternos, e deixamos de aproveitar chances únicas nos enganando de que, devido à imortalidade, teremos novas oportunidades para alcançar nossas metas. Esquecemos que a vida é única e imprevista, e que cada segundo é de extrema importância para nossa história. Lilian faz um alerta referente à negação da morte. “Preste a atenção na próxima vez que disser: ‘Serei feliz quando ganhar na megasena’, ‘Serei mais dedicado à família quando me aposentar’. Afirmações como estas partem do pressuposto de que o futuro nos pertence. É assim que nossa vida, no presente, se torna medíocre”.

A perda em si é o sofrimento, mas a negação é um complicador e pode aflorar um luto mal elaborado. Perder alguém, seja a razão morte, separação conjugal ou qualquer outro motivo, é um acontecimento triste, mas dependendo do relacionamento entre os envolvidos, esse processo pode vir a ser tranquilo ou não. Ao perder um parente que se tem certeza de que o relacionamento foi bom, a pessoa que sofre a perda naturalmente entristece, mas acaba aceitando o fato e passando por cima do luto.

Por outro lado, quando a convivência com o outro não é harmônica, quando uma das partes acredita que poderia ter feito muito além do que fez, a aceitação da perda é conturbada, pois envolve o sentimento de culpa por não ter aproveitado tanto quanto poderia ao lado daquele alguém. “A pessoa cria um diálogo interior interminável e, em certos casos, procura por apoio psicológico na tentativa de calar este diálogo” esclarece Cancello. “Nessa situação, talvez valesse mesmo uma intervenção psicoterápica” completa o psicólogo. Após o tratamento, o paciente pode reconhecer que, na realidade, poderia ter feito poucas coisas além do que havia sido feito.

Em caso de doentes terminais, que são obrigados a viver na iminência da morte, o processo de luto tende a ser complicado. Quando a pessoa sabe que vai morrer e fica revoltada com a situação, a morte é mal resolvida e a passagem muito mais sofrida. Já quando o paciente sabe que vai morrer e passa a aproveitar cada segundo de vida, a morte é muito mais tranquila e fácil de ser aceita. Tendo a consciência de que cada instante deve ser bem aproveitado, a vida ganha uma nova importância. Para a psicóloga Lilian, “ao viver bem a vida, perder algo é mais fácil, pois sabemos que cada momento foi muito bem aproveitado. Isso significa viver o presente sem pensar no que vai ser ou no que já foi”.

Enquanto para uns a morte significa o fim de tudo, o sofrimento maior, para outros da pode ser um alívio. “Isso costuma acontecer com a pessoa que tem muito trabalho ao cuidar de um idoso ou doente desenganado”, exemplifica Cancello. Quando a pessoa que cuida tem claro que a morte trará a paz para o doente, o processo de aceitação é muito mais fácil. No entanto, conforme explica o psicólogo, “certas personalidades exigem de si uma ‘coerência’ sobre-humana, não suportando a coexistência desses dois sentimentos (alívio e tristeza), sentindo-se culpadas”.

Mesmo com toda a complexidade da questão dos cuidadores, cada vez mais eles são necessários, face ao aumento da média de vida. Já aparece, na literatura científica, o termo “stress

dos cuidadores”. “E não podemos esquecer que alguns dos primeiros casos de histeria relatados por Freud referiam-se a mulheres que cuidaram por longo tempo de pessoas doentes. Possivelmente essa era, na época, a manifestação do que hoje chamamos de stress dos cuidadores”.

TIPOS DE PERDA

Quando falamos de luto ou perdas, o primeiro pensamento que nos vem à mente é em relação à morte. Mas o processo de luto vai muito além disso, como já dito na reportagem. Lidamos diariamente com perdas, em diferentes escalas e magnitudes. Perder o emprego, um carro, uma oportunidade de mudança. Tudo isso pode desencadear o luto e levar a pessoa a um grande stress emocional.

Luiz Cancello enumera que entre os principais fatores causadores de stress emocional, em primeiro vem a perda de um ente querido, seguida da separação conjugal. “No processo de separação sentimos a perda de um ambiente familiar e não necessariamente do parceiro”. Em ambos os casos, a dificuldade em lidar com a falta é porque aquela pessoa estava inserida em um projeto de vida, e com a perda, torna-se necessário reconstituir os planos. “Temos que ressignificar nossas vidas por completo, sem aquela presença. Este processo que torna a perda tão difícil e intragável”, concluiu o psicólogo.

A perda da referência cultural também pode gerar o luto. Cada vez mais pessoas migram de suas cidades natal para ganhar a vida nas metrópoles. A mudança pode acarretar na perda da referência cultural daquele lugar e com isso, a pessoa passa a se sentir isolada, não pertencente à nova realidade. “O processo de mudança requer uma serie de readaptações que levem um tempo grande da maturação para você se situar em um novo lugar, com novas pessoas”, justifica Cancello.

Há também uma série de pequenas perdas que muitas vezes passam despercebidas em meio à agitada rotina. ”Ao nos levantarmos, toda manhã, acabamos de contabilizar um dia a menos na nossa existência. Deixamos pra trás o dia de ontem que morreu e que se perdeu de nós; não há como acessá-lo, senãoatravés de lembranças”, ressalta Lilian Graziano.

Perdemos ainda com cada escolha que fazemos. Para comprar um carro tive que abrir mão da tão sonhada viagem. Se somarmos, ao longo do dia vivenciamos inúmeras perdas. Conforme destaca a psicóloga: “É claro que nem todas elas geram um processo de luto clássico, mas nem por isso deixam de nos angustiar, ainda que não tenhamos consciência disso”.

Além da perda de algo concreto, que veio a existir, o ser humano também sofre com a falta do fantasioso. ”Afinal, nós não nos emocionamos em função da chamada realidade objetiva, mas sim em função da nossa percepção acerca dessa realidade”, esclarece Lilian. Levando em consideração que há uma tendência em sofrer com uma perda de algo que nunca foi nosso, Cancello complementa que “na Fenomenologia, você é aquilo que você foi e aquilo que você não foi. O teu hoje é resultado do que foi feito ontem e também daquilo que você não fez”.

O RENASCER

Para Lilian Graziano todas as perdas são necessárias pois trazem em si a possibilidade de que venhamos a aprender com elas. “Se o sofrimento faz parte da vida, fugir dele seria o mesmo que fugir da própria vida, faro que boa parte das pessoas não se dá conta” completa.

Jonathas Martins Cardamone é um exemplo de superação da perda. Em 2001, ao retornar do seu horário de almoço sofreu um acidente de trânsito. Ele estava voltando da casa de sua sogra localizada no Morro do São Bento, em Santos. Na descida do morro, em uma curva, um carro guiado por um motorista embriagado atingiu sua moto ocasionando o acidente

“No hospital, após o exame radiológico, fui direto para a cirurgia. Como tinha acabado de almoçar, o médico anestesista não pode me ‘dopar’, ou seja, fiquei acordado todo o tempo. Cheguei a escutar o barulho deles cortando minha perna. Quando saí da recuperação fiquei procurando o resto da minha perna, e numa tentativa frustrada de me enganar, queria acreditar que não a sentia devido ao efeito dos remédios” relata.

Não aceitando à perda, Jonathas chorou por dois dias seguidos, pois sua esposa estava grávida de quatro meses e ele sentia-se na obrigação de trabalhar para sustentar a família. Durante a recuperação, ele sentiu medo do que iria enfrentar, “mas minha meta era me recuperar pois tinha um bebê para criar”. Em 2003, Jonathas começou a usar a prótese e após um ano já estava caminhando perfeitamente.

Atualmente, ele exerce a função de Auxiliar Administrativo na unidade de Cubatão da Petrobrás, contratado pela empresa AVAPE – Associação para Valorização e Promoção de Excepcionais. Com o emprego, descobriu também sua aptidão para tirar fotos. “Às vezes agradeço a Deus por ter perdido a perna, pois como não tive condições de fazer uma faculdade, dificilmente teria a chance que tenho dentro da empresa”, enfatiza Jonathas.

São relatos como esseque nos mostram que superar desafios é necessário. Jonathas teve que perder parte de sua perna para “ganhar” uma nova vida. Mas nem todos têm que passar por isso.  O importante é reconhecer que a vida é feita de perdas. Em certos momentos é normal sentir medo de seguir em frente. Em outras ocasiões,a perda trará alívio imediato. A certeza é que apesar da grandeza da perda, aceitar é essencial e, às vezes, inevitável.

Por mais que o luto possa parecer um processo infindável, somos seres capazes de passar por cima, de enfrentar e aceitar a falta do que não mais nos pertence. “É por isso que a saída não está em evitar o sofrimento, mas sim em fortalecer nossos recursos emocionais, para enfrentá-lo”, completa Lilian. Viver é uma dádiva. Que sejamos, então, dignos deste presente.

O PAPEL DA FÉ

Em busca de auxílio para a aceitação da perda, há quem recorra à religião para conseguir se sustentar e seguir a diante. “A religião é um recurso absolutamente legítimo. Se você se sente bem, certamente fará bem”, comenta Cancello. Acontece que, com frequência, apesar de buscar a ajuda da fé, “a pessoa não se sente pertencente a uma religião. É justamente esta pertinência ao grupo é que fornece explicações e consolo. O apoio do grupo ajuda a driblar as perdas”, afirma.

Nada mais atual do que as redes sociais para oferecer uma percepção disso. Nelas, você classifica sua personalidade e crenças. Muitos de seus usuários escolhem a opção “Espiritual, mas não religioso” para denominar a fé. De acordo com o psicólogo esse fato mostra que a pessoa tem a vaga sensação da existência de um algo a mais, no entanto, não se filia a nenhuma religião. “Não se perde a noção da transcendência, mas ao mesmo tempo tem um número significativo de pessoas que não se filiam a nenhuma crença”.

Os que se enquadram neste perfil lidam com o fato bruto em caso de perda, com aquela sensação de que existe algum lugar, sem saber ao certo se é o céu ou não. A única certeza é que após a morte não estamos mais aqui. Para Cancello “vivemos em uma época muito singular desta questão, pois estamos entre algo materialista e tradicionalmente religioso. Você fica num limbo entre essas duas coisas”.

OUTROS OLHARES

PAIS CONTRA O CAOS

Com isolamento, ficou mais difícil — em alguns casos até impossível — controlar o tempo das crianças diante das telas e substituir a tecnologia por atividades não virtuais

Se a pandemia do novo coronavírus transformou os dilemas das famílias da porta para fora, trazendo distanciamento social e isolamento, as transformações dentro de casa não foram menos dramáticas, já que os lares passaram a ocupar o espaço de todo um mundo exterior. Para pais que têm de lidar com o home office ao mesmo tempo que mantêm os filhos trancafiados, educando-os e os entretendo, o desafio ganha ares hercúleos. Sobretudo porque, para muitas dessas atividades, a tecnologia é a única saída possível — o que impõe novos questionamentos ao ato de educar. Existe um limite ideal entre utilizar a tecnologia como aliada para entreter as crianças e abdicar do controle das telas para mitigar as dores do isolamento? Tudo bem liberar o desenho favorito do fim de semana às 9 horas de uma terça-feira ou aumentar o tempo destinado para os games?

As dúvidas e inquietações deixaram o ambiente doméstico e passaram a aparecer em sessões virtuais e consultas informais com psicólogos, pediatras e pedagogos, que identificam uma sensação generalizada de aumento de demandas e tarefas aliada à culpa de não dar atenção suficiente para os filhos ou de relaxar regras preestabelecidas na rotina da casa. Levando-se em conta as especificidades de cada família, do número de filhos à idade de cada um deles, os especialistas coincidem no entendimento de que é necessário entender a excepcionalidade da pandemia e que o momento requer menos cobranças e mais diálogo. “É preciso ter a noção de que estamos vivendo um tempo historicamente marcante, até para que possamos nos adaptar. Não dá para agir como se não fosse um momento excepcional. Tentar manter de pé estruturas que não existem agora demanda um esforço e um tempo enorme, que podem ser melhor utilizados para construir essa adaptabilidade”, ressaltou o pediatra, palestrante e escritor Daniel Becker.

A Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que crianças de até 1 ano e meio de idade não tenham nenhum contato com telas e que aquelas entre essa idade e 5 anos estejam expostas menos de uma hora ao dia a aparelhos eletrônicos. Mas tudo isso leva em consideração o contexto normal de atividades de uma família. Nos Estados Unidos, a Associação Americana de Pediatria divulgou um comunicado no início da pandemia reconhecendo que o tempo em frente às telas aumentaria, mas recomendou que pais, mesmo diante da nova rotina, mantivessem algum limite. Canais infantis de TV e no YouTube já mostram esse aumento do uso. Segundo uma pesquisa feita pela Kantar Ibope, canais infantis da TV a cabo tiveram aumento de 9% de audiência em março. Na internet, o canal da Galinha Pintadinha, favorito das crianças na primeira infância, teve um salto de 34% nas visualizações diárias desde que a pandemia começou.

Na prática, o cotidiano da quarentena ainda traz desafios diários às famílias, mesmo após mais de dois meses de suspensão das aulas presenciais e da adoção de conteúdos on-line, em capitais como Rio de Janeiro e São Paulo. Alunos da ECO — Escola de Educação Comunitária, no bairro do Grajaú, Zona Norte do Rio, os gêmeos Isadora e Igor Tavares, de 11 anos, se revezam no laptop e no celular para acompanhar as aulas e fazer as avaliações do sexto ano do ensino fundamental. “Em casa, a concentração fica mais dispersa, tanto a deles quanto a nossa. A gente tenta manter uma rotina, mas não dá para fazer tudo como era antes. Eles acabam passando mais um pouco de tempo no celular ou comendo uma besteira a mais. Essa folga é necessária”, disse a servidora Agláia Tavares, que está em quarentena com os filhos e o marido.

O fato de o filho ainda não ter atividades escolares não diminui a carga da advogada Luciana Nahid Pacca, mãe de Henrique, de 1 ano e 4 meses. Tendo de sair semanalmente para reuniões externas com clientes, ela se reveza com o marido, o empresário Bruno Pacca, nos cuidados com o filho. O apoio da mãe, que, como ela, mora na Barra da Tijuca, foi suspenso em razão do risco de contaminação. A solução foi buscar bons conteúdos na TV e na internet para conseguir entreter Henrique durante o home office e o tempo dedicado às tarefas domésticas. “São coisas que o mantêm entretido por uma hora e meia, duas horas. No tempo que passo com ele, fico 100% dedicada, sem celular ou computador. Mas não dá para dar conta da demanda dele e das necessidades da casa e do trabalho”, disse a advogada. “A creche também ofereceu uma programação on-line, mas seria mais um tempo de tela. Consegui fazer um bom esquema de revezamento com meu marido, mas ainda assim tem horas que recorremos ao eletrônico”, afirmou.

Também com uma criança em idade pré-escolar, o fotógrafo Thiago Facina teve crises de ansiedade, com falta de ar e insônia, que acabaram por inspirá-lo a criar uma série de fotos no Instagram chamada “Confinamento”. Nela, Facina se veste com equipamentos de proteção individual (EPI). Sem poder lutar contra as telas, incorporou a vivência a seu cotidiano. Tanto a mulher, a atriz Lola Borges, quanto o filho, Antônio, de 2 anos e 10 meses, participam da atividade, que é feita diariamente. “Nos primeiros 15 dias ainda havia uma novidade, nós viemos para a casa da minha sogra, que tem mais espaço aberto para ele poder brincar. Nosso repertório de criatividade é colocado à prova o tempo todo, fica impossível não se render mais à TV do que a gente gostaria”, relatou Facina. “A série de fotos veio como uma ideia de ocupar este tempo que a ansiedade estava consumindo. A roupa traz uma sensação de ficção científica, reforça essa distopia que passamos a viver.”

A aflição de muitos pais levou a psicóloga e professora da Universidade de Brasília (UnB) Juliana Lopes a criar a série de vídeos curtos, Ju, me tira uma dúvida?, em seu canal no YouTube. Neles, a psicóloga, que é especializada em autismo e dificuldades de aprendizagem, dá dicas para os pais conciliarem o trabalho em casa com as demandas dos filhos ou ideias de atividades para que eles se entretenham sozinhos. Para ela, uma boa forma de lidar com o natural aumento do tempo diante das telas é distribuí-lo ao longo do dia. Caso não seja possível, o melhor é combinar com os filhos o tempo exato a ser dedicado aos eletrônicos, para manter a noção de limite. “A gente precisa entender que isso vai acontecer neste momento e que está tudo bem. O pior é impor que a criança troque a tela por outra atividade, como a leitura, que para ela vai ser entendida como um castigo, e não um prazer”, destacou Lopes. “Até para ter um momento de qualidade com os filhos, os pais também têm de ter um tempo para si. Que muitas vezes era o tempo do deslocamento para o trabalho, do cafezinho na empresa, de buscar os filhos na escola, e que agora não existe mais. É preciso que eles entendam que os adultos não só precisam desse tempo, mas que eles também o querem. Que é importante ver um filme que não seja infantil, entrar num chat com os amigos, fazer uma atividade que não envolva os filhos.”

Criadora do site “Papo de Mãe” com Roberta Manreza, que, desde 2009, virou programa na TV Cultura apresentado pelas duas, Mariana Kotscho viu as questões da quarentena se acumular no trabalho e em casa. Mãe de Laura (17 anos), Isabel (14 anos) e André (13 anos), a jornalista entrevista remotamente especialistas na área, com dúvidas enviadas pelo público para as redes sociais do programa. Muitas dessas inquietações também vêm de amigos pais e da própria vivência da quarentena. “No início tentei estabelecer uma rotina, colei uma lista de tarefas na geladeira, mas durou só umas duas semanas. Vi que teríamos de afrouxar um pouco as regras da casa, não tem como dar conta de tudo neste período”, contou Kotscho. “O mais importante foi evitar um esquema de férias. Mesmo que eles não precisem acordar tão cedo, dou uma controlada nos horários de sono. Também fazemos um rodízio na arrumação da casa, para que ninguém fique sobrecarregado. É preciso entender os altos e baixos de cada um nesse processo, que é natural ficar um dia mais quieto ou passar um pouco de tempo a mais no celular.”

Para Daniel Becker, mais importante que a atenção ao tempo dedicado às telas é a qualidade do conteúdo visto: “A internet tem um cardápio gigante, com muita coisa ótima, mas também muita porcaria. É bom acompanhar o que as crianças veem, para não deixá-las só com youtubers sem conteúdo ou submetê-las a um excesso de propaganda infantil. Programas de qualidade ou filmes que transmitam bons valores viram bons aliados dos pais neste momento”.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOILO PARA A ALMA

DIA 29 DE JUNHO

O CORDEIRO MUDO

Ele foi oprimido e humilhado, mas não abriu a boca… (Isaias 53.7a).

O profeta Isaías anunciou Jesus, de forma incomparável, setecentos anos antes de seu nascimento, como o cordeiro mudo que foi levado ao matadouro e não abriu a sua boca. O Filho de Deus foi traspassado pelas nossas iniquidades e moído pelas nossas transgressões. Ele foi ferido, mas pelas suas pisaduras nós fomos sarados. Ele foi ultrajado, mas não revidou ultraje com ultraje. Ele foi levado para a cruz debaixo das vaias de uma multidão sedenta de sangue, mas não proferiu nenhuma palavra de maldição. Tal qual um cordeiro mudo, ofereceu-se como sacrifício pelo nosso pecado. Pacientemente suportou zombaria, escárnio e açoites. Foi humilhado até a morte, e morte de cruz. Bravamente marchou sob a algazarra de uma multidão tresloucada, rumo às agruras do Calvário. Mesmo padecendo sofrimento atroz, não levou em conta a vergonha da cruz, pela alegria que lhe estava proposta. Mesmo sendo obediente até o fim, suportou o duro golpe da lei que violamos. Mesmo sendo bendito eternamente, foi feito maldição por nós, ao assumir o nosso lugar. Carregou em seu corpo os nossos pecados e verteu seu sangue para nos redimir do cativeiro e da morte. Seu padecimento nos trouxe alívio. Sua morte nos trouxe vida. Ali no Calvário, Jesus abriu para nós a fonte inesgotável da salvação.

GESTÃO E CARREIRA

NÃO PARE NA PISTA

O crescimento do comércio eletrônico no Brasil devido à pandemia do novo coronavírus criou novas soluções em transportes

A covid-19 está forçando o setor de logística a se tornar mais ágil, eficiente e digital. Com lojas fechadas e várias indústrias paralisadas, a demanda por frete rodoviário caiu 17,5°/o em abril em relação a março, segundo a Repom, que oferece soluções de gestão e pagamento de despesas para frota própria e terceirizada. O setor vem buscando mais segurança e eficiência. No lugar de ficar aguardando uma chamada no centro de distribuição, o caminhoneiro está usando plataformas que conectam a carga ao motorista. ”É muito mais conveniente”, diz Bruno Hacad, diretor de operações da FreteBras, plataforma de transporte de cargas que viu o número de cadastros crescer 118°/o entre janeiro e abril em comparação ao mesmo período do ano passado, chegando a 400.000 motoristas. O comércio eletrônico ajudou a mitigar parte dessa queda, impulsionando empresas de logística voltadas para a entrega de última milha, por exemplo. As lojas físicas de grandes redes, como Magazine Luiza, transformaram-se em centros de distribuição para o comércio eletrônico. Esse avanço não tem volta.

NOVOS CAMINHOS

Com o crescimento do comércio eletrônico nos últimos meses, as empresas precisaram ajustar sua logística. Varejistas, transportadoras e plataformas para entregadores estão mais digitais para dar conta do aumento da demanda:

EU ACHO …

UM RENOVAR-SE DE ESPERANÇAS

Para viver um grande amor, inspirem-se em Vinicius

Os amores líquidos de que nos fala Zygmunt Bauman estão de quarentena. O filósofo polonês fez sucesso com a defesa da ideia de que os tempos modernos favorecem relações pessoais menos duradouras. O amor contemporâneo, na sua observação, estaria mais para o acúmulo de experiências do que para a profundidade de um relacionamento, mais para descompromisso casual do que para vínculo afetivo. O barco dos encontros eventuais, no entanto, está fazendo água, para usar uma imagem próxima ao universo do pensador mais citado do momento, morto há dois anos.

O distanciamento social para combater o coronavírus nos põe cara a cara com nós mesmos. É uma oportunidade de experimentarmos novas possibilidades de trocas de sentimentos com pessoas que, mesmo a distância, talvez estejam vivendo um momento parecido, também com desejo de construir algo que vá além da superficialidade.

O impulso de viver um grande amor é contrabalançado quando se é responsável, pelo receio de contrair a Covid-19. Antes da pandemia, feliz de quem tinha um companheiro com quem pudesse passar o Dia dos Namorados. Hoje, ter um companheiro não garante um jantar romântico (e, para os que puderem desfrutar esse momento, recomendo frugalidade – não vamos perder o foco).

Nem todos estarão de mãos entrelaçadas, mas isso não é decisivo. Ouço muitos relatos de casais que estão passando a quarentena cada um em seu canto porque um dos dois trabalha com serviços essenciais ou está na linha de frente do combate à doença. Ainda assim, eles se fazem presentes, por meio de mensagens carinhosas, conversas em vídeo ou um buquê de flores por delivery. O que estão fazendo, na realidade, é transformar a ausência física em prova de amor.

Dificuldade maior enfrentam aqueles que a nova ordem mundial pegou num momento em que não dividiam as delicias do amor com ninguém em particular. Mas acredito que obstáculos existem para ser superados. É bonito ver casais se conhecendo por mensagens, construindo confiança mútua e estabelecendo pactos antes de se encontrarem pessoalmente. Começar um namoro virtual não é possibilidade que deva ser descartada. Quando menos, a postergação do contato físico traz uma carga de emoção que pode ser recompensadora tanto no encontro próximo como no futuro mais longínquo, quando a lembrança do platonismo imposto pelas circunstâncias ajudar a alimentar o amor de uma vida inteira.

Gosto de pensar que a ausência temporária pode esfriar as paixões pequenas, mas esquenta os grandes amores. Faz com os sentimentos o que o vento faz com o fogo: se apaga um fosforo, alimenta uma fogueira. No Dia dos Namorados, é bom podermos contar com Vinicius de Moraes. Hoje estamos preocupados com nossa saúde. Sem uma vacina, ainda em desenvolvimento, qual será o impacto no futuro das relações afetivas? O poeta tem a resposta: “Amai, porque nada melhor para a saúde do que um amor correspondido”. E, em meio a tatas agruras descritas em O Dia da Criação, ele registra uma confiança no porvir – “Há um renovar-se de esperanças” – que nos reconforta.

**LUCILIA DINIZ

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

IDENTIDADE E SENTIDO PARA A ALMA

O arquétipo trickster pode ser definido como um elemento que integra o inconsciente coletivo, representado por personagens da mitologia, do folclore, da literatura, da poesia, do teatro e do cinema

“O que nos reserva o futuro?” É com essa indagação que Carl Gustav Jung inaugura as linhas de Presente e Futuro (Jung, O. C., Vol. X/I§488). O pensador de Zurique lembra que, em momentos de profundas interrogações políticas e incertezas econômicas e espirituais, como o atual, o ser humano volta seus olhos para o futuro. Como Zaratustra, com seu “desejo de eternidade”, vive-se o impulso, resgatado pela poesia de Rimbaud, de “atravessar o limiar de uma consciência ordinária, a fim de atingirmos o tesouro cuja existência pressentimos no fundo”.

A importância de se trazer a contribuição do arquétipo do trickster para, a partir dele, falar sobre subversão não violenta, mediação de opostos, identidade e sentido no âmbito da cura da alma brasileira diz respeito ao diálogo que esse arquétipo propõe com todas as estruturas narrativas, as formas de socialização e os modos de subjetivar que, mesmo esgotados e reduzidos a estereótipos, ainda guardam, em sua essência, o gérmen do novo e a possibilidade do recomeço.

O trickster é uma das “pessoas psicológicas” que compõem o inconsciente coletivo, encarnado por personagens de inúmeras histórias da mitologia, do folclore, da literatura, presente na poesia, no teatro, no cinema e nas produções da cultura criativa em geral. A essas imagens pode-se chamar arquetípicas, posto que elas remetem às “representações simbólicas da psique total, entidade maior e mais ampla que supre o ego da força que lhe falta”. É importante salientar que, para Jung, toda afirmação sobre o arquétipo deve ser feita a partir da riqueza polissêmica das metáforas e dos símbolos, já que os arquétipos “pertencem à autocontradição interna e à duplicidade das metáforas míticas […]; são incognoscíveis econhecíveis através de imagens”. Assim, o que se conhece do arquétipo é o seu numen, isto é, a energia emanada do arquétipo que o atravessa e a consequente modificação fruto de seu impacto sobre a consciência.

Nesse ponto depara-se com uma importante sensibilidade poética e um giro epistemológico notável por parte de Jung. É importante lembrar que o pensador suíço lida com as fantasias arquetípicas do inconsciente coletivo já em seu cotidiano psiquiátrico no hospital de Burghölzli, na Suíça, validando assim seu percurso teórico com pacientes esquizofrênicos e, desse modo, evidenciando uma de suas maiores contribuições à chamada Psicologia Analítica, qual sejam, o caráter e a concepção estética e criadora de imagens que caracterizam a atividade da psique. A possibilidade de socialização dos pacientes psiquiátricos, na visão de Jung, estava baseada em uma ética do cuidado que favorecesse a comunicação e o acolhimento dessas fantasias e delírios, em relação com a cultura e sociedade.

Ao desenvolver a noção de arquétipo, inspirada nessas possibilidades “poiéticas” e mitológicas percebidas em seus pacientes de Burghölzli, Jung definiu o termo como um substrato psicológico comum a toda humanidade, procurando assim confrontar e ressignificar o já estabelecido literalismo e o consequente estigma da loucura que ele ativa. Suas premissas teóricas estão fundamentadas na experiência empírica e inspiradas em consistentes categorias filosóficas, mas ganham profundidade e potência quando sentidas a partir da realidade poética, simbólica e metafórica da psique.

Além dessa concepção mitopoética, prospectiva e homeostática da psique, também é importante frisar que, para a Psicologia Analítica, os arquétipos pertencem à esfera da psique objetiva (inconsciente coletivo), enquanto os complexos são representações mentais unidas por experiências afetivas de intensa carga emocional para o indivíduo, fazendo parte da psique subjetiva, isto é, do inconsciente pessoal.

INTERSECÇÃO

Há aqui um ponto de encontro interessante, entre o complexo e a possibilidade de análise de características culturais e intersubjetivas de um grupo ou país, já que “a origem do complexo é frequentemente o que se chama de trauma, um choque emocional ou algo parecido, através do que uma parcela da psique é ‘encapsulada’ ou se cinde”. Abre-se então a possibilidade hermenêutica de pensar acerca de alguns fenômenos em termos de complexos culturais, estando sua gênese relacionada a traumas coletivos e situações que ainda não foram reparadas socialmente ou psicologicamente elaboradas. No caso, no Brasil, podemos falar dos miasmas gerados pela colonização, a escravidão e os traumas impostos à formação da identidade cultural brasileira, constituída a partir do preconceito tomado como norma, do etnocentrismo como imposição da verdade do colonizador, do jeitinho do colonizado como resposta que improvisa saídas tanto quanto perpetua a corrupção como modus vivendi e operandi. Alguns exemplos dos traumas persistem constelados, atuando como poderosos complexos culturais na psique coletiva brasileira.

Dessa forma, deve-se evocar uma leitura simbólica do arquétipo do trickster baseada fundamentalmente nas contribuições de Carl Gustav Jung e seus continuadores, propondo assim um movimento subversivo-criativo, uma reflexão construtivo-destrutiva, necessários para reparar o tecido da relação europeu/índio/negro cristalizada e verticalizada no Brasil, e também para que afirme uma identidade cultural e uma cidadania plena e responsável, para além do “jeitinho brasileiro”. A essência da subversão aqui proposta, figurada pelo arquétipo do trickster, relaciona-se com a necessidade de amadurecer uma consciência comunitária, baseada na preservação -inovação criativa de nossas qualidades mestiças. Desse modo, seriam ressignificados os aspectos seculares de nossa psique coletiva, por meio de uma proposição que equilibre os aspectos polares, desde sempre dissociados pelos dualismos reducionistas da realidade. O pragmático em diálogo com o lúdico, o místico com o heroico, o lógico com o mágico, o cômico com o trágico instaurariam uma trajetividade que poria em movimento o cotidiano, o qual seria assim inseminado com uma visão de mundo muito própria dos ritos, tradições festivas e folclóricas do Brasil, na busca de um imaginário de superação e reparação.

O trickster é um personagem que, no contexto das narrativas em que irrompe como elemento de mediação, não aceita submissão, tampouco o culto ao cinismo convencional, muito menos investe na manutenção das personas sociais, do indivíduo entregue ao dissimular-se em aparências ou discursos puramente retóricos. Falar desse arquétipo é estar alinhado com o seu numen de mudança, baseado em autenticidade, autonomia, integridade e liberdade. As características muito próprias do trickster são sistematicamente banidas das sociedades totalitárias em geral, por serem elementos de forte questionamento da sujeição do indivíduo ao coletivo, da homogeneização dos discursos e práticas. O humor, característica essencial do trickster, é sumamente malvisto nesse modelo de sociedade rigorosa, séria, unilateral, paranoica e produtiva. Como escreve Todorov, “uma das tarefas mais difíceis (nesse modelo social) é manter o senso de humor – sinal de distância com relação à autoridade e, portanto, de autonomia”. 

ROMPIMENTO

O trickster é retratado, nas histórias tradicionais, como um personagem capaz de romper automatismos alienantes e de promover insights profundos que conduzem à mudança significativa. Em muitas narrativas da mitologia universal, ele é representado por personagens zoomórficos, tais como corvo, coiote, lebre ou hiena, isto é, animais cujas qualidades não são a força ou a ferocidade ou violência, mas a mobilidade, a astúcia e a leveza. No Brasil, ele aparece representado por personagens bem conhecidos, como os folclóricos Saci Pererê e Pedro Malasartes. O trickster é essencialmente um questionador, um outsider que, dotado de muita energia e dinamismo, sempre convida os personagens mais convencionais à desnaturalização de suas condutas e à sensibilização quanto a temas estabelecidos a priori. Mesmo a incoerência de um momento histórico é explicitada por tricksters sumamente famosos, como o Carlitos, de Charles Chaplin, o Macunaíma, de Mário de Andrade, e a dupla João Grilo e Chicó, de Ariano Suassuna. Sua função psicológica na narrativa também é a de conscientizar egos inflados e fixados na pobreza do literalismo conceitual, a exemplo da personagem do conto dos Irmãos Grimm, que se sente livre para afirmar, contra todo o senso comum, que “o rei está nu”. As trapalhadas e confusões que emergem desse personagem marginal e questionador são derivadas de seu caráter mediador e, por isso, seu movimento é filho da revelação imaginativa e do erro propositivo, sendo, em última instância, de caráter restaurador. Como linha de força desse arquétipo, movendo-se para além das percepções racionais do ego heroico, pode-se dizer que seu maior compromisso seja o de revelar o sentido real das coisas, para além das representações, oportunismos, dualismos e estratégias de manipulação.

O alívio que esse personagem promove nas narrativas que descortinam contextos emocionalmente engessados ou estéreis relaciona-se com sua habilidade de oferecer, pela via do lúdico, do inusual e do cômico, uma resposta de transformação adequada, porém, muitas vezes imprevista e brusca, embora raramente violenta, já que esse anti-herói sombrio está intimamente ligado ao discurso desviante e anti-hegemônico, com o flanar de asas que nos leva para longe de conexões esgotadas e das verdades consagradas.

A importância do estudo dos mitos, artes, religiões, filosofia e disciplinas ascéticas para a Psicologia Analítica é que, além de configurarem linguagens próprias da totalidade psíquica, estes são instrumentos que ajudam o “indivíduo a ultrapassar os horizontes que o limitam e a alcançar esferas de percepção em permanente crescimento”. Ao resgatar a função primária da mitologia e dos símbolos, a Psicologia Analítica oferece a plataforma para atingir o tesouro mencionado, enquanto auxílio arquetípico efetivo e impulso para tirar da potência os atos que ainda aprisionam em estruturas titânicas de dominação, repressão, unilateralismo, literalismo e poder. É preciso liberar o presente para ser vivido aqui e agora e, somente a partir da experiência, imaginar outros futuros. Assim como também é preciso trazer à tona os tensionamentos, de modo a gerar revisões e subversões criativas a temas cristalizados, permitindo assim que o cotidiano seja renovado a partir de energias ainda não experimentadas e de motivações mais profundas e coesivas.

A poesia do trickster é sua destruição. Como Shiva, o terceiro deus de trimurte hindu, ele está sempre se dissolvendo, recomeçando e fluindo. No trickster, nada engessa ou cristaliza, tudo se movimenta e se revela num continuum que é a própria vida. Em resposta ao saber fálico e hierárquico das compreensões unilaterais, o arquétipo do trickster convida para outras, nem sempre novas, mas sempre renovadoras, perspectivas e olhares: eis a autorização de um saber que experimenta, inova, articula e regride, quando necessário, superando a insistência num saber que analisa, abstrai e teoriza e num pensar compulsivo e autorreferente, que atrofia as demais funções psíquicas da consciência. Cabe lembrar do “samurai malandro”, o poeta Paulo Leminski, que encarnou um trickster pulsante, na roupagem mista, mestiça e não polarizada de sua “tropicalidade-zen”. Ele que não excluiu nenhum dos opostos, muito menos fixou a consciência nos extremos radicalizantes que o ego impõe como visão de mundo. Esse poeta soube seguir “sem demagogia, com amor e humor, talento e lucidez […], abrindo caminhos na selva selvagem da linguagem, no repertório caótico de nossas cabeças cortadas […]”.

Captando o empobrecimento da vida interior do homem contemporâneo, Jung assevera que a readaptação da existência humana a novas demandas éticas e existenciais deve ser baseada em uma cosmovisão que restaure os símbolos genuínos do desenvolvimento humano, além de integrar e direcionar os fluxos da energia instintiva, superando os pressupostos teóricos que impõem uma compreensão unilateral do homem.

Sugere Leon Bonaventure, na introdução de As Conferências de Tavistock, que Carl Gustav Jung estava assentado sobre uma sólida tradição filosófica e mística, subvertendo o caminho da Psiquiatria convencional da explicação do normal pelo patológico e por outro lado afirmando uma Psicologia fundamentada pelo arquétipo do centro, baseada numa atitude fenomenológica de descrição das realidades fundamentais da alma humana e na experiência viva e empírica do processo de individuação. Bonaventure destaca ainda que Jung pode ser facilmente considerado como um continuador da tradição humanista de pensamento, aquela que é comprometida com o Mysterium Animae, o mistério da alma.

TRADIÇÃO SÓLIDA

Deve-se a inúmeros continuadores do pensamento de Jung a articulação da abordagem junguiana com os acontecimentos históricos e culturais do Brasil. Entre eles estão Roberto Gambini e Eliana Atihé, ambos em busca de compreender e afirmar que o cerne vivo de uma nação é seu manancial imaginário e o acervo simbólico ativo e dinâmico de sua cultura. Disso emerge a compreensão de que a consciência mítica não é um epifenômeno de representações sociais, mas sim a pedra angular de qualquer grupo social ou país. Resguardada como possibilidade de encontro com essa “alma do mundo” revitalizadora, a ressonância poética dos nossos símbolos genuínos e das imagens arquetípicas que eles figuram serve como fator de equilibração psicossocial e também como forças de reparação da alma de um povo, de um país, de um mundo.

Esses e outros pensadores ajudam na difícil missão de ressignificar a história para, ao colocar o “Brasil no divã” ou subverter as narrativas, despertar a alma individual para a reemergência de um modo mais integrado de conhecimento e experiência, em que razão e intuição dialoguem em favor da totalidade. Desse modo, buscando compreender os movimentos da alma brasileira em seus sofrimentos, conflitos e dificuldades, bem como suas alegrias e prazeres, com a sombra e a luz sempre entrelaçadas, espera-se ativar algumas das possibilidades criativas e prospectivas que encaminhem para a superação das contradições que imobilizam, no sentido de viver o paradoxo que verdadeiramente todos somos.

A irreverência do arquétipo do trickster revela um modo de evidenciar aquilo que poucos observam, criticando os valores, os radicalismos e excessos que impedem o estabelecimento de uma ordem moral, cultural e política que sirva, de fato, à união dos opostos com vista à totalidade e não à dissociação, ao conflito crônico e à desintegração, por outro lado propiciando a “libertação da consciência do fascínio do mal, não sendo mais obrigada a vivê-lo compulsivamente”.

Eis afinal o trickster como o arcano sem número do Tarot, inspirando dissoluções sem retorno, destruindo para possibilitar a reconstrução a partir de outras soluções e alternativas, apagando velhos caminhos e abrindo novos. O arquétipo da delação premiada, da indignação política, da reunião dos opostos aparentemente inconciliáveis, aquele que convoca, com sua astúcia, com sua inteligência não racional, com sua visão bilateral e com os esculachos que ridicularizam os poderosos de todas as lateralidades possíveis, a força para transformar e as oportunidades para ampliar a consciência, no sentido de integrar a sombra excluída que parasita a todos. Afinal, para o trickster, a mudança é só uma grande brincadeira.

EU ACHO …

O AJUSTE NO PROTOCOLO

A falta de capacidade em adaptar descobertas científicas às políticas públicas tem sido fatal, mas ainda há tempo de mudar a abordagem no tratamento da Covid-19 e salvar vidas

O combate à pandemia causada pelo coronavírus vai entrar para a história como um dos grandes fracassos da sociedade moderna. Quando olharmos para trás para enxergar este período, veremos o enfrentamento de outras duas doenças tão graves quanto a infecção: a irracionalidade que vem da psicologia de massas das mídias sociais e o vácuo de lideranças que dominou as ações no planeta, com raras exceções. A radicalização que vem de uma e a politização que vem de outra impediram o enfrentamento eficaz da Covid-19. Faltaram análises pragmáticas, ações que permitissem o contraditório, provas e contraprovas, teses e antíteses. Com um outro tipo de abordagem, milhares de pessoas que estão morrendo em casa ou chegando virtualmente mortos aos hospitais poderiam sobreviver à doença. No Brasil, não é diferente, exceto por parte da sociedade civil em campanhas de solidariedade para conter a fome e iniciativas heroicas dos profissionais de saúde e líderes das comunidades vulneráveis.

Falta uma aliança entre os governos federal, estaduais e municipais que mobilize esforços para, de forma coordenada, suprir as carências do sistema de saúde. Falta a elaboração de uma estratégia consolidada, considerando o aspecto continental do país e suas diferenças regionais. Falta um plano de ação que ataque a carência na infraestrutura, com investimento em pesquisa para adaptação das políticas públicas aos achados científicos mais recentes, uma vez que a literatura está sendo escrita “ao vivo”, à medida que a pandemia se desenrola. Mas o que, de fato, angustia quem acompanha a evolução da pandemia no front é que, a rigor, medidas simples poderiam ter impacto significativo no destino de muitas pessoas. Desde abril o Instituto Estáter identificou uma tendência alarmante e que teimava em ser ignorada pelo noticiário e por autoridades. Interpretando dados da Itália e dos EUA, constatamos que um número superior a 70% das mortes aconteceu sem que os pacientes passassem pelas UTIs. Com ajuda de Ben-Hur Ferraz Neto, cirurgião do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, acessamos hospitais e médicos nos EUA, Reino Unido e Itália. Para nossa surpresa, nenhum deles conseguiu explicar esse fenômeno. Levamos os dados para um grupo de especialistas que apoia o Instituto. Esper Kallás, infectologista do Hospital das Clínicas, e Carlos Carvalho, pneumologista do Incor, identificaram vários pacientes que chegavam ao hospital com o nível de saturação de oxigênio muito baixo. Alguns morriam na ambulância enquanto outros chegavam colapsados à beira da morte. Estes, ou morriam rapidamente ou levavam de duas a três semanas para se recuperar nas UTIs. A hipóxia silenciosa (mecanismo que leva à perda do nível de saturação do oxigênio sem que o paciente perceba) matou mais gente nos asilos, em casa ou a caminho do hospital, do que aqueles internados nas UTIs. Isso porque, de acordo com o consenso de protocolo, os infectados só deveriam procurar um hospital no caso de falta de ar. Hoje vemos que foi um erro.

O Sars-CoV-2, vírus que causa a Covid-19, atua como uma bomba-relógio. Os especialistas constataram que a perda da saturação de oxigênio começa entre o quinto e o sétimo dia, período em que o paciente ainda está acamado e prostrado e não percebe essa queda na oximetria. Quando sente falta de ar, em muitos casos é tarde demais. A saída para evitar essas mortes trágicas desassistidas é acompanhar a saturação de oxigênio e ir ao hospital no primeiro indício de queda abaixo do limite. Mas se os hospitais estão lotados, qual a alternativa? Há aqui o paradoxo das hospitalizações. O protocolo atual faz com que uma parcela relevante dos pacientes seja internada diretamente nas UTIs. Enquanto isso, as enfermarias estão com ociosidade entre 35% e 45%. Por outro lado, a experiência tem mostrado que pacientes com a perda de oximetria constatada precocemente podem ser submetidos a métodos alternativos de oxigenação simples, como cateteres e outros que serão ministrados nos leitos comuns. Parte deles pode se recuperar depois de alguns dias com esse tratamento. O outro estágio é a ventilação mecânica não invasiva. Somente aqueles que não se recuperarem seriam submetidos à intubação – a experiência das equipes de frente também tem mostrado uma recuperação mais rápida desses pacientes do que dos submetidos à intubação em estágio avançado de baixa saturação. A conclusão é que o acompanhamento da oximetria, principalmente de pessoas do grupo de risco, pode permitir um alívio no uso de UTIs, além de salvar vidas.

Há iniciativas sendo testadas para criar controle do nível de oxigênio nas populações mais vulneráveis. Uma delas, em Paraisópolis, conta com oxímetros conectados a um aplicativo no celular que registra na nuvem o nível de saturação do oxigênio e dispara sinal de alerta quando atinge níveis de atenção. Outra, desenvolvida por uma ONG, treina motociclistas, paramentados com EPIs, para medir a oximetria de moradores do grupo de risco que não possuem condições de ter o aparelho. O acompanhamento é feito por mapas de controles e por aplicativos de telemedicina. A sociedade e as lideranças comunitárias têm se organizado, porém é necessário ampliar a divulgação para conscientizar grande parte da população mais vulnerável. O combate da Covid-19 é um fracasso global. Mas ainda há tempo para salvar muitas vidas. Para isso, o protocolo precisa ser ajustado.

**PÉRCIO DE SOUZA, engenheiro, é um dos fundadores do Instituto Estáter

OUTROS OLHARES

A CONTRAOFENSIVA DA VERDADE

Após anos de inação e tibieza, democracias centram fogo na responsabilidade das redes sociais para conter o poder corrosivo das Fake News

Antes da pandemia, antes de Donald Trump e Jair Bolsonaro serem presidentes, antes de o Reino Unido cogitar sair da União Europeia, antes da avalanche a abalar os alicerces da política planetária, antes de tudo houve Mandalai. Era julho de 2014 quando a violência irrompeu na cidade de Mianmar, imortalizada no Ocidente como lugar onde “o melhor é igual ao pior, não há Dez Mandamentos e um homem pode aguçar a sede”, versos de Rudyard Kipling que ganhavam sabor de exotismo quando cantados por Frank Sinatra ou recendiam a racismo quando recitados nos clubes fechados da elite britânica. Quanto aos eventos daquela noite de julho, nem o lorde Mountbatten que declama o poema na última temporada da série The crown nem o Boris Johnson que cometeu a gafe de arriscar algumas estrofes em visita oficial a Mianmar podem ser considerados culpados de nada. Foram centenas de birmaneses que invadiram a casa de chá de um muçulmano, acusado de ter estuprado uma funcionária budista. A mentira publicada num blog, compartilhada por ultranacionalistas que queriam se ver livres dos muçulmanos, se alastrou pelo Facebook. Não era a primeira vez. Não seria a última. Daquela, a polícia foi incapaz de conter a revolta popular, os saques, as gangues armadas com paus e facões que aterrorizaram a cidade por dias e deixaram um saldo de dois mortos e 20 feridos, num prenúncio do que aconteceria nos meses seguintes aos muçulmanos da minoria rohingya dos estados vizinhos.

Em 2018, depois de pelo menos 10 mil mortos e mais de 650 mil forçados ao exílio, os investigadores das Nações Unidas afirmaram que os eventos em Mianmar “carregam as marcas de genocídio”. Constataram o óbvio: as redes sociais “contribuíram substantivamente para o nível de ressentimento”. O genocídio em Mianmar demonstra que os riscos da desinformação não se restringem aos trolls da ultradireita, às invasões de hackers russos, à alquimia psicográfica dos marqueteiros da Cambridge Analytica, aos grupos de tiozões do WhatsApp ou ao inquérito que investiga, no Supremo Tribunal Federal (STF), a disseminação de “fake news” pelas milícias digitais bolsonaristas. Há algo de mais profundo e insidioso em ação. Uma força corrosiva ameaça a própria essência da democracia: a resolução pacífica dos conflitos humanos. DeMianmar ao estado indiano de Tamil Nadu, de Hong Kong às Filipinas, da Catalunha à Catânia, da Turíngia alemã à Charlottesville americana, de Santiago a Minneapolis, das charnecas inglesas aos cercadinhos no Palácio da Alvorada, “a dança é a mesma aonde quer que você vá”, na descrição certeira de Ryan Broderick, jornalista que, ao longo da última década, cobriu a radicalização on-line em pelo menos 22 países dos seis continentes.

Os últimos passos dessa “dança” se assemelham ao cerco a aves rebeldes num galinheiro. Enquanto os governos têm tentado mudar as leis, as redes sociais se esgueiram e batem asas desesperadamente, tentando escapar. As iniciativas de autorregulação geram algazarra, mas têm sido inúteispara fazê-las alçar voo para longe das garras do Estado. O Twitter passou a incluir mais advertências em tuítes depolíticos – eatingiu o próprio Trump. O Facebook instaurou um conselho externo para disciplinar seu próprio conteúdo. Nos Estados Unidos, a reação foi imediata: Trump baixou um decreto que torna as redes responsáveis pelo conteúdo que fazem circular. No Brasil, depois que a Polícia federal desbaratou o esquema de desinformação bolsonarista, o Senado está prestes a votar um projeto de lei semelhante. Aqui como lá – e por todo o planeta -, dois fatos já se tornaram cristalinos. Primeiro, a primazia das redes sociais na disseminação de qualquer discurso e na mobilização política. Segundo, a ameaça que a balbúrdia digital tem representado aos caminhos institucionais de toda democracia que se preze.

” Em campanhas recentes mundo afora, o candidato com a maior e mais engajada comunidade no Facebook emgeral venceu”, escreveu o historiador americano Siva Vaidhyanathan, da Universidade da Virgínia, em Antisocial media (Mídia antissocial), livro essencial para entender a música e os passos da “dança” das redes sociais – animada, nas palavras dele, por “boas intenções, espírito missionário e uma ideologia que vê o código de computador como solução universal para todos os problemas humanos”. Elas se tornaram o principal meio de comunicação e propaganda neste início de século, papel antes ocupado pelo rádio e pela televisão. “Se você quisesse construir uma máquina para distribuir propaganda a bilhões de pessoas, distraí-las das questões importantes, insuflar o ódio e o fanatismo, erodir a confiança social, solapar o jornalismo, instigar dúvidas sobre a ciência e promover vigilância em massa, tudo ao mesmo tempo, criaria algo muito parecido com o Facebook”, afirmou. “Quer chamemos o fenômeno de ‘fake news’, ‘propaganda’, ‘lixo’ ou ‘desinformação’, o resultado é o mesmo: o enfraquecimento constante e alarmante da confiança pública na especialização, na possibilidade de deliberação racional e de debate.”

A maior evidência é a profusão de curandeirices travestidas de ciência que tomaram conta da internet na pandemia. Mentiras sobre isolamento social, cloroquina e até detergente ganharam apoio político nos mais altos escalões. Um sentimento comum une autocratas, terroristas, trapaceiros, charlatães e milícias digitais: todos desprezam a verdade. Ninguém resumiu os riscos diante da humanidade tão bem quanto o humorista britânico Sacha Baron Cohen, falando a sério em novembro passado. “É chocante como é fácil transformar teorias da conspiração em violência”, disse. “Imaginem o que Joseph Goebbels, o ministro de Adolf Hitler responsável pela propaganda nazista, poderia ter feito com o Facebook”

Dez anos atrás, nos tempos da Primavera Árabe, as redes sociais eram saudadas como força que traria liberdade edemocracia a países sob o tacão de regimes autoritários. Hoje já ficou evidente não apenas o fracasso daquela promessa, mas o risco de que elas sirvam, ao contrário, de veículo para o retrocesso. para que o autoritarismo tome conta até mesmo de democracias consolidadas. “O mais duro para mim foi enxergar que a mesma ferramenta que nos uniu acabou servindo para nos separar”, disse numa conferência um desiludido Wael Ghonim, dono da página do Facebook que serviu de semente aos protestos no Egito em 2011. O plebiscito do Brexit e a eleição de Trump, em 2016, desmascararam a hipocrisia da pregação messiânica do Vale do Silício.

Em vez de promover um salto incomparável de produtividade na economia, a tecnologia digital serviu, sob o álibi da “disrupção”, de pretexto para os bancos centrais inflarem duas bolhas financeiras, cujo estouro lançou o planeta na maior depressão desde a crise de 1929 até a emergência do novo coronavírus. No lugar da aurora da liberdade e da apoteose da democracia, renasceu o nativismo chauvinista, sumiram os freios contra todo tipo de idiotice tacanha ou pseudociência – do negacionismo climático ao charlatanismo médico, da falsificação da História ao terraplanismo epidemiológico. Instaurou-se no meio digital uma espécie de vale-tudo da informação. A expressão “fake news”, usada pelo jornalista Craig Silverman numa reportagem para descrever o que acontecia na campanha de 2016 nos Estados Unidos, depois adotada por Trump e seus êmulos para atacar a imprensa profissional, se tornou um rótulo conveniente para encerrar qualquer debate.

Nas eleições deste ano no Brasil e nos Estados Unidos, a desinformação traz riscos evidentes. Para os americanos, os principais desafios, na análise de Paul Barrett, da Universidade de Nova York, são: vídeos capazes de representar candidatos dizendo ou fazendo o que jamais disseram ou fizeram, conhecidos como “deepfake” (a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, já foi vítima de uma fraude do tipo); uso do Instagram e do WhatsApp, mais que do Facebook, para disseminar conteúdos falsos e provocar radicalização; interferência digital não apenas da Rússia, mas de Irã, China e, principalmente, empresas americanas contratadas para gerar desinformação; novas tentativas de mobilização para protestos falsos e de evitar o comparecimento às urnas de minorias (tática conhecida como “supressão de voto”).

No Brasil, a preocupação se multiplica pelos 5.570 municípios, cada um com panorama político próprio, todos sujeitos a campanhas de manipulação. “A Justiça Eleitoral vê as eleições municipais como de execução mais complexa, porque preponderam circunstâncias locais”, dizia meses atrás o juiz Ricardo Fioreze, coordenador do programa de enfrentamento à desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). “Isso nos permite prever que será mais difícil enfrentar a desinformação.” O TSE já cassou o mandato de senadora da juíza Selma Arruda (Podemos-MT), cuja campanha foi condenada, entre outros motivos, por não declarar gastos com publicidade digital. Acusação idêntica pesa sobre a campanha de Bolsonaro, em processo que deverá ganhar novo fôlego nas próximas semanas a partir do inquérito das fake news.

A maior fonte de inquietação por aqui, como em 2018, é o WhatsApp. Basta lembrar o caso recente da jornalista Patrícia Campos Mello. Responsável por reportagens sobre a rede de desinformação bolsonarista pelo WhatsApp nas últimas eleições, ela própria foi vítima de uma campanha difamatória. Inicialmente disseminados também no WhatsApp, memes agressivos e calúnias ganharam repercussão no Twitter, sem que a rede social tirasse do ar as contas responsáveis por difamá-la e ofendê-la. Oficialmente, a resposta do Twitter foi de dever cumprido. “Foram tomadas medidas sobre tuítes e contas que violaram as regras”, afirmou em comunicado. “O Twitter condena comportamentos que intimidem ou tentem silenciar vozes, e o trabalho para evitar que isso ocorra está em constante aprimoramento.” É verdade que a empresa não está parada. Tanto que incluiu, nos tuítes recentes sobre os protestos em Minneapolis contra o racismo da polícia, uma advertência afirmando que Trump violou regras sobre “enaltecimento à violência”.

Mesmo assim, as medidas têm sido tímidas e hesitantes. O WhatsApp informa que, depois das denúncias em 2018, limitou o tamanho de grupos, as listas de transmissão e o reencaminhamento das mensagens. A despeito da tecnologia de comunicação segura para preservar a privacidade, passou a usar dados de localização e o número de telefone dos usuários para tentar coibir abusos (no Brasil, com mais de 120 milhões de aplicativos instalados, o reenvio caiu 30% e, na campanha de 2018, 400 mil contas foram suspensas). A eficácia dessas medidas foi, contudo, posta em xeque por um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com grupos no Brasil, na Índia e na Indonésia durante o período eleitoral (aqui, também durante a greve dos caminhoneiros). Nas mensagens com imagens, eles constataram que a desinformação alcança mais grupos e é distribuída mais rápido – em 60% dos casos, menos de duas horas depois da primeira aparição. Mensagens falsas de texto também circulam por mais tempo, metade delas mais de dez dias. É, portanto, crítico o tempo de reação, tanto das autoridades quanto das redes sociais. “No calor da eleição, precisamos intensificar a checagem para monitorar o que circula da forma mais ágil possível”, disse Fioreze. Ele não descartou a possibilidade de que, mais perto da eleição, o próprio WhatsApp impusesse mais restrições ao repasse de mensagens. No final do ano passado, o pesquisador brasileiro Pablo Ortellado, coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital da Universidade de São Paulo (USP), dizia que havia pouquíssimo tempo para agir a tempo das eleições. Não há mais. “Somos o segundo maior mercado depois da Índia em uso do WhatsApp. Se alguém pode regular o uso de modo sensato, é o Brasil.” O Facebook, dono do WhatsApp, vê na comunicação privada a vocação da plataforma e defende a tecnologia usada para manter as mensagens secretas. Isso não impede, porém a implantação de sistemas de monitoramento capazes de detectar violações nas imagens ou vídeos compartilhados, armazenados em servidores para facilitar o carregamento. Também não impede o uso de técnicas de inteligência artificial para disparar alarmes sobre usos suspeitos.

Seria injusto deixar de reconhecer os esforços do Facebook para tentar controlar a desinformação em suas redes. É fato que algo mudou depois das declarações desastradas do criador da rede social, Mark Zuckerberg, quando vieram à tona as primeiras evidências da interferência de russos na campanha americana em 2016. Além das mudanças implementadas no WhatsApp, a empresa fez parcerias com agências de checagem de fatos para rotular conteúdos falsos, passou a banir o que pudesse gerar violência ou representar risco à saúde pública, estabeleceu forças- tarefas para combater a desinformação em tempo real durante períodos eleitorais, adotou normas de transparência nos anúncios políticos, instaurou um conselho externo para supervisão do conteúdo e afirma contar hoje com 35 mil funcionários destinados a manter a “integridade da plataforma” (15 mil deles, moderadores com o poder de tirar do ar conteúdos mediante um dique).

Um jornalista que visita os escritórios do Facebook num prédio envidraçado da região da Avenida Faria Lima, em São Paulo, parece embarcar numa espaçonave rumo a outro planeta. Recebe um crachá de cor diferente dos demais (vermelho) e, entre a comida gratuita, os estofados coloridos e o ambiente descontraído das empresas digitais, encontra funcionários articulados e engajados, capazes de debater a fundo a tensão entre a liberdade de expressão e a qualidade da informação, até mesmo de defender a insistência ridícula de Zuckerberg em garantir aos políticos o direito de mentir em seus anúncios, repetindo o mantra “não podemos ser árbitros da verdade”. Ouve histórias épicas sobre como o Facebook desbaratou redes subterrâneas de desinformação, ocultas atrás de perfis anônimos (uma delas, ligada ao Movimento Brasil Livre). Descobre que a televisão e a imprensa profissional continuam imbatíveis em influência (o pico de posts sobre Bolsonaro na campanha eleitoral foi durante a entrevista ao Jornal Nacional). Espanta-se que o Facebook tenha contratado um professor de ciência política para lidar com o uso de suas plataformas no Brasil e na América Latina (só nas últimas eleições argentinas, mais de 80 funcionários se envolveram no combate à informação falsa). Admira-se com a constatação de que, desde a vitória de Trump, houve eleições nas duas maiores democracias do planeta (Índia e União Europeia) sem registro de abusos graves. Confirma que há urna disposição genuína em colaborar com autoridades eleitorais locais (o próprio TSE corrobora tal fato). E, ainda assim, não sai convencido de que as mudanças tenham lá muito valor.

“Não há dúvida de que estão promovendo mudanças, mas é o mínimo suficiente para afastar a ameaça de regulação”, afirmou o acadêmico Dipayan Ghosh, que pesquisa a interação entre tecnologia e política no Shorenstein Center da Universidade Harvard. “Não acho que a mentalidade deles tenha mudado. Não tenho evidência direta disso e, qualquer que seja a abordagem adotada, no final a bola vai parar em Mark Zuckerberg e Sheryl Sandberg (diretora de operações do Facebook e braço direito de Zuckerberg).” Ghosh sabe bem do que fala. Ex­ conselheiro da Casa Branca para assuntos digitais no governo Barack Obama, ele trabalhou no Facebook até pouco depois da campanha de 2016. Chocado com a manipulação, decidiu trocá-lo pela academia. Tornou-se, nos últimos três anos, um dos maisrespeitados dissidentes do Vale do Silício, coautor de estudos que esmiúçam o desafio das redes sociais no universo político, intitulados Digital deceit (Logro digital).

Ficam a cada dia mais evidentes os riscos da apatia e da indiferença diante da desinformação – atitudes que parecem definir cada nova entrevista ou depoimento de Zuckerberg. Em contrapartida, aquilo que não passava de um movimento incipiente de refuseniks digitais como Ghosh passou a contar com adesões de maior relevo no mundo dos negócios, maior consistência acadêmica e maior apoio político. Dez dias antes da eleição de 2016, diante do que passava por sua frente no Facebook, o investidor Roger McNamce, um dos entusiastas da rede social desde o início, escreveu num e-mail a Zuckerberg: “Estou decepcionado. Estou envergonhado. Estou sem jeito. O Facebook fez recentemente coisas horríveis, e não posso mais desculpar seu comportamento. Está ajudando pessoas a fazer o mal. Tem o poder de parar esse mal. O que falta é incentivo”. Com o conhecimento de causa de quem foi um insider, McNamee se tornou outra voz eloquente nas críticas às gigantes digitais, elaboradas na forma de memórias em Zucked, publicado em 2019. Seu livro nem foi a maior bomba disparada por uma celebridade do Vale do Silício contra o Facebook. Em maio, Chris Hughes, cofundador da empresa e ex-colega de quarto de Zuckerberg na faculdade, assino uma revista do jornal The New York Times um artigo sem meias-palavras. “A influência de Mark é impressionante, muito além de qualquer um no setor privado ou no governo”, escreveu. “Ele controla as três plataformas de comunicação – Facebook, Instagram e WhatsApp – que bilhões usam todo dia. Estou decepcionado comigo mesmo e com a equipe pioneira do Facebook.” Hughes concluía com um alerta: “O governo deve disciplinar Mark”.

A ideia de quebrar empresas como Google, Amazon ou Facebook entrou na campanha eleitoral americana – e, naturalmente, gerou reação. Em outubro, Zuckerberg compareceu a um jantar reservado com Trump na Casa Branca, acompanhado do investidor Peter Thiel, integrante do conselho de administração do Facebook, defensor dos monopólios digitais e, exceção no Vale do Silício, trumpista de primeira hora. Além de ter mantido dois encontros com o presidente, Zuck abriu a agenda a personalidades da direita americana, fez acenos ao público conservador e tentou dissociar sua imagem dos democratas, majoritários no Vale e em toda a Califórnia. “Acredito que deva haver regulação de conteúdo nocivo, a questão é o tipo de modelo a adotar”, afirmou no início do ano. Citou dois modelos como referência: o dos jornais, responsáveis por tudo que publicam, e o das empresas de telecomunicações, que não respondem pelo que alguém diz nas linhas telefônicas. “Deveríamos estar num lugar intermediário”, afirmou Zuckerberg. Apesar da operação de relações públicas, foi atingido em cheio pelo decreto de Trump, que põe as redes no mesmo papel dos jornais. O estopim foi o Twitter, mas o alvo era o Facebook. Principal beneficiário do statu quo, que lhe permite mentir quanto quiser sem sanção, Trump está incomodado com os movimentos das redes para regular o discurso. Baixar um decreto que vai contra seu próprio interesse é uma forma de forçar Zuckerberg a voltar a repetir que “o Facebook não pode ser árbitro da verdade” e a recuar em qualquer movimento para tolhê-lo. Quando irromperam os protestos contra o assassinato de George Floyd, Zuck falou ao telefone com Trump e, ao contrário do Twitter, decidiu não intervir nos posts dele. A decisão chocou lideranças do movimento pelos direitos civis e até funcionários do Facebook. Na academia, o debate sobre a regulação reuniu polos antes antagônicos. A divergência está mais na natureza do que na necessidade de mais rigor. A solução radical seria quebrar as gigantes digitais em empresas menores, como os americanos fizeram com a Standard Oil em 2011 ou com a AT&T em 1982. O Facebook naturalmente é contra. “Cindir as empresas não resolverá temas como privacidade, interferência em eleições e conteúdo nocivo”, afirmou a empresa. “Separar diferentes serviços reduziria nossa habilidade e escala para lidar com desafios que enfrentamos.” Partidários da cisão, como o jurista Tim Wu, da Universidade Columbia, contestam o entendimento jurídico formulado por Richard Posner, da Universidade de Chicago, adotado em tribunais americanos desde os anos 1970. A essência da visão de Chicago é preservar a integridade de corporações monopolistas, desde que não haja dano comprovado ao consumidor, em particular aumento de preços (serviços digitais costumam ser grátis). Como Wu explica em The curse of bigness (A maldição do tamanho), a falta de competição gera outro dano: inibe inovações que trariam benefícios ainda desconhecidos. Voltar a separar Instagram e WhatsApp do Facebook permitiria aos usuários escolher entre serviços rivais.

Do outro lado, há quem, como Ghosh, discorde de Wu. No entender dele, as redes sociais podem representar aquilo que os economistas classificam como “monopólio natural”. Assim como não faz sentido construir outra rede de distribuição de água ou de eletricidade numa cidade, não faria sentido econômico ter dois fornecedores do serviço de rede social. Para evitar a concentração de poder, Ghosh afirmou que o recomendado não é necessariamente quebrar as empresas, mas antes submetê-las a normas rígidas de regulação e fiscalização.

É esse o espírito da nova lei que entrou em vigor no início do ano na Califórnia, baseada num princípio já adotado no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados da União Europeia (RGPD) e no Marco Civil da Internet do Brasil: a garantia da privacidade e transparência na coleta e no acesso a dados pessoais. Impor restrições às corporações digitais em defesa dos cidadãos é hoje uma exigência até mesmo de liberais da Universidade de Chicago, como o economista Luigi Zingales. A extensão das restrições, contudo, ainda desperta controvérsia. Ghosh defende regular três áreas:

1) TRANSPARÊNCIA – acesso em tempo real e armazenamento de informações sobre anúncios políticos (como no rádio e televisão); identificação de robôs e contas ciborgues (medida apelidada “Lei Blade Runner”); atribuição de responsabilidade por decisões tomadas por sistemas automáticos de inteligência artificial;

2) PRIVACIDADE – controle de acesso e remoção dos próprios dados nas mãos dos consumidores; transparência sobre o uso de tais dados; estabelecimento de uma autoridade reguladora com recursos para criar regras e fiscalizar;

3) CONCORRÊNCIA – supervisão robusta de fusões e aquisições das empresas digitais; reforma na legislação antitruste para garantir a regulação ágil para inovações digitais; garantia de portabilidade e interoperabilidade de dados entre serviços.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 24 DE JUNHO

O MILAGRE DA ENCARNAÇÃO DO VERBO

E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade, e vimos a sua glória, glória como do unigênito do Pai (João 1.14).

A palavra “Trindade” não aparece na Bíblia, mas sua realidade sim. Deus é uno e trino ao mesmo tempo. Há um só Deus que subsiste em três Pessoas da mesma substância: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Jesus é Deus. Ele não passou a existir quando se fez carne. Ele existe desde os tempos eternos; é o Pai da eternidade. O apóstolo João diz: No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus (v. 1). Jesus é o Verbo de Deus, e o Verbo é pessoal, eterno e divino. Esse mesmo Verbo se fez carne e habitou entre nós cheio de graça e de verdade. Aquele que nem os céus dos céus pode conter, esse se esvaziou e foi concebido pelo Espírito Santo no ventre de Maria. Nasceu numa manjedoura, foi enfaixado em panos e cresceu em sabedoria, estatura e graça diante de Deus e dos homens. O eterno entrou no tempo, o infinito tornou-se finito e o Deus transcendente vestiu-se de pele humana e desceu até nós, para nos resgatar da escravidão do pecado. Jesus desceu da glória, nasceu numa manjedoura, andou por toda a parte fazendo o bem, morreu numa cruz, mas ressuscitou e está assentado à direita de Deus Pai, de onde há de vir para julgar o mundo com justiça.

GESTÃO E CARREIRA

MAIS ESPAÇO E MAIS LAZER

Depois da quarentena, o perfil dos imóveis buscados não será o mesmo com o aumento da demanda por espaços maiores e home office

A experiência de trabalhar em casa e passar mais tempo na própria residência durante o período de quarentena já tem provocado mudanças no mercado imobiliário. Nos últimos meses, os clientes que buscam apartamentos para morar começaram a procurar outro perfil de imóvel na capital paulista e no Rio de Janeiro. Em vez de estúdios compactos, as pessoas passaram a dar preferência a imóveis com uma metragem maior e que tenham um quarto extra ou um espaço que possa ser transformado em home office. Além disso, cozinhas amplas – de preferência abertas para a sala, no estilo cozinha americana – também estão sendo mais buscadas do que antes.

É o que identificou uma pesquisa inédita da startup Loft feita com pouco mais de 1.300 clientes de sua plataforma online de vendas de imóveis. Segundo Mate Pencz, copresidente e fundador da Loft, a mudança nas preferências dos compradores faz parte de uma tendência de valorizar mais o lar e o bairro onde se vive, algo que tende a continuar depois da quarentena. ”Da mesma forma que houve um certo boom de apartamentos muito pequenos e de estúdios, haverá uma tendência na contramão, com apartamentos mais flexíveis, com home office, cozinhas abertas. A mudança vai ser relativamente rápida”, diz Pencz, que nasceu na Hungria, cresceu na Alemanha e se mudou para o Brasil em 2011 para empreender junto com o sócio Florian Hagenbuch.

De acordo com a pesquisa da empresa, 45% dos clientes entrevistados agora têm interesse em morar em um apartamento maior e 70% notaram a importância de ter espaço para um home office em casa. Praças e espaços de lazer no entorno dos prédios também estão sendo mais valorizados. Outro movimento, de acordo com Pencz, é a tendência de as pessoas terem mais liberdade para procurar um lugar para morar nos bairros de sua preferência, ainda que sejam mais afastados. Nesse sentido, a distância até o local de trabalho deixa de ser um fator determinante e outras características passam a pesar mais na decisão de compra. ”Depois da pandemia, vejo que as pessoas vão procurar os bairros que proporcionam uma qualidade de vida que faça sentido para elas naquele momento. Porque simplesmente o trajeto até o trabalho vai ser menos relevante”, afirma.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

OS (DOIS) CAMIMHOS PARA O BEM-ESTAR

Conhecer mais de uma direção melhora nossas chances de êxito quanto ao destino. Para a busca do bem-estar existem dois caminhos. Você os conhece?

Talvez seja um efeito desta época do ano, mas tenho pensando bastante nas transformações da maturidade. As ruins, sempre aos berros por atenção, obrigam-me ao olhar apreciativo na busca pelos benefícios, por aquilo que se conquista com o passar dos anos e que se situa para muito além dos espelhos. É como se a cada ano um novo aspecto positivo da maturidade me fosse revelado, despertando ainda mais meu interesse pela vida e, sobretudo, pelo que ela me reserva.

Foi nessa atmosfera que comecei a refletir sobre caminhos. Caminhos que se cruzam, se fecham, se abrem, se revelam e que, acima de tudo, se sobrepõem. Houve um tempo em que eu acreditei que os caminhos eram únicos. Quanto sofrimento vivido na tentativa de descobrir o “correto, o exato, o que me protegeria dos percalços, dos enganos, o que me conduziria num atalho rumo à verdade”.

Acreditar na existência de um caminho único é condenar-se a um mundo preto e branco no qual o erro se esconde à espreita de cada acerto descuidado que nos leva à ilusão do conhecimento.

Minha vida profissional foi repleta de escolhas por caminhos que julguei únicos e que, ao longo dos anos, revelaram-se a mim como meras possibilidades em direção a um mesmo fim: psicanálise ou terapia cognitiva? Situação clínica ou organizacional? E, mais recentemente, emoções positivas ou negativas?

É comum, por exemplo, que, a partir do discurso da Psicologia Positiva, acreditemos na promoção das coisas boas (emoções, atitudes etc.) como forma de melhorar o bem-estar. Mas se esse é um   caminho verdadeiro, vale dizer que ele não é o único. Talvez no início da Psicologia Positiva o fato de enfatizar esse caminho tenha sido apenas uma estratégia de marketing ou uma forma eficaz de se contrapor a uma então chamada “psicologia convencional” que promovia a eliminação da dor como forma de promover esse mesmo bem-estar. Mas, afinal, quando o assunto é a promoção do bem-estar, qual dos dois é o melhor caminho? A eliminação daquilo que não queremos em nossas   vidas ou a busca por aquilo que desejamos? Ambos. Ainda que sob a ótica da Psicologia Positiva, não é possível negarmos a necessidade de combatermos aquilo que nos faz mal: uma emoção, uma dor, um comportamento, um velho hábito, todos eles são uma espécie de “furo no casco” do barco que é a nossa própria vida. Nesse sentido, a metáfora do barco me parece bastante interessante.  Afinal, se a nossa vida fosse um barco, colocar uma jacuzzi nesse barco a fim de torná-lo mais agradável não teria sentido se, ao mesmo tempo, ignorássemos aquele furo no casco por meio do qual litros e litros d’água nos deixassem molhados até as canelas.

Não, não existe um caminho único. E quando o assunto é a promoção do bem-estar, podemos tanto combater aquilo que nos incomoda quanto promover aquilo que desejamos, de uma simples emoção positiva a uma nova atitude perante a vida.

A maturidade tem me ensinado sobre a multiplicidade dos caminhos. Ainda assim nem todos eles    são iguais: alguns são floridos, outros, cheios de espinhos. Alguns mais curtos, outros mais longos.  Mas se é bem verdade que os dois caminhos que aqui apresentei podem levá-lo à melhoria de seu bem-estar, recomendo que tome o mais curto – e florido – que é o da positividade.

LILIAN GRAZIANO – é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área.

graziano@psicologiapositiva.com.br

EU ACHO …

O CONTÁGIO DA COVID-19

Numa igreja de Washington, dos 61 participantes do coro, 53 foram infectados por um único cantor com sintomas da Covid-19. Em Cingapura, ocorreu um surto que infectou cerca de 800 trabalhadores migrantes, num dormitório. Surtos epidêmicos semelhantes foram descritos em shows musicais, frigoríficos, restaurantes, hospitais, prisões e em instituições de longa permanência para idosos, estabelecimentos que contribuíram com mais da metade das mortes nos países europeus e ao menos 30% das que aconteceram nos Estados Unidos.

Em artigo para a revista Science, Kai Kupferschmidt, analisou as epidemias dos coronavírus causadores da SARS e da MERS, que também se disseminaram principalmente entre os contatuantes. Entender as circunstâncias em que ocorrem essas infecções em grupo é crucial para reduzir seu impacto na disseminação do novo coronavírus. A discussão tem se concentrado no número médio de novas infecções que cada paciente é capaz de causar (R). Sem medidas de isolamento social, o R é, aproximadamente, igual a 3, isto é, cada infectado trans mite o vírus para mais 3.

O problema é que esse número traduz a média das novas infecções, mas na prática algumas pessoas transmitem mais, enquanto outras simplesmente não o fazem. O virologista Lloyd-Smith, da Universidade da Califórnia, afirma: “O padrão mais consistente é aquele em que o valor de R é igual a zero. A maioria das pessoas não transmite”.

Por essa razão, os epidemiologistas calculam o fator de dispersão (índice k), que caracteriza como a doença forma grupos (clusters) de infectados. Quanto mais baixo o k, menor é o número de transmissores do vírus. Gabriel Leung, da Universidade de Hong Kong, defende que o novo coronavírus provoca uma concentração de clusters sugestiva de que um pequeno número de “supertransmissores” seja responsável por grande parte das infecções. Há estimativas de que apenas 10% dos infectados sejam responsáveis por 80% das transmissões. Essa heterogeneidade explicaria por que a doença não se espalhou pelo mundo imediatamente depois dos primeiros casos na China.

Não está clara a razão pela qual os coronavírus formam esses clusters de infectados. É possível que esteja ligada não só à concentração viral nas gotículas eliminadas ao falar, tossir ou espirrar, mas à capacidade de formar aerossóis que podem permanecer dispersos no ar o tempo suficiente para provocar infecções múltiplas. Em vários dos clusters descritos, as transmissões parecem estar ligadas a esses aerossóis.

Caraterísticas individuais ajudam a explicar a existência de supertransmissores. Um estudo de 2019, conduzido entre pessoas saudáveis, mostrou que algumas eliminam mais gotículas enquanto falam (provavelmente, por falar mais alto), e que cantar libera mais gotículas. O comportamento também influencia, na medida em que a falta de higiene das mãos, lugares fechados e os contatos sociais aumentam a probabilidade de transmissão.

**DRAUZIO VARELLA

OUTROS OLHARES

A PROLIFERAÇÃO DOS TESTES

Depois de semanas em que era quase impossível conseguir agendar um exame, agora há uma profusão deles – nem todos confiáveis

À medida que crescem os casos de contágio de coronavírus e de mortes pela Covid-19, aumenta também a oferta de testes para detectar a doença. No estágio atual da pandemia no Brasil, quando muitas cidades apresentam planos de flexibilização da quarentena, essa alta da capacidade de testagem é uma ótima notícia. Até o começo de junho, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tinha concedido registro a 134 testes — 106 deles importados, a maioria de países asiáticos, onde a pandemia começou. Há um mês e meio, o número era um terço disso. Se somados os pedidos em análise e os negados, a Anvisa já recebeu cerca de 450 solicitações.

A expansão da oferta por várias empresas é bem-vinda porque nenhuma sozinha teria condições de abastecer totalmente o mercado. “Essa é uma doença nova, não existia um diagnóstico e até hoje não há um medicamento específico ou vacina. Então é natural que a indústria tenha se mobilizado para desenvolver os testes e natural que fosse aumentar a concorrência”, explicou Priscilla Franklin Martins, diretora executiva da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed).

A questão é que, como em todo mercado, no de testes há diferentes produtos com distintos níveis de qualidade e eficácia. A Abramed já recebeu denúncias de quiosques para testagem duvidosa em postos de gasolina, de testes piratas e até de farmácia que vendia exame para a pessoa levar para fazer em casa, como se fosse teste de gravidez (a leitura para o chamado sars-CoV-2, designação do novo coronavírus, é bem mais complexa do que um ou dois tracinhos). Além disso, não raro o público leigo, que já lida com medo e desinformação sobre o novo coronavírus, se vê perdido em meio à variedade de testes possíveis e às diferentes indicações, que variam de acordo com o tempo de sintomas ou de contato com uma pessoa infectada.

Especialistas são unânimes em dizer que é preciso testar a população. Mas com o teste certo. “Mais importante do que ter muitos testes é ter aqueles que forneçam informação adequada. A aplicação indiscriminada de testes sem qualidade deve ser uma preocupação”, alertou José Luiz Gomes do Amaral, presidente da Associação Paulista de Medicina (APM).

Os exames oferecidos comercialmente hoje no Brasil para Covid-19 se dividem em dois universos. O primeiro são os chamados testes moleculares, que detectam a presença direta do vírus no organismo. O principal é o chamado teste RT-PCR, ou PCR em tempo real, que usa amostras colhidas das vias respiratórias do paciente com uma espécie de cotonete. Foi com essa técnica, por exemplo, que médicos do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, depois de pesquisar em laboratório métodos de teste para identificar o novo coronavírus, chegaram ao diagnóstico do primeiro paciente confirmado com Covid-19 no país, noticiado em 26 de fevereiro. É um exame apurado e preciso, mas que também exige estrutura física e tecnológica específica, além de reagentes importados — o que gerou limitações de expansão no momento em que havia uma corrida mundial pela compra desses insumos de testagem.

Com a disseminação dos casos no Brasil, e considerando que o PCR não seria aplicado em massa por causa de complexidade, custo da tecnologia e necessidade de insumos específicos, abriu-se espaço para outro grupo de testes, os chamados testes de anticorpos. São exames sorológicos, isto é, por meio de um exame de sangue, o laboratório analisa se o paciente teve contato com o novo coronavírus não pela presença do vírus, mas de anticorpos produzidos pelo organismo a partir do contato com ele. É um método mais barato e acessível, embora considerado de menor sensibilidade e especificidade. Entram também nesse grupo os chamados testes rápidos. A análise de anticorpos é feita com o sangue de uma “furadinha” na ponta do dedo. São ainda mais velozes — os resultados podem ser lidos em 15 minutos —, mas também mais imprecisos: a quantidade de falsos negativos é maior em comparação aos testes moleculares e exigem profissionais treinados para a interpretação dos resultados.

A questão-chave para entender a diferença entre os testes disponíveis para Covid-19, porém, é compreender que as indicações são distintas. Os testes moleculares são indicados para identificar infecção ativa. Se a pessoa teve contato com o vírus há poucos dias e começou a apresentar sintomas, faz o teste molecular. Os testes sorológicos são mais indicados para apontar se a pessoa já teve contato com o vírus e se desenvolveu anticorpos. Por isso, precisam ser feitos passado mais tempo do surgimento de sintomas, com 14 dias ou mais de intervalo.

No caso dos testes rápidos, a janela para testagem costuma ser entre o sétimo e o décimo dia. São os testes que podem orientar as autoridades, por exemplo, no entendimento do alcance e da disseminação da doença entre a população. Desde o início da epidemia no país, o governo federal comprou milhares desses testes, importados, com prioridade para testagem de profissionais de saúde e agentes de segurança. Antes de serem distribuídos, os testes passaram por análise pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), da Fiocruz.

Por um lado, ganha força o desenvolvimento de novos testes moleculares, que analisam a presença do vírus, mas com métodos diferentes do PCR. Na segunda quinzena de junho, o Einstein começará a aplicar um método de sequenciamento genético de nova geração do novo coronavírus. A tecnologia foi desenvolvida em dois meses dentro do próprio hospital, que aproveitou a ociosidade de máquinas de diagnóstico de outras doenças — sua utilização havia caído pela metade com a atual pandemia. “Nessa necessidade de aumentar a capacidade de testagem, começamos a buscar métodos alternativos que não os tradicionais em testes moleculares. Nosso olhar se voltou para máquinas de medicina de precisão, usadas normalmente para testes de genoma, prevenção de risco de câncer, testes farmacogenéticos etc., que estavam ociosas no laboratório. E resolvemos aplicar essa tecnologia para sequenciar pedaços do genoma do novo coronavírus”, explicou Cristóvão Mangueira, diretor do Departamento de Patologia Clínica do Einstein.

O teste sequencia fragmentos do RNA do novo coronavírus, em um método parecido com o do PCR, mas com outros equipamentos. Segundo os responsáveis, é ainda mais ágil no processamento das amostras. “Como ele processa até 1.500 amostras simultaneamente, com especificidade de 100%, consegue baixar muito o custo do exame”, acrescentou. Já no campo dos testes sorológicos, a corrida tem sido por aumentar a especificidade dos exames para identificar o novo coronavírus, detectar a carga viral e evitar falsos negativos. A sensibilidade para diagnóstico de sars-CoV-2 varia muito entre os testes disponíveis no mercado. A expansão dos sorológicos também coincide com o fato de que, por serem uma tecnologia mais acessível, são considerados os de maior custo-benefício para autoridades e empresas quando se fala em testar milhares de pessoas na discussão de retomada de atividades no país. O exame pode ajudar a identificar quem já desenvolveu certo nível de imunidade e poderia retornar ao trabalho — embora não seja consenso entre especialistas a discussão sobre um “passaporte de imunidade” em uma doença nova e com estudos sobre relatos de reinfecção.

“O Brasil ainda está atrás na testagem em comparação a outros países. E é fundamental, para uma volta à vida normal, ter um raio X de como estamos em termos de contaminação e geração de anticorpos. Isso passa por aumentar a testagem, educar sobre protocolos”, disse o presidente da Roche Diagnóstica no Brasil, Antônio Vergara. A empresa é uma das que acabam de conseguir aprovação da Anvisa para comercializar um novo teste sorológico para Covid-19. Realizado por coleta de sangue, o exame detecta a presença de anticorpos (os chamados IgM e IgG) para o novo coronavírus.

Os testes sorológicos são os que mais demandam pedidos de regulação atualmente na Anvisa. A agência diz que tem priorizado a agilidade na análise das solicitações. Mas nem todas passam por ela. É possível encontrar hoje, no país, produtos que tenham sido importados e adquiridos de acordo com uma lei surgida à luz da pandemia que autorizou a importação de produtos sujeitos à vigilância sanitária de forma excepcional e temporária — e desde que tenham sido registrados por uma autoridade sanitária estrangeira e estejam previstos em ato do Ministério da Saúde.

É apenas o primeiro passo para uma utilização segura. Depois do registro, cabe a laboratórios comprovar a validação e eficácia do teste. O Grupo Fleury, por exemplo, testou mais de dez marcas registradas de testes sorológicos até se decidir por qual usaria. E, recentemente, desenvolveu com tecnologia própria um método de teste molecular, que usa reagentes diferentes do PCR, e com foco em testagem em áreas remotas do país. “O RNA é uma molécula frágil, delicada. Temos de pegar o material do paciente, manter em temperatura baixa até chegar ao laboratório e realizar o teste. Se demorar muito, o material pode se danificar e testar falso negativo, ou ser inconclusivo. O que fizemos então foi desenvolver um teste que detecta outra parte do vírus, mais estável, que aguenta melhor variações de temperatura e tempo”, explicou o infectologista Celso Granato, diretor clínico do Grupo Fleury. A ideia é que o teste seja aplicado fora de grandes centros como Rio de Janeiro ou São Paulo, onde as facilidades para testagem estão acima da média da realidade brasileira. “Não é um exame criado para competir com o PCR. É para viabilizar que determinadas áreas do Brasil possam testar suas populações”, completou.

Novos testes continuarão surgindo, à medida que a doença não arrefece. “Partindo do pressuposto de que são validados em relação à eficácia, nenhum teste é ruim, sejam PCR ou sorológicos. Mas é preciso cautela. E entender a indicação e o período em que os testes devem ser feitos”, concluiu Priscilla Martins, da Abramed. A associação lançou recentemente um programa próprio de validação de testes. Também recomenda, a empresas que optam pelos sorológicos para seus funcionários, que busquem parcerias com laboratórios e profissionais qualificados para uma utilização segura. O mesmo vale para o público em geral. “A melhor pessoa para definir o teste a fazer é o médico. É ele quem tem autonomia para prescrever o exame a partir da conversa com o paciente, do entendimento dos sintomas e do tempo de contato”, disse Martins.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 23 DE JUNHO

TEMPERAMENTO CONTROLADO PELO ESPÍRITO

Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira (Efésios 4.26).

O nosso maior problema não é com a ação, mas com a reação. Podemos conviver pacificamente com alguém quando somos respeitados. Mas como reagimos quando somos insultados? O rei Salomão adverte: A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira (Provérbios 15.1). Note que Salomão não diz que a palavra branda desvia o furor, mas que a resposta branda o faz. Nesse caso, a pessoa que dá a resposta já foi agredida e insultada. Uma lei da física determina: “Toda ação provoca uma reação igual e contrária”. Essa lei da física não pode governar nossa vida espiritual. Não somos seres automatizados. Não somos governados por nosso temperamento, prontos a reagir com a mesma veemência que a ação chegou até nós. Não podemos pagar o mal com o mal. Não podemos falar mal daqueles que falam mal de nós. Jesus nos ensinou que, se alguém nos ferir uma face, devemos voltar a outra face. Se alguém nos forçar a andar uma milha, devemos caminhar duas. Se alguém nos tomar a túnica, devemos dar também a capa. Jesus não está falando de ação, mas de reação. Quando nosso temperamento é controlado pelo Espírito, podemos ter reações transcendentais. Podemos ter o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus. Podemos dar respostas brandas àqueles que nos insultam com palavras rudes. Podemos abençoar aqueles que nos amaldiçoam. Podemos orar por aqueles que nos perseguem. Podemos vencer o mal com o bem.

GESTÃO E CARREIRA

OS ABUTRES ESTÃO CHEGANDO

Com o aumento da inadimplência e das recuperações judiciais, fundos especializados em ativos estressados se preparam para atacar os ativos de empresas brasileiras

Crises costumam deixar os mercados de fusões e aquisições em polvorosa. No Brasil, a Covid-19 produz um efeito potencializado, uma vez que o desempenho econômico tem sido sofrível desde 2014. Em meio a esse cenário adverso, um grupo bem específico de investidores saiu à caça de empresas agonizantes, mas com condições de se recuperar. São os chamados fundos abutres, que compram participação em companhias ou ativos de dívidas a um valor irrisório, em troca de mantê-las de pé. A oferta é tão grande que até empresas desesperadas por liquidez têm buscado tais fundos. “Geralmente somos nós que vamos atrás de oportunidades de compra, mas nos últimos 100 dias o meu telefone não parou de tocar”, diz um funcionário da Canvas Capital, uma gestora especializada naquilo que costuma ser chamado de mercado de ativos estressados (ou distressed, em inglês).

A dinâmica desse tipo de investimento é regida por uma tese clássica desse setor, simbolizada pela letra “U”: em momentos de crise os preços dos ativos caem, tornando-se boas oportunidades de compra, e sobem no longo prazo, com a estabilização da economia. Esses fundos e investidores famintos se relacionam com bancos, governos, gestoras de crédito e principalmente com o sistema judiciário, por onde tramitam os processos de recuperações e falências. Em geral, buscam empresas que precisam de dinheiro rápido. Foi esse tipo de acesso que permitiu ao economista Guilherme Ferreira abrir a plataforma digital Jive, uma investidora em empresas claudicantes. Ferreira trabalhava no Lehman Brothers, em Nova York, até que a crise do subprime de 2008 levou o banco à falência. Com os recursos que tinha, a Jive comprou uma carteira com créditos podres de empresas brasileiras por cerca de 3,2% de seu valor original. A partir de 2011, com a retomada da economia, recuperou o valor da carteira.

A compra de dívidas, chamada de securitização, é a principal forma de atuação desses fundos. E, para eles, 2020 é um ano de abundância. Segundo cálculos da Jive, o total de dívida corporativa que deixará de ser paga neste ano dobrou desde junho de 2019. Com a pandemia do coronavírus, os fundos abutres têm demonstrado peculiar apetite na aquisição de nacos (ou a totalidade, se convier) de empresas em setores competitivos, mas fortemente impactados pela crise, como rodovias, aéreas, sucroalcooleiras, educação e turismo. A Serasa Experian estima que será registrado um número recorde de pedidos de recuperação judicial em 2020, acima dos 1.863 casos em 2016, criando o banquete perfeito para esses fundos. E, com a queda abissal da Selic, reduzida para 2,25% ao ano na quarta-feira 17 pelo Comitê de Política Monetária, os abutres estão recebendo grandes fluxos de recursos de investidores que não querem mais a baixa rentabilidade do Tesouro. “Os fundos estão com seus caixas reforçados e prontos para as oportunidades,” diz Carlos Priolli, sócio do escritório Alvarez & Marsal. Recentemente, o fundo Latache, comandado por Renato Azevedo, fez uma operação que chamou a atenção dos principais agentes desse mercado.

A gestora comprou, em maio, uma participação indireta de 50% da Concessionária Rodovias do Tietê, de propriedade dos grupos Bertin e Atlantia. De acordo com fontes ouvidas, não houve custo de aquisição para a Latache, porque o fundo assumiu os passivos e as obrigações de investimento. Após a crise de 2014, muitos fundos compraram participações em empresas brasileiras quebradas, como é o caso do americano Lone Star e da gestora Castlelake, que concederam um empréstimo milionário em 2017 para a Atvos, braço de etanol da Odebrecht. Hoje há uma grande briga na Justiça para assumir o controle da empresa. Um executivo envolvido na transação explica que experiências como essa traumatizaram os fundos internacionais porque a Justiça brasileira é vista como lenta e muito favorável aos devedores. A avaliação é que, enquanto o processo se desenrola, a empresa comprada se desvalorizou nos últimos três anos. “Hoje a posição da Lone Star, que opera 90 bilhões de dólares no mundo, é resolver esse problema e provavelmente nunca mais olhar para o Brasil”, diz o executivo. Evidentemente, é um negócio que tem seus riscos. Apesar dos sobressaltos, corra e olhe o céu: os abutres já despontam acima da nossa cabeça.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

A QUÍMICA DA TEIMOSIA

Novo estudo identifica os processos neurais que dificultam mudanças de opinião depois que uma ideia se cristaliza no cérebro (e haja dificuldade para mudá-la)

Poucas rivalidades na história do capitalismo – e certamente nenhuma na indústria da tecnologia – foram tão intensas, divertidas e fecundas quanto a que marcou a trajetória de Bill Gates, fundador da Microsoft, e Steve Jobs (1955-2011), criador da Apple. Durante pelo menos três décadas, os dois gênios transitaram entre os campos do antagonismo profissional e da inveja pessoal pura e simples, disputando o domínio do mercado e a reverência da sociedade, enquanto a corrida tecnológica fervilhava. Eles não poderiam ser mais diferentes. Gates era um nerd tímido. Jobs, um hippie contestador. Cada um ao seu modo, influenciaram milhões de pessoas e acabaram, mesmo que sem a intenção, transferindo a oposição entre eles para os fãs. No decorrer dos anos 1990 e 2000, no auge da rivalidade, os applemaníacos torciam o nariz para qualquer lançamento da Microsoft. No outro lado do ringue, os admiradores de Gates desprezavam os produtos da empresa da maçã. Os dois grupos jamais mudariam de opinião, mesmo se estivessem diante de uma grande obra: na cabeça deles, estava nitidamente cristalizada a ideia de que, se a Apple era boa, a Microsoft deveria necessariamente ser ruim – e vice-versa. De maneira simplificada, essa visão de mundo poderia ser traduzida como uma típica teimosia.

Um estudo publicado pela revista científica britânica Nature e conduzido por pesquisadores da University College London apontou, pela primeira vez, os processos neurais que levam à dificuldade de mudança de opinião depois que um conceito se solidifica no cérebro. Não seria exagero afirmar, portanto, que os cientistas descobriam o que está por trás do cabeça-dura, aquele sujeito que jamais altera seu ponto de vista, mesmo se todas as evidências mostrarem o contrário do que ele pensa. No estudo, 75 voluntários precisavam decidir se uma nuvem de pontos pretos estava se movendo para a esquerda ou para a direita. Depois, eles indicaram até que ponto estavam seguros sobre aquela escolha. Na sequência, os participantes receberam mais informações sobre os pontos pretos, que deixaram mais claro qual era a direção correta. Contudo, aqueles que indicaram níveis mais altos de confiança sobre a primeira decisão não absorveram os dados adicionais que poderiam corrigir um erro de avaliação – reação conhecida como “viés de confirmação”. Com um scanner de magneto encefalografia, os pesquisadores acompanharam a atividade cerebral durante o processo de tomada de decisões. A explicação para o comportamento se tornou química: o cérebro apresentou “pontos cegos” quando recebeu informações contraditórias, mas continuou sensível àquelas que confirmavam a escolha inicial.

A pesquisa se diferencia por demonstrar que o viés de confirmação existe até mesmo no caso de uma atividade extremamente simples, como acompanhar pontos pretos na tela de um computador, de acordo com o psicólogo e neurocientista Max Rollwage, o principal autor do estudo. “A falta de elementos complexos, como ideologias e relações afetivas, mostra que o processo é central dentro de um mecanismo muito básico”, disse ele. Em situ ações mais abrangentes, como a maneira de as pessoas interpretarem informações sobre a pandemia da Covid-19, por exemplo, pode ser ainda mais difícil mudar de opinião. “Evidências científicas sobre o coronavírus evoluem rapidamente e é preciso absorver as atualizações e mudar comportamentos e crenças de acordo com as novas constatações”, afirma o especialista. Nesse caso, portanto, os conceitos preestabelecidos estão tão arraigados no cérebro que o indivíduo resiste a absorver percepções diferentes.

A psicologia do comportamento humano é descrita há muito tempo na literatura universal e desde os anos 1960 existem relevantes estudos científicos sobre o assunto. A novidade agora é que os pesquisadores conseguiram esclarecer de que forma a química da teimosia se manifesta na mente. ”Até o nosso estudo, uma das hipóteses era que as pessoas recebiam informações conflitantes, mas poderiam escolher desprezá-las”, diz Rollwage. “Com a avaliação dos mecanismos neurais, mostramos que, em determinado ponto de confiança sobre uma crença, o cérebro simplesmente não processa as novas informações.” Isso pode explicar por que os negacionistas do aquecimento global mantêm suas convicções apesar dos cada vez mais irrefutáveis argumentos científicos, ou por que os terraplanistas sustentam que a Terra não é redonda apesar das estonteantes imagens de satélites que confirmam, evidentemente, que o planeta é uma imensa bola azul. Lógica idêntica ajuda a entender, na política, os motivos para a polarização radical, que não cede espaço a visões mais moderadas. Mesmo se houver provas em contrário – denúncias de corrupção, flertes com o autoritarismo – os cabeças-duras não abandonam seus políticos de estimação, sejam eles de direita ou de esquerda.

Os conceitos estabelecidos por grupos sociais são ainda mais difíceis de mudar. “A característica fundamental do ser humano é formar coletivos”, diz Paulo Boggio, psicólogo e coordenador do Laboratório de Neurociência Cognitiva e Social da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Dentro dos grupos, diz Boggio, a ideia de sobrevivência e a aproximação com aqueles similares a nós levam as pessoas a pensar de maneira parecida. Com o passar do tempo, as convicções semelhantes são reforçadas em conjunto e acabam se tornando pilares complicados de derrubar. É exatamente esse mecanismo que alimenta as torcidas de futebol, com o seu fanatismo que muitas vezes resulta no ódio ao rival (e, infelizmente, em cenas de violência). O mesmo conceito está por trás de grupos extremistas, radicais religiosos e facções de todos os tipos, incapazes de compreender ou ao menos escutar o outro. Com o cérebro programado por ideias preconcebidas, os integrantes dessas comunidades são impermeáveis a mudanças de comportamento.

Nem sempre, porém, é possível estabelecer uma resposta certa ou errada para muitas questões. Nas sociedades livres, a diversidade de opiniões e o debate entre pessoas que pensam de forma diferente são a maneira de chegar a um consenso e evoluirem pontos divergentes. Também é preciso dizer que, desde que uma ideia não provoque danos a princípios civilizatórios, ela pode ser defendida até o fim. Não são raras as ocasiões em que a teimosia demonstra seu valor. A inglesa J.K. Rowling, autora da saga Harry Potter, teve seus originais rejeitados por doze editoras antes de se tornar uma recordista em vendas de livros. Grandes gênios da inovação igualmente sofreram com o desdém de outros e, não fosse a irredutível obstinação, produtos como o iPhone, de Steve Jobs, ou o Windows, da Microsoft, talvez ficassem pelo caminho. Sem a insistência típica dos vencedores e a sequência de erros e acertos que constitui a construção do pensamento científico, o mundo certamente seria um lugar pior. A teimosia, porém, não faz sentido quando sustenta convicções comprovadamente equivocadas. Por mais que o cabeça-dura não acredite, a Terra é redonda, o planeta está aquecendo e Jobs e Gates produziram obras extraordinárias.

EXEMPLO BIZARRO DE CABEÇA-DURA

Protagonista de A Terra É Plana, documentário da Netflix, o americano Mark Sargent é um caso extremo (e equivocado) de pessoa que insiste em suas crenças e não muda de opinião. Apesar de todas as evidências, ele continua defendendo o terraplanismo.

A missão tripulada SpaceX transmitiu da órbita da Terra novas imagens do planeta – e ele é redondo. Como duvidar de uma evidência como essa? Você chama de evidência, eu chamo de péssimo teatro. Os Estados Unidos estão fazendo filmes há anos, inclusive vários ambientados no espaço, como 2001: uma Odisseia no Espaço, de 1968. Esse filme foi feito um ano antes de a Apollo 11 supostamente pousar na Lua. Nós não acreditamos na SpaceX. Nós nem a levamos a sério.

Também duvida que o foguete levantou voo em Cabo Canaveral? O lançamento do foguete é real, mas ele não sobe em linha reta.

Os terraplanistas dizem que “eles” querem esconder a verdade. Quem são eles? Se você perguntar para as pessoas que acreditam em conspirações quais são os dez grupos mais atuantes, elas dirão alguns nomes como a família Rothschlld, o Vaticano e a Maçonaria.

Como a Terra pode ser plana? A ciência diz que estamos nesta pequena rocha coberta com um pouco de água e fumaça, voando pelo espaço em diversas direções e velocidades. Não é diferente de um estúdio de Hollywood, só que muito maior. Algo parecido com aquele cenário do filme O Show de Truman. Tudo o que você vê no teto, em cima de nós, como as estrelas, os planetas, o Sol e a Lua, são apenas imagens no céu.

Ao questionar a ciência, não teme incentivar as pessoas a duvidar de coisas Importantes como a eficiência das vacinas? Essa pergunta é uma pegadinha. Sim, vacinas são importantes, mas as empresas que fazem as vacinas ganham muito dinheiro.

EU ACHO …

RACISMO À BRASILEIRA

Menos explícita, não menos perversa, a discriminação no país exibe a secular força dos senhores

O assassinato de George Floyd em Minneapolis serviu de gatilho para um a série de protestos em cidades dos EUA. Anos atrás, a morte do jovem negro Michael Brown, de apenas 18 anos, atingido em plena luz do dia por seis tiros disparados por um policial branco da cidade de Ferguson, no estado do Missouri, também tomou o país, transformando-o em um grande palco da luta racial.

Os protestos, na oportunidade, foram similares aos que acontecem agora, tendo início no local em que ocorreu a violência policial e ampliando-se para outras dezenas de cidades e estados dos Estados Unidos, causando grande repercussão internacional. Enquanto isso, no Brasil, um conjunto de outros casos semelhantes, como o do garoto João Pedro, de 14 anos, baleado no Complexo do Salgueiro, no Rio de Janeiro, não cria tamanha revolta popular, restringindo manifestações a grupos de ativistas e mantendo silenciosa a maioria absoluta da sociedade.

O que leva essas manifestações a acontecerem com tanta potência por lá e não alcançarem aqui a mesma comoção? Em princípio, é preciso pontuar as diferenças sociais entre os dois países, principalmente a forma de manifestação do racismo nas duas sociedades e a construção histórica desses formatos de discriminação.

Nos Estados Unidos, as violências raciais apresentam-se de formas muito mais diretas e contundentes – embora lá haja mais “permissões” do racismo sistêmico para que negros alcancem maiores níveis econômicos, marcadamente na música ou no esporte. Aqui, apesar de não ser menos violento o racismo, ele se apresenta de formas engenhosas, menos explícitas, adotando feições que o fazem ser escamoteado.

No geral, nas metrópoles brasileiras, o racismo dificilmente será manifestado com xingamentos violentos, como pode ocorrer em Nova York. Contudo, excluirá negros e negras da educação, do direito à saúde, à moradia, às terras e a uma série de instrumentos de bem-estar social. Fará com que sofram restrições, estejam em posições subalternizadas e os destinará à pobreza. Percurso inverso dos brancos brasileiros.

A abolição formal e inacabada do escravismo no Brasil fincou-se no abandono socioeconômico da população negra “liberta”. Parlamentares abolicionistas, entre eles o engenheiro negro André Rebouças, pautaram à época que, juntamente com a proibição do trabalho escravo, ocorresse reforma agrária em reparação à população negra, o que, como sabemos, não ocorreu até hoje, 132 anos após o “fim” da escravatura. A ausência de terra enquanto sinônimo de riqueza monetizada, apartou a população negra dos benefícios econômicos gerados pelo próprio trabalho.

Essa negação à ascensão econômica e social, que inclui todos os direitos aviltados dessa população, mitiga a capacidade do negro brasileiro em ecoar e comunicar o “racismo à brasileira”. Essa menor reverberação do racismo ocorrido no Brasil sinaliza que o capital branco-burguês opera de forma potente e perversa para silenciar os crimes por ele cometido – muito embora as estatísticas indiquem diferenças inversas em relação à dicotomia racista brasileira e estadunidense.

Os autores Frank Edwards, Hedwig Lee e Michael Esposito demonstram que a possibilidade de um homem negro ser atingido pela polícia, nos Estado Unidos, é 2,5 vezes maior daquela de um homem branco. No Brasil, os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública informam que esse risco é cinco vezes maior. Esses números demonstram a importância de assinalar que o racismo é um conceito atrelado a uma relação de poder. Cria cenários sociais de constrangimentos e vulnerabilidades para os negros e de poder e segurança para os brancos. Ao passo que vivemos um processo de sistemática Negação do racismo, considerando que, por aqui, convencionou-se tratar as desigualdades raciais como uma questão social, estratégia que dá conta de ilustrar a fina sofisticação do racismo no Brasil. A disseminada ideia do racismo cordial e da miscigenação das raças dilacera a perspectiva identitária racial no País.

Do outro lado dessa dicotomia, nos Estados Unidos, devemos lembrar que, logo após a Guerra de Secessão, ou Guerra Civil Americana, as tropas federais estacionaram nos estados do Sul para que a aristocracia branca não voltasse a escravizar os negros, até que se oficializasse a decisão de implantar o sistema de Apartheid, momento que fundou parte da identidade e da ideia de unidade nacional estadunidense, pois a oficialização da segregação racial permitiu unificar os brancos do Norte e do Sul.

Na sequência, em 1896, no caso Plessy vs. Ferguson, a Suprema Corte tomou uma decisão que originou a doutrina jurídica da lei constitucional dos Estados Unidos, denominada “Separados, mas “iguais”, que permitiu a segregação racial naquele país, desde que não se configurasse violação da 14ª Emenda, que garantia proteção e direitos civis iguais a todos os seus cidadãos.

No Brasil, os adventos da República e do “fim” da escravidão foram marcados por uma elite nacional usando de desfaçatez e ocultamento para tratar a questão dos libertos, manipulando a construção de conceitos de brasilidade, cordialidade e miscigenação, que ocultavam princípios de eugenia ancorados no que se viu elaborado, depois, como racismo científico. Tudo isso foi estratégia para mudar o regime de escravatura, mantendo a opressão sobre corpos negros. Além disso, o citado pós-abolicionismo sem garantias de direitos criou um abismo entre a população negra e a igualdade, que a democracia deveria garantir como básico.

A herança escravocrata vem se perpetuando pela história, sem reestruturação ou reparação. A fragilidade de nossas instituições tem raiz no período colonial, quando eram fortes apenas na metrópole. Nossa história foi sempre contada a partir das referências europeias. O Brasil nunca existiu enquanto nação. Somos apenas um esboço não terminado. A população negra, nesse contexto, é a base de exploração do capitalismo. Nossos corpos valem tanto quanto uma peça de máquina de fábrica. Se quebrar, o patrão repõe por outra, sem se importar em descartar a usada.

Por fim, o racismo em países do capitalismo periférico tem ainda mais força justamente pela forma cheia de desfaçatez que se apresenta. E aqui “a vida valerá sempre menos”. Logo, a morte de um brasileiro constitui-se como um “crime perfeito” e valerá sempre menos que a de um norte-americano ou europeu, mesmo que ele seja preto. Somos periferia, enquanto projeto de nação.

MARCOS REZENDE – é historiador, mestre em Desenvolvimento e Gestão Social pela UFBA e coordenador do Coletivo de Entidades Negras (CEN)

OUTROS OLHARES

FALÊNCIA DAS ESCOLAS

A redução nas receitas vira um desafio para as escolas públicas e privadas. Alunos e pais também são prejudicados com menos conteúdo e mensalidades que não diminuíram

O impacto da Covid-19 nas finanças de escolas privadas e públicas revela a fragilidade do sistema de ensino brasileiro, mostram diferentes pesquisas. Estudo da ONG Todos pela Educação e do Instituto Unibanco sobre despesas e receitas em 22 redes de educação estaduais — compreendendo 95% das unidades do País — revela perda estimada em até R$ 28 bilhões neste ano. O montante vai depender do resultado da arrecadação de tributos vinculados à manutenção e ao desenvolvimento da Educação, basicamente ICMS e ISS, além de fundos municipais e estaduais. Além disso, os gastos adicionais com adaptação das unidades ao ensino à distância já somam quase R$ 2 bilhões.

Outro estudo, feito pela startup de análise de dados Explora, mostra que 50% das famílias com filhos matriculados em instituições privadas de pequeno e médio porte não serão capazes de manter seus filhos na escola se a situação atual de pandemia permanecer. “Metade das crianças matriculadas deixarão de estudar em escolas privadas e buscarão uma vaga no ensino público”, avalia Tadeu da Ponte, professor do Insper e criador da Explora. “A escola pública não tem como absorver os novos alunos. Já seria uma situação incompatível mesmo sem a perda na arrecadação”, alerta. Alguns pais se queixam que precisam manter as despesas altas com educação mesmo que as aulas dos filhos tenham se tornado virtuais e com carga horária reduzida. Os alunos também vivem um momento de incerteza, já que precisam se adaptar e não sabem como se concluirá o ciclo escolar. E as escolas também vivem um desafio. Entre as 482 escolas privadas de pequeno e médio porte pesquisadas pela Explora, em 83 cidades do País, a receita média caiu 52% com a pandemia. “Estamos usando recursos próprios para sobreviver e mantendo uma relação aberta e clara com as famílias, negociando tudo que é possível”, disse Renata Leone, dona e diretora da Criar-Te, berçário e escola de educação infantil. Há 28 anos na capital paulista, a instituição perdeu apenas três alunos, mas luta contra as despesas que não diminuíram. “Famílias e escolas não são inimigas, ambas somos vítimas dessa situação”, avalia Renata.

SEM DIÁLOGO

No Rio, a ADM Máster, escola tradicional do Méier, já pediu empréstimo ao BNDES para honrar a folha de pagamento dos professores e funcionários. “Estamos todos com problemas, então seria um tiro no pé dizer ‘não’ aos pais que buscam descontos nas mensalidades”, disse a diretora pedagógica Adriana Leite Silveira. “Passamos 24 horas por dia renegociando.” Um consultor do setor imobiliário, que pediu para não ser identificado, entrou na Justiça contra a escola do filho, uma instituição tradicional em São Paulo. “Como perdi renda, solicitei um desconto, mas eles se recusam a conversar. Falta bom senso. Uma coisa é não querer pagar, outra é não poder pagar.”

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 22 DE JUNHO

O FULGOR DA NOVA JERUSALÉM

… Vem, mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro (Apocalipse 21.9b).

O apóstolo João foi chamado para ver a Noiva do Cordeiro, a Cidade Santa, a Nova Jerusalém. A figura da noiva e da cidade se inter-relacionam. Essa cidade gloriosa tem características singulares. Primeiro, é bonita por fora, pois a glória de Deus esparge sua luz sobre ela. Segundo, é bonita por dentro, pois no seu fundamento há doze tipos de pedras preciosas. Terceiro, é edificada sobre o fundamento dos apóstolos, ou seja, sua estrutura repousa sobre a verdade de Deus. Quarto, sua praça é de ouro puro, como de cristal transparente, ou seja, nela não há nada poluído. Quinto, é uma cidade aberta a todos, pois há portas desobstruídas para o norte e para o sul, para o leste e para o oeste. Na cidade santa entrarão aqueles que procedem de toda a tribo, povo, língua e nação. Sexto, não é uma cidade aberta a tudo, pois nela não entrará nada contaminado. Os pecadores remidos pelo sangue do Cordeiro entrarão por suas portas, mas o pecado não terá acesso a ela. Mui frequentemente, as igrejas de hoje são abertas a tudo, mas não a todos. Franqueiam suas portas ao pecado e fecham-nas aos pecadores. Sétimo, é suficientemente espaçosa para abrigar todos os que creem. As dimensões dessa cidade são únicas. Ela mede 2.400 km tanto de comprimento, quanto de largura e de altura. Mesmo sendo essas medidas tomadas de forma simbólica, descrevem que na Casa do Pai há muitas moradas, suficientes para abrigar todos aqueles que creram em Jesus.

GESTÃO E CARREIRA

O PODER DA LINGUAGEM

Não há dúvida nenhuma quanto à importância do processo comunicativo dentro das instituições. uma falha nesse processo pode gerar sérias consequências

Um ambiente que deveria ser totalmente à prova de erros na comunicação é o da saúde. Quando um profissional de saúde comete um erro de entendimento de alguma comunicação sobre procedimentos com os usuários, o resultado final pode ser fatal.

Clarificar a comunicação é a regra geral e deve ocorrer de duas formas:

1) DA PARTE DO RECEPTOR DA MENSAGEM: o que não foi entendido deve ser perguntado ao interlocutor;

2) DA PARTE DO EMISSOR DA MENSAGEM: se não tem certeza de que o outro entendeu, peça para ele repetir o que foi dito. Simples e fácil. O grande dilema é que as pessoas que não são habituadas à clarificação temem serem taxadas de burras ou incompetentes pelos seus companheiros de equipe. Para diminuir essa rejeição comportamental e ampliar a adesão aos protocolos de uma comunicação segura, é necessário um bom investimento em treinamentos com dinâmicas de impacto.

Alguns setores levam esses procedimentos bem a sério e, mesmo assim, falhas ocorrem. Os controladores de voo, por exemplo, possuem verdadeira obsessão por uma comunicação bem estruturada. Afinal, pior ainda que no ambiente da saúde, falhas desses profissionais podem resultar em catástrofes monumentais com centenas de vítimas fatais.

Nos diversos perfis de atendimento ao cliente, uma regra também é geral: todos querem ser bem atendidos em qualquer que seja o ramo de atuação ou tipo de relacionamento. Assim, usar de estratégias na condução das palavras faz toda diferença nas trocas que ocorrem entre as partes envolvidas no processo. Saber conduzir o outro com uma boa estrutura frasal é algo exigido de todo e qualquer elemento que deseje alcançar sucesso em sua atividade.

O dr. Milton Erickson, atuante na década de 1970, pai da hipnose ericksoniana, traz esse processo comunicacional a um nível capaz de moldar uma sessão psicoterápica tornando-a única para cada paciente. Na modernidade, várias personalidades elaboraram influentes textos sobre esse mecanismo fantástico que, quando incluído no cabedal linguístico, pode transformar as fortes emoções reinantes em conflitos numa tranquila conversa entre duas pessoas.

Steve Allen, autor de vários livros sobre persuasão, explora esse tema em seu livro Persuasão e Influência. A forma como o emissor estrutura o conteúdo, como conduz as palavras positivamente, pode auxiliar de maneira significativa a interpretação do receptor, tocando-o em nível subliminar e causando grande empatia. Muitas vezes conduzindo a pessoa a efetuar uma ação, indicada pelo emissor, sem que o mesmo se dê conta disso. A condução ao resultado esperado, de forma estrategicamente feita, não é um truque ou ato ilegal, trata-se de uma comunicação de excelência que sintetiza a real intenção da organização. Ninguém fará nada ou adotará posicionamentos contra sua vontade, mas, com uma conversação plena de conteúdos significativos para o receptor, o resultado sempre é melhor para os envolvidos.

Não são palavras mágicas ou encantamentos, apenas uma forma quase artística de colocar a argumentação em um tom mais aceitável para o outro em meio aos conflitos que podem existir quando ocorrem posicionamentos antagônicos. Vejamos alguns exemplos:

1- COMEÇAR A FRASE QUE SOLICITA UMA AÇÃO COM: “O senhor poderia…?”. Um pedido que, na verdade, indica o que deve ser feito. No entanto, a frase em tom respeitoso ainda deixa uma breve possibilidade para a negação, o que dá certa liberdade ao receptor.

2- CASO SEJA UMA NEGAÇÃO A UMA POSSÍVEL AÇÃO FUTURA DO OUTRO: “O senhor não deveria…”; “Não é necessário que…”. Sem impedir diretamente a possível ação futura do outro, esse início de argumentação não causa um conflito direto. O emissor deve sempre apresentar uma outra possibilidade alternativa para a possível atitude que o receptor deseja adotar.

3- CRIAR PROSPECÇÃO DE UM CENÁRIO POSSÍVEL: “Como seria se..?.”. Provocar a criação de um cenário imaginado com uma solução à demanda apresentada traz alívio imediato ao conflito em curso. Mesmo se essa solução ainda não for possível, trazer o outro a um nível mais confortável ajuda na elaboração de soluções reais e plausíveis.

4- DEVOLUÇÃO DA PERGUNTA EM NOVO TOM: “De que forma acha que deve ser feito…?”. Coloque a construção da solução para o conflito na responsabilidade do outro. Assim, por pior que possa se apresentar a finalização solicitada por ele, você ganha tempo para pensar ou, se for o caso, adequar a proposta apresentada por ele para uma realidade possível.

As empresas que investem nesse singular perfil de treinamento com seus atendentes possuem   uma forte aderência de seus usuários. Uma vez adquirida a capacidade de usar as palavras certas, direcionando o interlocutor para uma solução confiável, mesmo que em tempo incerto, elas   ganham respeito e confiança. Sempre colocando a ética em primeiro plano e respeitando as legislações vigentes – Código do Consumidor – qualquer perfil de empreendimento só tem a ganhar com uma comunicação estruturada.

JOÃO OLIVEIRA – é Doutor em Saúde Pública, psicólogo e diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros estão: Relacionamento em Crise: Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora).

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

UM ALERTA SOBRE O ESTRESSE

Com o ritmo imposto pela vida moderna cada vez mais as pressões psicológicas geram desequilíbrio emocional e oferecem risco de doenças físicas que acabam afetando a saúde

A Organização Mundial da Saúde (OMS) está alertando há algum tempo sobre como o estresse dos tempos modernos tem alterado o bem-estar geral da população. Em dados atuais, a doença depressiva passou da quarta para a segunda posição entre os problemas que retiraram a capacidade de trabalho das pessoas no ano de 2016. Antes, ela vinha atrás das doenças cardíacas, câncer e acidentes. Contudo, a previsão é que seja a primeira da fila em 2030.

A depressão tem sido, assim, um grande fator que contribui para uma vida sem qualidade, de aumento de doenças autoimunes, bem como para o câncer. Infelizmente, é uma realidade dura.

O fato é que as pessoas lutam cada dia mais para ganhar seu dinheiro e sustentarem suas casas. Afinal, as mudanças no mundo têm gerado mais e mais insegurança financeira e, com ela, têm arrastado a população a um verdadeiro colapso de tanto trabalhar, estudar, cuidar de filhos e se desdobrar para ter sucesso nessa vida maluca e atribulada.

Foi-se o tempo em que as pessoas iam para casa almoçar e descansavam após o almoço, tirando uma soneca gostosa. O expediente terminava pontualmente às seis da tarde. Hoje, o que se vê? Uma correria desenfreada atrás de mais habilidades, mais trabalho, mais dinheiro e tantas outras coisas.

Já não se sabe por que se trabalha: porque é preciso pagar contas e ter o que comer? Ou porque o consumismo provoca o acúmulo de contas que faz com que se trabalhe mais? Essa pressão acaba gerando um desequilíbrio emocional muito grande. Um corpo sob pressão, sob estresse emocional, gera a produção de neurorreguladores prejudiciais: a noradrenalina e o cortisol. Sendo liberados em quantidades muito maiores do que deveriam, essas substâncias desencadeiam desgaste físico e pioram o estado emocional. Assim, cria-se uma bola de neve.

Vale a pena repetir: quanto mais as pessoas se esforçam e desenvolvem atividades além do possível, mais elas vão produzir noradrenalina, que diz ao cérebro e ao corpo que se está em perigo. O corpo, então, aumenta a produção do cortisol e aí começa o desgaste físico maior. As doenças aparecem, a imunidade diminui.

No cérebro, o aviso dado pela noradrenalina provoca mais estresse nas pessoas, desequilibrando a liberação dos outros neurotransmissores, o que deixa os indivíduos ainda mais nervosos, deprimidos ou tensos. Uns terão compulsão alimentar, ou vícios em drogas; outros ficarão mais irritados com os seus familiares ou no trabalho. A bagunça geral se instala.

Como alguém pode gerar uma vida equilibrada vivendo assim? Como alguém pode ganhar seu dia e seu dinheiro estando esgotado, tenso e perdendo a alegria de viver? O que fazer?

Aprender que o menos faz mais! Sim, essa é uma verdade. Uma cabeça descansada consegue aprender melhor, ter mais criatividade e até render mais no trabalho. Muitos estudos nessas áreas vêm sendo feitos pelos pesquisadores da Psicologia Positiva.

O mais interessante que descobriram é que aquele tempo que se gasta com uma distração ou interrupção desnecessária toma, em média, de cinco a sete minutos para se recuperar o tempo perdido e se engajar no mesmo ritmo anterior. Isso vale para o tempo gasto em navegar pela internet, ver e-mails toda hora, responder WhatsApp o tempo todo, olhar coisas no Instagram ou mesmo telefone, conversas fora de hora. Que horror, não é mesmo?

Será que a maioria das pessoas já pensou nisso? Quanto tempo se perde num dia por ficar olhando mídias sociais ou e-mails no celular ou no computador a toda hora? É muito! Com isso, perdem-se horas de lazer, de brincar com o filho, de ir ao cinema ou de bater um papo ao vivo, em tempo real, com um amigo. Essas são coisas que verdadeiramente agem em benefício da saúde física e mental.

LONGEVIDADE

Psicologia Positiva estudou as pessoas mais felizes e otimistas e viu que elas são, em média, oito anos mais longevas. Que têm relacionamentos mais duradouros, que são mais criativas e fazem mais sucesso em seu trabalho.

Nesse momento, cabe a pergunta: será que as pessoas não querem ter mais saúde, ser mais longevas, ter bons relacionamentos e fazer muito mais sucesso? A grande pegada está em fazer o que as pessoas mais felizes e positivas fazem. São premissas tão simples. Mas, geralmente, alguns as tomam como coisas tão triviais que não prestam atenção no quanto são importantes.

Um dos principais exemplos disso é ser grato. A gratidão tem sido um tema insistentemente incentivado na mídia e na autoajuda nos últimos tempos. Faz todo sentido, porque é uma verdade. As pessoas mais agradecidas têm a capacidade de focar no que funciona, no que é melhor, no belo.

Aqui vão duas dicas importantes. A primeira é seja grato por tudo o que acontecer em sua vida, mesmo que sejam obstáculos, sofrimentos e perdas. No sofrimento, a vida nos ensina a valorizar as mínimas coisas. Assim, após passar por situações dolorosas, as pessoas que são mais positivas saem mais fortalecidas e agradecem o fato de terem que lutar para ver exatamente o que havia de bom em suas vidas. Descobrem que são apreciadores das pequenas coisas, das maravilhas que o universo oferece.

A segunda dica é: fazer um diário de gratidão. Quando a pessoa começar a colocar no papel, todos os dias, algumas coisas boas que aconteceram naquele dia, certamente passará a olhar mais para os pontos positivos que rodeiam seu dia. A ideia é focar no que funciona e apreciar o belo nas pequenas coisas. Ficar mais generoso, mais feliz, mais calmo. Então, a ordem é se animar. Começar a ampliar o positivo que está em volta. Ver nos detalhes quantas coisas boas acontecem diariamente.

Outro fator importante é o exercício físico. Certamente, todos já tomaram contato com a informação de que quem faz exercício físico, além de ter mais longevidade e melhor saúde, torna-se uma pessoa mais alegre e mais calma. Além disso, exercitar-se previne demências, AVC, ataques cardíacos, osteoporose e doenças crônicas autoimunes. Então, não há desculpa para não se animar.

Em troca de todos esses ganhos, a pessoa só precisa se levantar do sofá e sair fazendo. E, claro, agradecer por ter saúde ainda para fazer isso, pois pode perdê-la em breve. Ao fazer o exercício físico, o indivíduo abre mais arteríolas por todo seu organismo. Com isso, melhora a irrigação de todos os tecidos.

É imprescindível pensar nisso. É um bom negócio: garantir a saúde por poucas horas de treinamento. Se não der conta, a pessoa deve apenas aprender a sair andando por aí, que sejam 20 minutos a pé, observando o bairro, observando a vida.

Rituais também são importantes. Se a pessoa quiser mesmo ter uma vida mais saudável, precisa se habituar com uma vida com regras. Comer bem e saudavelmente, ter hora para se exercitar ou caminhar. Nada como criar pequenos rituais. Aos poucos, o indivíduo se acostuma com eles e vai ganhando autonomia.

Adotando rituais, todos conseguem fazer o tempo render em muitas atividades saudáveis que passam a fazer parte do dia naturalmente. A dica aqui é começar devagar, um novo ritual por mês.

Que tal começar dormindo meia hora mais cedo? Ou comendo de três em três horas? E, depois, que tal colocar um exercício bem tranquilo duas a três vezes na semana? Tudo aos poucos.

Dormir mais cedo é muito simples de fazer. A pessoa deve tentar dormir meia hora antes por mês. Infelizmente, a cada dia, dorme-se mais tarde para ler um e-mail, ou para ver seu grupo numa rede social, ou para fazer mais um trabalho e ganhar um dinheiro extra. Será que vale a pena? O ser humano produz serotonina, importante neurorregulador cerebral, apenas durante o sono da noite, no escuro. Quem deixa para dormir de madrugada poderá se deprimir em breve, pois não vai fabricar a quantidade de serotonina necessária. Depressão, nervosismo, irritabilidade são consequências de noites mal dormidas. Depois virão consequências maiores, como doenças graves e crônicas.

Mais uma dica é trabalhar menos e produzir mais de forma bem focada, utilizando a regra 80/20: utilizar 20% do seu tempo, em sua hora mais produtiva do dia, para fazer 80% do seu trabalho. Ou seja: o seu melhor, na sua melhor hora, em menos tempo. Essa é famosa regra Pareto, derivada do estudo de que apenas 20% da população estudada concentravam 80% das riquezas.

Aplica-se essa regra, 80/20, por exemplo, à produtividade no trabalho. Muitas empresas vêm adotando um sistema em que seus funcionários podem escolher seu melhor horário de desempenho para ir trabalhar. Outras liberam os funcionários para que trabalhem em casa em seu melhor horário. E muitas já estão mandando seus funcionários trabalharem apenas em casa, de forma “remota”, pois ficam mais criativos e rendem muito mais. Estando felizes, criam melhor. Dividem melhor seu tempo, trabalham mais focados.

Aqui se encontra um ótimo remédio para males da mente e do corpo. A cada dia, mais pessoas se tornam adeptas da meditação e da yoga como práticas saudáveis que conduzem ao equilíbrio da razão e da emoção. Simples de entender! Pesquisas feitas com monges budistas que meditam diariamente e pessoas que fazem yoga mostraram que eles têm maior atividade cerebral no lobo pré-frontal esquerdo, área da razão e da calma, enquanto aquelas pessoas mais ansiosas ou deprimidas têm seu lado direito pré-frontal mais ativado.

PRÁTICAS QUE AJUDAM

Após um experimento fazendo meditações com pessoas depressivas ou ansiosas, viu-se que elas tiverem diminuída a atividade do lado direito (emocional) e aumentada a atividade do lobo pré-frontal esquerdo que comanda a razão e o equilíbrio emocional. Espero que todos queiram meditar a partir de agora. E, caso a pessoa seja do tipo que diz que não consegue meditar sozinha, é aconselhável procurar uma aula de yoga.

Seja qual for o jeito do indivíduo, é fundamental que ele medite. Buscar formas de meditar todos os dias. Pode começar aos poucos, cinco a dez minutos por dia. Há tantas maneiras de meditar. Não é preciso ficar em posição de yoga, com pernas cruzadas. Pode fazer apreciando a natureza, respirando fundo, deitado, assentado, vendo uma bela vista ou somente fechando olhos. Não é preciso repetir mantras que muitos acham monótonos. Apenas deve respirar, parar e apreciar o momento presente. Ficar parado, deixando a respiração levar a pessoa, observar cada detalhe e se deixar ficar.

Agora, vale lembrar sobre os questionamentos sobre o significado de vida. Se há um fator desencadeante de estresse e desequilíbrio mental é obrigar alguém a fazer aquilo de que não gosta ou para o qual não tem aptidão. É preciso descobrir o que se gosta de fazer, o que se tem a habilidade maior, o talento. Unindo essas duas forças – o que se faz bem-feito com o que se gosta de fazer – uma pessoa pode trabalhar por horas sem perceber, se deixando levar junto com o que faz, totalmente engajada. Isso se chama fluir.

Por isso, dar um propósito à vida seria trabalhar de forma a se sentir uno com o que faz. A pessoa se sente feliz e trabalha melhor. Traz alegria, criatividade e bem-estar. Então, o que é mesmo que faz alguém mais saudável? Ter paz, ter alegrias. O trabalho tem seus obstáculos e dificuldades. Mas se o indivíduo trabalhar com um significado de vida, se trabalhar com prazer usando o respectivo talento, terá mais chances de ter uma vida mais equilibrada e de lidar melhor com o estresse.

Depois disso, uma vez que a pessoa já tem um sentido para viver, precisa estabelecer metas que possam ser atingidas. Muitas pessoas se estressam porque querem dar conta de muito mais do que podem. Ou impõem para si metas inatingíveis. Por isso, sofrem e muito. O ideal é pensar na possibilidade de alcançar o sonho, atingindo pequenas metas e construindo o desejo aos poucos.

Um sonho pode ser realizado se for bem dimensionado e dividido em metas realizáveis. Isso retira da pessoa muito estresse e desequilíbrio. E, ainda, deve-se permitir fazer aos poucos. Melhor é estar feito do que muito bem feito! Começa aqui uma nova meta, fazer o que se dá conta. Nada de querer que tudo seja perfeito, isso só traz mais estresse e procrastinação, quando não mais frustração.

Outra dica relevante é a permissão para ser humano. É fundamental permitir-se ser humano e até mesmo fracassar algumas vezes. Isso é normal. Permitir-se sentir tudo, até raiva, tristeza e medo. Todos são seres humanos, sofrem também. Mas não é para cultivar sentimentos negativos! Simplesmente deve-se parar e observar. Se ficar só pensando no negativo, a pessoa está alimentando raiva, tristeza e medo. O importante é apenas sentir e deixe ir.

Relembrando, é preciso aprender a meditar, se limpando dos sentimentos com os quais não pode lidar agora. Raiva faz muito mal. Aumenta a produção de cortisol, que leva muitas horas para se desfazer. Cortisol ativado diminui a imunidade e acarreta mais doenças físicas.

Todos já devem ter ouvido falar que falhar faz parte de ser humano e faz parte do aprendizado da vida. Quem nunca errou, mas depois acertou, exatamente porque houve um erro e com ele aprendeu muito? Então, é preciso observar de perto os respectivos erros e analisar o que aprendeu com eles.

Fazer é o verbo da saúde e da alegria. Quem quiser ficar mais alegre deve fazer. Fazer tudo o que estiver programado. Esforçar-se para colocar a vida em dia. “Fazer” é o verbo que coloca a pessoa em ação. E quando, então, se começa a colocar a vida em dia, a tendência é ficar mais alegre e cheio de energia. A criatividade aumenta. Dessa forma, a pessoa observa que dá conta e cria mais energia a cada passo dado na direção do fazer. Um sonho realizado foi algo realmente feito.

PAUSA

Chega o momento em que a saúde pede pausa e alegria. Pois é!

Assim, depois do dever cumprido, todos precisam da pausa, do descanso, do brincar. Por isso é necessário gastar tempo em família e com as pessoas de quem se gosta. Rir juntos, viajar juntos, ter almoços de família, de amigos. Tudo isso faz parte de uma vida saudável.

Mas o que tem acontecido hoje em dia? Pais não têm tempo, pois trabalham até sábado e domingo ou até muito tarde. Quando chega o fim de semana, estão exaustos e se deitam no sofá. Triste! É preciso prestar atenção e ver se todos estão mesmo tendo tempo de descansar.

Pois bem. A conclusão é que é imprescindível ter uma vida mais equilibrada e saudável, pautada em fazer as coisas mais simples por mais tempo na vida. É preciso parar, pensar e se autoquestionar: Está muito cansado? Está dormindo mal? Está nervoso com as pessoas que mais ama? Cuidado! É fundamental dar-se tempo, diminuir a quantidade de horas de trabalho, divertir-se mais, fazer exercícios físicos e permitir-se realmente viver, não apenas sobreviver.

EU ACHO …

O DIREITO A TER DIREITOS

No texto Nós, os refugiados (1943), a pensadora Hannah Arendt (1906-1975) – que havia fugido do campo de internamento de Gurs, em 1940, escapado para os Estados Unidos em 1941 e em 1942 acabara de receberas primeiras notícias sobre as câmaras de gás nos campos de extermínio – observa que a condição de refugiada significava, antes de tudo, a perda da casa e da familiaridade da vida cotidiana; do trabalho e do sentido da própria utilidade; do idioma pátrio e da espontaneidade da expressão; a perda dos amigos e a ruptura das vidas privadas.

Em Origens do totalitarismo (1951) ela retoma parte do que expõe nesse texto quando considera a condição do apátrida e a toma por refutação cabal da convicção de que os direitos humanos são naturais: “o mundo não viu nada de sagrado na abstrata nudez de ser unicamente humano”.  Inusitadamente, ela sustenta que o único direito humano fundamental é o direito a ter direitos, ou seja, o direito de não perder um lugar no mundo, o direito a ter um lugar próprio de onde sair para o mundo e para ele voltar, o direito de pertencer a uma comunidade e ser julgado pelas ações e opiniões. Obstinados em reconstruir suas vidas rompidas, “otimistas”, por assim dizer, os refugiados buscam adaptar-se aos mais diversos contextos e desafios, observa Arendt. Mas, diz ela, “há algo de errado com o otimismo. Há aqueles estranhos otimistas entre nós que, tendo feito vários discursos otimistas, vão para casa e ligam o gás ou dão uso a um arranha-céus de um modo um pouco inesperado”.

MORTE E VIDA SEVERINA

Essa desesperada disposição para “saltar da ponte e da vida” encontra eco em Severino, convertido de flagelado em retirante, aquele que em nossa presença emigra de sua caatinga, a encontrar novas misérias no agreste e no mangue, em busca não propriamente de uma vida melhor, mas de escapar das coisas que ele porta – “fome, sede, privação”. Sem esperar muita coisa, nem ser movido por grande cobiça, Severino buscava defender sua vida contra a vida Severina, “aquela vida que é menos vivida que defendida”, aquela que, nas palavras de João Cabral de Melo Neto em Morte e vida severina, é sempre comprada à vista, a qual, paradoxalmente, “é ainda mais Severina para o homem que retira”.

Somos muitos Severinos – diz ele – iguais em tudo na vida:/ na mesma cabeça grande/ que a custo se equilibra,/ no mesmo ventre crescido/ sobre as mesmas pernas finas/ e iguais também porque o sangue/ que usamos tem pouca tinta./ E se somos Severinos/ iguais em tudo na vida,/ morremos de morte igual/ mesma morte Severina:/ que é a morte que se morre/ de velhice antes dos trinta,/ de emboscada antes dos vinte/ de fome um pouco por dia.

Severino segue o rio, e da morte à vida, encontrada na frágil novidade de um novo nascimento: “belo como as ondas/ em sua adição infinita/ belo porque tem do novo/ a surpresa e a alegria/… E belo porque com o novo/ todo o velho contagia/ belo porque corrompe/ com sangue novo a anemia/ infecciona a miséria/ com vida nova e sadia/ com oásis, o deserto/ com ventos, a calmaria”. Tão vigorosas metáforas da natalidade –  metáforas arendtianas, arrisco-me a indicar –  traduzem a renitência do fora da vida, que é a vida severina daquele que se retira, a embeber a política com aquilo que a solapa: a persistência de uma vida comprada a retalho da qual não se escapa senão para a morte.

NECESSIDADES DA VIDA

Sem o direito de Severino retirante a poder transcender tal vida, a universalidade democrática não passa de simulacro, e o direito à cidadania, de ser participante do governo, encontra seu antípoda mais remoto. A casa, a ocupação, o idioma, os sotaques, o conforto da saciedade, as companhias de familiares e amigos constituem aquele lastro de estabilidade privada que é pressuposto na vida política tanto quanto a administração das necessidades da vida.

O direito a ter direitos, como formulado por Arendt, em As origens do totalitarismo, implica não ser expulso da Terra ou do gênero humano em consequência de ter sido expulso do mundo e de sua comunidade política e de cultura. Antes de ter direito à participação política, o direito a ter direitos é o direito a não ser um estrangeiro na Terra, que abre a possibilidade de não ser um estrangeiro no mundo. Como refugiado, em sua vida exposta e abandonada, Severino retirante, compelido a vagar, desafia quanto de miséria pré-política uma comunidade política pode suportar? Infelizmente, parece que muita.

Enquanto não enfrentarmos politicamente a vida Severina no sentido de obstar sua sistemática reprodução, não poderemos jamais alcançar a consolidação do direito a ter direitos como direito a uma existência política, que implica, além dos direitos civis, o de não ser impedido a participar na vida em comum devido aos constrangimentos da miséria, o que converte a própria pobreza extrema, como a condição dos refugiados e apátridas, em um problema político primeiro.

ADRIANO CORREIA – é professor de Filosofia da Universidade Federal de Goiás e presidente da Associação Nacional de Pós-graduação em Filosofia (ANPOF).

OUTROS OLHARES

REVOLUÇÃO SEM HORMÔNIOS

Um contraceptivo em forma de gel, sem o desconforto químico e os efeitos colaterais provocados pela pílula, acaba de ser aprovado nos Estados Unidos

Nenhum produto farmacêutico mudou tanto a vida das mulheres, e o cotidiano da sociedade, quanto a pílula anticoncepcional. A chegada do comprimido às farmácias, nos anos 1960, representou a antessala da chamada revolução sexual. Em 1968, a escritora americana Pearl S. Buck (1892-1973), Nobel de Literatura, resumiu o que via: “Todo mundo sabe o que a pílula é. Um objeto pequeno, mas que pode ter um efeito mais devastador em nossa sociedade que a bomba atômica”. As primeiras cartelas eram liberadas apenas para aquelas que apresentassem receita médica e certidão de casamento. Em pouco tempo se viu que o papel dos comprimidos ia muito além de evitar a gestação. Graças à pílula, o sexo deixou de ser uma questão moral, mas de bem-estar e prazer. O controle da natalidade libertou a mulher e o orgasmo, enfim, pôde ser dissociado do risco de engravidar.

Mas foi – e ainda é – uma revolução ancorada em hormônios, e os hormônios embutidos na pílula podem fazer mal e incomodam. Seis em cada dez mulheres interrompem o uso de anticoncepcional em menos de um ano por reagir mal às substâncias hormonais. Entre os efeitos adversos mais comuns estão náusea, dor de cabeça e sangramento. Em casos mais severos, há quadros de trombose. São problemas que começam a ser postos de escanteio. A FDA, a agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, acaba de aprovar a venda de um contraceptivo em gel completamente livre de hormônio. É a primeira vez em trinta anos que se aprova um remédio subtraído desses compostos ­ o anterior, lançado na década de 90, foi a “camisinha feminina”, que não colou. Desenvolvido pelo laboratório americano Evofen com o nome comercial de Phexxi, o produto chegará às farmácias americanas em setembro deste ano, a 250 dólares, suficiente para doze aplicações. Ainda não há previsão para o lançamento no Brasil, mas não deve demorar. Ele age de forma aparentemente muito simples, mas fruto de altíssima tecnologia. Altera a acidez do pH vaginal e impede a movimentação dos espermatozoides até os óvulos, onde ocorre a fecundação (veja o quadro abaixo). “O método conseguiu finalmente suprir uma lacuna no mercado formada por mulheres que querem evitar os hormônios”, diz Eduardo Ziotnik, ginecologista do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. A taxa de eficácia é comparável à dos preservativos, em torno de 86%. Está, portanto, longe dos espantosos 99,9% da pílula anticoncepcional. Mas os índices do gel tornam-se perfeitos para uma quantidade grande de mulheres que não se adaptam aos hormônios dos contraceptivos. A maioria deles, na forma de comprimido ou injetável, é feita da combinação dos hormônios estrogênio e progesterona sintéticos, que inibem a ovulação. A novidade em gel também apresenta contraindicações: cerca de 10% das mulheres relataram dores e sensação de queimação nas partes íntimas. Há ainda uma relevante questão comportamental a ser considerada. A mulher pode se sentir constrangida ao aplicá-lo diante de um parceiro que não conhece bem”, diz a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do programa de estudos sexuais da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. “Ainda assim, é uma grande conquista feminina.”

E os homens? As tentativas (infrutíferas) de produção de um contraceptivo masculino existem também desde os anos 1960. Há ponderações pouco científicas (a resistência dos homens) e econômicas (laboratórios temendo perder com a possível queda no consumo desses remédios entre as mulheres). Mas o principal nó é fisiológico. Bloquear a ovulação mensal é um desafio mais simples e barato do que inibir a produção diária de milhões de espermatozoides. “É difícil mexer na fertilidade no corpo masculino sem impactar fortemente nos hormônios de forma negativa”, diz Ziotnik. “Diminuir a testosterona, essencial na produção dos espermatozoides, causa extremo desânimo e mal-estar. “O primeiro remédio que parece ter driblado o entrave é uma vacina. Em fase final de testes, ela é aplicada na região dos testículos e pode durar até treze anos, com eficácia comprovada de 97%.  A injeção, chamada de Risug, já passou por testes clínicos e a expectativa é que chegue ao mercado até o fim deste ano. Uma nova revolução sexual pode estar só começando.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 21 DE JUNHO

NÃO SE ENCHA DE VINHO, ENCHA-SE DO ESPÍRITO

E não vos embriagueis com vinho, no qual há dissolução, mas enchei-vos do Espírito (Efésios 5.18).

Quanto mais cheias de álcool, mais vazias as pessoas ficam. O homem sempre está cheio de alguma coisa. Está cheio de Deus ou de si mesmo. Está praticando as obras da carne ou produzindo o fruto do Espírito. O apóstolo Paulo diz que não devemos embriagar-nos com o vinho, mas encher-nos do Espírito. O vinho produz dissolução; o Espírito Santo produz comunhão, adoração, gratidão e submissão. O vinho produz uma alegria passageira e superficial; o Espírito, uma alegria permanente e profunda. O vinho produz uma alegria mundana; o Espírito, uma alegria indizível e cheia de glória. O vinho escraviza; o Espírito liberta. O vinho leva o homem a perder o controle; o Espírito produz domínio próprio. O vinho traz vergonha e opróbrio; o Espírito produz honra e reconhecimento. O autor de Provérbios pergunta: Para quem são os ais? Para quem, os pesares? Para quem, as rixas? Para quem, as queixas? Para quem, as feridas sem causa? E para quem, os olhos vermelhos? Para os que se demoram em beber vinho, para os que andam buscando bebida misturada (Provérbios 23.29,30). As cadeias estão lotadas de protagonistas da embriaguez, e os cemitérios estão semeados de suas vítimas. Mantenha sua família longe da embriaguez. Esse caminho é escorregadio. O fim dessa linha é o vício, a vergonha, a escravidão e a morte.

GESTÃO E CARREIRA

FOCO NAS TAREFAS

Rotular-se um (a) “desorganizado (a)” não ajuda. O indivíduo deve ser realista ao avaliar suas possibilidades e o grau de dificuldade de seus afazeres

Atualmente, em nossa sociedade, são inúmeras as pressões e demandas nos mais diferentes contextos: escola, família, trabalho, etc. A troca de informações e o acesso a elas acontecem de modo cada vez mais dinâmico. Diante dessa configuração, tem-se um mercado de trabalho cada vez mais exigente e restrito. Dos profissionais, espera-se competência, precisão, eficiência; estas relacionadas à otimização do trabalho. Mas há uma progressão na quantidade e complexidade de tarefas requisitadas. Como cumpri-las, então, em prazos cada vez menores? Em alguns contextos e situações é inevitável falar de prioridades, mas como elegê-las, quando tudo parece importante e imprescindível de ser realizado?

A eleição de ordem de prioridade facilita a administração do tempo, questão relevante àqueles profissionais que desempenham ou que que pretendem assumir papel de líder ou gestor e têm de lidar com grupos de pessoas. Para administrar a agenda, inicialmente, é importante adquirir o máximo de informações e esclarecimento a cerca das especificidades das tarefas, quais os pré-requisitos necessários à sua realização, até mesmo para distinguir entre elementos que são mais prioritários. Fazendo uma analogia ao contexto da saúde, algumas atividades que assumem o caráter de “emergência” têm prioridade número 1. Outras se enquadrariam no nível 2 da escala de prioridades de execução caráter “urgente”. Há ainda, um outro rol de tarefas que são parte da rotina diária, as quais, portanto, precisam ser executas regularmente.

Vale lembrar que, no ambiente de trabalho, modos eficientes na condução de múltiplas tarefas, principalmente sob adversidades, favorecem o aprimoramento de habilidades que envolvam tomada de decisão, rapidez e agilidade, autocontrole, divisão e delegação de tarefas, mesmo sob condições de pressão, estresse e ansiedade. Características importantes diante de um mundo cada vez mais competitivo que enfatiza estas habilidades.

Sob uma outra ótica, há situações em que o “excesso” de tarefas não é o principal entrave à conclusão de algumas atividades. Porém, um furor muito presente seria o adiantamento dessas tarefas para contextos mais favoráveis, com pouca pressão ou menor frequência de compromissos concorrentes. Mesmo sob condições mais favoráveis, não há garantias de cumprimento rápido e de qualidade de algumas tarefas. Em contextos escolares e acadêmicos, por exemplo, essa questão se torna mais visível. Observa-se um constante adiamento de algumas tarefas ou mesmo interrupções.

PARA AMANHÃ

Pesquisas clínicas em análise do comportamento investigam a interferência da procrastinação ou adiamento de tarefas sobre a tomada de decisões e resolução de problemas em diversas áreas e aspectos da vida da pessoa, tais como trabalho, casamento, amor e família. O adiamento é ocasião para sentimentos de desmotivação, ansiedade e angústia. Gera regras e suposições, por vezes incompatíveis, de que a tarefa possa ser mais difícil do que realmente é.

Algumas variáveis relacionam-se ao adiamento; por exemplo, quanto mais prazerosa a atividade, maior a chance de conclusão e não adiamento. Entretanto, nem sempre estaremos lidando com tarefas agradáveis a serem cumpridas.

Nesse sentido, o adiamento é reforçado na medida em que o indivíduo investe em outras atividades concorrentes mais prazerosas e imediatas, por exemplo, assistir televisão, dormir, brincar etc. (elementos dispersores), protelando no engajamento das atividades necessárias. Em outras palavras o indivíduo tende a ficar sob controle das consequências em curto prazo.

Como forma de esquivar-se da execução da tarefa, o tempo é, muitasvezes, “superdimensionado” pela pessoa que supõe a viabilidade de concretização em tempo hábil, adiando o início da tarefa. No adiamento, sentimentos como alívio, liberdade e prazer podem estar presentes; após adiamento, angústia, inquietação, sensação de falta de tempo para completar a tarefa adiada e outras novas que vão surgindo concomitantemente.

Na execução da tarefa adiada, pode haver mais sentimentos de alívio que de prazer, além de desconforto pelotempo “insuficiente” e prejuízo na qualidade do trabalho. Após a conclusão: sensação de que poderia ter feito melhor, se houvesse mais tempo. Algumas variáveis que contribuem para o adiamento: medo de fracassar, baixa tolerância à frustração, dificuldade em lidar com tarefas desagradáveis. O que a tarefa demanda ou exige em termos de outros elementos ou comportamentos para se chegar à resposta ou resultado finais? Quais os níveis de dificuldade?

Em atividades escolares, por exemplo, às vezes o mais difícil é começar. Ao iniciar uma tarefa há o contato com as facilidades, mas também com as dificuldades, o que aumenta a probabilidade de interrupção.

Embora difícil, exercitar o “começar” uma tarefa também pode aumentar a probabilidade de manutenção do foco nesta atividade. Nesse caso, a função seria entrar em contato com o assunto, e com sentimentos de interesse, motivação e prazer pela execução de tarefa, o que possibilita o envolvimento com esta, e aumenta o engajamento em outras ações necessárias ao seu cumprimento, tais como, pesquisa, organização das ideias e construção do texto.

Mesmo parecendo comuns, algumas estratégias auxiliam na execução de tarefas como organização, agendamento, estabelecimento de metas a curto, médio e longo prazo e o enfrentamento, propriamente dito, da tarefa, que significa fazer ou, pelo menos, começar a fazer, para despertar concepções mais realistas em torno desta, como facilidades e dificuldades, e tomada de atitudes necessárias a este empreendimento.

Logo, a atribuição a características pessoais (p.ex. “sou desorganizado”, “desleixado”, “sem vontade”’, “não consigo me concentrar”) como causa da procrastinação ou adiamento, não ajuda na mudança de comportamentos. Faz-se necessária uma análise mais cuidadosa e específica acerca das interações do indivíduo com seus ambientes físico e social, que auxiliem na compreensão de elementos que dificultam a atenção e o foco em suas atividades, assim como na promoção de hábitos mais saudáveis ao indivíduo.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

O PRAZER COMEÇA NA PELE

As zonas erógenas são encontradas sobre todo o corpo humano, mas a sensibilidade de cada região varia e pode oferecer diversas sensações quando estimulada

As zonas erógenas são aquelas áreas do corpo humano mais sensíveis à estimulação sexual, também denominadas de zonas eróticas. A estimulação dessas regiões podem ocasionar e/ou aumentar a excitação sexual. Alguns as mencionam como sendo superfícies corporais que estão previamente sensibilizadas para receber essas estimulações. Portanto, zonas são regiões/superfícies do corpo humano, e erógenas se referem à estimulação dessas áreas que se relacionam com a excitação sexual.

Mas, afinal, como se estimulam essas regiões? Elas são excitadas pelo tato, pois ele é o único dos cinco sentidos que podem estimular as superfícies corporais, os demais sentidos (visão, audição, olfato e paladar) não.

Podemos considerar toda a superfície corporal como uma grande zona erógena, entretanto nem todas as áreas corporais têm a mesma sensibilidade, ademais o que para um pode ser atribuído como um toque prazeroso, para outro pode não ser. Assim sendo, o toque de uma zona erógena de uma pessoa pode ser entendido como um ato de intimidade física; todavia, algumas podem se sentir desconfortáveis quando estimuladas dessa maneira; já para outras, a sensação proveniente do toque está associada a sensações prazerosas, que provocam gratificação. Sem dúvida, essas sensações dependerão das suscetibilidades individuais e da relação entre as pessoas envolvidas.

As zonas erógenas podem ser classificadas pelo tipo de sensações que provocam. Muitas pessoas, quando tocadas gentilmente nas pálpebras, sobrancelhas, ombros, mãos, braços, e/ou sutilmente nos cabelos, as reconhecem como prazerosas, as quais irão contribuir no engajamento para uma relação sexual. Outras, por sua vez, relatam maior excitação quando suas zonas erógenas são acariciadas durante a atividade sexual.

De maneira geral, para melhor entendimento, podemos agrupar as zonas erógenas em dois grupos: primárias e secundárias. É importante ressaltar que o grau de sensibilidade de cada local pode variar muito entre as pessoas, bem como as preferências individuais, os fatores psicológicos (sensações de inibição, por exemplo), os aspectos sociais, o ambiente cultural no qual estamos inseridos, entre outros fatores.

As zonas erógenas primárias são aquelas relacionadas com áreas da genitália, que quando tocadas podem provocar intensa estimulação conduzindo ao orgasmo. Nos homens, comumente, a região que compreende a glande do pênis é muito sensível; por sua vez, as mulheres referem maior estimulação quando tocadas no clitóris, assim como no introito vaginal. As zonas erógenas secundárias, na maioria das vezes, são de menor intensidade e não estão relacionadas diretamente com a obtenção do orgasmo, entretanto há pessoas que relatam orgasmo com a estimulação de áreas que não são consideradas primárias. A própria genitália tem regiões que quando estimuladas podem provocar sensações prazerosas, sem estarem envolvidas diretamente com a obtenção do orgasmo, por exemplo: a bolsa escrotal nos homens e os lábios maiores e menores nas mulheres, que são regiões da genitália responsivas a estimulação tátil, porém com menor intensidade que as mencionadas anteriormente.

A parte inferior do abdômen, a região inguinal, assim como a região que compreende o ânus são descritas como zonas erógenas secundárias perigenitais. As zonas erógenas secundárias extragenitais são áreas afastadas da genitália. As mulheres costumam relatar essas regiões como sendo mais responsivas que os homens, mas não podemos esquecer que fatores sociais, culturais e psicológicos podem estar relacionados com essa percepção.

Entre as zonas erógenas extragenitais citamos: a boca (lábios, língua – muitas vezes empregados para estimular zonas erógenas da parceira), orelhas (sensibilidade especial é atribuída nessa região para muitos), colo e nuca, membros superiores (as próprias mãos quando tocadas provocam sensações gratificantes para várias pessoas), as mamas, os mamilos, o abdômen (incluindo o umbigo), as nádegas, regiões dos membros inferiores. É comum escutarmos, em nosso meio médico e psi, que a pele é a nossa maior região sexual. A gratificação vinda do toque, em diversas áreas corporais, além de ser relevante antes, durante e após a atividade sexual, pode ser fundamental na descoberta de novas possibilidades que enriqueçam nossa percepção e consequentemente o prazer.

GIANCARLO SPIZZIRRI – é psiquiatra doutor pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP.

EU ACHO …

OS VERDADEIROS DESAFIOS: ACEITAR-SE E SER ACEITO

Autoafirmação, descobertas e adrenalina são características da adolescência. Nessa fase, os jovens necessitam provar (para eles mesmos e para os outros) que cresceram e já são capazes de lidar com as responsabilidades caminhando sozinhos. Em virtude disso, muitos não somente se mostram bastante abertos a novas experiências, como desejam ousar. Aliás, ousadia é outra marca desse complexo e conturbado período repleto de sentimentos intensos. Aceitar-se e ser aceito são grandes desafios e para isso não se medem esforços. Arriscar-se é praticamente uma filosofia, entretanto essa tendência de optar por ‘manobras arriscadas” pode custar caro. Em algumas situações o custo é a própria vida.

Recentemente, casos de suicídios entre adolescentes ganharam os noticiários do Brasil e do mundo e reacenderam muitos debates acerca das motivações para esse ato. Estudiosos avaliam uma gama de traumas emocionais que podem desencadear o desejo de morrer, como bullying, uso de drogas, problemas familiares, vazio existencial e depressão precoce.

Essa última, inclusive, é a principal causa de incapacidade e doença entre adolescentes. Diversos estudos demonstram que metade das pessoas com alguma doença psicológica a desenvolveu antes dos 14 anos.

Mas os acontecimentos noticiados chamaram atenção por estarem envolvidos em modelos de competição que levam esses adolescentes a testarem seus limites ao extremo e que ultrapassaram fronteiras de diversos países por meio da conexão virtual.

Precisamos analisar esse comportamento e buscar a compreensão do estímulo do flerte com o perigo, que os tem levado a consequências mortais.

“A  juventude sempre flertou com a morte, os jogos tipo roleta-russa foram frequentes na era vitoriana, como também os desafios em defesa da honra e os duelos, afinal, para nos tornarmos adultos é preciso matar, simbolicamente, a criança que um dia fomos”, explica a psicanalista Luciana Saddi. Porém, ela ressalta que é fundamental olharmos para além dos jogos e desafios tópicos da idade e enxergarmos a saúde emocional dos jovens. A pressão e a vulnerabilidade pungentes a que estão expostos precisam ser levadas em conta na avaliação desse fenômeno, assim como o que significa ser adolescente nos dias de hoje.

Muito se falou sobre jogos como baleia azul ou da asfixia como fontes de preocupação, quando o foco deveria ser olhar com atenção para o sofrimento dos jovens. Tememos o virtual quando deveríamos estar de fato assustados com o real à nossa volta.

OUTROS OLHARES

MATEMÁTICA DA PESTE

Compreender o padrão por trás do crescimento exponencial da Covid-19 é a maneira mais inteligente de criar um planejamento efetivo para combater a doença. Além dos médicos, a estratégia prevê o envolvimento de outros especialistas: os matemáticos

Um equívoco no início da pandemia foi negar a importância da ciência – o contágio certamente teria sido menor se os cientistas tivessem sido ouvidos mais amplamente. Além dos médicos, outros especialistas são importantes para definir as estratégias de enfrentamento à Covid-19: é o caso dos matemáticos. A peste que assola o planeta segue um padrão lógico, e identificá-lo é um passo importante para planejar possíveis soluções.

A teoria matemática que pode ser aplicada à Covid-19 é a do crescimento exponencial, ou seja, quando o número inicial é multiplicado por ele mesmo e assim indefinidamente. Nesse caso, 100 pessoas infectam outras 100, que irão infectar outras 100. O que é importante determinar em relação à pandemia é o período de tempo que essas pessoas levam para se infectar, para então detectar e compreender esse padrão. O monitoramento desses números também pode levar a um plano mais adequado a respeito do relaxamento das medidas sanitárias. A maior dificuldade no momento, no entanto, é que os dados não são 100% confiáveis.

VIDAS SALVAS

Para desenvolver um sistema matemático que consiga calcular quantos podem ser os infectados e mortos é necessário analisar três variáveis principais: número de hospitalização e letalidade; desenvolvimento da imunidade ou desenvolvimento de uma vacina; taxa de propagação da doença. O primeiro item não pode ser controlado no curto prazo, ou seja, não é possível construir novos hospitais do dia para a noite nem prever o número de pessoas internadas que vai se curar ou não. Em relação ao segundo, não se sabe ainda como as pessoas desenvolvem a imunidade nem quando a vacina estará pronta. A solução é pensada a partir da terceira variável, a taxa de propagação da doença. Os cálculos, portanto, são realizados em cima da estratégia de distanciamento social.

O professor do Instituto de Matemática da Unicamp, Dr. Paulo José Silva e Silva, explica que, mesmo com muitos defeitos, “as medidas propostas de distanciamento social salvarão 35 mil vidas no Brasil nos próximos 14 dias, uma vida a cada 36 segundos”. O professor explica que esse número é subestimado, uma vez que os dados não são exatos. Isso significa que o número de vidas salvas é maior, assim como o número de mortos, já que há a subnotificação dos casos.

Em conjunto com um grupo de pesquisadores, o matemático da Unicamp desenvolveu um sistema (https://github.com/pjssilva/Robot-dance) que sugere a alternância das cidades no isolamento social. A justificativa é que, além da capacidade produtiva não entrar em colapso, seriam reduzidos os transtornos que o longo distanciamento provoca. A sugestão é que a tomada de decisões sobre esse escalonamento das cidades seja feita de maneira centralizada. A principal variável seria a taxa de ocupação dos hospitais. O isolamento, nesse caso, seria decretado imediatamente quando as UTIs atingissem 50% dos leitos. O sistema ainda não começou a ser utilizado, mas o professor Paulo disse que já foi procurado por órgãos públicos.

Um dado importante para os cálculos de infecção é a possibilidade de realizar mais testes. No horizonte próximo, no entanto, não existe, a promessa de que isso será realizado em massa, como seria o ideal. A opção pelo lockdown, o fechamento total, teria sido mais adequada se tivesse sido usada no início da pandemia. Hoje, no Brasil esta curva está em crescimento. Segundo o médico infectologista do hospital Beneficiência Portuguesa de São Paulo, João Prats, “não existe uma tendência de queda, os casos ainda estão subindo”. Uma outra estratégia é a chamada “imunidade de rebanho”, quando grande parte da população adquire a doença e se cura, deixando, portanto, de passá-la adiante. Há dúvidas sobre o percentual que seria necessário para essa abordagem, além do alto número de vítimas fatais que a estratégia causaria, uma vez que ela funciona de maneira mais assertiva quando existe uma vacina. “Essa estratégia só funcionaria quando atingíssemos mais de 50% da população”, afirma Prats. A estimativa atual é que entre 4 e 6% da população esteja imunizada e cerca de 10% já possua anticorpos. O médico alerta que todos esses dados não são conclusivos pela falta de pesquisa e pelo pouco tempo de observação. Em qualquer cenário, só nos resta uma opção: confiar que a ciência vai apontar os caminhos que devemos seguir.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 20 DE JUNHO

DOUTRINA E VIDA, UM BINÔMIO NECESSÁRIO

Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina… (1Timóteo 4.16a).

O apóstolo Paulo recomendou a Timóteo, seu filho espiritual e, pastor da igreja de Éfeso, a cuidar de si mesmo e da doutrina. Ortodoxia e piedade são irmãs gêmeas. Teologia e vida não podem ser separadas. Doutrina sem vida ou vida sem doutrina são posturas insuficientes. Precisamos associar à verdade o testemunho. O testemunho precisa ser regido pelo vetor da verdade. Há muitas pessoas ortodoxas que se descuidam da vida. Abominam as heresias e professam a sã doutrina, mas falham na prática. São ortodoxos de cabeça e hereges de conduta. Têm luz na mente, mas lhes falta amor no coração. São como a igreja de Éfeso segundo a avaliação de Cristo: elogiada por manter-se firme na sã doutrina, mas repreendida por ter abandonado o seu primeiro amor. Outros, porém, desprezam a sã doutrina, mas são zelosos na prática do amor. Era assim a igreja de Tiatira, que estava abrindo as portas para uma falsa profetisa ao mesmo tempo que era zelosa na prática do amor. Também essa igreja foi repreendida por Jesus por tal atitude. Não podemos separar o que Deus uniu. Não podemos voar com uma asa apenas. Não podemos correr com uma perna apenas. Não podemos viver de forma agradável a Deus com doutrina apenas, sem vida; nem podemos atender aos preceitos de Deus com vida apenas, sem doutrina. Doutrina e vida são um binômio necessário. A ordem de Paulo a Timóteo cruza os séculos e chega até nós: Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina.

GESTÃO E CARREIRA

DASA FAZ AUTODIAGNÓSTICO

Depois de monitorar mudança no comportamento dos clientes durante a pandemia, o maior grupo de medicina diagnóstica da América Latina irá priorizar os atendimentos domiciliares no Brasil.

Briga comercial com a Europa. Cargas confiscadas pelos Estados Unidos. Produtos retidos na China. Esses fatos parecem fazer parte de um roteiro de filme de espionagem, mas narram os desafios enfrentados desde o início da quarentena pela empresa de medicina diagnóstica Dasa, para garantir equipamentos de proteção individual (EPIs) e insumos a mais de 800 unidades laboratoriais e hospitais distribuídos por 14 estados e o Distrito Federal. O maior grupo de medicina diagnóstica da América Latina – com atuação ainda na Argentina e no Uruguai – é detentor de 40 marcas de laboratórios no País, como Delboni Auriemo, Lavoisier e Salomão Zoppi, e da Rede Ímpar, que reúne sete hospitais em três capitais: Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo. Com faturamento de R$ 7,1 bilhões no ano passado, a holding estuda investir no aumento dos atendimentos e exames domiciliares, para ampliar também os testes de Covid-19 e recuperar a demanda. “O momento pede mobilização e agilidade. A gestão diária dessa crise reforça a importância de oferecer medicina diagnóstica embasada em rigorosos critérios técnicos e científicos”, afirma o CEO da Dasa, Carlos de Barros.

As metas estabelecidas pela diretoria são proporcionais às dificuldades encontradas pela Dasa desde o início da pandemia. Na semana que antecedeu a implantação da quarentena (que começou no dia 23 de março), os clientes lotaram as unidades. Uns para realizar exames de rotina, outros com suspeita de contaminação pelo coronavírus. Diante desse cenário e para seguir as diretrizes traçadas pelo comitê de crise montado um mês antes, a empresa optou pelo fechamento de 40% dos estabelecimentos e viu dobrar a procura por exames residenciais. Com isso, o atendimento presencial despencou 70% nas semanas seguintes, percentual que diminuiu para 40% a 50% em maio.

O vice-presidente médico Emerson Gasparetto revela que a Dasa suspendeu momentaneamente os investimentos e optou por uma revisão estratégica, que inclui o direcionamento de capital para a coleta domiciliar e não mais para a abertura de novas unidades. “Aconteceu, sim, uma repriorização”, diz Gaspsaretto. “Teremos de investir melhor em estruturar a plataforma digital para apoiar os serviços de coleta domiciliar.” Ele diz que a provável alteração no plano não implica em corte de pessoal. No início da crise, a empresa afastou os colaboradores com mais de 60 anos e doenças crônicas e adotou o home office para grande parte da equipe.

O infectologista Renato Grinbaum, com doutorado em clínica médica e professor da Universidade Cidade de São Paulo, lembra que o cenário pós-pandemia é imprevisível, mas já provoca mudanças de comportamento nas pessoas, como constatado pela Dasa. Dentro dessa perspectiva, ele acredita ser uma oportunidade interessante a disponibilização de serviços e ferramentas que atendam a esse tipo de demanda. “Filas e salas de espera são ambientes que as pessoas evitarão sempre que puderem. Pagarão pelo espaço individual”, observa Grimbaum.

SEGURANÇA

Apesar de a Dasa reavaliar as prioridades, Emerson Gasparetto reforça as medidas adotadas para garantir a segurança dos pacientes e dos colaboradores durante o atendimento presencial. A companhia direcionou 71 unidades para realização dos testes diagnósticos de Covid-19 – e que realizam também todo o portfólio de exames – e criou dez centros para atender exclusivamente clientes de medicina fetal, cardiologia, geriatria, neurologia, oncologia e pediatria em São Paulo.

A empresa já constatou retomada dos exames pelos pacientes oncológicos, cardiopatas e diabéticos que tinham abandonado as suas investigações diagnósticas. “Atrasar três, quatro meses em diagnóstico de câncer de mama, por exemplo, pode ser letal”, diz. Hoje, a diretoria tem como principal desafio obter insumos para o processamento de testes de RT-PCR (um dos principais para diagnóstico da Covid-19), em que se detectam rastros genéticos do coronavírus. Apesar de ter capacidade de processar 6 mil exames por dia (com preços a partir de R$ 180), a Dasa não atinge metade do volume por falta de material. A empresa concorre com os Estados Unidos e países da Europa.

“Cargas de insumos foram confiscadas, outras não saíram da China. Remessas de EPI ficaram presas nos Estados Unidos. Mas chegamos num volume de testes diários que acredito estar atendendo a esse momento de crise”, afirma o vice-presidente médico. A empresa ainda ampliou o estoque dos testes sorológicos, que detectam imunoglobulinas IGM e IGG e mostram se o organismo está criando anticorpos. A confirmação revela que o indivíduo já foi exposto ao coronavírus.

APOIO

A Dasa fechou parceria com o Ministério da Saúde para a realização de 3 milhões de testes de RT-PCR, por seis meses, para pacientes do Sistema Único de Saúde. A capacidade inicial é de 30 mil exames por dia. Cerca de 200 pessoas trabalham no centro emergencial de diagnóstico erguido em Alphaville, na Grande São Paulo, próximo ao centro de produção da Dasa. A companhia disponibiliza, de forma gratuita, os profissionais e a infraestrutura para o processamento dos exames e insumos cedidos pelo governo federal. A iniciativa poderá ser ampliada para até 10 milhões de testes, dependendo da disponibilidade de equipamentos e da adesão de outras empresas. “A expectativa é de que outros empresários do setor se integrem à mobilização e contribuam para ampliarmos, juntos, a capacidade produtiva e o acesso aos exames para o maior número de brasileiros, num momento tão desafiador para a saúde global”, destaca Gasparetto.

O executivo lembra, ainda, que a companhia fechou unidades, perdeu receita com a queda de demanda, fez parcerias com o governo federal e não poupou recursos na aquisição de EPIs para os 30 mil colaboradores, além de 5 mil médicos. “Posso dizer que a nossa empresa estava saudável, com bom caixa antes da crise, o que nos permitiu fazer o que é melhor para os pacientes e os colaboradores”, afirma. Outro impacto se dá no hábito dos clientes. Segundo Gasparetto, a Covid-19 promoveu a transformação digital da saúde, ao, por exemplo, acabar com o receio das pessoas de pegar o resultado do exame pela internet ou de fazer uma consulta virtual.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

O ABC DA CONTROVÉRSIA

A questão sobre com que idade as crianças devem realmente ser alfabetizadas volta a rondar os noticiários e a gerar dúvidas entre profissionais da educação e entre os pais

Historicamente a alfabetização se dá em nosso país no primeiro ano do ensino fundamental, e essa determinação resistiu há anos de discussões sobre os métodos pedagógicos envolvidos, achados científicos a respeito da maturidade infantil, estudos sobre a psicogênese da escrita e depois do letramento e várias questões de diferentes ordens. Criou-se, no século XIX, um aparato jurídico para garantir a obrigatoriedade escolar, em consonância com diferentes países europeus, nos quais já havia “leis de obrigatoriedade escolar”, que conferiram visibilidade social à idade da meninice (por volta dos 7 aos 14 anos).

É simples compreender por que a Lei nº 11.274/2006, responsável pela ampliação do ensino fundamental de 8 para 9 anos, tenha despertado polêmica em torno da questão da alfabetização das crianças que passaram a entrar no chamado “1º ano” com 6 anos.

Embora escolas particulares, principalmente, já iniciassem tal processo no último ano da educação infantil, a idade passou a ser antecipada oficialmente em todas as escolas. E, com base em diferentes argumentações, o dispositivo de antecipação da alfabetização passou a operar no primeiro ano do ensino fundamental, mas se entendendo que o processo se consolidaria no terceiro ano do ensino fundamental, quando as crianças têm geralmente 8 anos de idade.

Entretanto, é fato, e reconhecido em diferentes estudos, que exageros vêm sendo praticados de modo que o primeiro ano se transformou em um período em que os professores se dedicam quase que exclusivamente à alfabetização: em Rondônia, em São Paulo, em Belo Horizonte, entre outros, o achado se multiplica e não apenas na escola particular.

Alfabetizar significa compreender o funcionamento do Código Alfabético. Esse código refere-se à correspondência entre as letras do alfabeto (grafemas) e os fonemas da língua que eles representam. Corresponde a um complexo processo, que não começa exatamente nos bancos escolares, mas neles se desenvolve e solidifica. Obviamente existe uma parcela (mínima) de crianças que se alfabetizam praticamente sozinhas, mas não é de longe uma regra, pois esse procedimento exige planejamento, estímulo a partir de competências, de habilidades individuais, e vai sendo concretizado através de trocas com o meio, de treino, de oportunidades de aprendizagem variadas.

Mas, recentemente, o quadro se complicou com o anúncio da terceira versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) pelo Ministério da Educação, que antecipa para o segundo ano a alfabetização plena das crianças. A discussão é ampla, mas já se inicia por um fato prático: reduzindo o tempo final para a consolidação dessa aprendizagem, a solução será usar dos últimos anos da educação infantil para o início da alfabetização, o que já é feito por algumas escolas, especialmente as particulares. E há famílias que apoiam e até buscam esse tipo de conduta…

Afirmar que dessa forma aproximaríamos o rendimento das crianças do sistema público de ensino às do ensino particular não basta, até porque não se encontrou até hoje vantagem alguma em fazer uma criança se tornar um leitor precoce. Além disso, os resultados da Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) de 2014 apontaram que a proposta atual não está dando resultados positivos: 20% dos alunos da rede pública que frequentam o quarto ano (10 anos de idade) não sabem ler adequadamente. E os resultados das escolas particulares nem sempre são diferentes.

Oferecer uma boa pré-escola foi o caminho que países de educação reconhecidamente de qualidade encontraram: deixaram para o ensino fundamental o aprendizado formal da leitura e escrita, deram tempo para que neurologicamente a criança alcançasse um grau de desenvolvimento que lhe permitisse aprender sem prejuízo a outras atividades igualmente importantes para seu amadurecimento global.

Não foi uma decisão impensada: foi fundamentada em estudos científicos que mostram que o cérebro infantil precisa desenvolver-se durante os seis primeiros anos de vida através de atividades como brincar, exercitar-se com dinamismo, correr, experimentar coisas novas com crianças da mesma idade, ampliar a linguagem, a atenção, a memória, sensibilizando-se para o mundo das letras por meio de contato com histórias, dramatizações, músicas, artes.

Determinar que a consolidação da alfabetização, ou seja, que a criança seja capaz de codificar e decodificar com autonomia, atribuindo sentido a textos e escrever textos compreensíveis por outros leitores ocorra no segundo ano do ensino fundamental (aos 7 anos de idade), em todas as escolas, é um objetivo ambicioso e tangível para uma parcela de nossas crianças, mas não sem ônus para elas e para seus professores. Além disso, saber ler e escrever perfeitamente aos 7 anos não evita problemas na vida escolar e não garante o sucesso profissional futuro, nem muda o quadro da educação brasileira.

Estender até os 8 anos o processo de alfabetização não significa perda de tempo, pois a criança estará desenvolvendo outras múltiplas habilidades e adquirindo novos conhecimentos compatíveis com seu neurodesenvolvimento, sua cognição, capacidade psicomotriz, socioemocional, todas fundamentais para as outras aprendizagens que virão.

MARIA IRENE MALUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br

EU ACHO …

O VALOR DA INTUIÇÃO

Seríamos nós mais marcados pela determinação do que imaginamos? Somado à filosofia e à literatura, o conceito de intuição de Henri Bergson nos remete à construção da liberdade, criatividade e inventividade

O século XIX é reconhecido como aquele em que ocorreram amplas transformações, principalmente nas ciências.

Foi no século XIX o grande acontecimento da invenção da fotografia que daria continuidade à reprodutibilidade técnica. Grandes movimentos artísticos e literários potencializaram, mais do que nunca, os movimentos de vanguarda que aconteceriam nas primeiras décadas do século XX.

No entanto, na área das ciências, o século XIX foi marcado por uma atmosfera determinista por inúmeros caminhos. Bergson, Freud, Marx e tantos outros pensadores importantes devem ser, entre outras coisas, vistos como aqueles que deram aberturas tão necessárias aos espaços do indeterminado, e com isso os ventos de uma liberdade sopram, finalmente, por todos os lados.

Henri Bergson (1859-1941) foi um pensador que buscou, de todas as maneiras, um profundo diálogo entre a filosofia, as ciências e a literatura. Sua vasta e profunda produção é composta de conceitos muito importantes. Na verdade, determinantes para que possamos entender melhor este vasto universo que habitamos. E mais importante do que isso: Bergson é o filósofo das paixões alegres, por lembrar Espinoza. O filósofo francês é aquele pensador que potencializa o ser humano. Que acredita no pensamento inventivo e criativo. E até que somos seres inesgotáveis em busca de objetivos que realmente tragam uma atmosfera menos asfixiante para este mundo tão cheio de conflitos, inclusive, os existenciais.

EXISTÊNCIA DO TODO

Um dos conceitos mais importantes propostos por Bergson é o da intuição. Intuição para Bergson não é o de senso comum. Ou seja, ligada a um vago pressentimento ou coisa parecida. Intuição para Bergson é, sobretudo, duração. Duração tem a ver com a fundação ontológica do ser. Está ligada à memória e temporalidade. Intuição faz parte do processo de raciocínio que, realmente, nos leva a pensar no que existe de mais profundo. Intuição significa, para Bergson, liberdade. E como ele fundamenta tudo isso?

Bergson é um metafísico que, no entanto, não oferece certezas. Mas, como bom pensador, nos coloca perspectivas possíveis para serem refletidas e questionadas. Um ponto importante que diz respeito à intuição é a sua concepção de cosmologia. Aquela, na realidade, que antecede qualquer proposição. Para Bergson existe um todo. O todo está dado. No entanto ele é aberto! O que isso significa? Que, segundo ele, habitamos um universo cheio de determinações por, necessariamente, nos lembrarmos de Peirce. Ou seja, somos seres muito mais marcados pela de­ terminação do que imaginamos, assim como os elementos que nos cercam.

Quando nascemos, muitas coisas já estão determinadas sem que tenhamos, conscientemente, interferido. Um elefante hoje continuará, tudo indica, a ser um elefante no dia de amanhã. Uma flor não se transformará em uma abelha. O mundo que nos permeia precisa das constantes e das invariáveis. Enfim, se prestarmos atenção veremos que o universo é muito mais determinado do que imaginamos. Um mundo sem determinações seria totalmente caótico! No entanto, de acordo com Bergson, existem as indeterminações. Ou seja, os espaços em que podemos construir nossa liberdade, criatividade e inventividade.

TEMPO DAS MULTIPLICIDADES

Mas afinal como Bergson fundamenta a intuição? Nas felizes reflexões de Deleuze, inseparável das leituras de que possamos fazer de Bergson, intuição é uma espécie de método que ele aplica à sua própria filosofia. Tem como fundamento a duração. Duração refere-se, primordialmente, ao tempo subjetivo. Incomensurável. Tempo qualitativo. A duração diz respeito a um tempo que o ser humano não tem como medir. O tempo dos relógios é implacável, obedece a uma cronologia. O tempo enquanto duração é o tempo das multiplicidades, embora seja indivisível. Atravessa o ser humano de acordo com suas experiências e sensações plenamente individuais.

Nas palavras de Bergson: “A verdade é que a filosofia não é uma síntese das ciências particulares e que se ela muitas vezes se coloca no terreno da ciência, às vezes abarca em uma visão mais simples os objetos de que a ciência se ocupa, não o faz intensificando a ciência, não o faz levando os resultados da ciência a um grau mais alto de generalidade. Não haveria lugar para dois modos de conhecer, filosofia e ciência, se a experiência não se apresentasse a nós sob dois aspectos diferentes: por um lado, sob forma de fatos que se justapõem a fatos, que se repetem aproximadamente, que se medem aproximadamente, que se desenrolam enfim no sentido da multiplicidade distinta e da espacialidade, e, por outro lado, sob forma de uma penetração recíproca que é pura duração, refratária à lei e à mensuração”.

Veja-se que Bergson coloca em xeque o quanto as ciências desprezam as relações humanas em face de algum objeto. Não somente um objeto de pesquisa. Mas tantos outros. Justamente porque as ciências jamais foram capazes de nos dar algo em si mesmo. Escapou às ciências a interioridade humana. O grande argumento de Bergson é mostrar, pelo conceito de duração, que somos seres separados das coisas. Na verdade, rigorosamente falando, somos exilados de nós mesmos. Visto que somos existencialmente interiores ao tempo, por lembrarmos as condições a priori de Kant. O conceito de duração busca mostrar que jamais temos uma relação direta com o que quer que seja. Escapamos de nós mesmos pelo tempo.

CONSTRUTORES DE LIBERDADE

Por sua vez, os grandes escritores, destacadamente, Proust, vai ao encontro do conceito de duração de Bergson quando mostra que nosso passado é inseparável de nós e ao mesmo tempo é ele que nos identifica pela memória. Na verdade, se comparados com um cavalo que galopa senhor absoluto de sua liberdade sob um presente não desdobrável e consegue flutuar pelos ares, perceberemos o quanto a condição humana é paradoxal. Somos seres condenados, permanentemente, a construir nossa liberdade, como diria o bom e velho Sartre!

ANA MARIA HADDAD BAPTISTA – é graduada em Letras. Possui mestrado e doutorado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pós-doutoramento em História da Ciência pela Universidade de Lisboa e PUC/ SP. Autora de diversos livros publicados no Brasil e no exterior. Atualmente é pesquisadora e professora da Universidade Nove de Julho em São Paulo.

OUTROS OLHARES

DIVERSÃO DO ASSUSTA GIGANTES

Vídeos curtos e engraçados levam aplicativo chinês a ascensão meteórica no concorrido mercado das redes sociais e tem tirado o sono dos executivos de Facebook e Google.

Quem nunca pegou uma vassoura para imaginariamente transformá-la em uma guitarra e começou a imitar seus ídolos da música, com caras e bocas, cantando suas letras favoritas? Uma diversão que ficou na memória de quem tem acima de 30 anos, na chamada Geração Y. Atualmente, para a Geração Z (entre 10 e 25 anos), esse mesmo passatempo é gravado na câmera do celular, potencializado com recursos tecnológicos e colocado em redes sociais. Será visto e comentado por milhões de pessoas ao redor do mundo. A brincadeira ficou séria e virou negócio. Principalmente com o surgimento do TikTok, aplicativo chinês de edição, publicação e compartilhamento de vídeos de até 15 segundos, com dublagem de músicas, esquetes de comédia, memes e desafios.

O app da rede criada em 2016 bateu a marca de 2 bilhões de downloads em todo o mundo. Uma diversão que assusta gigantes como Facebook, dona do Instagram e do WhatsApp, e Google/Alphabet, proprietária do Youtube, líderes do mercado de entretenimento na internet. “Sempre há algo novo e surpreendente que encanta os usuários”, afirma Rodrigo Barbosa, community manager do TikTok no Brasil. “Nossa plataforma oferece muitas oportunidades de negócios interessantes, tanto para marcas, como criadores.”

Ao analisar os números globais do TikTok é que se tem a noção de por que o aplicativo tem tirado o sono de Mark Zuckerberg e Sundar Pichai. Em 2019, foi o segundo mais baixado do planeta, com 738 milhões de downloads, segundo a consultoria Sensor Tower, atrás apenas do WhatsApp. No primeiro trimestre deste ano, já com o isolamento causado pela pandemia de Covid-19, foi instalado 315 milhões de vezes em smartphones, recorde para um período de 90 dias em todos os tempos, de todos os aplicativos. Dos 2 bilhões de downloads totais, quase metade é de usuários ativos, sendo 40% de jovens entre 16 e 24 anos. O que deixa o TikTok como quarta rede social mais usada, atrás de Facebook (2,2 bilhões), YouTube (1,9 bilhão) e Instagram (1 bilhão), segundo relatório da We Are Social.

Se os líderes das colossais americanas estão com dificuldades para dormir por martelar o TikTok em suas cabeças, Zhang Yiming é só alegria. Aos 37 anos, o fundador e diretor-executivo da ByteDance, um conglomerado de tecnologia que inclui o TikTok, comemora o crescimento meteórico. A companhia terminou o ano passado com valor de US$ 75 bilhões e recentemente, com transações privadas de ações, ultrapassou US$ 100 bilhões, de acordo com informações divulgadas pela agência Bloomberg. O faturamento anual estaria em torno de US$ 2,5 bilhões.

A insônia provocada pela ascensão do aplicativo chinês faz os concorrentes trabalharem para não ficar para trás. O YouTube promove testes de um recurso similar, o Shorts, que segue a mesma temática, de criar e editar vídeos de curta duração. E o Instagram lançou a função Cenas (Reels) para também criar vídeos curtos com músicas e postá-los diretamente nos Stories.

DE OLHO NO BRASIL

Já a estratégia do TikTok é, por enquanto, de preocupação mais geográfica. Com grande penetração nos principais países do Oriente, como China e Índia, e evolução gradual nos Estados Unidos (onde passou por polêmica após suspeita, não confirmada, de vazamento de dados de usuários ao governo chinês), os olhos do aplicativo estão voltados para a América do Sul, principalmente o Brasil, onde seus competidores têm presença consolidada. A cobiça pelo mercado nacional, onde a empresa instalou escritório em 2018, ocorre por diversos fatores: tamanho, estrutura econômica e empresarial, potencial de consumo e a própria característica do internauta, que passa 3h45 minutos, em média, por dia, conectado em redes sociais, segundo pesquisa da GlobalWebIndex. O País é vice-campeão nesse quesito, perdendo apenas para as Filipinas, onde os usuários passam 4h01 nesses canais. “Existe um enorme potencial para o TikTok permitir que mais usuários no Brasil e na América Latina mostrem seus talentos a um público novo e global”, afirma Barbosa.

E, para escalar esse mercado, o app tem usado os rivais. Primeiro ao contratar fenômenos de popularidade de outras plataformas, como o comediante e youtuber Whindersson Nunes e o ator e apresentador Fábio Porchat, para estrelarem suas campanhas. Segundo porque os vídeos produzidos, editados e publicados no TikTok são divulgados pelos usuários também por meio do WhatsApp, Facebook e Instagram, onde viralizam com um selo do logotipo do aplicativo chinês. Ou seja, os concorrentes fazem propaganda gratuita para ele. Outro diferencial da rede social asiática é o algoritmo usado para distribuir os conteúdos. Não há possibilidade de impulsionar as postagens de forma paga para obter melhores resultados, pois a empresa ainda não está interessada nessa forma de monetização. “A disputa neste momento é pelo tempo do usuário”, diz Isabela Ventura, CEO da Squid, especializada em marketing de influência. No primeiro trimestre deste ano, comparado com o último trimestre de 2019, a Squid registrou aumento de 600% nas propostas comerciais que envolvem campanhas no TikTok para as marcas.

CURADORIA

Marcas como Havaianas e Guaraná Antarctica estão entre as primeiras a promover ações publicitárias em parceria com o aplicativo no Brasil, no intuito de se aproximar do público jovem. A marca de refrigerantes usou curadoria do TikTok para buscar criadores para produzir conteúdos adequados à plataforma. Foram feitas 27 latinhas temáticas e um QR Code, que redirecionava para o perfil de Guaraná Antarctica no app. Pelo mundo, projetos conjuntos envolvem grifes como Calvin Klein e Sephora, além de corporações esportivas como a NFL (do futebol americano) e a La Liga (campeonato espanhol de futebol.

Ainda em solo tupiniquim, o TikTok mostra-se plural e democrático, tornando anônimos em famosos rapidamente. O fotógrafo e designer Vincynite, de 24 anos, foi o primeiro a ter um vídeo viral na rede. Em uma música autoral – conhecida como “Me diz seu nome” –, ele convoca os usuários a responder perguntas, como nome, idade, altura, cidade onde mora, roupa preferida. Outros tiktokers completam essas informações em seu próprio vídeo, com uma edição fácil, disponível no app, imitando a coreografia de Vincy. Entre os 600 mil perfis que participaram do desafio estão celebridades como Mariana Ruy Barbosa. Ao todo, são 10 milhões de views da criação, o que fez Vincy torna-se popular e ter hoje 1,4 milhão de seguidores na rede. “Gosto de vídeos rápidos, de coisas espontâneas e diferentes”, diz o agora famoso creator, que já produziu conteúdos para marcas como McDonalds, Santander e Trident.

Especialista em marketing digital e performance, André Salles, consultor técnico da YZ Media para a América Latina, diz que o TikTok é um caso de sucesso, tem se tornado uma válvula de escape para as pessoas durante a pandemia, o que aumenta a importância do aplicativo. Mas faz um alerta. “É difícil prever se é uma onda passageira.” OK, como tudo na internet. O fato é que por enquanto, para os gigantes americanos da tecnologia, tem sido um tsunami.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 19 DE JUNHO

O DRAMA DA MALEDICÊNCIA

Pois quem quer amar a vida e ver dias felizes refreie a língua do mal e evite que os seus lábios falem dolosamente (1Pedro 3.10).

A maneira mais indigna de alguém se promover é falar mal dos outros. A língua mata mais que a espada e destrói mais que o fogo. A maledicência é uma espada afiada que sangra suas vítimas. A língua é fonte de vida ou cova de morte. É árvore frutífera que alimenta ou espinheiro que fere; é medicina que cura ou veneno que mata. Como o leme de um navio, pode dirigir você em segurança pelos mares da vida ou lançá-lo sobre os rochedos das intrigas. A língua é como uma fagulha que incendeia toda uma floresta. Fazer um comentário maledicente é como lançar um saco de penas do alto de uma montanha. É impossível recolhê-las. O maledicente espalha contendas entre os irmãos, e esse é o pecado que Deus mais abomina. Há muitas pessoas prisioneiras da língua solta. Há muitos relacionamentos quebrados e muitos lares feridos por causa da maledicência. A Bíblia fala de Doegue, o fofoqueiro, o homem que incitou o rei Saul a cometer uma chacina na cidade de Nobe. A Palavra de Deus reiteradas vezes diz que aquele que domina a sua língua domina também todo o seu corpo. Quem refreia a sua língua abre largas avenidas para uma vida feliz. Nossas palavras precisam ser verdadeiras, agradáveis e proveitosas. Precisam transmitir graça aos que as ouvem. Nossas palavras precisam glorificar a Deus e edificar o próximo.

GESTÃO E CARREIRA

O ESPAÇO É PRIVATIZADO

Com a missão tripulada bem-sucedida do foguete Falcon 9, Elon Musk sai na frente na corrida espacial privada. Os bilionários Richard Branson e Jeff Bezos, da Amazon, também estão nessa disputa

O fascínio do homem pelo espaço tem desafiado os esforços de países, cientistas e empreendedores. A corrida pela conquista espacial começou com a disputa entre União Soviética e Estados Unidos, durante a Guerra Fria, ainda nos anos 1950. Alternadamente, as duas potências econômicas e bélicas mostraram todo seu poderio já nos anos 60, com êxito em suas expedições. Além da rivalidade ideológica e política, a quebra dos limites tecnológicos inspirou, na sequência, a indústria cinematográfica. O imaginário das pessoas foi trabalhado durante décadas e muitas crianças sonhavam com a profissão de astronauta. Alguns, muito poucos, se tornaram bilionários e conseguiram até virar donos de naves espaciais — como o sul-africano Elon Musk.

No dia 30 de maio, ele conseguiu inaugurar uma nova etapa na história da corrida espacial, quebrando meio século de monopólio das nações. Sua companhia SpaceX foi responsável pela viagem do foguete Falcon 9 para a Estação Espacial Internacional, uma jornada que durou 19 horas e percorreu 400 km. Ela partiu do Centro Espacial Kennedy (Flórida/EUA) com dois tripulantes – os astronautas Bob Behnken, 49 anos, e Doug Hurley, 53 anos –, e se atracou na estação com precisão, completando com sucesso a primeira viagem tripulada de uma empresa particular. Com ela, o espaço começou a ser privatizado.

As interrogações sobre o potencial de retorno de uma empresa privada no setor logo foram respondidas. Com o anúncio do lançamento do foguete, somente a Tesla, a montadora pioneira de carros elétricos de Musk, viu, em um mês, suas ações aumentarem 18% na bolsa Nasdaq. Mas o investimento público foi essencial para a Space X. A Nasa, desde 2011, concedeu aporte de US$ 3 bilhões para o lançamento da Falcon 9. A companhia ainda tem um contrato de US$ 500 milhões para construir uma rede de microssatélites de conexão à internet. Entusiasta da vida fora do planeta e embaixador das viagens espaciais para civis, Musk já fechou negócio com o turismo em órbita. Em 2018, garantiu uma passagem para outro bilionário, o japonês Yasaku Maezawa, em um voo ao redor da Lua — dessa vez, será no foguete Big Falcon. Os valores não foram revelados, mas Musk afirmou que estaria recebendo muito dinheiro pela viagem.

DOS DISCOS AO ESPAÇO

O britânico Richard Branson segue os passos de Musk na corrida espacial privada. O empreendedor iniciou sua trajetória profissional com uma loja de discos nos anos 70. O sucesso fez a Virgin Records crescer muito e virar uma gravadora. Nos anos 2000, o agora multimilionário Branson criou a Virgin Galatic, um braço da Virgin Group que reúne companhias aéreas e ferroviárias, uma operadora móvel e empresas de mídia. Em 2014, um acidente fez o projeto ser desacelerado. A nave Enterprise explodiu após separar seus módulos e causou a morte do astronauta Michael Alsbury. Em 2018, A Virgin Galactic fez uma viagem de teste de altitude com 80 quilômetros de distância e dois pilotos. O que não foi suficiente para chegar à órbita, mas reposicionou Branson na disputa. O empresário se destaca por pensar no espaço como um lugar a ser explorado por turistas. Diferente dos negócios de Elon Musk, o britânico quer contar com turistas que invistam cerca de R$ 250 milhões para dar um passeio despretensioso pela órbita da Terra.

O MAIS RICO DO MUNDO

O americano Jeff Bezos é o terceiro bilionário da corrida. Homem mais rico do mundo, tem uma fortuna avaliada em US$ 148 bilhões. CEO da Amazon, segunda companhia do mundo a superar o valor de US$ 1 trilhão de mercado, ele garante que em 2021 a sua nave Blue Origin vai triunfar no espaço. Bezos diz que investiu US$ 2,5 bilhões na nave New Glen, com 300 metros de altura, que promete ser reutilizável. O empresário desconsiderava o aporte de recursos do governo americano no início da empreitada, mas desde 2018 mudou de posição. Atualmente, participa de concorrências para oferecer produtos espaciais.

NOVO MUNDO

A corrida espacial inaugurou um novo mundo. As cifras envolvidas estavam além da capacidade de investimento das empresas. Essa barreira, agora, começa a ser superada por empreendedores visionários e multimilionários. Ainda é bem cedo para avaliar quanto tempo será necessário para que tripulações de civis tenham acesso ao serviço. Talvez, nem mesmo seja essa a intenção. O fato é que a iniciativa privada agora é a dona da bola. A Nasa, que conseguiu levar o homem à lua em 1969, continua sendo uma importante instituição do governo norte-americano, mas parece que tem futuro muito mais próximo de uma agência reguladora do que de uma concorrente tecnológica. Os custos envolvidos apontam que é mais barato desenvolver projetos no campo privado. A utilização do marketing a serviço das empresas promete ser uma grande arma para a arrecadação de recursos. A disputa, no final, será daqueles meninos que um dia sonharam em ser muito mais do que astronautas.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

PSICOLOGIA DAS NAÇÕES

Lima Barreto, em “O homem que sabia javanês”, nos apresenta um país sem leis e sem preocupação com a verdade, sob a égide dos favores e minado pela desordem. Talvez não fique tão longe daqui

Desejos de suplantar as dificuldades pessoais e controlar o destino por meio do misticismo são os ingredientes para se descobrir e se nutrir um trapaceiro. A reflexão dos homens pode ser aprisionada às suas emoções e, com isso, eles podem legitimar as ações e mentiras de um malandro. Essa é a essência de um conto que Lima Barreto escreveu em 1911 intitulado “O homem que sabia javanês”.

O conto começa com Castelo relatando ao seu amigo Castro como soube levar vantagem em tudo na vida com a postura de um malandro carismático. Esvaziando copos de cervejas, relatou, como se fosse um assunto banal, “as partidas que havia pregado às convicções e às respeitabilidades, para poder viver”. Uma dessas “partidas” foi tornar-se professor de javanês sem conhecer a língua. Orgulhava-se de sua esperteza como a sorrir dos ingênuos que foram enganados. Aprendeu que o reconhecimento social nada tem a ver com verdades, e sim com a habilidade política de enganar.

Contava Castelo que morava em pensões e se mudava frequentemente, de uma para outra, por falta de pagamento. O trabalho com horários a cumprir não lhe era aprazível. Um dia viu um anúncio no jornal que procurava por um professor de javanês. Intuiu que não teria concorrência e que estava diante de uma oportunidade para usar os seus dotes tapeadores e se inscreveu. Sua função era ler um misterioso calhamaço em língua javanesa para um velho supersticioso, o barão de Jacuecanga.

Castelo empenhou-se na valorização de sua aparência para sentir-se seguro em enganar. Relatava ao amigo, de forma irônica, como se aproveitou da ingenuidade e estupidez daqueles que nele acreditavam para conduzir a sua sorte para onde queria. Ao constatar a tolice alheia, a luta entre a ambição e a honestidade, tão logo iniciou, cedeu lugar à ganância.

Numa dessas ocasiões em que sua farsa foi desafiada, foi convidado a participar de um congresso, em Paris, com os sábios da língua. Por engano, recebeu o convite para se apresentar na seção de tupi-guarani. A situação foi muito proveitosa e, como em muitas outras vezes, a sorte, aliada à sua autoconfiança, o fez voltar consagrado pelos jornais europeus, que mencionaram o banquete a ele “oferecido”, o qual ele mesmo financiou. Dos mestres ficou o retrato do ridículo, pois não foram capazes de desmascarar um espertalhão impostor.

O barão de Jacuecanga escutava as histórias inventadas por Castelo, como se ele estivesse lendo o calhamaço escrito em javanês. A sorte, sempre aliada à fé em si mesmo que o malandro tinha, fez com que, nesse ínterim, o barão recebesse uma herança inesperada. Convencido de que a leitura desse livro traria ventura à sua família, o barão admitiu o quão importante era esse homem que sabia javanês. O barão e seu genro conheciam o visconde de Caruru, que conseguiu colocar Castelo na carreira diplomática e, desse modo, ele se tornou cônsul do Brasil.

Até se tornar esse impostor que fingia ler o javanês, o mundo de Castelo era o das ruas de pensões pobres, onde aprendera a se especializar na malandragem. Saiu desse mundo dos bondes lotados para viver nos reconfortantes lugares frequentados pela burguesia bem-sucedida. Em todas as situações em que Castelo poderia ser desmascarado, o universo conspirou a seu favor. E todos os que se convenceram da sua notoriedade legitimaram suas ações e mentiras. O malandro está sempre preparado para alterar a percepção do outro sobre si mesmo. Tem firmeza no que faz e diz, e isso impressiona. Na ocasião da Segunda Guerra, Walt Disney criou um personagem para representar o Brasil e deu o nome de Zé Carioca. Era um papagaio desajeitado, pobre, preguiçoso, capaz de aprender tudo rápido e muito criativo para enganar e lucrar explorando os outros.

A obra denuncia o espaço que tem um farsante que, com a sua sorte, consegue enganar pessoas, as quais, no lugar de usarem a racionalidade, usam dogmas e encaminham-se para o fanatismo para, dessa forma, ninguém poder apontar e dizer “o rei está nu”.

Criamos ídolos para compensar nosso sentimento de incompletude. Esses ídolos não podem ter imperfeições para não comprometerem nossa autoestima já cambaleante. Um líder carismático que promete a felicidade a qualquer preço passa a ser uma figura sedutora para uma massa   desacreditada que vive o desemprego, a fome e a escassez de alimentos. Os fatos sucumbem ao fanatismo, e a adesão é cega. Não podemos enxergar aquilo que foge ao que esperamos para que nossas fraquezas não sejam denunciadas. Torna-se difícil conseguir um nível de consciência crítica suficiente para perceber a diferença entre o falso e o autêntico, pois essas pessoas, ao se unirem a seus pares, deixam de usar a razão e se aprisionam no fosso fundo das emoções.

Reduzir nossos ídolos a um malandro é tão doloroso que mergulhamos em nosso campo cego e encontramos explicações suficientes para apaziguarmos nosso espírito e continuarmos a defendê-lo. Nesse ponto, as mentiras dos “castelos” vão ficando consagradas a ponto de todos os atos deles que aparecem como imperfeições tornarem-se invisíveis, pois estas são nossas próprias imperfeições, que temos dificuldades em aceitar. Jung nos alerta que somente com a transformação da atitude do indivíduo é que começará a se transformar a psicologia das nações.

CARLOS SÃO PAULO – é médico e psicoterapeuta junguiano. É diretor e fundador do Instituto Junguiano da Bahia. carlos@ijba.com.br/www.ijba.com.br

EU ACHO …

EM DEFESA DA PRESENÇA

Apesar de não admitirmos, somos, em geral, péssimos ouvintes. E isso não é recente. Mas a habilidade de trazer mais atenção às conversas, em tempos de redes sociais, só tem piorado

Ao constatar que processamos apenas 25% do que nos é informado verbalmente, pesquisas realizadas na década de 1950 já apontavam para uma necessidade de melhorarmos nossa habilidade de trazer mais atenção às conversas – que, na maioria das vezes, não passam de monólogos cruzados. O problema é que, comprovadamente, só percebemos essa falha nos outros: um estudo dos anos 70 envolvendo 8 mil americanos mostrou que todos consideravam-se ouvintes mais atentos que seus colegas de trabalho.

De lá pra cá, ganhamos vários meios de expor nossa privacidade e opiniões, sem precisar oferecer a contrapartida que costumamos evitar. Socializamos nosso egocentrismo, desequilibrando ainda mais a relação entre a escuta e a expressão. Os smartphones com os quais hoje temos que dividir a atenção do nosso interlocutor nos momentos em que usufruímos do luxo de um encontro pessoal não são a causa, mas o retrato da nossa propensão à vaidade e à impaciência. São extremamente tentadores justamente por alimentar nossa tendência de falar mais que ouvir, de aparecer mais que comparecer e de escapar daquilo que demanda energia mental. Facilitam a fuga das exigências que vêm com as relações mais significativas.

Como resultado, vivemos uma ansiedade cuja origem pode ser difícil de rastrear. Sentimos falta de atenção, apesar de termos o poder de publicar cada pensamento. Sentimos falta do processo lento de construção de relações satisfatórias, da empatia que só uma boa conversa propicia, de não precisar acompanhar todas as mudanças, de não precisar de constante exposição. A tentativa de identificar e, assim, poder dominar melhor essa ansiedade levou-nos a nomeá-la com uma sigla: FOMO (inglês para fear of missing out, ou medo de ficar por fora). O FOMO é o retrato de nossa contraditória condição de querer participar de tudo, mas não conseguir dedicar atenção a quase nada e, em contrapartida, não termos ninguém que nos escute de fato. É também reflexo do sentimento de fracasso despertado pelo acesso constante ao sucesso dos outros.

Adolescentes aprendem que podem ser quem quiserem e que a fama não depende de sorte, mas está ao alcance de quem for capaz. Enquanto não soubermos ensiná-los o real significado de uma vida bem-sucedida, continuaremos correndo o risco de vê-los recorrendo a inimagináveis formas de atrair atenção e sentirem-se aceitos.

Precisamos reaprender, para então ensinar às crianças, que a sensação de que nossos sonhos estão distantes da realidade, apesar de isso não ser divulgado nas redes, aflige todos; que felicidade não é algo a ser perseguido a qualquer custo e que, principalmente, não será encontrada na fama. Temos que ensiná-los que não há curtidas ou visualizações suficientes para superar o valor de uma grande amizade. Boas conversas, pessoas interessadas e inteiramente presentes são, possivelmente, a única forma de nos salvar das aflições que, assim como o FOMO, crescem até ganhar definição nos dicionários. Mas construir relações significativas é um exercício trabalhoso, que exige uma série de capacidades encontradas nos raros bons ouvintes: generosidade, para oferecer tempo e presença; disposição, para ouvir com interesse sincero; vulnerabilidade, para mostrar-se desarmado e inteiro; e tolerância, para administrar frustrações e aceitar diferenças, sem julgar nem comparar.

Essas virtudes não se desenvolvem por meio de canais que trazem praticidade às interações sociais, ao simplificarem conflitos e possibilitarem contatos múltiplos com economia de tempo. Afinal, não há nada de prático nas relações humanas: são tão complexas que se desenvolvem continuamente ao longo da vida e só são aprendidas na prática.

A tecnologia é algo que sempre se faz supreendentemente imprescindível logo que surge com nova finalidade. Portanto, admitir a ação pouco eficaz das redes sociais na realização que buscamos nas relações não fará com sejam menos usadas. Mas pode ser o início de um movimento que nos alerta para a urgência e o valor da presença. Pode nos fazer reconhecer que os canais virtuais são inevitáveis e excelentes meios para complementar – e não sustentar – as interações, que necessitam, mais que nunca, de profundidade e atenção mútua.

Se o papel fundamental da amizade é termos testemunhas para nossa existência, como defende o filósofo David Whyte, as redes iludem oferecendo a ideia de que podemos ter todos os momentos da vida testemunhados, curtidos e comentados. Mas não é à multidão de olhares distantes que ele se refere, e sim aos poucos e valiosos olhares atentos e ouvidos interessados, que se dispõem a presenciar as nuances da nossa essência e dos sentimentos que não conseguimos expor a uma plateia. Não basta sermos observados – precisamos ser compreendidos e aceitos, sem o medo de julgamento ou de expor as inevitáveis fraquezas, para nos livrarmos da solidão de uma existência superficialmente compartilhada.

Pois no fim do dia, os espectadores já terão esquecido as imagens e pensamentos que jogamos nas redes, mas nossos amigos de verdade terão o carinho de guardar na memória o que nos faz únicos e temos de melhor, o que pode ser percebido na comunicação completa, que só a presença permite.

MICHELE MÜLLER – é jornalista, pesquisadora, especialista em Neurociências, Neuropsicologia Educacional e Ciências da Educação. Pesquisa e aplica estratégias para o desenvolvimento da linguagem. Seus projetos e textos estão reunidos no site www.michelemuller.com.br

OUTROS OLHARES

CORPO BLINDADO

Tratamentos que atuam no sistema de defesa do organismo no combate ao novo coronavírus ganham força em estudos no mundo, inclusive no Brasil

No verão de 430 a.C., Atenas foi abalada por uma infecção misteriosa. Deflagrada na zona portuária, a enfermidade rapidamente se espalhou pela cidade inteira, matando um terço da população em apenas um ano. A origem da “praga de Atenas,” como a nomearam os pesquisadores, foi desvendada somente em janeiro de 2006, quando se confirmou a presença de bactérias da febre tifoide em dentes de ossadas. Em meio à pandemia, o historiador Tucídides descreveu um fenômeno: as pessoas que haviam contraído a peste e se recuperado não se contaminavam com a doença pela segunda vez.

Foi o pioneiro (e fascinante) relato do papel do sistema de imunidade do corpo humano. É como uma “dança barroca”, na definição da escritora americana Eula Biss, pela qual centenas de milhares de células atuam sob rígida, bela e intrincada hierarquia para manter o corpo blindado de infecções. Há aquelas que podem destruir células infectadas, as que engolem os microrganismos e depois exibem pedaços deles para que outras os reconheçam e reajam. Há as que monitoram sinais de doenças e outras, ainda mais sagazes, que produzem e transportam anticorpos.

Como não há ainda vacina contra a ação do Sars-CoV-2 e como a Covid-19 por enquanto não tem tratamento definitivo, um campo de trabalho cresce com extraordinária rapidez – a busca por técnicas de fortalecimento da própria engrenagem de defesas naturais do organismo. A mais bem-sucedida é a aplicação de plasma sanguíneo dos curados em acamados. Em decisão inédita no mundo, o respeitado serviço de saúde do Reino Unido (NHS) determinou que todos os pacientes com o novo coronavírus internados, mesmo os que não estão em UTIs, são elegíveis para receber a transfusão.

O princípio do recurso médico é simples: os anticorpos, os fiéis escudeiros contra invasores, que nadam no plasma de uma pessoa já imune, ao serem transferidos para outro organismo, passam a trabalhar avidamente. É o que se alcunhou de “imunização passiva”. Diz José Mauro Kutner, hematologista do Hospital Albert Einstein e coordenador da pesquisa de plasma em pacientes com Covid-19: “As pessoas recuperadas da Covid-19 têm altos níveis dessas proteínas de proteção, que permanecem no sangue mesmo depois do desaparecimento dos sintomas, afastando-as de futuras infecções”. O plasma compõe mais de metade do volume sanguíneo. Amarelado, ele é constituído majoritariamente por água. O restante inclui gorduras, fatores coagulantes, sais minerais e os preciosos anticorpos. É substância tão valiosa que hoje chega a representar 1,6% das exportações totais de produtos nos Estados Unidos, mais do que o país lucra com a venda de aviões.

Em todo o mundo, há dezenas de centros de investigação dos bons efeitos do plasma nos cuidados com a Covid-19, e muitos deles estão no Brasil. Os hospitais Albert Einstein, Sírio-Libanês, Beneficência Portuguesa e as universidades estaduais de São Paulo e do Rio de Janeiro lideram o movimento. “Não há dúvida das reais possibilidades desse tipo de tratamento contra a pandemia”, diz o hematologista André Larrubia, gerente executivo do banco de sangue da Beneficência Portuguesa. Um trabalho publicado no respeitadíssimo The American Journal of Pathology mostrou que 76% dos pacientes que receberam plasma apresentaram melhora. O maior estudo já realizado até o momento, feito por pesquisadores do Hospital Mount Sinai, em Nova York, comparou 39 pacientes graves com Covid-19 que receberam plasma com doentes que não foram submetidos a transfusões. Os resultados mostraram que os receptores de plasma saíram mais rapidamente do hospital e precisaram de menos oxigênio suplementar.

No fim de abril, a americana Cynthia Lemus, de 24 anos, foi uma das primeiras a ter alta nos Estados Unidos depois de ser tratada da Covid-19 com plasma no Intermountain Medical Center, em Utah, uma das maiores referências de saúde do planeta. O final feliz chegou treze dias após ela ter recebido a transfusão. A doação veio da Mayo CLinic, em Rochester, onde os médicos estão atuando como investigadores principais do protocolo nacional de tratamento do coronavírus com o plasma. As doações passam por rigorosa triagem, que inclui a análise da quantidade de anticorpos, além, claro, da tipologia sanguínea. “Muitas pessoas se voluntariam para doar, mas apenas 40% são selecionadas”, diz Silvano Wendel, diretor do banco de sangue do Hospital Sírio-Libanês. Infectada no início da pandemia, Gabriela Korek, de 34 anos, foi aprovada pelo Hospital Albert Einstein depois de longa e minuciosa investigação em torno de seu estado de saúde. “Queria não só fazer a minha parte para ajudar doentes graves, mas também agradecer a sorte que eu tive por ter me curado”, diz Gabriela.

É estrada luminosa, de curvas sinuosas, mas que aponta para um extraordinário caminho de esperança. Os cientistas já conseguiram desenvolver em laboratório anticorpos semelhantes aos do plasma humano. No início deste mês, a farmacêutica americana Eli Lilly iniciou o primeiro teste clínico com esses compostos. Trabalha-se ainda com uma alternativa atrelada à imunidade – e, curiosamente, ela trata de frear as respostas dos anticorpos, em vez de aumentá-las. A explicação: o novo coronavírus se espalha de forma tão avassaladora que, em muitos casos, a reação do sistema imunológico é excessiva e desproporcional. Diz o infectologista Gerson Salvador, especialista em saúde pública pela Faculdade de Saúde Pública da USP: “O resultado é uma inflamação exagerada”. E o que poderia fazer bem pode matar. É preciso, portanto, dar um basta no exército de defesa, para usar metáfora muito comum. Os anti-inflamatórios, como os corticoides e o interferon (desenhado originalmente para hepatite), têm apresentado bons resultados.

Ressalve-se, contudo, para evitar louvações exageradas, ser improvável que apenas uma solução medicamentosa aponte para a bola de prata contra a Covid-19. Usar os anticorpos – por meio de plasma ou barrando os demasiadamente glutões – é um modo de atacar a infecção. Os cientistas acreditam que o futuro está em combinações dessas terapias com o uso de antivirais, como o remdesivir. Até que surja uma vacina (e há bilionária corrida para alcançá-la), a rainha de todos os mecanismos de imunidade, a maestrina a conduzir as tropas afeitas a expulsar os batalhões perversos.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 18 DE JUNHO

ANSIEDADE, O FANTASMA DA ALMA

Não andeis ansiosos pela vossa vida (Mateus 6.38b).

A palavra “ansiedade” no grego significa “estrangulamento” e se relaciona a tirar o oxigênio, apertar o pescoço, sufocar. Muitas pessoas vivem com a respiração ofegante, atormentadas pelo fantasma da ansiedade. Jesus disse que a ansiedade é inútil, pois não podemos acrescentar um único côvado à nossa existência. Disse também que a ansiedade é prejudicial, pois basta ao dia o seu próprio mal. Ansiedade é ocupar-se no presente de um problema futuro. É afligir-se por algo que ainda não está acontecendo. Está provado que mais de 70% das questões que nos deixam ansiosos nunca se concretizarão. Sofremos desnecessariamente. Ficar ansioso hoje não nos ajudará de forma alguma a resolver os problemas de amanhã. Finalmente, Jesus disse que a ansiedade é um sinal de incredulidade, pois os gentios que não conhecem a Deus é que se preocupam com o dia de amanhã, acerca do que vão comer, beber ou vestir. Nós, porém, devemos buscar em primeiro lugar o reino de Deus e sua justiça, sabendo que as demais coisas nos serão acrescentadas. O fantasma da ansiedade é afastado do nosso caminho quando confiamos em Deus e entregamos nossos cuidados a ele. Vencemos a ansiedade quando adoramos a Deus, fazendo-lhe petições e súplicas, com ações de graças. O resultado dessa atitude é que a ansiedade vai embora e a paz de Deus, que excede todo o entendimento, vem habitar em nossa mente e em nosso coração.

GESTÃO E CARREIRA

ENTRE O CÉU E O INFERNO

Com perdas estimadas em US$ 314 bilhões neste ano, as companhias aéreas tentam fugir da tempestade causada pela pandemia e pela recessão. O destino das empresas, no entanto, depende da boa vontade – e da consciência – de governos e bancos estatais.

Oscar Lima Alfa, mayday, mayday, mayday.” Se a atual situação das companhias aéreas pudesse ser exemplificada em um diálogo entre pilotos de avião e controladores de voo, essa provavelmente seria a síntese da conversa. No jargão aeronáutico, trata-se de um pedido urgente de socorro, diante de um risco iminente de queda. Mas fora do campo das metáforas, em chão firme, a crise econômica gerada pela pandemia da Covid-19 derrubou as receitas das empresas de aviação comercial no Brasil e no mundo, com prejuízos incalculáveis em longo prazo e efeitos ainda imprevisíveis – turbulência jamais enfrentada por um setor que globalmente emprega 68 milhões de pessoas e simboliza a espinha dorsal do lazer e dos negócios internacionais.

Pelos cálculos da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA, na sigla em inglês), a pandemia acarretará em perdas de US$ 314 bilhões em 2020, uma redução de receita de 55% em relação a 2019. Mais do que a queda no faturamento, o hiperendividamento em dólar é uma imensa nuvem de tempestade na rota das empresas. A dívida mundial total do setor, atualmente em US$ 430 bilhões, deve superar US$ 550 bilhões até o fim de dezembro, alta de 28% na comparação com o mesmo período do ano passado. Cerca de US$ 200 bilhões serão necessários para salvar as empresas. Nesse contexto, é quase uma unanimidade que só existe uma opção de rota para a sobrevivência da indústria aérea: resgate com dinheiro público. “O auxílio dos governos está ajudando a manter a indústria”, afirmou o francês Alexandre de Juniac, diretor-geral da Iata. “O próximo desafio será impedir que as companhias aéreas afundem sob o peso da dívida que esta ajuda está criando.”

Em todo o planeta, do aumento de US$ 120 bilhões nas dívidas das companhias aéreas para este ano, uma fatia de US$ 67 bilhões é referente a empréstimos de governo e bancos estatais, além de impostos diferidos e garantias de empréstimos. Os US$ 53 bilhões restantes se referem a empréstimos contraídos com bancos privados, dívida do mercado de capitais, débitos de novos arrendamentos operacionais e acesso a novas linhas de crédito. Praticamente todas as empresas aéreas apelaram para suspensão temporária de pagamento mensal do leasing de aeronaves – grande parte deles controlados por fundos de pensão internacionais –, de taxas aeroportuárias e de contratos com grandes bancos.

Dos recursos que os governos já se comprometeram neste ano para resgatar as empresas, US$ 67 bilhões deverão ser pagos em médio e longo prazos. Do total, US$ 34,8 bilhões se referem a subsídios salariais, seguido por financiamento de ações (US$ 11,5 bilhões) e desoneração ou subsídio fiscal (US$ 9,7 bilhões). “Menos de 10% dos auxílios do governo serão adicionados ao patrimônio da companhia aérea. Isso muda completamente o quadro financeiro da indústria”, afirma Juniac. “Pagar a dívida dos governos e credores privados significará que a crise vai durar muito mais do que o tempo necessário para a demanda de passageiros se recuperar.”

Indiscutivelmente, a rota de voo para as companhias saírem da crise é uma das mais arriscadas de toda a história econômica recente. Para o presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, a crise provocada pelo coronavírus é um “cenário como jamais se viu”. O executivo avalia que as três maiores companhias aéreas brasileiras (Azul, Gol e Latam) entraram crise um pouco mais fortalecidas do que empresas de outros setores, por causa da falência da concorrente Avianca. Segundo ele, no entanto, a queima de caixa tem sido brutal. “A gente não cria demanda, apenas atende. Para as viagens de lazer, se as pessoas não tiverem dinheiro não vão viajar”, afirma. “As viagens de negócios dependem da retomada de eventos, congressos, feiras. E não há cenário de retorno desse setor no curto prazo.”

O presidente da Abear afirma que a retomada do setor aéreo também vai depender das políticas do governo federal para a recuperação econômica. As empresas aéreas pleiteiam com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) um pacote de ajuda em forma de empréstimos, no total de R$ 6 bilhões – R$ 2 bilhões para cada uma das três maiores companhias. O BNDES estuda se comprometer com um terço do total, enquanto os bancos privados entrariam com outros R$ 4 bilhões. Pela proposta, cerca de 75% da quantia será em forma de títulos de dívida, e 25% poderá ser convertido em ações. “Vamos atravessar essa crise. Mas como vamos atravessar, vai depender das políticas, especialmente do crédito do BNDES”, afirma Sanovicz.

Menor do que o pleiteado ao governo, o aguardado socorro estatal, por meio do BNDES, tem sido fonte de disputas e conflitos dentro do própria staff bolsonarista. “O governo não vai pegar dinheiro público, dinheiro que falta para saúde e educação, e simplesmente salvar uma grande empresa, não é assim. É da vida ser abatido, é do mercado”, disse o ministro Paulo Guedes, em abril. Já o time técnico do Ministério da Infraestrutura, comandado por Tarcísio de Freitas, trabalha nos bastidores para evitar que as empresas quebrem e prejudiquem toda a cadeia de transporte de passageiros e de logística do País.

O consenso é que a oferta de socorro estatal de R$ 2 bilhões às empresas é considerado insuficiente e fora do ‘timing’. No Brasil, atualmente as empresas estão operando com uma malha aérea mínima, que é aproximadamente 90% menor se comparada com o mesmo período de 2019, redução que foi acordada entre as companhias aéreas e o governo. Thiago Carvalho, advogado especialista em direito aeronáutico e integrante da Comissão de Direito Aeronáutico da OAB no Rio de Janeiro, diz que a expectativa de crescimento da aviação no mundo para 2020, antes da pandemia, era de aproximadamente 4%. “Para a América Latina a alta seria menor, de 1,8%, muito em razão de problemas em Argentina, México, e Venezuela.”

DECOLAGEM FRUSTRADA

Na avaliação do executivo Jerome Cadier, CEO da Latam no Brasil, a crise é uma espécie de decolagem abortada em alta velocidade, já que antes da chegada do novo coronavírus o setor da aviação estava em um momento bastante positivo no País. “Depois dos anos difíceis de 2015 a 2017, estávamos voltando a crescer”, afirma. “Em 2018 e, principalmente, 2019 estávamos em recuperação do setor, colocando mais aviões para voar e fazendo investimentos pesados em cabines novas e contratação de tripulantes.”

Com a pandemia, no entanto, tudo parou muito rápido. Em menos de três semanas vieram a queda nas vendas até a paralisação dos voos, inicialmente na Europa, e nas semanas seguintes nos Estados Unidos e no Brasil. “Este é um setor que precisa de muito giro. Usamos o valor das vendas do dia para bancar as operações realizadas naquele mesmo dia”, explica Cadier.

A Latam, com ações negociadas na bolsa de Nova York, precisou recorrer ao Chapter 11, uma versão de recuperação judicial e o último recurso antes da falência. Para Cadier, o instrumento é muito utilizado nos Estados Unidos para garantir que as empresas consigam se reestruturar de forma sustentável do ponto de vista financeiro. “As grandes montadoras americanas, assim como American e Delta, já entraram com esse pedido no passado e tiveram êxito”, afirmou. “Ele permite que a empresa continue operando, vendendo e pagando os colaboradores enquanto negocia as dívidas, o que deve ocorrer num prazo de 12 a 18 meses.” O executivo destacou também que a filial brasileira não entrou no Chapter 11, mas sim as subsidiárias no em Chile, Colômbia, Equador, Peru e Estados Unidos. As operações da Argentina e do Paraguai também ficaram de fora do processo.

SEM MARGEM

O problema é que o setor aéreo, há tempos, convive com margens de lucro espremidas, e muitas vezes negativas. Segundo Leonardo Nascimento, sócio-fundador da Urca Capital Partners, os resultados de companhias aéreas são bastante afetados em depressões de demanda devido aos altos custos com o leasing de aeronaves, folha salarial e, principalmente, pelas variações cambiais. “As margens do setor já são bastante apertadas e qualquer flutuação relevante na demanda já consome o caixa de curto prazo das companhias”, afirmou.

Ao analisar o volume de voos das empresas, fica evidente o cenário de desespero. A Latam realizava em média 750 voos por dia no País antes da pandemia. Em maio, a empresa operou cerca de 35 voos diariamente. Após essa forte redução, o grupo anunciou aumento gradual de suas operações em junho, passando de 5% para 9% da capacidade pré-crise, operando 74 rotas domésticas no Brasil, além de retomar de forma reduzida as rotas internacionais São Paulo-Frankfurt, São Paulo-Londres, São Paulo-Madri, São Paulo-Santiago e Santiago-Miami. Para julho, a previsão é atingir 18% da sua capacidade anterior à crise. Já na Gol, que tem quase 16 mil colaboradores, a maior parte deles está trabalhando em home office, em férias ou de licença não remunerada. Aproximadamente 6,2 mil colaboradores (38% do quadro total) estão em licença não remunerada ou tiveram seus contratos de trabalho suspensos.

RENEGOCIAÇÃO

Na Latam, a palavra de ordem é renegociar tudo o que for possível. Além do corte de voos e salários, como parte das primeiras medidas emergenciais a empresa também negociou com fornecedores, pedindo redução de custos e postergação dos prazos de pagamento para equilibrar o fluxo de caixa. Em relação aos trabalhadores, ainda haverá novas negociações. “Agora que já conhecemos melhor os impactos da crise estamos novamente em contato com os sindicatos para definir como agir a partir de julho”, disse o CEO Cadier. Ele acredita que as soluções possam envolver licenças não remuneradas de 12 meses ou rotativas, mas que certamente o ajuste será grande. Por esse motivo, a empresa tem tido conversas diretamente com seus colaboradores por meio de vídeos e webcasts com perguntas ao vivo para explicar o que está acontecendo neste momento da crise.

Como parte do esforço para escapar da crise, a Azul Linhas Aéreas fechou acordo para repassar de sua frota 53 aviões Embraer 190/195, da serie E1, para a empresas LOT, da Polônia, e a Breeze, start-up americana criada por David Neeleman, fundador também da Azul. Os prazos, porém, estão indefinidos. Essas aeronaves seriam substituídas por outras 50 novas unidades do modelo Embraer E2, mais modernas e econômicas. As entregas previstas para acontecerem entre 2020 e 2023, a um ritmo de uma aeronave nova a cada duas semanas, foram adiadas para 2024.

Segundo John Rodgerson, CEO da Azul, não se sabe quando o remanejamento de frota será concluído, já que as incertezas ainda existem sobre o tempo de retomada da demanda da aviação e, por consequência, quando LOT e Breeze necessitarão de todas as aeronaves. “Temos um ótimo relacionamento com a Embraer e estamos muito animados com o E2. Infelizmente, tivemos que adiar nossos planos de pegar mais desses aviões até que a economia se recuperasse”, disse Rodgerson, em entrevista a jornalistas do setor. “Na medida em que o tamanho do mercado mude após a Covid-19, queremos estar preparados.”

PROTOCOLOS

As autoridades aeronáuticas do mundo todo, juntamente com a Organização Internacional da Aviação Civil, Associação Internacional de Transportes aéreos e outros órgãos, estão criando padrões a serem seguidos pelos países com a intenção de possibilitar um retorno seguro da aviação civil, sem que esse modal se torne vetor de reinfecção para os países. Aqui no Brasil não há nada normatizado, mas existem instruções e orientações expedidas pela Anvisa e Anac, voltadas tanto para os passageiros, quanto para as empresas aéreas e aeroportos. Também foi criado um grupo de trabalho chamado Retomada da Aviação Civil pós-Covid-19, por meio da Portaria Anac 1126, de 23 de abril deste ano, cujo objetivo é acompanhar a retomada das operações aéreas nos aeroportos brasileiros e propor estratégias voltadas à segurança, ao desenvolvimento e à sustentabilidade da aviação civil.

As empresas que operam no Brasil estão adotando medidas que incluem filas transversais, alternadas e espaçadas nos balcões de check-in, distribuição de álcool em gel, obrigatoriedade do uso de máscaras a bordo, novos processos de limpeza e desinfecção profunda das aeronaves, além de redução da interação física com os passageiros. Segundo as empresas aéreas, a frota brasileira está equipada com sistema de filtragem que renova o ar a cada 3 minutos e captura aproximadamente de 99% das partículas no ar.

As tripulações também têm orientado os passageiros para que se acomodem nas poltronas de acordo com a sua preferência, mantendo entre si o maior distanciamento possível. Para elevar os níveis de segurança, higiene e prevenção a bordo, as companhias têm implementado processos intensos de limpeza nos voos, que englobam desde a pulverização do interior das aeronaves até a limpeza de todas as superfícies de contato, com aplicação de álcool 70% e outros materiais indicados pela Anvisa e órgãos internacionais. Um saneamento físico que se espera chegue também ao saneamento financeiro.

EM APUROS, EMBRAER TAMBÉM DEPENDE DE SOCORRO

Sem ter para quem vender e com clientes lutando para sobreviver, a fabricante brasileira de aviões Embraer deve obter em junho um financiamento junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a bancos privados no valor de US$ 600 milhões (R$ 3,3 bilhões) para atender a sua demanda de jatos executivos e comerciais para os próximos meses, disseram fontes do governo em condição de sigilo. As negociações, lideradas pelo próprio presidente Francisco Gomes Neto, estão em ritmo acelerado. Espera-se que o crédito seja liberado nas próximas semanas. Além dos recursos do BNDES, a companhia deve receber injeção de bancos como Bradesco, Santander, Itaú, Citibank, Morgan Stanley e Natixis.

No balanço do primeiro trimestre deste ano, a fabricante brasileira de aeronaves anunciou que tem no horizonte cerca de US$ 16 bilhões (R$ 86,8 bilhões) em encomendas firmes para os próximos anos. No mesmo balanço, a Embraer registrou um prejuízo líquido de R$ 1,3 bilhão no primeiro trimestre de 2020, perda quase sete vezes superior à registrada nos três primeiros meses do ano passado. O resultado foi pressionado pelo diferimento de imposto de renda e contribuição social, com efeito negativo de R$ 571,2 milhões, por uma provisão adicional para perdas de crédito durante a pandemia. O balanço também apontou como fatores para o prejuízo a queda de R$ 108,6 milhões no valor da companhia aérea Republic Airways Holdings, na qual a Embraer qual tem participação. Outro destaque foram os custos de separação ligados ao fim da parceria estratégica com a Boeing, de R$ 96,8 milhões.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

HOMOSSEXUALIDADE FEMININA

Há evidência mostrando que as mulheres transitam mais entre relações sexuais com pessoas do mesmo sexo e do sexo oposto do que os homens

A conclusão sobre o amor entre as mulheres partiu de um estudo feito pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). A pesquisa, feita em 24 estados brasileiros e no Distrito Federal, avaliou a prática sexual e o nível de conhecimento de homens e mulheres em relação à Aids.

Os resultados do estudo mostram que 3% das mulheres sexualmente ativas nos últimos cinco anos relataram ter tido na vida relações sexuais com pessoas do mesmo sexo ou de ambos os sexos. O índice é de 1,7% para as que mantiveram relações homossexuais no último ano. Os dados foram coletados entre 1997 e 1998 pelas pesquisadoras Regina Maria Barbosa, da Unicamp, e Mitti Ayako Hara Koyama, da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), de São Paulo.

“A ideia da existência de uma homossexualidade feminina estanque e estável ao longo da vida desaparece, dando lugar a um cenário mais dinâmico no qual as mulheres transitam pelas diferentes experiências e a categoria ‘mulheres exclusivamente homossexuais’ só é expressiva nos recortes de tempo mais recentes”, dizem as pesquisadoras. Elas sugerem uma nova forma de encarar o lesbianismo, não mais como um papel assumido ao longo da vida, mas como uma condição temporária.

As pesquisadoras afirmam que os homens que tiveram parceiros exclusivamente do mesmo sexo nos últimos cinco anos tendem a permanecer assim ao longo da vida. As mulheres, por sua vez, desempenham um papel mais dinâmico em relação à escolha dos parceiros sexuais. Elas podem ter relações com outras mulheres por cerca de um ano e depois ter parceiros sexuais do sexo oposto num período seguinte. A maioria dos casais de lésbicas não sente necessidade de reproduzir padrões de comportamento heterossexuais, em que um indivíduo mantém poder sobre o outro. Dessa forma, essas mulheres conseguem exercer papéis diferentes dos moldes patriarcais. O homossexualismo feminino tem suas origens na Antiguidade. Safo, célebre poetisa da Grécia Antiga, é considerada como a fundadora do amor lésbico. O termo é originário de Lesbos, ilhas de forma triangular situadas no mar Egeu, de onde a poetisa era natural. Safo era conhecida pelo amor que nutria por mulheres, à qual é atribuída a prática conhecida por safismo (cunilíngua).

O lesbianismo era muito disseminado em Roma. Os locais de encontro das homossexuais eram os estabelecimentos de banhos. Nesses ambientes, as lésbicas entregavam-se às práticas sexuais com suas escravas, chamadas de fellators. Na era vitoriana, a rainha Vitória – através de uma lei – condenou somente as práticas sodomitas entre homens, negando punição para o sexo entre as mulheres por não acreditar na viabilidade desse amor invisível.

Em 1927, o psicanalista galês Ernest Jones – baseado na análise de cinco mulheres homossexuais – define as diferenças entre mulheres heterossexuais das lésbicas a partir do medo da castração.  Segundo ele, a não gratificação dos desejos edipianos impulsiona o processo homossexual.

O medo da castração se dá de maneiras distintas entre meninos e meninas. O homem deseja obter uma satisfação num ato, mas “ele não ousa, por medo de que esse ato seja seguido do castigo da afânise, da castração, o que significaria para ele a abolição permanente do prazer sexual”.

Enquanto no homem o medo primitivo é o da castração, na mulher o temor é o da separação. Na imaginação da menina, essa separação emana seja da mãe, como rival, seja do pai, que se recusa a dar-lhe a satisfação desejada. Para a mulher, o medo mais primitivo de ser abandonada se origina daí.

Para o estudioso, desenvolvem-se duas formas de regressão no processo de identificação das mulheres: na primeira, elas mantêm o desejo por homens, mas gostariam de ser um entre eles; na segunda, as mulheres desejam outras mulheres, as quais representam sua própria feminilidade.

Já a psicanalista austríaca Melanie Klein postula que homossexualidade feminina deriva de etapa anterior à definida por Freud, enfatizando o temor fundamental da menina em relação ao interior   do seu corpo e curiosidade em relação ao corpo da mãe. [Enquanto Freud vê o início do complexo de Édipo por volta dos quatro anos de idade, Klein situa-o já no primeiro ano de vida]. Os psicanalistas concordam que é necessária uma identificação com o pai, que confirma a menina com o desejável. Se a expressão da experiência erótica chega a ser tão problemática, a representação da sexualidade lesbiana se intensifica, excluindo a figura do homem e colocando a mulher numa posição de sujeito atuante, em vez do homem. Em todos os países, as lésbicas são objeto de   numerosas discriminações diante das leis e regulamentações e políticas públicas. A maioria dos países não reconhece os casais de mulheres, nem social nem juridicamente. Muitas lésbicas perdem seus empregos e a guarda dos seus filhos, e a outras nega-se até mesmo o acesso a moradia. O homossexualismo feminino carece de estudos e permanece como fenômeno invisível.  Um dos fatores para isso acontecer é o fato de que nunca se deu importância à sexualidade feminina. A sociedade convenceu-se de que o prazer da mulher consiste em criar os filhos. Por outro lado, há maior liberdade de expressão no afeto entre mulheres, que podem se tocar e se beijar sem levantar suspeitas, tornando suas relações mais facilmente dissimuladas.

ROBERTA DE MEDEIROS – é jornalista científica.

E-mail: medeiros.revista@gmail.com

EU ACHO …

A PANDEMIA, O PÂNICO E A RECESSÃO

O Brasil não vai passar incólume pela Covid-19. A infecção debilitou a economia mundial fortemente e vai exigir medidas hábeis para evitar uma quebra geral

Nas últimas semanas, com a paralisação da economia decorrente de medidas para conter a transmissão do vírus, o pânico tomou conta dos mercados financeiros. As Bolsas, os preços das commodities e o valor da moeda de países com economias menos sólidas despencaram. Os impactos negativos na economia global começaram pela China, onde o surto iniciou-se. A China responde, hoje, por quase 1/3 da indústria do planeta. Sua paralisação afeta a indústria de todo o mundo, que depende de componentes produzidos por lá. Em janeiro e fevereiro, sua indústria encolheu 13,5% e as vendas do varejo caíram 20,5%.
Depois dos estragos na Ásia, o vírus disseminou-se pela Itália. Em pleno inverno, com população envelhecida e vulnerável e fronteiras abertas para a União Europeia, da Itália o surto espalhou-se pelo Velho Continente e para o resto do mundo, inclusive o Brasil. A paralisação econômica causada pela reação ao vírus, por sua vez, derrubou a demanda de petróleo. Para controlar a queda de preços, a OPEP, liderada pela Arábia Saudita, tentou convencer, sem sucesso, a Rússia, a também cortar sua produção. A Rússia não topou e a Arábia Saudita resolveu deixar o preço despencar, reduzindo recursos para todos os países exportadores de petróleo, incluindo alguns em situação delicada, como Venezuela e Irã. Com menos recursos, a economia destes países vai piorar muito e a insatisfação, crescer. Como seus governos reagirão? Ninguém sabe, lembra dos conflitos recentes entre Irã e EUA?

A piora da economia mundial descortina conflitos adormecidos pela bonança gerada pelo mais longo ciclo de expansão econômica desde a Segunda Guerra. Com a brutal destruição de riqueza, conflitos eclodem, aumentando os impactos negativos na economia, em um círculo vicioso. No campo da política, governos de todo o mundo se beneficiaram da bonança. Agora, a oposição a eles vai se beneficiar com a insatisfação popular que crescerá, particularmente em caso de recessão global, o que parece cada vez mais provável. Em países com eleições presidenciais, como os EUA, as consequências podem ser significativas. A Goldman Sachs cortou a previsão de crescimento da economia americana para 0,4% neste ano, com queda de 5% no 2º trimestre, um prejuízo recorde. Ninguém sabe ao certo como o surto evoluirá no Brasil e no mundo, quais serão as reações da população e de governos, mas uma hipótese é certa: o PIB brasileiro pode se contrair neste ano. Essa possibilidade tornou-se absolutamente real.

** RICARDO AMORIM – Economista, apresentador do “Manhattan Connection” (Globo News) e presidente da Ricam Consultoria (www.ricamconsultoria.com.br)

OUTROS OLHARES

A REAÇÃO INOVADORA

Assim como em qualquer guerra, a luta contra a Covid-19 está acelerando o desenvolvimento de soluções criativas para melhorar a vida das pessoas em tempos de pandemia

Toda guerra traz muitas consequências nefastas, levando a humanidade a situações limite. Mas nem todos seus efeitos são negativos. As grandes crises costumam produzir importantes inovações. Muitos avanços como a tecnologia de microondas, o GPS e até a internet surgiram justamente desses momentos de tensão global e a chegada da Covid-19 não é diferente. Cientistas, médicos, engenheiros e tecnólogos uniram esforços a outros tantos profissionais no mundo inteiro e, juntos, arregaçaram as mangas para compartilhar seus conhecimentos e encontrar soluções não só para o combate ao coronavírus como também para garantir o bem estar das pessoas no futuro. Esses avanços já começam a aparecer, indo desde os mais simples, como lavar mais as mãos para evitar o contágio até mais complexos como oxigenação do sangue por membranas extracorpóreas.

MENOS CONTAMINAÇÃO

Mundo afora há soluções de robótica para fazer a triagem de pacientes com coronavírus e surgem máscaras inteligentes que dão um alerta quando a pessoa está contaminada. A equipe do InovaHC, do Centro de Inovação do Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP), colocou em funcionamento, por exemplo, um robô colaborativo que, entre outras atividades, retira o lixo da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com o objetivo de reduzir a exposição e o risco de contaminação dos profissionais na linha de frente. Além disso, o HC também já testa com sucesso um capacete que pode evitar a necessidade de intubação dos pacientes, oferecendo oxigênio numa “bolha” de forma menos invasiva. A tecnologia foi toda desenvolvida no Brasil por um grupo de engenheiros vindos de empresas como a Embraer, Avibrás e Roboris, aliado ao conhecimento dos médicos do HC. Segundo o diretor da divisão de pneumologia do InCor, Carlos Carvalho, o equipamento não exige sedação e, com o paciente ainda consciente, fornece a oxigenação em casos que não são tão graves, garantindo uma recuperação mais rápida.

“O paciente na UTI pode fica intubado, em média, de 8 a 15 dias. Mas com o capacete não invasivo, ele consegue se recuperar de 4 a 8 dias, com menos complicações”, explica o pneumologista envolvido no projeto. Já foram produzidos 1.000 aparelhos e, após os testes, a fabricante Lifetech espera para a próxima semana a autorização da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para comercializar o equipamento, de acordo com o engenheiro responsável, Guilherme de Souza. Outro grande avanço no HC está na telemedicina, que inclui a capacitação dos profissionais que trabalham em UTI diante de novos protocolos exigidos pela Covid-19 para reduzir a contaminação na linha de frente. O InovaHC está colocando em prática conceitos de Inteligência Artificial para ajudar médicos de todo o País a fazer o diagnóstico da doença apenas com imagens geradas pela tomografia ou com um simples raio X de pulmão. Uma plataforma recebe as imagens do exame de tórax e traça o diagnóstico num tempo menor que o necessário para o exame de sangue, o que é considerado vital para o tratamento da doença. “Conseguimos reduzir o risco de mortes”, diz Giovanni Cerri, presidente do Conselho Diretor do Instituto de Radiologia e da Comissão de Inovação do HC.

Especializada em tecnologia médica, a norte-americana LivaNova também começou a oferecer sua máquina de oxigenação do sangue por membranas extracorpóreas, que tradicionalmente é usada em cirurgias cardíacas, para auxiliar os médicos nos casos mais graves. Pensar soluções diante da pandemia mobilizou a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que criou uma força-tarefa com profissionais de várias áreas. Eles atuam na manutenção dos equipamentos hospitalares, produzindo até peças em 3D, e equipamentos de proteção individual (EPIs) que não só bloqueiam como matam o vírus e materiais para testes rápidos. A colaboração de várias áreas aproximou profissionais e esse será o grande legado da pandemia, segundo a coordenadora da Frente Tecnológica da Força Tarefa da Unicamp contra a Covid-19, Marisa Beppu. “Afinal, nunca se deve desperdiçar uma boa crise”, afirmou, citando a famosa frase de Winston Churchill.

MÁSCARAS INTELIGENTES (EUA) – Universidade de Harvard e MIT desenvolveram máscara que acende quando a pessoa está contaminada

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 17 DE JUNHO

O CORDEIRO VENCEDOR

… estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos… (Apocalipse 1.18b).

O apóstolo João era o único sobrevivente do colégio apostólico. Todos os demais apóstolos já haviam sido martirizados. O imperador Domiciano o deportou para a ilha de Patmos, numa tentativa de calar sua voz. No entanto, quando todas as portas da terra estavam fechadas para João, o Senhor abriu-lhe uma porta no céu. Revelou-se a ele. João teve uma visão do Cristo glorificado, cujos cabelos eram brancos como a neve e cujo rosto brilhava como o sol em seu fulgor. Seus olhos eram como chamas de fogo, e seus pés, como de bronze polido. Sua voz era como a voz de muitas águas e de sua boca saía uma afiada espada de dois gumes. João caiu como morto aos pés de Cristo, mas ouviu: Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos (Apocalipse 1.17b,18a). O Cristo vencedor é o Cordeiro que foi morto, mas ressuscitou. Ele matou a morte com sua própria morte e triunfou sobre ela em sua ressurreição. O Cordeiro vencedor está assentado no trono do universo e governa céus e terra. Não adoramos o Cristo que esteve vivo e está morto, mas o Cristo que esteve morto e está vivo pelos séculos dos séculos. O Cordeiro de Deus venceu para abrir o livro da história e conduzi-la à consumação. Não precisamos temer o futuro, pois aquele que se assenta no trono do universo tem as rédeas da história nas mãos!

GESTÃO E CARREIRA

CINCO PASSOS PARA SOBREVIVER NO NOVO NORMAL

A palavra adaptação nunca fez tanto sentido como agora. A pandemia acelerou a mudança na vida de todos e das empresas e, em muitos aspectos, antecipou em cinco ou sete anos o futuro. Fato é: quem não entender as mudanças e inovar, ou mesmo reinventar seus negócios, não sobreviverá ao mundo pós-Covid-19. Mas como recriar uma operação para estar adequado ao novo modelo? Antes de falarmos sobre o “como”, gostaria de primeiro apresentar “o que” precisa ser revisto a tempo deste novo normal. Para isso, quero listar cinco passos que ajudarão as empresas neste ajuste inicial.

O primeiro passo é a velocidade para acompanhar o ritmo das mudanças do mercado e dos hábitos do consumidor. A tomada de decisão estratégica e a execução das ações não poderão mais ser morosas, a empresa ágil terá que sair do Powerpoint e virar ação.

As duas próximas dicas são as formas de comercialização e a disponibilização de novos produtos aderentes ao consumidor digital. A velocidade do modelo de consumo mudou e vai se alterar mais rapidamente com a pandemia e, para isso, a tecnologia e os dados serão imprescindíveis para identificar o perfil do consumidor, seus hábitos, seus desejos. Para dar vazão às oportunidades, as empresas precisarão garantir que as ofertas estejam adequadas com as novas demandas e sendo disponibilizadas nos canais digitais. Um ponto importante neste cenário é estar atento à produtividade de fazer mais com menos para adequar a receita. 

 A integração de soluções, que será essencial para conectar aplicações prontas que trarão agilidade no processo, é uma das premissas. Junto à infraestrutura de TI, teremos o uso acelerado da Inteligência Artificial, por exemplo, que viverá um caminho sem volta, pois ela nos ajudará a conhecer mais sobre o consumidor, disponibilizar o melhor produto e ainda personalizar a oferta. Vejam a Amazon, que teve suas ações batendo recorde histórico nesta pandemia, passando a valer US$ 1,1 trilhão. Ela é rápida, traz o produto que você quer, entrega num prazo curto e ainda oferece a venda com um clique. Isso é mindset digital!

E aqui entra o quarto aspecto dessa análise, que é a desburocratização. A estratégia definida, assim como a adaptação às mudanças necessárias nos negócios, deve ser implementada rapidamente sem barreiras, sem entraves e, um ponto importante, sem abandonar a governança. O barco deve conseguir mudar de rumo rapidamente e todos devem estar remando na mesma direção. E, por fim, mas não menos importante, vem a comunicação, nosso quinto aspecto que trará a velocidade para reagir e agir rapidamente no nosso novo amanhã.  

 Não considero arriscado dizer que é mudar ou morrer. E a reinvenção das empresas estará calcada não mais nos famosos quatro “P”s do marketing — produto, preço, praça e promoção —, mas em quatro “D”s: digitalização da operação, democratização da oferta, desmonetização dos preços e desmaterialização do processo (ou produto). E sem a tecnologia não conseguiremos fazer nenhum desses movimentos.

O “digital” é a ferramenta chave para isso e, olhando sob esse aspecto, a área de Tecnologia da Informação precisará se reinventar. Atualmente essa área suporta com excelência a operação atual, mantendo o negócio rodando, porém está muito aquém da agilidade necessária para suportar os negócios na questão inovação. A parceria com empresas inovadoras, ágeis e confiáveis é a tendência do mercado.

O consumo se tornou digital, seja B2C ou B2B. E a gama de usuários aumentou e vai ampliar ainda mais, o que prevê a condição de que não dá mais para fazer produtos que não estejam alinhados a esse novo consumidor. Então, mãos à obra para colocar a Transformação Digital na prática, porque se por anos os CEO´s e o CIO´s não fizeram isso, a covid-19 foi o decisora dessa nova orquestração tecnológica.

MARCEL PRATTE- é CEO do Grupo Viceri, holding de tecnologia da informação especializada em desenvolvimento de software customizado, consultoria e produtos digitais.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

O PRIMEIRO DA CLASSE

Todos os pais desejam que seus filhos se sobressaiam nos estudos, pois a cultura e o preparo acadêmico são uma espécie de garantia de um futuro mais tranquilo

Embora muito bem-intencionados, percebo que alguns pais agem de modo a criar obstáculos para que os filhos se tornem alunos brilhantes, autônomos, motivados e bem-sucedidos. Empecilhos são criados mesmo por excesso de zelo, de proteção e outros por simples ingenuidade, a que todos nós estamos sujeitos quando somos jovens pais.

Algumas orientações podem ajudar a quem deseja ter um filho que, mesmo não sendo (pois não precisa mesmo ser) o primeiro da classe, terá tudo para se dar muito bem na vida acadêmica e mais tarde na vida profissional. Imagine que ao invés de seus familiares lhe perguntarem como você vai, lhe perguntassem sempre sobre seu saldo bancário, seu salário, suas promoções no emprego… como você se sentiria? Da mesma forma se sentem as crianças cujos pais as pressionam diariamente com perguntas do tipo “que nota você tirou hoje?” ao invés de se importarem em saber como foi o seu dia na escola, se aprendeu coisas novas, se foi divertido estar com os amigos. O aspecto humano nunca pode perder espaço para a produção!

FAZER AS LIÇÕES JUNTO COM O FILHO: a princípio, toda criança precisa de alguma ajuda, até para se organizar e compreender o que é exigido dela. Mas fazer pela criança, seja o que for, é contra indicado, pois, além de lhe dar a impressão de que ela sofre de alguma incapacidade, cria dependência. O correto é o pai ou a mãe checar se as tarefas foram feitas com esmero, ouvir as dúvidas e orientar, quando possível. Mas as dificuldades devem ser encaminhadas aos professores. Lição de casa é um importante momento de aprendizagem para a criança desenvolver a sua cognição e metacognição. Outro problema é permitir que tarefas sejam feitas às pressas, às vezes no carro, outras na porta da escola, com o adulto ditando as respostas: a lição não é uma provação! Além disso, criar responsabilidade é uma conquista gradativa e, na prática, nunca se desenvolve quando outras pessoas fazem por nós.

RESOLVER OS PROBLEMAS DOS FILHOS PARA POUPÁ-LOS: se desde pequenos os filhos se habituam que tudo será provido e resolvido pelos pais ou adultos de modo geral, eles dificilmente aprenderão a planejar, se organizar, prever necessidades futuras, suprir faltas. Se tornarão jovens frágeis, imaturos, dependentes e frustrados. Aprenderão a postergar suas responsabilidades à espera de alguém que os venha socorrer de última hora. Infelizmente há familiares que chegam ao cúmulo de tentar justificar comportamentos de desleixo e desinteresse dos filhos com atestados de transtornos de aprendizagem para que possam usufruir de benefícios desnecessários. Um exemplo que constitui uma verdadeira temeridade e que deve ser combatido. Na vida profissional como será que esses pais pensam em proteger os filhos? Qual desafio terão capacidade de enfrentar, se mesmo os pequenos problemas não tiverem sido resolvidos?

PREMIAR BOAS NOTAS: se o prêmio for um abraço, um carinho, uma comemoração familiar, tudo bem. Mas trocar notas por bens materiais desvirtua a educação e aumenta o sentimento de frustração naquela criança que, embora se esforce, não consegue ser bem-sucedida. Notas se conquistam, não se compram: não têm preço, têm valor. Valor correspondente ao empenho de cada um. Por isso, o que vale não é o “10”, mas a superação gradativa em relação a si mesmo.

ESTUDO E PRAZER: todo mundo sabe que antes de entrar na educação formal as crianças adoram os livros. Todas parecem que serão leitoras vorazes, mas bastou entrar no ensino formal e uma boa parte parece que perde o prazer de ler. Quando se impõe gradativamente a obrigação, a criança bem-educada compreende que está crescendo e suas responsabilidades também e que mesmo que prefira naquele momento estar brincando, é necessário ler um livro ou estudar. A obrigação deve vir primeiro, antes das brincadeiras. A superproteção dos pais que não dão as devidas responsabilidades aos filhos cria crianças que não querem ler, não querem fazer lição, não querem enfrentar nada que os desaponte, desafie ou desagrade. Gradativamente vão se afastando do rendimento escolar médio de sua classe. Surgem problemas de aprendizagem, perfeitamente evitáveis!

O RESPEITO PELA ESCOLA: é a instituição socialmente destinada às crianças e com várias metodologias, justamente para que as famílias busquem e escolham aquela que mais se aproxima da linha educativa que oferece em casa. Saber identificar e respeitar os pontos em que família e escola não concordam é primordial para a manutenção do aluno nesse ambiente e até como lição de vida: afinal, nenhum lugar, nem mesmo a família, é perfeito! Sempre há um ponto de discordância, que desagrada e exige paciência e compreensão. Falar mal da escola ou dos professores então é inimaginável, já que esses profissionais representam os pais dentro da escola, a qual em última análise foi selecionada pela família para seus filhos.

O assunto obviamente não se esgota por aqui, mas tudo que se refere a respeito humano, afetividade, estímulo intelectual, dignidade, valores faz muito bem e é bom para o futuro das crianças. A dedicação ao filho não é a penas cuidar fisicamente dele, pagar boas escolas, oferecer férias e brinquedos, fazer-lhe as vontades, mas lhe dar estímulo e oportunidade de crescer de modo autônomo, responsável, dentro de normas socialmente aceitas, para que se desenvolva a partir de suas características pessoais e assim atinja o seu melhor, tanto pessoal como social e profissionalmente.

MARIA IRENE MAUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É editora da revista Psicopedagogia da ABPp e autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem.

irenemaluf@uol.com.br

EU ACHO …

O ESPELHO DO ADOECIMENTO

Atualmente é praticamente impossível refletirmos a relação humana distante do âmbito da cibercultura, pois o que antes era considerado possibilidade de conexões, agora é a estrutura de sociedade na qual estamos mergulhados

Redes sociais. O que pode ser compreendido em relação a essas duas palavras? O primeiro pensamento que possivelmente surge na mente do leitor é a relação com a internet. Instagram.   WhatsApp, Facebook. Essas três redes sociais, cujo dono é o mesmo, são as principais mencionadas nos consultórios de Psicologia. Porém existem diversas outras que crescem constantemente em   diversos campos: música, fotografia, empreendedorismo, trânsito, dentre outras. Porém, qual o papel dessas redes? E quais as preocupações da Psicologia Clínica em relação a elas?

Inicialmente é relevante mencionar que cada vez mais evidências na literatura científica demonstram que o mau uso desses recursos tecnológicos está atrelado ao campo psicopatológico, especialmente no grupo de adolescentes. A grande parcela dos pacientes que chegam aos consultórios de psicoterapeutas, com a queixa inicial relacionada ao uso de tecnologia, apresenta problemas vinculados ao excesso na utilização de redes sociais. Considera-se que essas redes são indispensáveis, porém, além do uso excessivo, muitas vezes esses jovens utilizam diversas redes sociais de forma simultânea. Estudo realizado em Hong Kong com 384 estudantes demonstrou essa   relação problemática entre redes sociais e desempenho acadêmico. Nessa pesquisa foi demonstrado que utilizar as redes sociais para fins acadêmicos não causa prejuízos nas notas, mas usá-las para outros fins está diretamente relacionado a um mau desempenho acadêmico. A grande questão é: qual é o quantitativo, no Brasil, de jovens que utilizam essas redes para a aprendizagem e quantos as usam como diversão ou escapismo de problemas do cotidiano? Utilizando a experiência de consultório, os dados seriam inevitavelmente trágicos.

Outro estudo relacionado ao uso das redes sociais verificou, em uma amostra de 253 estudantes que utilizam Instagram e Snapchat, que os usuários que mais usufruem dessas redes apresentam sintomas mais predominantes de solidão. Esse tipo de informação ressalta aquilo que constantemente é mencionado nesta coluna: a nova configuração social de pessoas que estão se transformando em ilhas. Essa informação é preocupante, pois em alguns momentos a impressão  que fica é que mesmo conscientes das problemáticas relacionadas a esse uso nocivo, os jovens  ainda não estão considerando mudar suas atitudes, comumente justificando com os pensamentos  a seguir: “meus colegas fazem o mesmo”, “não terei um mau desempenho acadêmico devido ao   uso das redes sociais”, “não há nada mais interessante para fazer” ou “se eu não ficar nas redes  sociais estarei desligado do mundo”. Apesar do crescente número de estudos que sugerem uma reflexão sobre o tema, ainda não é perceptível uma real mudança nesse uso excessivo de tecnologia. Dessa forma, surge uma pergunta: qual seria a melhor estratégia para reverter esse comportamento disfuncional? A resposta mais óbvia pode ser a psicoterapia, porém nem todos conseguem alcançar os consultórios, o que é preocupante.

Pesquisadores sugerem que com o aumento de tempo despendido nas redes sociais há, concomitantemente, um aumento da ocorrência de transtorno depressivo maior e ansiedade nessa população. As checagens constantes e o usufruto relacionado ao escapismo, associados a uma autoestima comprometida, são os fatores etiológicos mais discutidos.

Os autores desse estudo afirmam que quanto mais redes sociais os participantes possuem, maior o nível de ansiedade; alguns utilizam ao menos onze redes distintas, o que é um número expressivo. Preocupados com esse fenômeno, pesquisadores desenvolveram a The Social Media Disorder Scale, um instrumento de mensuração de uso patológico de redes sociais. Essa escala de nove itens foi testada em uma amostra de 2.198 adolescentes holandeses, entre 10 e 17 anos, apresentando uma validade estrutural sólida, consistência interna adequada e boa estabilidade no teste-reteste. Instrumentos relacionados a esse fenômeno são úteis na avaliação de pacientes que chegam em consultório com essa queixa.

Por fim, deixo algumas questões para reflexão: como está o seu uso de redes sociais? É perceptível um aumento na utilização? Existe, na sua opinião, algum tipo de situação de que tenta escapar através do uso dessas redes? O primeiro ponto para a modificação de padrões cognitivos disfuncionais é estar ciente deles.

IGOR LINS LEMOS – é doutor em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental Avançada pela Universidade de Pernambuco (UPE). É psicoterapeuta cognitivo-comportamental, palestrante e pesquisador das dependências tecnológicas. E-mail: igorlemos87@hotmail.com

OUTROS OLHARES

O INIMIGO MORA AO LADO

Com todos os moradores passando dia e noite dentro dos prédios, o que era simples chateação virou um grande incômodo, com sucessivas brigas entre vizinhos

Som alto, reformas, crianças correndo, pessoas batendo papo na varanda são situações que sempre incomodaram quem mora em prédio. Mas uma coisa é ter de aguentar o incômodo durante um fim de semana. Outra, muito diferente, é passar o dia inteiro com ele. Prédios, pela própria definição – várias famílias morando sob uma mesma laje, pertinho umas das outras -, foram planejados para gente que sai de manhã e volta à tarde, cortando pela metade a convivência cotidiana. Quando a quarentena imposta pelo novo coronavírus juntou todo mundo em casa 24 horas por dia, sem poder sequer relaxar na piscina e no playground, o que era terreno pacífico (ou quase) virou zona de conflito. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, as reclamações entre vizinhos chegaram a triplicar nos últimos três meses, segundo dados coletados pela Associação das Administradoras de Bens Imóveis e Condomínios de São Paulo (AABIC) e pela carioca Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (Abadi). Para o antropólogo Roberto DaMatta, a agravante maior das irritações é o fato de moradores que antes apenas se esbarravam nos corredores e elevadores agora perceberem ativamente a presença uns dos outros – e os supostos defeitos de parte a parte. “Discordar é uma arte que se pratica aprendendo a conversar com gente que não conhecemos bem”, filosofa.

A grande maioria das queixas registradas pelas administradoras de prédios é, como se sabe, relacionada ao barulho em geral e a obras não essenciais em particular. Mais típicas da vida em pandemia são as reclamações de circulação sem máscara em áreas comuns e das aglomerações na forma de festas e pequenas reuniões. Além dos sapatos no corredor – o hábito de removê-los antes de entrar no apartamento, para não carregar o vírus junto, resulta em fileiras de calçados do lado de fora da porta, para desgosto de muitos. No caso da professora Andrea Muner, de 43 anos, o mote para a discussão com uma vizinha foi ela querer entrar sem máscara no elevador do seu prédio no Parque São Domingos, Zona Norte de São Paulo. “Ela não gostou, mas deixei claro que estava errada e puxei a porta”, conta Andrea, que estava acompanhada da filha de 9 anos. Informado sobre o caso, o síndico implantou multa para quem circular com o rosto descoberto nas quatro torres do condomínio. “Agora todos estão obedecendo, mas é uma pena que precise haver esse desgaste todo”, diz Andrea.

O melhor a fazer para desatar nós entre vizinhos é buscar um acordo na base do diálogo, sem precisar envolver a administração dos edifícios – este um caminho certo para que o perrengue se eternize. Pelo mesmo motivo, chamar a polícia ou autoridades da saúde, só em último caso. “Os conflitos durante a pandemia mudaram. Vemos agora uma série de pequenas irritações que podem ser resolvidas com um ajuste fino”, afirma o advogado especialista em condomínios Márcio Rachkorsky, síndico profissional de mais de 200 condomínios. A vida, que já era dura, complicou ainda mais. A publicitária Raquel Esper, de 29 anos, se mantém quietinha até agora, mas está tendo de se controlar para conciliar o home office com os barulhos do dia a dia no prédio no bairro Funcionários, em Belo Horizonte. “Encontre algumas soluções próprias, como tampão de ouvido, ouvir música e deixar tarefas que requerem mais concentração para o fim da tarde e noite” explica, ao resumir o que já virou chavão: o “novo normal”.

Nem sempre, porém, o jogo de cintura resolve. O som do barulho do cachorro correndo no andar de cima, que nunca atrapalhou, vira tortura quando tem de ser ouvido o dia todo – mas vai convencer a dona do bichinho, praticamente parte da família, a prendê-lo na área de serviço. A administradora de empresas Lara Camargo, de 26 anos, preferiu escrever uma reclamação formal à direção de seu prédio, na Vila Buarque, no centro da capital paulista, quando o vizinho de porta passou a realizar encontros com amigos no apartamento todo fim de semana. “O pior era o risco de ter estranhos circulando nos corredores. Muitos idosos moram aqui. Mas não quis entrar em conflito com pessoas que vejo constantemente”, diz.

A organização de festas e reuniões com convidados é desaconselhada durante a quarentena, para evitar aglomerações desnecessárias. No Guarujá, litoral de São Paulo, caso semelhante foi parar na Justiça e rendeu uma rara sentença de despejo aos responsáveis. Inquilinos de dois apartamentos de um condomínio na Praia da Enseada Foram expulsos por promover festas, às vezes com mais de trinta pessoas e, usar áreas sociais interditadas, como a piscina. O caos no Condomínio Golden Sun resultou em quase três meses de reclamações constantes, notificações, aplicação de multas e até mesmo intervenção policial. “Além da música alta, eles gritavam e atacavam os funcionários que repassavam as queixas”, diz Sebastião Saar, vizinho dos encrenqueiros. “Quando as ações contra os inquilinos não funcionaram, o proprietário dos imóveis acabou responsabilizado. “Foi ele quem deu início ao processo”, conta o advogado responsável pela acusação, Caio Mário Fiorini Barbosa. Fica o alerta: nestes tempos de quarentena, em briga de vizinho todo mundo se mete. O melhor mesmo é respirar fundo e evitar.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 16 DE JUNHO

UM RAMO FRUTÍFERO JUNTO À FONTE

José é um ramo frutífero, ramo frutífero junto à fonte; seus galhos se estendem sobre o muro (Genesis 49.22).

José era filho de Jacó e neto de Abraão, tipo de Cristo. Foi íntegro na adversidade e na prosperidade. Andou com Deus nas sombras espessas do sofrimento e na luz aurifulgente da notoriedade. Sua vida foi resumida de forma magistral: José é um… ramo frutífero junto à fonte; seus galhos se estendem sobre os muros. Três verdades são destacadas aqui. Em primeiro lugar, José tinha uma vida abençoadora. Ele era um ramo frutífero. Sua vida não era estéril; dava frutos com abundância. Sua presença era abençoadora como escravo e como príncipe. Segundo, José tinha uma vida de intimidade com Deus. Ele era um ramo frutífero junto à fonte. O poder que impactava as pessoas não vinha dele próprio, mas de Deus. Era um homem influenciador, porque se abastecia da fonte, que é Deus. Era um abençoador, porque vivia em comunhão com Deus, a fonte de toda bênção. Finalmente, José tinha uma vida de larga influência. Ele era um ramo frutífero que estendia seus ramos para além dos muros. Era bênção dentro e fora de casa, em seu país e no estrangeiro, como escravo e como governador. Não eram as circunstâncias que determinavam sua vida. Não era influenciado pelo meio, mas influenciava o meio. Mesmo sendo alvo de injustiças e perseguições, ele se manteve íntegro. Mesmo passando treze anos de sua juventude como escravo e prisioneiro, conservou-se fiel. Mesmo quando elevado à posição de governador do Egito, persistiu em humildade.

GESTÃO E CARREIRA

A NOVA CARA DA B3

A bolsa de valores tem crescido com a chegada de investidores mais jovens, com menos recursos para aplicar e sem medo da volatilidade. Juros baixos e plataformas de investimento acessíveis explicam o fenômeno que levou ao recorde de 2 milhões de pessoas físicas a participar do mercado de ações.

Morador do município de Arujá, na Grande São Paulo, Matheus Martinez, 22 anos, está alguns passos à frente da maior parte dos jovens da sua idade.

Engenheiro formado pelo Instituto Mauá de Tecnologia, ele tem investido desde março uma parte de seus recursos na bolsa de valores, a B3. A escolha de Martinez ilustra um fenômeno que se acelerou recentemente: o aumento do número de pessoas físicas investindo em ações. Somente no mês de março, 300 mil indivíduos chegaram ao mercado de capitais. Desse total, 220 mil investiram pela primeira vez na vida em ações.

O restante já havia feito aportes em algum momento e retornou às negociações.

Esse movimento coincidiu com o período de maior pânico, com queda acentuada dos preços dos papéis e o acionamento por seis vezes do circuit breaker — a parada temporária das transações que ocorre quando o Ibovespa cai 10% em um dia. Com isso, a B3, que havia alcançado em julho do ano passado a marca de 1 milhão de investidores, passou a ter, desde abril deste ano, precisamente o dobro: 2 milhões de pessoas físicas detentoras de produtos de renda variável. Desse total, cerca de 60% têm entre 19 e 39 anos.

O aumento na quantidade de investidores trouxe, assim como mudanças no perfil etário e social de quem aplica seu dinheiro na B3, alterações em alguns dados estatísticos desse mercado.

Em 2017, os investidores pessoas físicas somavam R$ 203 bilhões na bolsa. Hoje, o volume é quase 30% maior: de R$ 260 bilhões. Em contrapartida, o valor médio investido apresentou queda. Em 2011, as carteiras com até R$ 10 mil respondiam por 44% dos integrantes. Em março deste ano, o percentual alcançou 54%. Dos 220 mil investidores que entraram na renda variável há dois meses, 30% aplicaram menos de R$ 500. Isso ajuda a explicar o aumento do percentual de pessoas com saldos relativamente baixos. “Isso é positivo. As pessoas colocam pouco dinheiro por uma questão de segurança”, diz Tarcísio Morelli, diretor de inteligência de mercado da B3. “Esse pessoal está experimentando a renda variável.” O executivo afirma que, diferentemente do que se poderia imaginar, esses novos investidores não ficaram assustados com a elevada volatilidade do mercado.

Na crise, os novos investidores viram seus recursos diminuírem, mas não zeraram as aplicações. “Os dias de maior estresse, com circuit breaker, foram aqueles em que as pessoas físicas mais investiram”, diz Morelli. E o movimento de novos entrantes continua alto. Em abril, mais 140 mil pessoas aportaram investimentos. Se, como disse o especialista, esses novos investidores tiveram sangue frio no pior momento da crise, agora começarão a colher os frutos da recuperação do mercado.

O Ibovespa, que pouco antes da pandemia havia chegado aos 120 mil pontos, em março caiu para quase a metade (63 mil). Com dois meses seguidos de alta, o índice fechou a quarta-feira 3 a 93 mil pontos. O fluxo de investimentos feitos pelas pessoas físicas, até o dia 28 de maio, somava R$ 1,26 bilhão, elevando o total do ano a R$ 34,7 bilhões. “Esse comportamento também depende de outros fatores macroeconômicos. O momento é muito diferente do que estamos acostumados”, afirma Morelli. “As consequências da pandemia ainda serão dimensionadas. O que temos visto é que as pessoas continuaram a investir e esperamos que continue assim”.

Em fevereiro, Martinez saiu da poupança para o Tesouro Direto e, na terceira semana de março, com apoio de corretores, aplicou em três fundos distintos. “Estar bem informado me ajudou a manter minhas posições. Agora que o pior já passou, vejo tudo com mais tranquilidade ainda”, declara ele, que manteve parte do seu dinheiro em renda fixa, caso tenha alguma necessidade imediata. Se houver contratempos em momentos de baixa, ele terá liquidez garantida e sem perdas.

Atualmente, a taxa da Selic está em 3% ao ano com viés de baixa, um nível de juros que nunca esteve tão baixo na história brasileira. Isso causa impacto negativo em todos produtos de renda fixa, o que serve como estímulo na busca por ativos mais rentáveis. Segundo Rodrigo Marcatti, sócio da Veedha Investimentos, quase a metade da população dos Estados Unidos investe em bolsa, mas isso ocorre porque há muitos anos a renda fixa oferece remunerações extremamente baixas. Por aqui, ao contrário, os juros giraram acima de 13% nos últimos 25 anos. Era o que possibilitava ganhos expressivos sem a necessidade de tomar riscos. “No Brasil, o cara investia na bolsa, perdia dinheiro e saía”, explica Marcatti. “Se a política atual de juro baixo for mantida, mais e mais pessoas migrarão para a bolsa.”

EDUCAÇÃO

A procura pelo capital de risco, no entanto, não pode ser vista como uma bala de prata usada pelos investidores para manter ganhos mais expressivos. Laio Santos, CEO da corretora Rico, entende que o movimento atual é consistente e está conectado com um trabalho de educação realizado pelos agentes do mercado, que envolve abordagens presenciais e mais recentemente apoiadas na internet e nas redes sociais. As corretoras passaram estrategicamente a gerar conteúdo financeiro todos os dias. A cobertura se ampliou. Há também os influenciadores nas salas digitais que desenvolvem um papel importante para atrair mais investidores, principalmente jovens. Para Santos, esses jovens, aos poucos, vão percebendo que, quando a bolsa cai, surgem oportunidades.

Desde 2016, a gestora Claritas, em parceria com a entidade Junior Achievement São Paulo, mantém um projeto batizado Claritas Solidária. O objetivo é levar educação financeira para estudantes de ensino médio de escolas públicas paulistas. “A educação financeira é uma forma de contribuir para a mobilidade social. Já impactamos 4 mil estudantes”, diz Ernesto Leme, diretor comercial da gestora de fundos. Na internet, a Claritas oferece um game que estimula a pessoa a investir etapa por etapa, desde a tomada de decisões básicas.

Essa mesma tecnologia, que tem levado educação financeira a potenciais investidores, também contribuiu para a democratização do investimento na B3. Se antes isso parecia uma operação burocrática, com taxas que inviabilizavam o investimento de pequenas quantias e de acesso difícil, agora o processo todo se tornou bastante mais simples. Em especial depois do surgimento de plataformas como a da XP Investimentos e a da Easynvest, que possibilitam a qualquer um com acesso a internet ter contato com os mais diversos produtos financeiros, corretores e agentes autônomos. Isso implica em mais gente procurando empresas especializadas, como acontece com a corretora Clear, que registra desempenho semelhante ao da própria B3. “De janeiro a maio, tivemos crescimento de 103% de investidores na faixa etária entre 25 e 34 anos, e de 234% entre 18 e 24 anos, se compararmos com o mesmo período de 2019”, afirma Roberto Indech, estrategista–chefe da empresa.

Outro ponto destacado pelo estudo da B3 se refere à diversificação dos investimentos. Em 2016, apenas 26% da base possuíam cinco ou mais empresas em carteira. Hoje, esse percentual é de 48%. No mesmo período, 78% detinham apenas ações, índice que caiu para 54%. No fim de 2019, 640 mil pessoas investiram em fundos imobiliários. Em março, já eram 790 mil. “Muita gente vem preferindo investir na Bolsa por meio de fundos diversos. Em parte, porque é uma boa solução para quem tem pouco tempo e precisa de um gestor profissional, que toma decisões de forma racional”, afirma Rodrigo Marcatti, da Veedha Investimentos. “Implica em custo mais alto, mas com o tempo isso se reverte em retorno acima da média.” São Paulo é o estado com o maior número de investidores. Eram 549 mil em dezembro de 2019 e, em março, já somava 729 mil (alta de 33%). O Rio de Janeiro vem na sequência, com 214 mil em março (26% a mais) e Minas Gerais em terceiro, com 180 mil (39%).

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

CAMINHOS ALTERNATIVOS

Medicina complementar ainda encontra resistência na comunidade científica, que enfatiza necessidade de mais estudos clínicos

Um sem-número de terapias com efeito sobre a psique humana está à disposição de quem busca alívio emocional. Entre as chamadas alternativas, há algumas já bem conhecidas e até aceitas pela comunidade científica, como a Acupuntura e a Bioenergética. Outras nem tanto; como os Florais de Bach, a Iridologia e a Terapia Regressiva. Se por um lado tais opções arrebanham cada vezmais adeptos, por outro, encontram resistência por parte da comunidade médica e dos psicólogos, embora o próprio Sistema Único de Saúde (SUS) já esteja regulamentando alguns procedimentos.

Os cientistas intensificam seus esforços tentando identificar os tratamentos realmente eficazes e compreender as maneiras com que estes agem no corpo humano. Positivos ou negativos, os resultados são frequentemente contestados em função do (suposto) olhar por demais objetivo e generalizante da ciência que os produziu. O método científico moderno – influenciado por um cartesianismo renitente – segundo adeptos de tais terapias, não seria capaz de mensurar os reais benefícios de técnicas que compreenderiam o homem como um ser único e em sua integralidade: corpo, mente e espírito.

Uma das principais discussões sobre as terapias alternativas recai justamente sobre sua real eficácia. Não raros, os resultados de pesquisas sobre uma mesma terapia utilizada em uma determinada situação parecem ser diametralmente opostos. Na opinião de Nicola Robinson, da Faculdade de Saúde e Ciências Humanas da Thames Valley University (Londres), em uma sociedade que se baseia fundamentalmente em evidências e que exige provas científicas de eficácia de qualquer tipo de intervenção, a pesquisa sobre a medicina complementar ainda enfrenta dificuldades, apesar dos avanços.

Em artigo publicado recentemente na revista Complementary Therapies in Clinical Practice, a pesquisadora afirma que o padrão ouro tradicional nessa busca de evidências científicas, o ensaio controlado aleatório (RCT- estudo randomizado), está no centro do debate sobre as terapias alternativas e muitos profissionais de saúde defendem que o indivíduo não é levado em consideração nessa metodologia. O RCT seria baseado em certas suposições sobre saúde e doença nas quais os indivíduos seriam essencialmente os mesmos, com tratamentos e pessoas sendo tratados homogeneamente.

“Os sistemas curativos (healing systems) partem de suposições diferentes, de que nós somos todos únicos e que embora as pessoas tenham as mesmas doenças, elas vão reagir diferentemente e apresentar respostas a distintas abordagens terapêuticas”, defende Nicola. Para ela, não haveria acordo universal sobre o que constitui uma evidência, no entanto, os praticantes das terapias alternativas não podem prescindir da medicina baseada em evidências. “O receio de que profissionais de saúde treinados no Ocidente dominem aqueles tratamentos complementares vistos como efetivos é o contrário da situação atual observada em Hong Kong”, exemplifica.

Na mesma linha, S. Ziaei e L. Hajipur, da Faculdade de Ciência Médica da Tarbiac Modarres University, no Irã, investigaram os efeitos da Acupuntura no trabalho de parto e citam entre as dificuldades relacionadas ao método de pesquisa a diversidade de formas que a terapia pode assumir, a individualidade do tratamento, a seleção de objetivos primários (end points) adequados, a não-identificação prévia dos pacientes (que seria o estudo cego) e a escolha apropriada de pacientes para comparação (que seria o grupo controle). “No presente estudo, a Acupuntura não apresentou efeitos sobre a intensidade da dor ou o grau de relaxamento”, afirmam em artigo publicado na International Journal of Gynecology and Obstetrics.

Ao todo, foram analisadas 90 mulheres, submetidas aleatoriamente à Acupuntura (30), a uma simulação da técnica (30) ou a nenhuma intervenção (30). Eles ressaltam, entretanto, que escudos adicionais, com um maior número, são necessários para determinar os efeitos neste caso – em consonância com determinação da Organização Mundial da Saúde (OMS), que menciona a Acupuntura como um método não-farmacológico a ser utilizado durante o trabalho de parto e enfatiza a necessidade de estudos clínicos.

DESAFIOS

Na opinião de Suely Gevertz, psicanalista e coordenadora da Comissão de Mídia da Associação Brasileira de Psicoterapia (Abrap), é preciso diferenciar a ciência exata da psicológica. Segundo ela, na última, não há possibilidade de repetição, que é uma condição sine qua non da ciência tradicional. “Na ciência psicológica não há como fazer um experimento onde se controle variáveis e onde haja repetição. Também não é possível fazer uma análise estatística, apenas qualitativa”, explica. A pesquisadora, que é também docente no Curso de Psicoterapia de Orientação Psicanalítica do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ressalta, no entanto, que este é um desafio das ciências humanas em geral.

Para Luciano da Fonseca Lins, psicanalista e professor adjunto da Universidade de Pernambuco (UPE), apesar dos avanços, ainda existe cena resistência vinculada à ciência tradicional. “Nós carregamos muito o ranço da visão cartesiana e positivista. A própria Física tem derrubado tais posições”. Lins, que trabalha no Núcleo de Apoio Psicossocial da Secretaria de Saúde de Pernambuco, acredita que cada vez mais esses paradigmas serão quebrados.

Os defensores das terapias ditas alternativas criticam que o acesso da população em geral está longe de ser o ideal – e não só no Brasil. Estudo italiano inédito, a ser publicado na revista Complementary Therapies in Clinical Practice, avaliou  o  uso da medicina complementar pelos serviços de saúde do País, especificamente na dependência ao álcool. Os dados obtidos, referentes aos 312 entrevistados mostram que apenas 16,5% utilizaram alguma terapia alternativa. Neste grupo, constatou-se que a Acupuntura é a mais utilizada (71,45%), seguida pela Fitoterapia (10,08%) e pela Homeopatia (9,74%).

“De fato, os serviços de saúde que usam a medicina complementar corno método principal foram um evento raro em nosso estudo (1%). Ela desempenha um papel integrado com as formas tradicionais de tratamento do alcoolismo na Itália e pode ser útil para reduzir recaídas e aumentar a aderência aos tratamentos”, acreditam Gabriele Bardazzi e equipe, autores do artigo, do grupo de pesquisa em medicina complementar e álcool, ligado à ltalian Society for Alcohol Studies. Nesse sentido, os pesquisadores defendem que tais terapias “oferecem vantagens que não devem ser ignoradas, como baixo custo e nenhum, ou mínimos, efeitos colaterais” – este último não aplicável somente ao caso da Fitoterapia.

AUMENTA A PROCURA

Em todo o mundo, cada vez mais pessoas têm procurado diferentes formas de terapias alternativas. Analisando o contexto ocidental, mais especificamente, países desenvolvidos – onde a oferta e a qualidade dos serviços de saúde convencional são superiores – tal tendência suscita um questionamento: por que, tendo à disposição os recursos da medicina contemporânea, as pessoas optam por tais terapias?

Em um dos poucos estudos sobre o assunto, John A. Astin do centro científico tradicional Center for Research in Disease Prevention, ligado à escola de medicina da Stanford University (EUA), procurou verificar três hipóteses para explicar a tendência: insatisfação com o tratamento convencional; visão de que os tratamentos alternativos ofereceriam mais autonomia pessoal e controle sobre o atendimento; ou uma maior compatibilidade com os valores, visão de mundo e crenças em relação à natureza e à compreensão de saúde e doença.

Ao analisar os dados, Astin constatou que usuários da medicina alternativa, em geral, tendem a apresentar alguns traços em comum como, por exemplo, terem uma orientação filosófica sobre saúde que poderia ser descrita como holística (integração entre corpo e mente). Além disso, eles têm uma probabilidade maior de já terem passado por uma experiência transformacional que tenha mudado sua visão de mundo significativamente.

“Além de apresentarem maior escolaridade e relatarem estado de saúde pior, a maioria dos usuários parece não ter insatisfação com a medicina convencional, apenas veem nestes cuidados alternativos mais congruência com seus próprios valores, crenças e orientações filosóficas sobre a saúde e a vida”, concluiu Astin em artigo no The Journal of the American Medical Association. Na amostra analisada, os problemas de saúde tratados por métodos alternativos mais frequentes foram dor crônica, ansiedade, síndrome de fadiga crônica, adição, artrite e dor de cabeça.

Para Fátima Rodrigues, terapeuta regressiva, psicóloga e diretora do Instituto Brasileiro de Pesquisa em Terapia Regressiva (IbrapeTR), a busca crescente por terapias como a regressiva tem a ver com certa insatisfação do paciente junco à medicina. “Os pacientes percebem que só buscar o médico pra trabalhar o físico não está sendo suficiente”, aponta, discordando em parte do pesquisador de Stanford. Para ela, o aspecto clínico de uma doença deve abordar a plenitude do indivíduo fundamentado pela Terapia Transpessoal. “Quando uma pessoa busca tratamento com um especialista que trabalhe com essa abordagem, vai procurar pelo entendimento não só do que provoca, por exemplo, sua dor no estômago, mas o que está por trás dela. Se eu não trabalhar em cima do psicológico, o remédio receitado pelo médico vai aplacar a gastrite momentaneamente – depois ela pode voltar a existir, porque sua origem está nas disposições mentais negativas, nas emoções conturbadas”, exemplifica.

CRENÇA OU PSICOTERAPIA?

Uma das grandes polêmicas em relação à terapia regressiva é sua proximidade com conceituações religiosas. Na opinião de Fátima Rodrigues, isso dificulta sua aceitação no ambiente científico e, principalmente, no Conselho Federal de Psicologia (CFP). “Eles associam o trabalho no nível espiritual necessariamente com a religiosidade. O que pensamos, porém, é que é possível ter o entendimento de um ser permanente, infinito, e não necessariamente estar dentro de uma religião”.

A despeito da polêmica em torno da terapia junto ao CFP, que não reconhece a prática, o curso de Especialização em Terapia Regressiva ministrado no Ibrape TR assume a prerrogativa de admitir somente psicólogos, psiquiatras e médicos com formação psicoterapêutica. De acordo com Fátima, tal exigência se faz necessária, pois, “dentro da área de saúde, o Ibrape defende que esses profissionais têm mais instrumentos e habilidade para lidar com os aspectos emocionais abordados na terapia regressiva”. Noelly Heredia complementa: “o curso vai além de ministrar uma técnica de regressão. Na verdade, pretende ensinar um processo de terapia psicoterápica que envolve procedimentos éticos, próprios da formação psi”.

Fátima salienta que se deve ter cautela em usar a titulação de psicólogo junto à prática terapêutica regressiva. ”Não aconselhamos a divulgação do registro profissional junto a essa prática. Apesar de ser psicóloga, intitulo-me terapeuta regressiva para trabalhar com essa abordagem. No entanto, acho que o psicólogo é, atualmente, um dos profissionais mais preparados para atuar na técnica”, defende.

A regulamentação da prática contudo; vem sendo buscada não somente junto no CFP, mas também pela comunidade científica como um todo. A modificação do nome terapia de vidas passadas – para a atual terapia regressiva faz parte desse processo. “É para que a prática não se resumia a uma visão reducionista. Não se trabalha só o conteúdo da vida passada; aborda-se também o presente e seu conteúdo passado”, pontua Nodly. A psicanalista Suely Gevertz critica a prática.

Para ela todo método psicoterápico é fundado em uma teoria, que é baseada, por sua vez, em dados observáveis – o que seria um entrave para a terapia regressiva. “Há, por trás, a crença de que a pessoa reencarna, e a Psicologia não lida com crenças. Pode-se até estudar, do ponto de vista psicodinâmico, a manutenção de algumas crenças – sejam estas institucionalizadas ou individuais – mas o instrumental teórico utilizado não é baseado em crenças”. Para Ana Maria Pereira Lopes, conselheira do CFP, ainda não há acúmulo suficiente de dados para que a prática possa ser regulamentada.

CONSELHO É CONTRA

Apesar do número crescente de adeptos – tanto por parte de usuários como de profissionais – a maioria das terapias alternativas não são reconhecidas pelos Conselhos federais brasileiros, responsáveis pela regulamentação e fiscalização da atuação dos profissionais de saúde do País. No caso específico do Conselho Federal de Psicologia (CFP), por exemplo, uma resolução de 1997 (10/97) determina critérios para o exercício profissional do psicólogo associado a práticas que “não estejam de acordo com os critérios científicos estabelecidos no campo da Psicologia”.

Segundo essa resolução, terapias só podem ser utilizadas como recursos complementares à clínica e devem estar em processo de pesquisa conforme os critérios estabelecidos pelo Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde (resolução 196/96). Além disso, o psicólogo tem que dispor de meios para comprovar junto ao CFP que possui habilitação adequada para desenvolver a técnica em questão e seu cliente deve declarar expressamente “ter conhecimento do caráter experimental da técnica e da prática utilizadas” – sempre em acordo com o Código de Ética.

Conforme explica Ana Maria Lopes, conselheira e secretária de orientação e ética do CFP, a regulamentação de uma prática pressupõe, em primeiro lugar, o respeito ao princípio da dignidade, o que muitas práticas místicas talvez não alcancem. “Quando a terapia envolve questões relativas à crença, muitas vezes estabelece-se uma relação de submissão do paciente pelo profissional”, afirma.

A regulamentação depende de amplo debate entre o Conselho, os profissionais e os pesquisadores, baseado em pesquisas científicas, cuja validade depende, segundo Ana Maria, “da ampla divulgação dos resultados, derivados de experimentação e reconhecimento da comunidade científica, e não apenas da conclusão das pesquisas”, como pontua a resolução 011/97 do CFP.

Nesse contexto – frequentemente confuso – Suely Gevertz afirma que é fundamental que a pessoa em busca de uma terapia tenha em mente o que ela realmente espera em termos de resultados – o que evitaria a “armadilha das soluções rápidas”. “Um indivíduo que tenha medo de avião, por exemplo, pode optar por fazer uma psicoterapia mais breve e, nesse caso, vai conseguir viajar de avião, concretamente. Se esse mesmo indivíduo levar em consideração que o medo de avião está inserido em algo mais amplo de sua personalidade e quiser aproveitar para se tratar a partir dessa visão, a psicanálise seria mais indicada, pois o avião é tomado como símbolo de ideias e emoções”, exemplifica. Ela ainda defende que “o fundamental é que o psicoterapeuta, independentemente da linha que ele adote, seja muito bem formado – o que envolve um trabalho pessoal, muita supervisão “dos atendimentos clínicos e estudo da teoria”.

EU ACHO …

EDUCAÇÃO DESIGUAL

As crianças pobres estão condenadas a continuar nessa situação por não receberem educação adequada

A origem do problema brasileiro de desigualdade: os filhos dos mais ricos têm mais oportunidades educacionais. Por isso, qualificam-se mais. Por isso, ganham mais. Por isso, tornam-se mais ricos. Daí, seus filhos têm mais oportunidades educacionais, e o ciclo recomeça… Desigualdade de renda não é problema. A busca das pessoas por melhorar de vida gera desenvolvimento, melhora das condições para toda a sociedade e também desigualdade de renda. O problema é a falta de mobilidade social que decorre da falta de igualdade de oportunidades educacionais. Grande parte dos filhos dos mais pobres é condenada a continuar a ser pobre por não receber educação adequada.

A universidade pública, paga com impostos de todos os brasileiros, mas só os mais ricos têm acesso na maioria dos casos, mantém e agrava o problema. É um programa anti-social, um Robin Hood às avessas: dinheiro de todos para bancar os estudos dos ricos. Antes que alguém sugira que a solução é simplesmente colocar mais alunos pobres nas universidades públicas, é importante enfatizar que isto, sozinho, não é solução. As cotas para entrada na universidade deveriam ser baseadas fundamentalmente em critérios socioeconômicos, mas apenas colocar, por cotas, mais alunos pouco preparados nas universidades pioraria ainda mais a qualidade da educação nas universidades.

Precisamos qualificar os alunos mais pobres desde a escola básica. A grande solução para permitir que, mais alunos pobres cheguem à universidade, bem preparados, qualifiquem-se ainda mais nas universidades, ganhem mais, deixem de ser pobres e ajudem a desenvolver o país, aumentar a mobilidade social e diminuir as injustiças é muito simples: educação de primeira nas escolas públicas. Isso, sim, é um programa social. Mais do que nunca, esta tem de ser uma das principais prioridades do país. O isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus e a transição forçada e sem planejamento para o ensino à distância piorou ainda mais a educação no país, principalmente a educação dos mais pobres, que em geral não têm boa internet, nem espaço adequado em casa para aulas digitais. No caso das crianças menores, estes desafios se multiplicam pelas dificuldades naturais de educar uma criança pequena à distância. Se não investirmos para corrigir o fosso educacional que se formará, teremos toda uma geração mais despreparada e mais mal paga, desperdiçando potenciais talentos e reduzindo ainda mais nossa já baixa mobilidade social, o que aumentará tensões no país.

**RICARDO AMORIM – Economista, apresentador do “Manhattan Connection” (Globo News) e presidente da Ricam Consultoria (www.ricamconsultoria.com.br)

OUTROS OLHARES

BANDIDOS DIGITAIS

Hackers invadem redes, divulgam dados pessoais do presidente e mostram como os sistemas públicos são vulneráveis a ataques cibernéticos

 Uma conta no Twitter registrada em nome do grupo de hackers Anonymous Brasil divulgou na internet senhas de e-mail, dados de um cartão corporativo, números de telefones e endereços vinculados a Jair Bolsonaro e aos seus filhos. Essa é a segunda vez em menos de um mês que o presidente se torna vítima de ataques virtuais. Em maio, Bolsonaro e a primeira-dama tiveram os seus exames médicos capturados no sistema do Hospital das Forças Armadas (HFA). Os dois casos estão sendo investigados pela Polícia Federal. Os responsáveis, se identificados, podem pegar até quinze anos de cadeia. A ação de hackers preocupa o governo. Além do presidente, órgãos públicos que armazenam informações sigilosas de milhões de brasileiros têm sido alvo de criminosos cibernéticos. Segundo levantamento do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), apenas no ano passado foram registrados 2.404 casos de invasão e tentativas de invasão aos computadores oficiais – uma média de seis incidentes por dia.

Os ataques virtuais vêm se tornando cada vez mais frequentes – e bem­ sucedidos. No mês passado, um grupo de hackers identificado como Digital Space, que já havia divulgado o resultado de exames médicos do presidente, colocou na rede os dados pessoais de milhares de integrantes das Forças Armadas. Poucos dias depois, o GSI recebeu a informação de que a senha do e-mail de um servidor do Palácio do Planalto também havia sido capturada. Muitos desses criminosos digitais invadem sistemas públicos por mera diversão, para criar constrangimento ou simplesmente para mostrar que são capazes. Mas há aqueles que miram negócios. “Uma base genérica de informações roubadas pode ser negociada por até 600 dólares”, afirma Filipe Soares, ex-oficial da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e sócio da Harpia Tech, consultoria de segurança digital, especialista em monitorar criminosos e vazamentos nas redes.

Não por acaso, os órgãos que mais sofrem ataques virtuais são o Dataprev e o Serpro. O primeiro é responsável por processar o pagamento mensal de 34,5 milhões de aposentadorias, enquanto o segundo gerencia dados e transações do governo, fornecendo tecnologia para a cobrança de multas de trânsito e do imposto de renda. Quando informações como essas caem em mãos erradas, os danos são gigantescos tanto para a imagem do governo, que deveria garantir a segurança pública, como para o cidadão, que tem a sua privacidade exposta. No ano passado, uma lista com dados pessoais de mais de 2 milhões de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) foi publicada num site. Em outra invasão, dados do sistema do Cadastro Nacional de Usuários do SUS foram adulterados – pessoas vivas foram colocadas como mortas, o que resultou em enormes transtornos para as vítimas. “Alguns órgãos públicos têm uma estrutura frágil e muito limitada para se defender dessas ofensivas”, diz Filipe Soares.

Um levantamento da Controladoria-Geral da União feito em 226 órgãos federais revelou que, em algumas dessas repartições, não havia sequer instrumentos básicos, como programas antivírus. As pastas mais vulneráveis são Cidadania, Educação e Ciência, Tecnologia. As limitações atingem até mesmo os órgãos responsáveis pela investigação de crimes cibernéticos. As ferramentas utilizadas pelo GSI estão há oito anos sem receber atualizações. É preocupante. Dois anos atrás, houve um vazamento de documentos reservados do Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia, responsável por gerenciar informações estratégicas da região. Uma investigação para apurar o caso foi aberta, mas até hoje os criminosos não foram encontrados. “É muito difícil conseguir identificar e responsabilizar esses hackers”, reconhece um perito da Polícia Federal. Um desastre de grandes proporções é questão de tempo.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 15 DE JUNHO

A FELICIDADE DE UMA FAMÍLIA UNIDA

Eis como será abençoado o homem que teme ao Senhor! (Salmos 128.4).

Não há felicidade verdadeira sem a bem-aventurança da família. Não podemos construir nossa felicidade pessoal sobre os escombros da nossa casa. Não podemos nutrir nossa alegria com a tristeza do nosso lar. Os Salmos 127 e 128 falam dos quatro estágios da família: a família que se fundamenta em Deus; a família que recebe os filhos como herança de Deus; a família que continua unida ao redor de uma mesa, desfrutando do fruto do seu trabalho; e a família que se multiplica, deixando para as gerações pósteras uma descendência santa. Não podemos construir nossa felicidade sobre as ruínas de um lar fracassado. Nenhum sucesso compensa o fracasso da família. O maior patrimônio que possuímos é a nossa família. Um casamento feliz vale mais que fortunas. Uma família unida vale mais que riquezas. A herança do Senhor não são as coisas, mas os filhos. Por isso, o maior investimento que podemos fazer para o futuro é valorizar nossa família. O homem feliz é aquele que dedica o melhor do seu tempo para sua família. É aquele que tem espaço na sua agenda para cultivar relacionamentos profundos dentro do lar. É aquele que vê sua esposa como uma oliveira frutífera, e seus filhos, como rebentos ao redor da mesa.

GESTÃO E CARREIRA

APETITE DE CROCODILO

Com o Brasil à frente em suas estratégias, a Lacoste aposta na expansão da distribuição e das vendas no e-commerce para ampliar os negócios na América Latina, agora sob o comando de Pedro Zannoni.

Difícil falar da Lacoste e não pensar no emblema do crocodilo. A marca francesa de roupas e acessórios, famosa pela imagem do réptil, mostra o seu lado voraz com um plano de crescimento na América Latina, desde maio sob o comando do CEO Pedro Zannoni, ex-Asics e Adidas. Com experiência de quatro anos em posições regionais, o executivo minimiza a crise econômica decorrente da pandemia e aposta na expansão da distribuição e das vendas on-line para ampliar os negócios no Brasil e aumentar a participação latino-americana no mercado global. Em 2019, o setor faturou 2,7 bilhões de euros (R$ 15,3 bilhões na cotação da quarta-feira 3). “O Brasil é um país estratégico para a Lacoste, devido ao volume crescente de negócios e ao posicionamento que a marca tem. Daqui, vamos controlar a região”, diz Zannoni. Sem revelar números, ele afirma que a América Latina teve crescimento nas vendas em 2019, na comparação com 2018. O bom desempenho da marca se manteve nos primeiros três meses deste ano, o que, segundo o CEO, suavizou os impactos do fechamento de lojas físicas devido à Covid-19. “Estamos otimistas com as reaberturas que já estão ocorrendo em todo o mundo, inclusive na nossa região”, destaca. Ele conta que, nos próximos meses, a Lacoste vai construir uma estrutura regional para fortalecer a marca. Em operação no Brasil há apenas um ano, o e-commerce receberá atenção especial. Com lojas físicas fechadas em muitas regiões, a empresa apresentou “crescimento fortíssimo” nas vendas on-line, a exemplo do que aconteceu em diversos setores da economia. “Prevemos maiores altas no decorrer do ano. É o canal no qual colocaremos mais foco e investimento nos próximos meses.”

Para Walter Sabini Junior, CEO da HiPartners Capital & Work – grupo focado em empresas inovadoras com potencial de crescimento no setor de tecnologia e internet –, a pandemia de coronavírus acelerou a transformação digital de todo o varejo, principalmente entre empresas que priorizavam as lojas físicas. Ele afirma que a Lacoste já estava num momento de globalização de fornecedores e estruturando dados para isso. Agora, é necessário apoiar-se em marketplaces para buscar o cliente digital, uma vez que grande parte dos varejistas não está preparada. “Além disso, a empresa precisa ter logística perfeita para entrega e sistema de pagamento”, observa Sabini. Ele afirma que a tendência é a loja física virar uma oportunidade de experiência de produtos. Ainda será a forma mais barata de conquistar e engajar o consumidor. Já por meio das plataformas digitais, as empresas poderão consultar sua base de dados para conhecer o perfil dos clientes e, assim, oferecer os produtos ideais. “Os varejistas têm de se preparar para ampliar esse conhecimento. Será a grande transformação.”

FRANQUIAS

 O CEO da Lacoste também busca aumentar a presença da companhia no mercado de calçados, uma das vitrines ao lado das polos, t-shirts e camisas, e ampliar sua presença no Brasil, por meio de lojas multimarcas, franquias e lojas próprias. “Precisamos, ainda, desenvolver e posicionar a marca nos demais países da América Latina”, diz ele, em referência às operações na Argentina, Uruguai, Chile e Colômbia. Zannoni explica que, nos últimos anos, a Lacoste tem trabalhado também no reposicionamento do público alvo, segundo ele, cada vez mais atual e diverso. “Isso fica evidente em nossos desfiles, campanhas, coleções. Num ambiente acirrado de mercado, conseguimos nos destacar entre os players sportwear, o que é uma vantagem”. A companhia tem linha diversificada de produtos que vai de peças íntimas a perfumes, bolsas, cintos, entre outros, cuja produção está distribuída por fábricas na América Latina, Ásia e Europa. O marketing está nesse pacote de elevar a força da grife. Desde 2017, a Lacoste tem o tenista sérvio Novak Djokovic como seu embaixador. Atual número 1 do ranking mundial, Djokovic é amado e respeitado em todo o planeta.

Atenta às questões sociais em relação à pandemia, a empresa tem procurado ajudar no combate ao coronavírus. Além de produzir 200 mil máscaras em suas fábricas na França e na Argentina, a Lacoste direcionou parte das vendas de uma coleção no e-commerce brasileiro, em abril e maio, para a compra de cestas básicas, que foram distribuídas ao Instituto Gustavo Kuerten e à Fundação Gol de Letra, antigos parceiros da marca. Os mantimentos foram entregues a comunidades carentes de São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Diante da crise mundial de Covid-19, até o crocodilo tem mostrado seu lado generoso.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

EPILEPSIA – UM PROBLEMA BIOLÓGICO

A escola, responsável pela formação do cidadão, precisa fazer parte das intervenções, quer no aspecto pedagógico ou no socioemocional das crianças que têm a doença

De origem grega, a palavra epilambanei (“surpresa”) é uma condição biológica, que revela um desequilíbrio neurológico manifestado frequentemente na forma de crises convulsivas inesperadas e recorrentes, com grau variável de intensidade e duração.

A convulsão é apenas um dos sintomas da doença, a qual traduz a existência ocasional de uma descarga excessiva e desordenada do tecido nervoso sobre os músculos do organismo. Não é contagiosa e pode surgir em qualquer idade. Ainda que a confirmação desse diagnóstico seja da área médica, através de exames específicos, e que a intervenção, medicamentosa ou cirúrgica, ofereça à grande maioria dos epilépticos uma condição de vida normal, alguns fatores decorrentes podem trazer prejuízos a sua vida escolar, mesmo se sabendo que não há comprometimento cognitivo associado ao quadro, até pelo contrário: a maioria dos epilépticos tem funcionamento normal e acima da média.

A epilepsia é comum a cerca de 2% de nossa população, especialmente na infância, já que nos primeiros anos de vida há mais vulnerabilidade para infecções do sistema nervoso central, e acidentes ocorrem com certa frequência. As crises epilépticas podem ser de diversos tipos, conforme as áreas do cérebro afetadas. Há crises parciais, outras generalizadas, assim como há as chamadas crises de ausência, em que não há uma evidência motora. Os sintomas da epilepsia variam de acordo com os neurônios que estão em estado de hiperexcitação, e em decorrência podem surgir confusão temporária, ausência, movimentos musculares descoordenados e completa perda da consciência. Quando as crises ocorrem apenas em parte do cérebro, elas são chamadas de crises convulsivas parciais, mas quando a hiperexcitação neuronal não se atém apenas a uma determinada região cerebral, ocorrem crises convulsivas generalizadas.

Relatos e registros têm mostrado que nem todo professor está aparelhado para agir no caso de um aluno ter uma crise convulsiva e, decorrente a esse fato, as crianças, os colegas de classe também não têm esse conhecimento e se assustam, pois não fazem ideia do que ocorre com o amigo em crise.

Por isso, o impacto geral é na maioria das vezes marcante para quem assiste a uma convulsão, já que a ideia de morte, aliada aos mitos que envolvem a epilepsia, ainda é grande na atualidade. Pode ser mesmo uma cena impactante se a crise for intensa e a pessoa se machucar na queda. Embora quem tem o ataque epiléptico não padeça de dor física, pode se machucar ao se debater contra uma superfície rígida, pontiaguda.

Mas pior é o mal-estar do ponto de vista pessoal e social: epilépticos em geral relatam vergonha dos colegas, sentem-se vulneráveis a ter outras crises e serem objeto de pena e discriminação. Tornam-se crianças e jovens menos sociáveis, pois a sua condição repercute no aspecto psicossocial, de relacionamento com meio ambiente, tanto na família como na escola e, mais tarde, na vida profissional.

A família toda precisa de orientação e frequentemente essa advém da escola: muitos pais tornam-se superprotetores, ansiosos, permissivos e há um importante estresse familiar permeando, o que aumenta o sentimento de inadequação, dependência, imaturidade do epiléptico. Além disso, nesse contato do professor com a família, informações sobre diagnóstico, medicação e características especiais desse aluno trarão maiores recursos aos profissionais, criando ainda condições de esclarecimento de base científica sobre o que é uma convulsão, o que é a epilepsia e afastar tabus que rondam a doença. Por essa razão, é de extrema importância que os professores saibam o que fazer antes, durante e após a crise.

Conhecimentos científicos específicos sobre o assunto estão em bons sites na internet, em boas revistas e em livros de autores experientes, além de cursos de primeiros socorros que são indispensáveis para quem tem sob sua responsabilidade muitas crianças e adolescentes diariamente.

Sabe-se que mesmo entre os alunos medicados e que não apresentam crises convulsivas típicas na escola, devido ao efeito de algumas dessas medicações e a algumas interrupções na frequência às aulas, podem aparecer prejuízos no processo de aprendizagem devido a uma relativa baixa atentiva, e de memória, um rebaixamento na velocidade de processamento, no desenvolvimento das funções da linguagem, no perceptivo motor e no aprendizado do cálculo.

Se houver surgimento de uma eventual dificuldade de aprendizado ligada à epilepsia, certamente será complicada por fatores de ordem socioemocionais e de ensino-aprendizagem, referente à maneira como a escola desenvolve a inclusão da criança no grupo.

É importante não apenas lembrar que incentivar a criança a elaborar estratégias de aprendizagem adequadas ao seu perfil de aprendiz lhe oferece oportunidade de desenvolver suas habilidades cognitivas e ter sucesso na escola, autoconfiança e motivação. Mas também é preciso estar atento ao fato de que alunos com dificuldades escolares de toda ordem precisam de retorno e reforço mais constante, para que modifiquem sua conduta no sentido da superação.

MARIA IRENE MALUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br

EU ACHO …

COMO O MUNDO, PROFESSORES NUNCA MAIS SERÃO OS MESMOS

Diante do cenário que estamos vivenciando, os desafios são gigantes para a educação como um todo e para os professores em particular. O mundo está se transformando e não voltaremos “ao normal”, pois o normal será uma nova realidade, muito diferente do que estávamos vivendo até a pandemia de covid-19. O mundo, provavelmente, não será o mesmo. A Educação e os professores também não. São muitos os aspectos que devem ser levados em consideração, como também, as inúmeras incertezas: durante quanto tempo as escolas ficarão fechadas? Como será a regulamentação? Como garantir a qualidade e o cumprimento do currículo? Como engajar alunos e famílias nesse nosso modelo? Mas, deixando de lado as incertezas e sobre as quais não temos domínio, vamos focar especialmente no papel do professor, que precisa se reinventar para continuar cumprindo sua missão de mediar a aprendizagem dos estudantes.

O processo de ensino e aprendizagem se transforma neste contexto. As formas habituais de lecionar precisam ser revistas. É preciso modificar o planejamento pedagógico e encontrar alternativas para envolver, motivar e propiciar o desenvolvimento dos estudantes, mesmo que a distância. A profissão de professor envolve muita relação interpessoal e acolhimento. Talvez aqui esteja a maior perda. A falta do olho no olho e das interações entre professores e alunos assim como entre alunos e os colegas. Um dos principais desafios é adequar aulas, materiais e atividades para outro modelo que não o presencial. Muitas tecnologias estão sendo disponibilizadas neste momento de crise. É uma avalanche de informações, o que torna muito difícil encontrar a melhor solução para atender a essa necessidade não planejada de ensinar além dos muros da escola.

Apesar de a grande maioria dos professores utilizar regularmente as tecnologias no dia a dia, a situação fica mais complicada quando se trata de conhecer e dominar novas ferramentas e metodologias para adaptar as aulas a um novo formato. Isso exige um tempo que não temos. Inclusive, muitas escolas no país estão definindo férias de vinte dias para que suas equipes se preparem melhor e desenvolvam conteúdos e dinâmicas adequados para as aulas a distância. Outro grande desafio é a falta de infraestrutura necessária para aulas a distância nos lares, especialmente em se tratando de estudantes da escola pública. Essa questão, de homeschooling, não pode ficar à margem, pois temos que garantir uma educação não excludente. A falta de tempo e preparo das famílias para mediar a realização de atividades pedagógicas torna a situação do ensino ainda mais complexa.

Existe o fato, ainda, de que os desafios são diferentes para alunos das diferentes faixas etárias, já que é possível adaptar recursos para atender desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. Porém criatividade, objetividade e simplicidade são os postos-chave para este momento, independentemente da idade dos estudantes. A crise consolidou algo que já sabemos: alunos estão mostrando que as instituições formais de ensino já não são mais os principais locais para buscar informações e aprender. Portanto, precisamos reinventar a escola como espaço relevante de aprendizagem para que cumpra seu papel de formar estudantes a fim de interagir com criatividade, ética e responsabilidade na sociedade em que estão inseridos.

As tecnologias digitais podem ajudar a tornar esse desafio menos estressante para todos os envolvidos nos processos de ensinar e aprender. Plataformas adaptativas, por exemplo, permitem ao estudante seguir o próprio caminho de aprendizagem de uma forma mais autônoma, seja recuperando dificuldades individuais ou avançando para conceitos mais complexos. Os dados coletados no decorrer da realização das atividades auxiliam o professor a acompanhar, mesmo que a distância, o desempenho de cada aluno e a intervir quando a mediação se faz necessária. É apenas um exemplo de como os tão propalados Big Data e Inteligência Artificial podem ajudar o #FiqueEmCasa a ser mais produtivo e envolvente.

Oferecer conteúdo relevante, bem dosado, com interação e uma rotina de produção para que os alunos participem de forma ativa das atividades, compartilhando ideias e dando devolutivas, pode assegurar maior interesse e compreensão dos conceitos abordados. Metodologias ativas, educação 4.0, autonomia do aluno, temas voltados para educação e amplamente discutidos em congressos, seminários, simpósios entre outros eventos agora ganham destaque e é o momento para colocá-los em prática.

O professor, depois do covid-19, assim como qualquer um de nós (inclusive os estudantes), será um profissional mais preocupado com o outro, que valoriza as relações interpessoais. A principal transformação que a crise nos trará está ligada ao envolvimento, engajamento e determinação para fazer e ser diferente. Quando as aulas presenciais retornarem, o professor certamente estará mais antenado às estratégias diferenciadas e ao novo. Será capaz de enxergar, avaliar e aliar o interesse dos alunos aos recursos usados em sua prática pedagógica diária. Isso proporcionará mais dinâmicas para aulas, engajamento dos alunos e, consequente, mais aprendizagem. Estamos prestes a vivenciar a decolagem da Educação 4.0 no Brasil, definitivamente.

** REGINA SILVA é diretora pedagógica da unidade de tecnologia educacional da Positivo Tecnologia e especialista nas soluções para escolas disponíveis em http://tecnologia.educacional.com.br

OUTROS OLHARES

 OS PRIMEIROS SINAIS DE LIBERDADE

O mundo começa a sair da quarentena em meio à pandemia. A experiência lá de fora mostra que o retorno deve ser gradual e cercado de regras, o que não tira o legítimo prazer de pôr o pé na rua (ou nas praias, nos shoppings, cinemas, restaurantes…)

Parece sonho. Depois de mais de dois meses vendo o sol pela janela do apartamento ou, no máximo, do jardim de casa e convivendo com as mesmas pessoas – cada vez mais entediadas, cada vez mais entediantes -, boa parte da população do planeta começa enfim a pôr o pé na rua. Esse primeiro passo é cuidadoso, tateante e cercado de regras. E não é para qualquer um – ou, pelo menos, não deveria ser. Estão aptos à onda de liberdade vigiada os locais que só relaxaram as imposições quando a curva da pandemia dava uma trégua, a taxa de transmissão do vírus abrandava e o sistema hospitalar desafogava, o que abrange populações na Ásia e na Europa. Não estão prontas, mas mesmo assim já puseram a roda para girar, várias cidades nos Estados Unidos e no Brasil, países onde o número de vítimas está em linha ascendente, mas os governos acharam por bem correr riscos. “A liberação aqui é precipitada. Recomendo que seja feita com o máximo de responsabilidade e rigor”, alerta o epidemiologista Roberto Medronho. Dado o aviso, a perspectiva de sacudir o bolor do confinamento e voltar a ser dono de seu destino enche de gente e de animação lugares onde seres humanos não pisavam fazia tempo.

Sendo quase verão na Europa, e sendo os europeus adoradores do sol e do calor, as praias de lá estão no topo do processo de abertura lenta e gradual para a vida normal. Quase todas já foram liberadas, desde que se reparta a areia com responsabilidade: distância entre as barracas, máximo de quatro a dez pessoas em cada uma, obediência de mão e contra mão e comércio zero de alimentos e bebidas – quem quiser leva o seu e volta com o lixo para casa. Portugal tem sinal verde, amarelo e vermelho para indicar o nível de ocupação. A Itália cogita em exigir reserva prévia de espaço. O Rio de Janeiro, depois de 79 dias sob isolamento social, começou na terça-feira 2 a afrouxar as normas, por meio de um plano em seis fases de quinze dias cada uma, até o fim de agosto. Já valem programas ao ar livre, inclusive caminhar no calçadão e entrar no mar para nadar ou surfar. Tomar sol, não – mas muitos foram direto se aboletar na areia, reforçando a veia de indisciplina capaz de, perigosamente, estragar qualquer cronograma.

A liberação das praias na Europa, por mais que agrade à população local, tem o objetivo mais amplo de religar o motor da indústria do turismo, que responde por cerca de 10% do PIB da União Europeia (UE) e que foi posta na UTI, em estado gravíssimo, pelo novocoronavírus. As expectativas, no momento, estão concentradas na movimentação interna, embora a reabertura das fronteiras entre integrantes da UE esteja marcada para 15 de junho. Detentor de um dos melhores registros de controle da Covid-19 no continente, Portugal começou a retomada da vida normal cedo, em 4 de maio, e está na fase 4 do processo, com restaurantes, cafés, museus, palácios e monumentos funcionando. Fases e cores, aliás, estão no cronograma de todas as trilhas do desconfinamento.  A Espanha se encontra na fase 2, com estabelecimentos fechados e locomoção entre cidades severamente limitada pelo menos até o fim de junho. “A recuperação ainda vai demorar”, constata Inés Miró-Sans, dona do hotel Casa Bonay, em Barcelona – cidade que recebeu 12 milhões de visitantes em 2019, dos quais 83% estrangeiros. Ah, bons tempos. Para onde quer que se viaje na pós-pandemia, a Comissão Europeia requer das empresas menor número de passageiros e check­ in e retirada de bagagens sem aglomerações, além de medição de temperatura em massa – uma medida positiva que o Aeroporto de Brasília, outra cidade brasileira apressada em acabar com o isolamento, já implantou. Os termômetros também são item de primeira necessidade nas escolas que já reabriram na Coreia do Sul, divisórias de acrílico separam as carteiras.

Na vida cotidiana dos europeus, a maior preocupação das autoridades é conter o entusiasmo de quem estava louco para sair à rua e encontra r os amigos – o ponto de partida para os temidos repiques da Covid-19. “As pessoas querem esquecer a tragédia que viveram e estão se sentindo seguras demais. Isso é perigoso”, diz o epidemiologista italiano Marco Vinceti. ” Repito todos os dias para minha família: cuidado, cuidado e cuidado.” As lojas reabriram em boa parte do continente. As de roupa, na Itália, têm de fornecer luvas aos clientes que quiserem tocar nas peças. Ar condicionado está proibido em toda parte, pelo potencial de transportar e espalhar o vírus. “Voltar à normalidade é como reaprender a andar: um passo de cada vez”, comparou o primeiro-ministro da Itália, Giuseppe Conte. A frequência é limitada a 40 %, 50% do espaço útil e os provadores sumiram, o que levou grifes como Zara e H&M a facilitar a política de trocas. Na maioria dos shopping centers, marcas no chão indicam o sentido a seguir e até os pontos de ultrapassagem. O acesso a banheiros ficou muito mais restrito.

No capítulo entretenimento, a ida a cinemas e teatros se tornou uma experiência sem precedentes. Nas salas já abertas – Reino Unido e França ainda não permitiram – há mais assentos vazios do que ocupados, sempre comprados on-line, já que as bilheterias foram suprimidas. No esporte, nem isso: os campeonatos de futebol estão sendo retomados com estádios vazios. As normas contra aglomerações nos locais de lazer deram origem a um fenômeno na Europa – a reabilitação dos drive-ins para tudo, de filmes a apresentações de DJs. Para regozijo da população em geral, e dos franceses em particular, os bares e cafés reabriram as portas, a maioria atendendo só na calçada”. A liberdade voltou a ser a regra e as restrições, a exceção”, comemorou, com certo exagero, o primeiro-ministro Édouard Philippe na terça-feira 2. No Reino Unido, os pubs e restaurantes permanecem fechados, mas as reuniões em casa estão autorizadas, desde que não passem de seis pessoas ao ar livre, cada um com sua cadeira e poucas e rápidas idas ao banheiro –  a única desculpa para entrar na casa. Do governo britânico partiu uma das propostas mais invasoras de intimidade de que se tem notícia em tempos de pandemia: casais que moram em casas diferentes não podem passar a noite juntos. Apesar das ruas e parques mais cheios do que o recomendado, as determinações têm sido respeitadas. “A maioria dos europeus tem disciplina, e quem não concorda cumpre as regras do mesmo jeito, por causa da fiscalização”, diz Narcisa Quiles, professora de imunologia da Faculdade de Medicina da Universidade Complutense de Madri.

Transportados para o Brasil, que tem mais de 600.000 contaminados e passou dos 30.000 mortos, o relaxamento da quarentena e a retomada das atividades deixam os especialistas preocupados. “Corremos o risco de uma explosão de casos, daí a necessidade de as pessoas manterem o freio”, explica Rafael Galliez, professor de doenças infectocontagiosas da Faculdade de Medicina da UFRJ. O retorno à normalidade requer estatísticas monitoradas e prazos revistos ao menor sinal de risco. “Considero os planos de abertura do Rio e de São Pauto coerentes e consistentes”, afirma o epidemiologista Medronho – desde que as regulamentações saiam do papel. No Rio, hotéis, concessionárias e lojas de móveis e de decoração já funcionam (com resultados financeiros ainda pífios, claro). Em São Paulo, shoppings e escritórios devem voltar à vida até 15 de junho. Em um primeiro momento, vão funcionar quatro horas por dia e ocupar um quinto de seu espaço. Uma das primeiras cidades a adotar medidas restritivas de circulação, Brasília também saiu na frente na retomada do comércio. Aprove-se ou não, as portas no Brasil es tão se abrindo. Por mais forte e legítimo que seja o suspiro de alivio, contudo, ninguém pode baixar a guarda.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 14 DE JUNHO

ALEGRIA INDIZÍVEL E CHEIA DE GLÓRIA

A quem não havendo visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais com alegria indizível e cheia de glória (1Pedro 1.8).

O apóstolo Pedro escreveu aos crentes dispersos e forasteiros da Ásia Menor. Era um tempo de grande sofrimento. As perseguições patrocinadas pelo imperador Nero já haviam começado. Os crentes enfrentavam variadas perseguições. Porém, no meio desse fogo de prova, os crentes deveriam regozijar-se na salvação com alegria indizível e cheia de glória. O mundo anseia por alegria. As pessoas investem dinheiro procurando comprar a alegria. Mas onde está a alegria? Nas aventuras sexuais? Nas bebidas requintadas? Nos banquetes fartos? Nas vestes caras? Nas riquezas deste mundo? No luxo extremado? Muitas pessoas experimentam todas essas coisas e continuam infelizes. Outras, entretanto, mesmo desprovidas dessas coisas, experimentam uma alegria indizível e cheia de glória. A verdadeira alegria é mais que um sentimento. É mais que uma emoção. A verdadeira alegria é uma pessoa, é Jesus. Aqueles que o conhecem e desfrutam de sua salvação experimentam uma felicidade maiúscula e superlativa. Aqueles que tomam posse da salvação e nutrem na alma uma esperança viva desfrutam da alegria que não pode ser comunicada com palavras, uma alegria gloriosa. Você é uma pessoa feliz? Conhece essa alegria indizível e cheia de glória? Tem usufruído dessa alegria? Tem-se fartado desse banquete de Deus? Agora mesmo você pode tomar posse dessa alegria. Ela é uma iguaria deliciosa no lauto banquete da graça.

GESTÃO E CARREIRA

A SOLIDARIEDADE QUE TRANSFORMA

Iniciativa da XP Inc., o projeto Juntos Transformamos já destinou R$ 32 milhões em recursos para atenuar os efeitos da pandemia. Além das doações, o movimento busca inspirar novas atitudes. A live com o visionário Chris Gardner é um exemplo.

É um clichê afirmar que a vida de determinada pessoa daria um livro ou filme. Pois a de Chris Gardner rendeu ambos — e muito mais. Sua incrível jornada pessoal foi narrada na autobiografia À procura da felicidade, best-seller adaptado para o cinema em um tocante longa-metragem estrelado pelo ator Will Smith. A trama conta a história real de provações e superação de um pai de família negro, de origem humilde e que, como tantos outros, luta para manter seu casamento e conseguir um trabalho capaz de prover o sustento dos filhos. Por um longo período, quase nada dá certo. Ele fica sem emprego, passa os dias tentando vender um equipamento médico que ninguém demonstra interesse em comprar e chega a ficar encarcerado por dez dias depois de acumular uma imensa lista de multas de trânsito, que evidentemente não tinha como pagar. Em uma das cenas do filme ele se envolve em um acidente e fica sem um pé de sapato. Vai só de meia à corretora de ações Dean Witter, na qual fazia um estágio para entrar no mercado financeiro. Contra todas as previsões, Chris Gardner venceu. Tornou-se um corretor de sucesso na bolsa, abriu a própria empresa e fez de sua trajetória a inspiração para milhões de pessoas.

Na terça-feira (2), ele participou como convidado especial de uma live organizada pela XP Inc. no âmbito da campanha Juntos Transformamos, que em 22 dias já destinou R$ 32 milhões a quatro projetos sociais (leia no quadro). O valor corresponde a 64% da meta fixada para a campanha. Ao apresentar Chris como embaixador da campanha, o presidente da XP Inc., Guilherme Benchimol, afirmou: “A gente não consegue salvar o mundo sozinho. Mas se todo mundo abraçar uma causa social, a gente pode ajudar o Brasil a atravessar essa crise e sair dela melhor do que estávamos quando ela começou”.

Durante a entrevista de meia hora conduzida pela estrategista de ações Betina Roxo, Chris deixou várias mensagens inspiradoras. A primeira delas diz respeito diretamente à pandemia: “Eu já ouvi muitas pessoas dizendo que o coronavírus colocou todos nós no mesmo barco. Não estamos no mesmo barco. Estamos na mesma tempestade.” E prosseguiu explicando as diferenças entre os barcos em que cada um está, dependendo de sua condição social, de saúde e de renda durante e após a pandemia. “Quem está conseguindo trabalhar de casa, apesar de todas as restrições e dificuldades impostas pelo isolamento está em um barco bem diferente daqueles que já não têm emprego, ou dos que precisam arriscar as suas vidas para poder trabalhar.”

LIDERANÇAS

A descrição é especialmente oportuna para sensibilizar quem está em uma situação privilegiada e pode contribuir para amenizar ao menos parte da dificuldade que enfrentam os mais vulneráveis, seja fazendo doações em dinheiro, dedicando parte de seu tempo em trabalho voluntário ou compartilhando conhecimento. É desse tipo de ajuda que sobrevivem ONGs como a Amigos do Bem, que nasceu por iniciativa de Alcione Albanesi, uma batalhadora que levava roupas, alimentos e atendimento médico e odontológico a famílias do sertão nordestino. Hoje, seus inúmeros projetos educacionais e autossustentáveis movimentam a vida de mais de 75 mil pessoas nos estados de Alagoas, Ceará e Pernambuco.

Também beneficiado com recursos do movimento Junto Transformamos, o Instituto Gerando Falcões, liderado pelo empreendedor social Eduardo Lira, que desde o início da pandemia fez chegar 243 mil cestas básicas a comunidades carentes. Mais importante que o trabalho emergencial, a ONG nascida na periferia paulistana tem por finalidade criar novos projetos de vida para jovens desassistidos. Um propósito que pode criar futuros líderes, algo que está faltando hoje no Brasil e no mundo, segundo o próprio Chris Gardner. “Não temos liderança em diversas partes do mundo. Por isso, uma das coisas que farei com meu tempo agora é encorajar os jovens para que votem.” Ele sabe da importância que reside na escolha de um governante.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

DE LÚDICO A TRÁGICO

Perfil e origem da compulsão por jogos varia entre os sexos. A idade em que os jogadores procuram a primeira ajuda psicológica gira em torno dos 40 anos

Aos 17 anos, Márcia (nome fictício) fez sua primeira aposta no “jogo do bicho”. No começo gastava seu próprio salário para sustentar o comportamento compulsivo de jogar. Com o tempo, porém, passou a dispor das economias capitalizadas pela família no banco em que era responsável pela área de aplicações. Movimentava o dinheiro dos parentes entre as contas, até deixá-las negativas. Descoberta por um auditor, acabou demitida por justa causa e prometeu jamais voltar a jogar. O compromisso foi mantido nos quase 20 anos que se seguiram, período em que pôde reorganizar sua vida, cursar faculdade e conseguir bons empregos.

Entretanto, um problema emocional a fez voltar a apostar, desta vez, em máquinas eletrônicas. “Voltei a jogar compulsivamente, perdi tudo o que havia construído. Além do dinheiro, perdi minha dignidade, minha moral, autoestima, caráter, e espirito familiar. Tudo isso coube naquelas máquinas”, enfatiza ela, que chegou a dormir na rua e a passar frio e fome, tendo, inclusive, tentado o suicídio na véspera do aniversário da mãe. Desde julho de 2003, frequenta as reuniões dos Jogadores Anônimos, grupo que funciona segundo os moldes dos Alcoólatras Anônimos e dá suporte aos dependentes. “Desde então nunca mais fiz nenhuma aposta, faz dois anos e 11 meses e dois dias. Tenho o amor da minha família de volta, minha autoestima, minha dignidade, amigos. Hoje, a vida, que não é só o espaço entre nascer e morrer, é curtir cada momento e poder ajudar alguém”, finaliza.

Histórias, como as de Márcia, mostram os desdobramentos reais de um problema que ganha vulto nos serviços de saúde mental. Embora não existam estatísticas brasileiras, pesquisas feitas nos Estados Unidos, Canadá, Espanha e Austrália mostram que, nestes países, entre 0,8 e 4% da população vivencia o hábito de jogar de maneira patológica, o que pode ser caracterizado como um comportamento mal adaptativo persistente e recorrente de apostar em jogos de azar, implicando em prejuízo significativo em diferences aspectos da vida. “O jogo perde seu significado lúdico quando o indivíduo joga para recuperar perdas anteriores, perde o controle ao apostar mais que o programado ou jogar por mais tempo do que o planejado, recorre ao jogo como fuga, se endivida, compromete as relações familiares e sociais e ainda persiste na atividade”, enumera o psiquiatra Hermano Tavares, coordenador do Ambulatório do Jogo Patológico, vinculado ao Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo.

ENQUADRAMENTO

Reconhecido como transtorno psiquiátrico pela Organização Mundial de Saúde somente em 1992, aparece nos manuais de psiquiatria desde a década de 80. No DSM-IV, faz parte do grupo de Transtornos do Controle dos Impulsos Não Classificados em Outro Local, já no CID-1O consta entre os Transtornos de Hábitos e Impulsos. O enquadramento vem justamente pelo fato de existirem similaridades entre o jogar patológico e consumo de substâncias psicoativas. Conceitos como o de tolerância, que pontua a necessidade de se consumir uma quantidade maior de substâncias (nesse caso, de se apostar cada vez mais), para a obtenção do mesmo prazer ou perda de controle são válidos também neste contexto. “A atividade de jogar excita o sistema nervoso central e se reflete no corpo pela aceleração dos batimentos cardíacos, elevação da tensão muscular e aumento da frequência respiratória. Nesse sentido, seus efeitos se assemelham muito às reações produzidas por excitantes químicos corno cocaína, anfetamina e ecstasy”, compara o psiquiatra.

Embora cada um traga sua própria bagagem de vida, é possível pontuar algumas características que se combinam significativamente, propiciando o aparecimento destes quadros. “A impulsividade e a instabilidade emocional são os principais fatores de vulnerabilidade ao jogo. Ambos têm uma determinação compartilhada entre a genética e o ambiente. Estima-se que 30 a 50% dos fatores determinantes sejam herdados e o restante vem do meio, como estresse no trabalho, na vida familiar e a oferta abundante e progressiva de jogos de azar em nossa sociedade”, esclarece Tavares, enfatizando também que a expansão do jogo de azar é um fenômeno internacional, comum na cultura ocidental, em que autoestima e  reconhecimento social foram progressivamente alçados à condição de valores intercambiáveis e, de certa forma, identificados com a questão da posse financeira.

No cenário nacional, a expansão dos Bingos acabou por se tornar um fator decisivo no aumento da demanda por tratamento; assumindo a dianteira como jogo de preferência entre as pessoas que buscam ajuda em programas especializados na cidade de São Paulo.

QUEM É O JOGADOR?

O psiquiatra delimita dois perfisde jogadores, sendo que muitas vezes, é possível reunir características de ambos. O primeiro é predominantemente masculino e começou a jogar no fim da adolescência. Antes de se tornar praticante preferencial de uma modalidade de jogo, transitou por várias, formas, entre sinuca, jogo do bicho, dominó, cartas, cavalos. Em geral, casou-se cedo e logo entrou no mercado de trabalho, tendo um sucesso inicial por ser falante, ágil e extrovertido, o que lhe protegeu por um tempo de envolver-se mais profundamente com jogo. ”Entre os 30 e 40 anos, contando com uma folga financeira, passa a apostar mais imensamente na busca pela emoção do risco. Aposta grande volume de dinheiro em um curto espaço de tempo visando à excitação. Em torno dos 40 anos tem sua primeira quebra financeira, mas como é orgulhoso, independente, ainda vai cair e levantar-se algumas vez até aceitar o fato de que necessita de ajuda ou tratamento especializado para lidar com seu problema”, delimita o psiquiatra, acrescentando que a média de idade na primeira procura por tratamento dessas pessoas é em torno dos 45 anos.

Quanto ao segundo perfil, que tanto pode ser masculino quanto feminino, engloba os indivíduos que começaram a jogar mais tarde, em torno dos 40 anos, sem ter experiência prévia.

Aqui, o jogar aparece comoum reflexo do esvaziamento do cotidiano, uma vez que os filhos são mais independentes e a demanda pordinheiro na família se reduz, ou seja, a principal motivação para jogar é o alheamento dos problemas. “Este paciente dá preferência caça-níqueis e jogos eletrônicos emgeral, e história anterior de depressão ou transtorno de ansiedade é comum nesta população. A progressão para a compulsividade é muito rápida, em geral de 6 meses a 2 anos”, caracteriza o médico, informando ainda que este jogador aposta valores menores buscando prolongar o seu tempo em frente à máquina.

Nestes casos,a procura por tratamento é mais rápida e muitas vezes vem mascarada como uma queixa de tristeza e nervosismo, acompanhada de reclamações sobre a incompreensão da família, já que neste perfil, o paciente tem vergonha de confessar que joga. “Como a progressão é mais rápida, apesar do início tardio, este paciente chega ao tratamento mais ou menos na mesma época, ou seja, em torno dos 45 anos de idade. A progressão acelerada é chamada de efeito telescópio e seus principais fatores de risco são: gênero feminino, preferência por jogos eletrônicos e início após a quarta década de vida”, esclarece o médico.

A psicóloga Thaís Grade Maluf, integrante do Programa de Atendimento de Jogadores Patológicos do Proad, vinculado à Universidade Federal do Estado de São Paulo (Unifesp), pontua que o pedido de ajuda costuma vir quando “a corda já passou do pescoço”, ou seja, quando houve uma desestruturação financeira significativa e o casamento está comprometido ou desfeito. Para a entrada no programa oferecido pela instituição, a pessoa passa por um grupo de acolhimento que integra outros dependentes não químicos, como compradores, dependentes de sexo ou de internet. O intuito é o de sensibilizar não só o paciente, como também sem familiares para o tratamento, colocando-se em pauta a questão da impulsividade e da compulsividade, presentes de forma contundente nos jogadores, embora manifestos em graus diferentes no decorrer da vida. “O jogador tem um estigma muito parecido com o do viciado em drogas e por isso procura o tratamento com mais frequência”, pondera a psicóloga ao comparar a maior participação desta clientela, em relação ao espectro de dependências reunidos no grupo.

Entre as crenças do jogador patológico, está a de que se tem controle sobre o hábito, ou que se “joga só para relaxar”. Há ainda uma tendência em buscar continuamente a experiência vivida numa fase inicial de “euforia’, em que o retorno financeiro ainda era significativo. Este estado prazeroso do ganho fica na memória por muito tempo e, de uma certa forma, é atrás desta sensação de ganho e poder que se vai”, pontua a psicóloga.

A partir deste ponto, o usuário do serviço passa a receber acompanhamento psiquiátrico e psicoterápico individual ou em grupo, sendo que a equipe segue uma orientação psicodinâmica da dependência. Nesta perspectiva, o foco de atenção se direciona para além dos sintomas, em busca das causas do que não vai bem e que se manifestam através do comportamento compulsivo. Muitas das pessoas que procuram o serviço trazem, no seu histórico familiar e também pessoal, O fato de já terem feito o uso abusivo de droga, muitas vezes apenas “migrando” de uma adição para outra.

Mais do que o cessar da atividade, busca-se a conscientização e a possibilidade do sujeito em responsabilizar-se pela sua condição, reduzindo os inúmeros prejuízos vinculados à dependência de jogar e a possibilidade da construção de outros vínculos de lazer, e possibilidades efetivas de prazer. Enquanto se busca o enfrentamento na gênese do problema, a equipe também traz orientações simples, como a de que o usuário do serviço deve uma quantia determinada, ao sair de casa para jogar ou ainda que jogue no computador, em casa, sem apostas.

A psicóloga pontua que boa parte dos homens chegam ao serviço impotentes nas diversas esferas da vida, pois não conseguem gerir o próprio dinheiro, sendo que muitos tiveram sucesso profissional e conseguiram um bom padrão de vida trabalhando. Esta situação acaba favorecendo um novo arranjo de papéis dentro do lar, em que há um certo ganho de poder por parte da mulher, que acaba assumindo um papel central no comando das finanças, por exemplo, o que, de alguma maneira, a torna resistente em partilhar com o companheiro do percurso do tratamento.

O médico Hermano Tavares reitera a importância do processo psicoterápico nestes casos, pelo alto índice de associação com outros transtornos psiquiátricos, principalmente na dependência química, depressão e ansiedade. (É importante uma avaliação psiquiátrica e o tratamento dessas  condições associadas”, pontua o psiquiatra, enfatizando que, ainda em fase experimental, estão  sendo testadas medicações que possam reduzir a “fissura” que os jogadores sentem ao tentarem parar, ressaltando que os resultados são promissores, mas ainda inconclusivos.

No Instituto de Psiquiatria da USP é oferecido tratamento gratuito por um ano aos jogadores que são voluntários. O programa inclui psicoterapia individual e existe há dois anos o trabalho com grupos de orientação psicanalítica supervisionado por uma psicanalista para investigação e tratamento neste território de atuação. Além do acompanhamento psiquiátrico e orientação familiar, a participação nos Jogadores Anônimos é fortemente encorajada.

EXPERIÊNCIAS COMPARTILHADAS

Os grupos de Jogadores Anônimos são o resultado de um encontro, em janeiro de 1957, entre dois homens, que tinham em comum uma trajetória de vida repleta de dificuldades e misérias, relacionadas ao jogo. Começaram a reunir-se regularmente, e, com o passar do tempo, nenhum dos dois voltou a jogar. Como resultado da publicidade favorável por parte de um colunista de jornal e apresentador de televisão, a primeira reunião de Jogadores Anônimos aconteceu numa sexta-feira, 13 de setembro de 1957, em Los Angeles, Califórnia.

Foi o passo inicial para que grupos do gênero fossem fundados pelo mundo. “Em São Paulo comemoramos todo dia primeiro do mês de junho, tendo completado 24 anos em 2019. Hoje, contamos com reuniões todos os dias da semana, inclusive feriados, e somamos um total de 45 grupos de Jogadores Anônimos espalhados pelo Brasil, que têm como objetivo o parar de jogar e ajudar outros jogadores compulsivos a fazerem o mesmo através de nossos depoimentos de vida e do que a doença nos causou”, pontua a Relações Públicas dos Jogadores Anônimo, informando que o Programa de Recuperação segue os “Doze Passos”, que refletem a aplicação de princípios espirituais, praticados cotidianamente, possibilitando o despertar de mudanças interiores. “O jogo compulsivo é uma doença, progressiva por natureza, que não pode ser curada, porém pode ser detida. A pessoa inventa montanhas de problemas aparentemente insolúveis. Criam problemas financeiros, mas também têm que enfrentar questões legais, de emprego e matrimoniais. Descobrem que perderam amigos e são rejeitados por parentes”, enumera, salientando o longo trajeto percorrido pelas pessoas até poderem aceitar ajuda, muitas vezes se entregando a uma deterioração sutil.

EU ACHO …

HORA DE SE REINVENTAR

Aos 85 anos, Renato Aragão virou tiktoker e conta como a rotina nas redes o mantém “adolescente”

Quando me questionam como é ser idoso em uma pandemia, rebato de bate-pronto com outra pergunta: é comigo mesmo? Eu não sou um idoso, tenho é juventude acumulada. Alguns dias acordo com 30 anos, em outros com 16. Nunca com a minha idade cronológica. Estou sem sair de casa há quase três meses e sigo à risca todas as orientações para proteger a mim e a minha família Sou do grupo de risco, embora não me sinta assim. E tenho medo desse vírus. Enquanto isso tudo não passa, tento ir levando a situação com energia e humor. Outro dia mesmo postei no Instagram uma cena em que eu dizia ao telefone que ia sair, e minha mulher (Lilian Aragão) me interrompia falando que não iria a lugar nenhum. É ela quem manda. Faço esse papel de incentivar as pessoas a ficarem casa, com leveza. E aí, em pleno isolamento social e em busca de novas distrações, eis que acabei, por estímulo de minha filha, Lívian, e amigos, aderindo ao TikTok (aplicativo com vídeos curtos usado por milhões de crianças e adolescentes no mundo todo).

Eu me encontrei como tiktoker. Tenho mais de 700.000 seguidores lá e quase 2 milhões de pessoas já curtiram meus vídeos. É uma linguagem rápida, despretensiosa e, mesmo sendo um novato na área, ela não é tão nova assim para mim. Sempre gostei de fazer minhas coreografias na televisão, com Os Trapalhões. Agora, em casa, faço ainda mais: já postei de tudo um pouco – dancei sucessos como Despacito, o funk Lacraia, Don’t Start Now, Pump It e Braba, de Luísa Sonza. Esse é o repertório, variado. O segredo é não ter medo do ridículo, e eu não tenho. Queria ser como o Didi Mocó (seu personagem), que pensa zero no dia seguinte. Eu não sou exatamente desse jeito, mas não tenho problema nenhum em me expor. Aliás, gosto disso. Corro pelo quintal, subo em pedra, rego o jardim, faço flexão, uso bambolê, planto bananeira – e depois posto.

Duas coisas ajudam a me manter atualizado, com o espírito jovem. Uma delas é o fato de eu nunca ter deixado de me exercitar; isso desde os tempos em que servi no Exército, ainda no Ceará. Meu manequim continua exatamente o que sempre foi ao longo da vida – 1,64 metro e 61 qui1os. A outra vantagem, fonte de meu ânimo permanente, é justamente minha relação com a tecnologia, com a internet e com as redes sociais. Eu mesmo faço questão de responder aos amigos no Instagram. Passo tanto tempo conectado que a Lilian (que também faz suas aparições no TikTok) vive dizendo que pareço um adolescente.

Às vezes me bate uma tristeza. Sou emotivo demais. Choro todos os dias assistindo ao noticiário. Tenho até evitado ver direto. Como tanta gente, experimentei a dor de perder uma pessoa muito querida nesta pandemia. Também não pude me despedir do meu irmão, que não resistiu a uma cirurgia para colocar um marca-passo, em Fortaleza. Para diminuir o peso, eu me exercito pela casa, faço meditação, escrevo meus esquetes de humor. Por ora, extravaso no Instagram, no TikTok, e por aí vai. Volta e meia imito um aluno tendo aulas on-line e cheio de desculpas por estar atrasado, mesmo confinado. Já estou com um estoque de piadas prontinho e repleto de projetos. Não vejo a hora de voltar a trabalhar, poder sair para jantar com meus grandes amigos, como o Dedé Santana, com quem falo quase todos os dias, e abraçar meus filhos. O Ricardo, que mora em Portugal, e a Livinha, que estava nos Estados Unidos, chegaram há pouco mais de uma semana e vieram para casa. Só não posso me aproximar deles, o que é bastante angustiante. Estão tendo de cumprir quarentena nos quartos, isolados por precaução, mesmo depois de o teste para o novo coronavírus de ambos ter dado negativo. Em um momento assim, quando está tudo tão mudado, você também precisa se reinventar e se reconectar ao mundo da maneira que dá.

OUTROS OLHARES

GRAVIDEZ NA ADOLESCÊNCIA

Campanha propõe aguardar a idade adulta para iniciar a vida sexual

De acordo com o Ministério da Saúde, cerca de 930 meninas com menos de 20 anos dão à luz todos os dias, totalizando mais de 434,5 mil mães adolescentes por ano. O Brasil registra a maior taxa entre os países da América Latina e Caribe, chegando a 68,4 nascidos vivos para cada mil adolescentes e jovens.

Em fevereiro deste ano o governo federal lançou a campanha “Tudo tem seu tempo: Adolescência primeiro, gravidez depois”. A estratégia propõe que os adolescentes considerem a possibilidade de adiar o início da vida sexual como uma ferramenta para evitar a gravidez precoce.

Instituída por meio da lei nº 13.798, a campanha é voltada para adolescentes, jovens, pais ou responsáveis, com o objetivo de disseminar informações sobre medidas preventivas e educativas que contribuam para a redução da incidência da gravidez na adolescência.

Mas a campanha, que está sendo chamada de projeto da “abstinência sexual”, vem sendo alvo de críticas de entidades como a Sociedade Brasileira de Pediatria e a Defensoria Pública da União. Entre os argumentos está o de que a estratégia não funciona, fere a liberdade do jovem sobre seu corpo e confunde.

Dados apresentados no lançamento da campanha apontam um crescimento das DST (doenças sexualmente transmissíveis) no Brasil nos últimos anos, especialmente entre os jovens. Os novos casos do Aids aumentaram 21% entre 2010 e 2018 no país, enquanto diminuíram no mundo, segundo a ONU.

Para a ginecologista e obstetra, Kadja Froés, a real medida para redução dos índices de DST e da gravidez na adolescência deve ser a educação sexual.

“Eu acho válido que seja incentivada uma redução da sexualização infantil. É necessário o conhecimento das doenças, do corpo da mulher e do homem e da importância do uso dos métodos de prevenção. Nessa fase os hormônios sexuais estão em níveis altos, levando a um desejo sexual maior, além da descoberta do prazer. Tornar esse prazer proibido é mais um incentivo para o adolescente querer tê-lo. Na minha opinião, a única maneira de conseguirmos reduzir os números de adolescentes grávidas é um programa bem feito de educação sexual, que pode ser nas escolas ou veiculado na mídia”, comenta.

A médica alerta sobre os riscos de uma gravidez precoce tanto para a saúde da mulher quanto do bebê.

“Se formos considerar o ponto de vista anatômico e fisiológico, a idade inicial para engravidar seria a partir dos 20 anos, quando o aparelho reprodutor está totalmente formado. Claro que pode variar para cada mulher, algumas se desenvolvem antes, mas pensando em uma média seria essa idade. A pré-eclampsia, que é a elevação da pressão arterial na gestação, é mais comum nos extremos etários, ou seja, adolescência e após 40 anos. É uma doença grave que pode levar ao óbito materno e fetal, se a gestante não for bem assistida no pré-natal. A gestação na adolescência também apresenta maior risco de parto prematuro e baixo peso do bebê ao nascer devido retardo de crescimento intra-uterino, com maiores índices de morbimortalidade fetal e neonatal”, explica.

Para a psicóloga e diretora administrativa da Uniser do Vale, Nilcéia Costa, uma campanha de incentivo ao início da vida sexual somente na idade adulta não têm o poder de mudar a vida das adolescentes.

“Só haverá mudanças saudáveis se houver medidas educativas sobre a vida sexual. A falta de orientação sexual, tanto na escola como na família, leva à gravidez precoce e às doenças sexualmente transmissíveis. Essa campanha não vai levar a nada se não houver efetivamente um trabalho feito desde a pré-adolescência falando sobre a vida sexual, sobre os seus valores e consequências, pois todo ato tem sua consequência e acho que o adolescente está precisando ouvir isso, tanto da família como na escola”, comenta.

A especialista esclarece sobre os efeitos psicológicos de uma gravidez na adolescência. “Se os pais não tiverem maturidade para a maternidade e a paternidade, isso pode acarretar efeitos psicológicos negativos, como a insegurança, frustrações diante de outros sonhos que não são realizados, como liberdade para sair com amigos, viajar, estudar. Muitas vezes, o filho ocupa grande parte do tempo e a mãe deixa de fazer as coisas que deseja e isso pode acarretar efeitos negativos como a depressão. É muito comum a depressão pós-parto diante dessas frustrações. Alguns abandonam a escola e têm dificuldade para conseguir emprego. Muitas vezes a maternidade ou paternidade é vista como gravidez não planejada, não desejada. Eles ficam rotulados e isso é uma privação para os adolescentes”, explica.

A psicóloga destaca a importância do apoio familiar nesses casos. “O apoio da família é fundamental em toda gestação. Mas na gestação precoce, muito mais. O apoio dos familiares é muito importante para a adolescente conseguir continuar seus estudos, ter contato com amigos e conseguir dividir o seu tempo, não só com o filho. Ela será mais feliz e, consequentemente, será uma boa mãe. É um momento da vida de amadurecimento e o apoio da família, como suporte emocional, pode fazer toda a diferença para o desenvolvimento da criança e da mãe. Só é preciso ter cuidados para que os avós não assumam a criança. Em muitos casos os avós assumem para suprir as necessidades, principalmente quando se trata da filha. Por acreditar que a filha não é capaz, muitas vezes erram por excesso de cuidados. A mãe adolescente deve assumir o papel de mãe com o apoio dos avós, mas a avó não deve assumir esse papel. O pai adolescente, muitas vezes, se ausenta por medo, pressão e mesmo até por exclusão. A família da adolescente assume toda a responsabilidade e exclui o pai. Segundo pesquisas e estudos, o papel do pai favorece o aumento do bem-estar da mãe e revela que a participação do pai levaria ao melhor desenvolvimento social da criança”, esclarece.

A auxiliar administrativa, de 25 anos, Janaína Kelly Dias Fernandes, conta que engravidou de sua filha Sophia quando tinha apenas 17 anos.

“Não foi uma gravidez programada. Me senti assustada, não acreditava que era verdade que eu estava grávida. Foi um susto enorme para a minha família, eles sabiam que eu já tinha uma vida sexual ativa, mas não imaginavam que eu fosse engravidar tão nova. Engordei bastante na gestação, foram 16 quilos no total. Meu parto foi normal, mas bem difícil e eu sofri muito. Tive que abrir mão dos estudos, depois eu precisei fazer um supletivo para terminar o colegial e deixei de fazer muitas coisas, viagens, faculdade. Acho correto o incentivo para que as pessoas esperem a vida adulta para iniciar a vida sexual, afinal de contas nem sempre é bem-vinda uma criança sem planejar antes”, comenta.

Janaína destaca a importância do apoio familiar e do pai da criança. “Tive que amadurecer mais rápido devido a chegada da minha filha. Hoje vejo que minha vida poderia ter tomado outro rumo, e devido ao comportamento que eu tinha na época, poderia não ser nada bom. Fui mãe muito nova e acho que não estava preparada psicologicamente para ser mãe, mas no meu caso, deu tudo certo. O apoio que recebi da minha família e do pai da minha filha, que hoje é meu marido, fizeram toda a diferença”, conclui.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 13 DE JUNHO

JESUS RESSUSCITOU DENTRE OS MORTOS

Ele não está aqui; ressuscitou, como tinha dito. Vinde ver onde ele jazia (Mateus 28.6).

A ressurreição de Cristo é o seu brado de triunfo. É o amém de Deus à agonia da cruz. O túmulo vazio de Cristo é o berço da igreja. Jesus nasceu numa manjedoura, cresceu numa carpintaria e morreu numa cruz. Aquele que andou por toda a parte, fazendo o bem e libertando os oprimidos do diabo, foi preso, condenado, pregado numa cruz e sepultado, mas ressuscitou ao terceiro dia. Seu túmulo foi aberto de dentro para fora. Os grilhões da morte não puderam retê-lo. Ele arrancou o aguilhão da morte e matou a morte com a sua própria morte, pois ressuscitou dentre os mortos como primícias daqueles que dormem. Agora a morte não tem mais a última palavra. A morte foi vencida e tragada pela vitória de Cristo. Jesus é a ressurreição e a vida. Aquele que nele crê não está mais debaixo do jugo da morte, o rei dos terrores, mas passou da morte para a vida. Não precisamos mais ter medo do amanhã, pois a morte não é o ponto final da existência. Caminhamos não para uma sepultura coberta de pó, mas para a gloriosa ressurreição. Nosso destino não é uma noite eterna de escuridão, mas a cidade santa, o paraíso de Deus, onde o Cordeiro será a sua lâmpada. Receberemos um corpo imortal, incorruptível, poderoso, glorioso, celestial, semelhante ao corpo da glória de Cristo. Podemos, então, dizer como Paulo: Porquanto, para mim, o viver é Cristo e o morrer é lucro (Filipenses 1.21).

GESTÃO E CARREIRA

A ERA DA INOVAÇÃO ACELERADA PELA CRISE GLOBAL

Usado de forma recorrente e muitas vezes sem critério no ambiente corporativo, o termo inovação já começava a ficar obsoleto. Até que a pandemia do novo coronavírus impôs a necessidade de reinvenção para a maior parte das empresas, em todo o planeta. E a inovação voltou à ordem do dia. Agora, atualizada: a Inovação 4.0.

A inovação consiste em um conjunto de novas ideias que são implementadas com sucesso econômico e geração de valor para o cliente e para a empresa. Independentemente do tipo ou da classificação, é natural que a forma de fazer a inovação tenha acompanhado a história do desenvolvimento da indústria. Hoje, chamamos de Indústria 4.0 o processo de renovação das cadeias produtivas a partir de tecnologias que permitem um ganho transformacional e uma gestão mais inteligente.

Da mesma forma, o termo Inovação 4.0 reconhece um momento que se demanda novos processos de gestão da inovação nas grandes empresas. A crise causada pela pandemia fez com que muitas barreiras à inovação caíssem, forçando as empresas a correrem mais riscos e acelerando esse novo estágio da inovação. Elas estão intensificando sua capacidade criativa, sua flexibilidade e desenvolvendo novas habilidades que são as alavancadas para acelerar a capacidade de inovar.

O conceito de Inovação 4.0 precisa amadurecer com a contribuição de empresas e academia, mas algumas características são ponto de partida para esse conceito:

COLABORAÇÃO

As empresas se tornam efetivamente mais abertas à participação de diferentes áreas, pessoas, parceiros e clientes no processo de inovação. Co-desenvolver, colaborar e co-criar se tornam naturais.

DESCENTRALIZAÇÃO

A inovação no centro da estratégia das empresas e impulsionando o processo de Transformação Digital, que pode mover a empresa para novos mercados e negócios. Isso gera necessidade de envolver todas as áreas da empresa na geração de inovação.

USO INTELIGENTE DE DADOS

Quantas ideias a empresa gerou ou implementou no ano? Quais são os resultados gerados e previstos para esses projetos? O custo de responder essas perguntas hoje é enorme, mas uma gestão onipresente está nascendo através de ferramentas inteligentes de acompanhamento.

CULTURA

A gestão da inovação deixa de ser processual e passa a ser cultural. A cultura determina o que é considerada a forma certa de fazer as coisas. Se dar ideias e tentar novos caminhos para melhorar a performance não for um elemento compartilhado pelos colaboradores, é de se esperar resultados medianos e processos de inovação cheios de obstruções.

OUSADIA

Quando o mais arriscado é não fazer nada, muitas empresas têm se movimentado muito além de sua zona de conforto, preparando a organização para trabalhar inovações com maior nível de ousadia.

IMPACTO

O cenário de investimento de impacto tem se tornado cada vez mais relevante. Investidores de todo o mundo trazem mais consciência para seu capital. Isso chega nas empresas através da pressão de investidores para uma prática mais sustentável, e da expectativa de seus clientes quanto à atuação delas. Esse movimento faz com que a estratégia de inovação da empresa incorpore rotas de impacto em um ciclo muito positivo para o mundo.

Não é a tecnologia em si que faz a inovação evoluir, mas o uso e entrelace dela com os processos inerentemente humanos da gestão e da tomada de decisão. A Inovação 4.0 é o momento em que a inovação passa a ser guiada e conduzida por novos paradigmas.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

MARCAS INDELÉVEIS

As consequências que o abuso sexual na infância e na adolescência desencadeiam ao longo do desenvolvimento têm sido tema de diversos estudos

Os transtornos psiquiátricos na idade adulta, relacionados a eventos traumáticos com cunho sexual sofridos na infância e na adolescência, podem ter influência de diversos aspectos, entre eles: idade do início do abuso, sua duração (por exemplo: episódio isolado ou múltiplos – ao longo do tempo), ameaça ou gravidade da violência (em alguns casos, com risco de vida), grau de relacionamento da vítima com o agressor, diferença de idade entre a criança e o perpetrador. A futura adaptação social das vítimas varia de indivíduo para indivíduo, conforme o tipo de violência sofrida, ausência de figuras parentais protetoras e da capacidade de reação individual diante de circunstâncias que geram sofrimento.

O abuso sexual ocorrido na infância tem sido considerado como um fator de risco para ideações e/ ou tentativas de suicídio; e também apresenta uma relação estreita com outros transtornos psiquiátricos, como a depressão, o estresse pós-traumático e a dependência química (uso de drogas). Além dos mencionados anteriormente, há relação do abuso sexual na infância com disfunções sexuais, transtornos de ansiedade e perturbações do sono.

As sequelas emocionais comumente relatadas compreendem: sentimentos de baixa autoestima, dificuldades de dizer não, culpa, sensação de descontentamento e / ou raiva com o próprio corpo, impressão de estar “sujo”, em alguns casos, surgem pensamentos obsessivos, como lavar- se constantemente; além disso, é frequente a dificuldade no estabelecimento de relações de confiança com outros indivíduos adultos. Também estão descritas dificuldades no desenvolvimento emocional em adultos que vivenciaram abuso sexual na infância, e, por consequência, na sua maturidade comportamental. Vários indivíduos adultos referem problemas em dar e receber afeto, alegrarem-se em ocasiões habituais da vida, além de apresentarem desinteresse por atividades recreativas e que propiciem satisfação.

Outro aspecto que merece consideração é o risco para doenças sexualmente transmissíveis, associado ao fato da imaturidade física; ou seja, pelos órgãos genitais não estarem completamente desenvolvidos, as chances de contaminação aumentam. Alguns países têm dados da relação entre abuso sexual e contaminação pelo vírus da Aids, como exemplo quase 5% das crianças infectadas na Nigéria foram contaminadas em circunstâncias que envolviam abuso sexual. No Brasil, os dados epidemiológicos sobre essa relação são escassos, apesar dos esforços empreendidos pelas autoridades nessa averiguação. Por sua vez, para outra doença sexualmente transmissível, o condiloma acuminado, verifica-se que a principal via de transmissão em crianças é em decorrência de abuso sexual; além dessa, o papiloma vírus (HPV) tem como meio de transmissão relevante essa conjuntura.

Há situações nas quais o provedor da família (geralmente o pai ou padrasto) é o perpetrador, e muitas famílias podem ficar vulneráveis na dimensão econômica com a possibilidade de se retirar essa pessoa do convívio familiar (não é incomum o acobertamento da situação de abuso sexual por parte dos familiares próximos à criança). Muito embora não seja a melhor alternativa, há circunstâncias nas quais é recomendável que a criança seja encaminhada para um local fora do ambiente familiar, como parentes próximos, casas de apoio institucionais, ou uma família adotiva; situações essas que implicarão numa ruptura e rearranjo familiar, e sem dúvida são casos que merecem assessoramento profissional especializado.

Além do que foi considerado, está descrito que há relação entre um indivíduo – na grande maioria das vezes do gênero masculino – ter sido abusado sexualmente durante a infância e ele mesmo ser um possível abusador no futuro, entretanto mais estudos são necessários para identificar as variáveis que compõem essa associação. No entanto, cada criança reagirá de forma diferenciada ao abuso sexual. Estudos que contemplem indivíduos abusadores sexuais que não tenham vivenciado essa situação durante a infância poderão contribuir para o melhor esclarecimento dessa situação, que imprime marcas indeléveis no psiquismo.

GIANCARLO SPIZZIRRI – é psiquiatra doutorando pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em Sexualidade Humana da USP.

EU ACHO …

CHEGOU A HORA DE VOLTAR. MAS COMO E PARA ONDE?

Pronto, vamos imaginar aquele dia mágico no qual a comunidade médico-científica, com a classe política, decidiram que é possível voltar a trabalhar. Fogos! Festa! Comemorações! A vida corporativa vai voltar ao normal. Eba!

Só que não. O desenho da nossa jornada cotidiana de casa-transporte-trabalho-almoço-trabalho-transporte-casa foi desenhado pré-Covid.

E, acredite, tudo indica que voltaremos a trabalhar num futuro próximo (me recuso a escrever a expressão “novo futuro”), no qual nem todos estarão vacinados e, portanto, passíveis de contrair o vírus.

E agora? Vamos mudar essa jornada, ok. A casa, a gente agora conhece bem mais. O transporte, a gente controla até a página 3 (dependemos do Estado para ampliação de ciclovias etc.). Mas uma coisa a gente pode, deve e precisa mudar: o nosso conceito de escritório. Na vida “AC” (antes da Covid-19), as tendências eram os escritórios do Vale do Silício, com muitas áreas comuns, cada um senta onde quer (hotdesking), ambientes polivalentes e áreas abertas de convívio e de circulação.

É, não vai dar. A guinada é para o outro lado. Não vou entrar também no debate óbvio da tendência do home office – é um caminho sem volta. A provocação que faço aqui é sobre o escritório “antigo”.

O que fazer com ele? Como reorganizar aquela fila depois do almoço pra subir no elevador lindo, de pé-direito duplo, em que cabiam 18 pessoas e agora vão caber seis, cada um no seu quadrado, com um caminho de saída marcado no chão dando no meio da porta? E como reimplantar um andar cheio de baias coletivas em prédios de vidro (sem janelas para abrir)? E o almoço? E se um colega tossir? E se um voltou de NY agora? E se alguém aparecer no dia seguinte ao qual faltou reclamando de febre?

Voltar já mexe com o emocional das pessoas. A gente vê nos nossos conhecidos, uns mais radicais com cuidados e outros mais relaxados. Como juntar esse povo todo com um viés colaborativo de performance sob um mesmo teto? O ser humano sofre com o home office, mas ele se acostuma, ele se adapta e se vira. Grande parte não vai querer voltar. E muitos com razão. Como fazer um protocolo de retorno às atividades e uma campanha interna motivacional tão boa que faça com que o funcionário queira, de verdade, voltar à jornada “AC”? Nos países cuja abertura gradual começou, as taxas de retorno são baixíssimas (os ambientes fabris puxam a média pra cima, mas ambientes corporativos vêm tendo dificuldades reais).

Será que esse modelo acabou? A arquitetura, o design de interiores e, principalmente, as campanhas de endomarketing vão ter que andar juntos de maneira inédita. Essa é uma oportunidade única de construir um ambiente de trabalho novo, uma empresa com um espaço físico que ouça mais e dite menos, uma preocupação nova com essa jornada de cada um, um modelo mais atento às necessidades reais das pessoas – que talvez um dia evolua para uma nova forma do trabalhar.

Os times terão que aprender a jogar juntos sob novas regras de impedimento que serão escritas por um juiz (ciência), que as mudará com a partida rolando. O campo nunca mais será o mesmo: quando se troca o campo, muda-se o jogo pra sempre.

Nesta altura do campeonato, no jogo corporativo, quem der o pontapé inicial da mudança logo e fizer uma boa preleção do retorno pro segundo tempo estará marcando um golaço.

Só não vai dar pra correr pro abraço, pelo menos por enquanto.

OUTROS OLHARES

ARENAS VIRTUAIS

Sem competições presenciais, as disputas profissionais de videogame, conhecidas mundialmente como eSports, continuam quentes mesmo durante a crise sanitária

Pode até não parecer trabalho, mas há grandes chances de que um garoto que vive com um joystick nas mãos ou que passa horas debruçado diante do computador, em partidas virtuais de videogame pela internet, esteja ganhando (muito) dinheiro. A evidência: jogadores e times profissionais de games como League of Legends (LoL) ou Counter Strike: Global Offensive (CS: GO) se mantiveram na ativa mesmo durante a quarentena provocada pela pandemia. Ressalve-se, claro, que o mercado dos eSports, que antes da Covid-19 deveria movimentar 1 bilhão de dólares em 2020, também foi impactado pela crise sanitária. Os eventos presenciais, que mobilizam milhões de ávidos seguidores ao redor do globo, foram quase todos adiados ou cancelados. Foi preciso voltar às origens, quando as partidas eram todas realizadas de forma virtual, por meio da internet. A primeira fase (o split, no jargão da turma) do Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLoL) foi concluída no início do mês de forma remota — desde 2015, a Riot Games, empresa que criou o jogo, reunia as equipes participantes na sua sede brasileira em São Paulo. Mesmo assim, teve ganho de 10% na audiência de suas plataformas digitais e do canal por assinatura SporTV.

De suas casas, cada um dos competidores conectava-se a um servidor dedicado exclusivamente ao torneio e adentrava na arena virtual. “De casa, o clima do campeonato se assemelha ao de um treino. O jogador não tem aquele ritual de acordar, vestir o uniforme, ir até o palco”, afirma Thiago Maia, que atende pelo apelido “Djoko”, técnico do time de LoL do Flamengo — sim, o clube carioca mantém equipes de eSports. “Isso pode ser bom ou ruim. Tem atleta que cresce no palco com torcida, enquanto outros, geralmente os mais inexperientes, podem acabar sentindo um pouco a pressão.”

Quem parece não ter se adaptado muito bem às mudanças foi Felipe Gonçalves, conhecido no universo do LoL como “brTT”, pentacampeão brasileiro do jogo. De volta à equipe paiN Gaming, uma das pioneiras no Brasil, após uma passagem bem-sucedida pelo Flamengo eSports, o carioca de 29 anos nem chegou à fase de mata-mata do primeiro split do CBLoL. Mesmo assim, brTT é um dos jogadores mais badalados do país. Com mais de 600 000 seguidores no Instagram, recebe salário mensal de cerca de 15.000 reais, segundo estimativas do mercado, fora a receita que consegue de contratos de publicidade e os valores arrecadados com cursos on-line e com o canal de vídeos que mantém no YouTube.

Embora o universo do marketing esteja num momento de retração, com vários clubes de futebol de “carne e osso” com contratos suspensos, tal realidade não se repete no universo virtual. Thomas Hamence, diretor executivo da paiN Gaming, comemora o fato de não ter perdido nenhum de seus patrocinadores, entre eles Coca-Cola e BMW. “Temos uma torcida fiel, a maior da América Latina, mas nosso público-­alvo é sempre a geração que está por vir”, diz. A partir do ano que vem, o CBLoL estreará uma estrutura de franquias, como já ocorre nas grandes ligas americanas. Com isso, as equipes serão sócias do campeonato e não haverá rebaixamento, o que representa maior organização e segurança para os investidores. “Estudamos a estrutura de franquias e chegamos à conclusão de se tratar de um modelo viável no Brasil”, afirma Carlos Antunes, diretor da Riot Games no país.

Modalidades como futebol e automobilismo assistem de camarote ao próspero caminho dos eSports e tentam seguir seus passos para diminuir os preocupantes prejuízos comerciais. A Fórmula 1, que nem chegou a estrear em 2020 — sete GPs já foram adiados e três cancelados —, passou a promover corridas remotas, ancoradas em simuladores. Nelas, porém, não aceleram apenas os pilotos do grid real, mas também convidados, incluindo craques famosos do futebol, como Sergio Agüero, do Manchester City, e o brasileiro Arthur, do Barcelona. Sem partidas ao vivo para transmitir, a Rede Globo decidiu abraçar de vez o universo gamer e tem promovido minitorneios de Pro Evolution Soccer. O jogo licenciou os vinte clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, cujos participantes são os astros das equipes nacionais. O atacante flamenguista Gabriel Barbosa, o Gabigol, até conseguiu replicar no videogame sua comemoração característica, mas caiu precocemente na disputa — o primeiro vencedor do troféu Controle de Ouro foi o zagueiro Bruno Fuchs, do Internacional de Porto Alegre.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 12 DE JUNHO

O PLANO DE DEUS É PERFEITO

Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus… (Romanos 8.28a).

O apóstolo Paulo escreveu seu maior tratado teológico e o enviou como uma carta à igreja de Roma. Os estudiosos dizem que essa carta é como a cordilheira do Himalaia da revelação bíblica, seu pico culminante. No versículo em tela, Paulo diz que Deus tem um propósito estabelecido na eternidade. Esse propósito é eterno, perfeito e vitorioso. O soberano Deus não improvisou as coisas. Fez tudo de acordo com um plano que não pode ser frustrado. A sua vida está incluída nesse plano. Você, que ama a Deus, tem a sua vida nas mãos daquele que também tem as rédeas do universo sob controle. Não há acaso nem coincidência. Não há sorte nem azar. Não há determinismo nem desastre. A história não está à deriva como um caminhão desenfreado, nem está volteando em círculos como pensavam os gregos. A história caminha para uma consumação gloriosa. Paulo diz que todas as coisas cooperam para o nosso bem. Não algumas coisas nem as melhores coisas, mas todas as coisas. Essas coisas não se encaixam por si mesmas como num jogo de coincidência. Elas não são governadas por um destino aleatório. A verdade insofismável é que Deus está trabalhando as circunstâncias da nossa vida, como se tecesse uma tapeçaria, como se montasse um mosaico, para que o resultado seja o nosso bem. Obviamente Paulo não está dizendo que todas as coisas que acontecem conosco são boas; está dizendo é que Deus age nessas circunstâncias, convertendo-as para o nosso bem.

GESTÃO E CARREIRA

A DIGITALIZAÇÃO DO CORONAVOUCHER

Beneficiários poderão gastar o auxílio emergencial de R$ 600 por meio de cartão de débito virtual. Uma rede de 3 milhões de maquininhas está sendo preparada para evitar que as pessoas precisem se aglomerar nas agências da Caixa.

Foram duas semanas de trabalhos intensos em Porto Alegre. Uma equipe de 20 pesquisadores do parque tecnológico da PUC-RS foi dedicada a agilizar a adaptação da rede da adquirente Getnet para receber pagamentos do auxílio emergencial. Tudo para que, já na última sexta-feira de maio, as 1,3 milhão de maquininhas ativas da empresa ligada ao grupo Santander estivessem prontas. Um mês antes, todos os presidentes das adquirentes, entre eles Pedro Coutinho, CEO da Getnet, foram chamados para uma reunião na Caixa Econômica Federal para dizer como suas empresas poderiam ajudar a distribuir os recursos do auxílio de R$ 600 reais mensais para as pessoas mais vulneráveis economicamente, durante o impacto do isolamento social causado pela Covid-19. As filas nas agências da Caixa para sacar o benefício (apelidado de “coronavoucher”) haviam se tornado um risco para ampliar as contaminações do coronavírus.

A solução foi permitir que as maquininhas de crédito e débito, presentes em 3 milhões de estabelecimentos comerciais no Brasil, pudessem receber pagamentos do auxílio emergencial por QR Code, usando o aplicativo Caixa Tem. “Vai facilitar muito para quem recebeu esse recurso”, afirma Coutinho. “É uma oportunidade de comunicação com esses clientes ainda um tanto invisíveis. Para eles, isso traz a autoestima de se inserirem no mundo das finanças digitais.”

A funcionalidade de fazer pagamentos sem contato vinha sendo aventada como opção desde o lançamento do coronavoucher. Ela entra no ar agora que falta o pagamento de mais uma parcela, se o programa não for estendido. O objetivo de evitar que o beneficiário vá até as agências será alcançado se uma parte da população preferir acessar digitalmente os recursos disponíveis em vez de buscar o dinheiro em espécie nos caixas eletrônicos. O pagamento por QR Code também pode ser usado no e-commerce. “Para o comerciante, ela elimina o principal momento de risco, que é o de manusear o dinheiro”, diz Coutinho. “E, pela função débito, ele já recebe o recurso em conta um dia depois de feito o pagamento.”

Isso tudo tem o potencial de estimular também que mais pagamentos aconteçam pela funcionalidade, trazendo um novo hábito ao brasileiro. Além da Getnet, também a Cielo, controlada por Bradesco e Banco do Brasil, já entrou no programa desde o início. Entre a sexta-feira (29) e a terça-feira (2), 1,5 milhão de maquininhas aptas a ler QR Code completaram 300 mil transações. A Rede, ligada ao Itaú Unibanco, divulgou que colocaria a sua infraestrutura de aparelhos disponível “em ampla escala para a aceitação de pagamentos com aplicativo Caixa Tem” a partir da segunda-feira (8). No entanto, não revelou quantas maquininhas estariam aptas a fazer essas transações.

Para o mercado de cartões, o projeto pode significar um avanço no uso de tecnologias sem contato (o chamado contactless, segundo o jargão do mercado). A mais popular dela tem sido os pagamentos por aproximação, pela tecnologia de NFC (comunicação de campo próximo, na sigla em inglês), que está em franca expansão no País. Ela apresentou crescimento de transações de 456%, no primeiro trimestre deste ano, em comparação com o mesmo período de 2019. Com a popularização do QR Code, o Brasil pode ter duas tecnologias contactless avançando fortemente, em paralelo.

ACESSO FINANCEIRO

Nenhum impacto dessa funcionalidade, no entanto, deve ser maior do que para a democratização do acesso financeiro, um processo que já vem ocorrendo nos últimos tempos, com a ajuda das fintechs que permitem criar contas e prover crédito de forma rápida e simplificada. As estatísticas levantadas com o cadastro do coronavoucher — que é dedicado a trabalhadores informais, microempreendedores individuais, autônomos e desempregados — revelaram haver entre 30 milhões e 40 milhões de brasileiros sem conta em banco. Eles seriam responsáveis por até R$ 850 milhões transacionados anualmente fora do sistema financeiro principal, segundo estima Rafael Pereira, presidente da Associação Brasileira de Crédito Digital.

A partir de agora, mais informações sobre essa massa podem ser coletadas. “De forma diferente do que acontece em outros países emergentes, aqui essas pessoas não ficam de fora por falta de infraestrutura, mas devido a custos”, diz Pereira, que também é CEO da Rebel, fintech de crédito on-line. “Quase todo brasileiro adulto tem um smartphone e está incluído no mundo da tecnologia, mas prefere não ter conta corrente. Quem recebe um coronavoucher de R$ 600 não vai querer pagar tarifas de R$ 100 mensais ou DOC e TED de R$ 10 por transação.” Mais que sacar o benefício, esses consumidores recém-digitalizados poderão entrar de vez na mira do governo, das grandes redes adquirentes, das próprias instituições financeiras donas dessa infraestrutura e também das fintechs que atuam como subadquirentes e como carteiras digitais. É uma digitalização promissora.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

NEUROSE DE GUERRA

Traumas provocados pela violência urbana fazem mais vítimas que grandes guerras. As sequelas vão muito além das perdas materiais

Situações de grande estresse, como um acidente de carro ou um sequestro, podem deixar marcas profundas. À medida que a exposição à violência urbana aumenta, também maiores são os casos de trauma, especialmente entre adultos e adolescentes.

A Organização Mundial da Saúde só veio reconhecer o problema em 1994, a partir da revisão da Classificação Internacional de Doenças (CID). Depois dessa origem, o transtorno é hoje um dos diagnósticos mais populares da Psiquiatria e já começa a fazer parte do acervo popular com força semelhante à que aconteceu em relação ao termo depressão ou pânico.

Em apenas uma década do surgimento do conceito, 50 centros de estudo e tratamento foram criados nos Estados Unidos. Em 1970 apareceram apenas 20 trabalhos científicos sobre o trauma. Em 1990 foram 150 referências e, em 1999, chegaram a mil. A maioria desses trabalhos é de autores dos Estados Unidos, Austrália e Israel.

Crianças, em geral, são as maiores vítimas. Pesquisas feitas por autores que analisam os eventos capazes de gerar traumas em meninos concluíram que em 100% dos casos a experiência será traumática, independentemente de aspectos como o nível de desenvolvimento da vítima, sua história de vida ou a qualidade de suas relações familiares.

Pesquisadores encontraram o expressivo índice de 100% de incidência de trauma em meninos que foram sequestrados no ônibus do colégio em Chowchilla, na Califórnia, nos Estados Unidos. Outro estudo obteve o índice de 94,3% ao analisar a frequência do trauma em estudantes adolescentes que, quando estavam na escola, sofreram ataque de um franco-atirador.

Diversos especialistas têm sondado o impacto dessas situações na população. O ranking dos principais fatos geradores de traumas são: sequestro, ataque de franco-atirador, abuso sexual, agressão física, furacão, terremoto, guerra, incêndio, desastre nuclear, violência doméstica. No Brasil, a ocorrência é maior em relação a acidentes de carro e violência familiar. Nesse caso, a chance de a vítima desenvolver trauma é de 24%.

SENSAÇÕES REPETIDAS

O quadro clínico é caracterizado pela presença de temores infundados intensos, agitação e a sensação de reviver o evento traumático ocorrido. Podem surgir imagens mentais, pensamentos recorrentes ou sonhos repetitivos, relaciona dos com o episódio traumático. O paciente pode agir como se o evento traumático estivesse realmente acontecendo de novo.

O transtorno é considerado de ordem emocional com ligação a algum evento traumático como, por exemplo, história de abuso na infância, violência sexual, violência física, ter presenciado alguém doente ou gravemente ferido ou ter participado de algum desastre natural como terremoto ou enchente. E está em quinto lugar no ranking de doenças mentais.

Cerca de 60% dos pacientes reconhecem haver sofrido alterações psíquicas entre as primeiras horas e três dias depois do choque vivido com a situação traumática. Imediatamente após o trauma, os sintomas mais frequentes são a ansiedade, o estado de aturdimento e a desorientação parcial em relação às atividades cotidianas.

Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, a duração mínima dos sintomas é de um mês. Quando não está associado a algum outro problema psicológico, o trauma é transitório. Os sintomas, nesse caso, ocorrem no período de quatro semanas após o evento traumático e desaparecem dentro de algumas horas ou dias. Esse período de latência médio é de 4,5 meses.

PERMANECE NA MEMÓRIA

Pesquisadores testaram problemas no aprendizado e na memória de pessoas vítimas de estupro. Foram 15 vítimas que sofriam com o trauma, comparadas a 16 pessoas, também vítimas de estupro, mas sem esse transtorno. O grupo ainda foi comparado com outras 16 que não haviam sido expostas a experiências traumatizantes. O grupo que tinha trauma apresentou uma incidência de 53% de depressão severa, além de leve deficiência na capacidade de memorização. O problema só foi observado em 6% das vítimas de estupro que não ficaram traumatizadas. Nenhuma pessoa do grupo que não foi exposta a experiências estressantes tinha depressão.

A reexposição à situações que recordam o trauma são muito penosas às pessoas com transtorno por estresse pós-traumático. Em recente trabalho de José Luís Medina Amore, José Luís Pérez e Inigo Gancedo, constatou-se que essa situação foi relatada por 86% das vítimas, e houve reação psicofisiológica (vegetativa) na reexposição em 79% dos casos.

São de diversas ordens as ações violentas sobre o psiquismo humano. Entre as principais, citam-se as torturas físicas e psíquicas, a opressão política, a negligência socio-econômica, o abandono cívico, o sequestro, o terrorismo. “Algumas pessoas, quando expostas a situações inesperadas, não conseguem tirar as ‘cenas’ da cabeça e podem, por exemplo, até chegar a reviver as sensações de sofrimento do momento do atentado ou acidente”, explica a psiquiatra Dilza Feitosa, membro da diretoria da Sociedade Pernambucana de Psiquiatria.

LESÕES FÍSICAS

Sugerindo que as lesões físicas nem sempre acompanham o transtorno de estresse pós-traumático, um estudo mostrou que a maioria dos pacientes não sofreu lesões físicas através do acontecimento traumático (45%), ou elas foram muito leves (22%). Em torno de 15% precisaram de um breve período de hospitalização e apenas 18% necessitaram de um período mais prolongado.

Alterações psíquicas imediatas ao trauma vivenciado surgiram em 62% dos pacientes, os quais reconheceram ter sofrido desconforto emocional nas primeiras horas até um máximo de três dias depois do impacto do acontecimento traumático.

Os sintomas mais frequentes desse desconforto emocional imediato foram a ansiedade, em geral, de forma flutuante (ora com mais ansiedade, ora com menos), um certo estado de aturdimento com desorientação parcial em relação ao entorno e, finalmente, alterações vegetativas. As alterações dissociativas (da linhagem histérica) aparecem em 20% dos pacientes.

Para o típico transtorno de estresse pós-traumático o período de latência entre o aparecimento da sintomatologia correspondeu, em média, a 4,5 meses. Entretanto, no transtorno de estresse pós-traumático observa-se que as alterações emocionais podem ter início desde o momento do trauma até 42 meses depois da ocorrência do fato traumático.

Aceita-se ainda a existência de um grupo variável de pessoas nas quais os sintomas de estresse pós-traumático se tornam permanentes. A real incidência desse grupo de cronificados é, usualmente, baixa ou muito baixa na maioria de estudos e elevada (até 25%) em alguns outros poucos estudos.

Em seu estudo, o psiquiatra Ivan Figueiredo salienta que, nas situações em que há possibilidade de guerra, o estresse pós-traumático passa a rondar as sociedades. “Foi assim na Guerra Civil Americana (síndrome do coração irritável), na Primeira Guerra Mundial (choque da granada), na Segunda Guerra Mundial (síndrome de esforço, neurose de guerra), na Guerra do Vietnã e, mais recentemente, nos atentados do dia 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center e ao Pentágono.” Curiosamente, os pesquisadores têm dado pouca atenção aos desastres ocorridos no Brasil, sobretudo mortes por acidentes automobilísticos e por armas de fogo.

“Para que o diagnóstico do estresse pós-traumático seja feito, clínicos e pacientes têm que superar diversas barreiras de comunicação. Ambos podem ficar constrangidos em abordar temas que estejam associados ao segredo e à vergonha.” O psiquiatra lembra a importância de questionar o problema de forma direta. Do contrário, o paciente dificilmente tomará a iniciativa de revelar relevantes, tais como ter sido abusado sexualmente na infância.

EU ACHO …

QUARENTENA FAKE

Isolamento com jeitinho brasileiro é o pior dos mundos

Quarentena fake

Vivo escrevendo que a quarentena pode ser uma experiência positiva e transformadora. Tento exalar positividade a cada sílaba. Um coro de autores segue a mesma trilha. “Oh, como é bom ter uma oportunidade para reavaliar a vida” – esse é o refrão repetido incansavelmente. No Instagram, no Facebook, no Twitter, nos textos, todo mundo garante que a quarentena é uma oportunidade. Vamos cair na real. Não tem coisa mais chata.

Eu nem sou do tipo que vive saindo de casa. Escrever novelas é puro home office. Autor fica trancado a maior parte do processo. Acostumei a trabalhar isolado. Mas sinto falta do contato social mínimo. Tipo ir a um rodízio, devorar costela e picanha. Só pedir ao garçom: “Mais um pedaço deste… aquela ponta bem torradinha…”. Dá para ir de máscara a um rodízio? Impossível. Aliás, nem tem rodízio aberto.

Muita gente está pirando. Enviam mensagens dizendo que não aguentam mais. Aconselho: “Não trate a pandemia como um problema pessoal, emocional. É uma crise mundial, com impacto comparável ao da I Guerra, por exemplo”. É verdade. Transformar o coronavírus em problema emocional é o caminho para o despenhadeiro. Contudo, para a maioria das pessoas, é difícil de aguentar.

Outro dia soube de um senhor que mantinha um isolamento social rígido. Pegou o coronavírus e faleceu. Como? Fez o que muita gente está fazendo. Deu uma saidinha. Um amigo carioca garantia estar trancadinho. Postou uma mesa repleta de sushis. “Foi só para comemorar o aniversário” – explicou. Outro conhecido foi para a praia. Alugou uma casa, para viver ao ar livre e caminhar na beira do mar. Em seguida, passou a convidar os amigos nos fins de semana. Faz até raves. Mas, se alguém pergunta, diz que cumpre rigorosamente o isolamento social.

As pessoas acreditam nas próprias mentiras, eis tudo. Eu sempre desconfiei de pesquisas de comportamento justamente por isso. Quando questionado, o entrevistado apresenta a melhor face de si mesmo. Sendo assim, quem vai falar que transgrediu a própria quarentena? Ainda mais sobre a vida sexual, que está difícil. Quem é casado ficou na vantagem. Os outros estão frenéticos. Tipo tigres correndo de um lado para outro numa jaula. Eu nunca recebi tantos nudes! O povo mais atrevido distribui cantadas. Recorre aos aplicativos. Se faz de anjinho. Mas só falta ter um aplicativo chamado vapt vupt – tal a rapidez com que acontecem os encontros. Um amigo está organizando orgias. Quando soube, adverti-o dos riscos – não só de corona, aliás. A resposta: “Mas não é tanta gente assim”. Fico pensando: de quantas pessoas está falando? Em seguida, ele volta como refrão: “Estou tomando absoluto cuidado”. Opa! Como seria se não estivesse?

Saí para passear de carro, sem descer. Peguei trânsito. As ruas estão ficando cheias. É o pior dos mundos: quarentena com jeitinho brasileiro. As pessoas fazem home office e adiam compromissos, com o argumento de que estão isoladas. Mas, de fato, caem na farra. Já disse que quarentena é chata, não vamos mentir sobre isso. Mas cuidado. Mentira não evita o corona.

 

** WALCYR CARRASCO

OUTROS OLHARES

AMASSA QUE PASSA

 A quarentena impulsiona busca por receitas de pão e bolo na internet, reconhecida por cozinheiros e acadêmicos como simples, familiares e afetivas. O de chocolate é o mais procurado no mundo

Amassa que passa

Uma receita dar certo ou errado tem menos relevância do que as experiências e os vínculos que o ato de cozinhar pode proporcionar. O ensinamento da psicóloga Kika Melhem, que orienta oficinas nas quais cozinha e psicanálise se encontram, vem no momento em que a quarentena levou milhões de pessoas para a frente do fogão, nem todas elas com amplo domínio das panelas. “O isolamento trouxe o desafio de nos aproximar desse universo, com prazer”, disse ela.

As buscas semanais por receitas culinárias chegaram a dobrar em março, em relação aos primeiros meses do ano, segundo o Google Trends. Os gráficos também sugerem que o aumento da procura por receitas na internet não só se dilatou, como se sustentou acima dos 50%. A alta foi ainda mais expressiva quando se trata das receitas de pão. Só no Brasil, atingiu um pico de 233%; na Itália, alcançou 900%. A busca por preparos de bolo também disparou — o de chocolate é o mais popular no mundo. No Brasil, o incremento chegou a 194%, maior que a média mundial.

Para Melhem, o resultado reflete um ingrediente subjetivo: pães e bolos são alimentos relacionados ao coletivo, ao familiar e capazes de despertar a sensação de cuidado. “São formas de demonstrar afeto e têm a simbologia do presentear, do repartir.”

Neide Rigo, nutricionista e autora do blog Come-se, faz pão há anos e sempre teve como hábito doar parte do que produz — “é o mesmo trabalho, e a alegria é dupla”. Com o isolamento social, ela teve de interromper as oficinas que ministra em sua casa e se viu diante de 100 quilos de farinha recém-comprados.

Para não haver desperdício, mobilizou suas vizinhas para um mutirão de preparo de pães, cada uma em sua casa, cuja produção abasteceu moradores da Brasilândia, uma das áreas mais afetadas pela Covid-19 em São Paulo, epicentro da pandemia.

Ao notar o interesse crescente por pães nas redes sociais, Rigo desenvolveu também uma mentoria, em que orientou alunos no processo completo de preparo em tempo real, com longos encontros por vídeo e telefone. Também fez lives em seu Instagram para ensinar a fazer levain, o fermento natural que apelidou de levaineide, para que outros pudessem se beneficiar: “Não adianta só dar a receita do pão”, afirmou.

Antes da pandemia, aliás, já distribuiu iscas de seu levaineide em vários estados do Brasil, como Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul. “Uma vez, pendurei vários pacotinhos, que levo na mala, em uma árvore no Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, e só quem me acompanha no Instagram sabe onde encontrar.”

Mesmo com a experiência de anos, até hoje Rigo vez ou outra acorda de madrugada e caminha descalça até a edícula de sua casa para espiar a quantas anda sua produção. Gosta de observar o fermento a expandir e derramar, de sentir o cheiro do pão enquanto assa, de incrementar sua receita-base com outros grãos e castanhas, para que fique mais nutritiva.

“Fazer pão é um exercício terapêutico e de paciência. As pessoas têm de mexer com as mãos, e tem o encanto da transformação também. Quando você cozinha lentilha, o resultado é lentilha. Mas a farinha vira outra coisa sem adição de muitas coisas.”

Para o antropólogo Ulisses Stelmastchuk, esse encanto vem de longe, e o pão evidencia o potencial criativo-transformador do homem. “Todas as civilizações apresentam indícios de um alimento, de consumo cotidiano, feito à base de cereais moídos e água. Ainda que sem a presença de qualquer tipo de fermentação, essas massas são os ‘mitos primordiais’, para usar uma expressão de Lévi-Strauss, que deram origem a todos os tipos de pães, bolos e bolachas de diferentes povos e culturas.”

Autora de A química dos bolos (Companhia de Mesa), a confeiteira Joyce Galvão também enxerga no bolo uma volta às origens e uma possibilidade de reconexão com os cadernos de receitas da família. “Não há comprovação histórica, mas a confeitaria, especialmente no Brasil, nasceu dentro de casa, com as sinhás, que ensinaram às escravas, que, alforriadas, passaram a vender doces na rua. Depois eram nossas avós, nossas mães que faziam bolo. Ficou na memória como algo confortável”, disse.

O crescimento da busca por esse tipo de preparo na internet pode estar associado a essa dimensão afetiva, diz Stelmastchuk. “É um alimento compartilhado e, agora, nosso maior desejo é voltar ao espaço público, rever amigos e familiares.”

Heloisa Bacellar, chef e dona do Lá da Venda, que conjuga mercearia e restaurante na Vila Madalena, em São Paulo, fundou uma escola de cozinha no final dos anos 1990. De lá para cá, ela persiste em mostrar que “o simples pode ser maravilhoso”. “Enquanto as pessoas só falavam de três estrelas Michelin, eu falava quanto era bom um bolo benfeitinho e quanto a cozinha podia ser um lugar de prazer.”

Hoje, conta histórias e compartilha receitas no site Na Cozinha da Helô, que escreve com “a seriedade do farmacêutico que faz uma bula de remédio”, contou ela.

Autora de vários livros, Bacellar explora em seu Chocolate todo dia (DBA Editora) mais de 100 preparos com o ingrediente, para quando se está “feliz, superfeliz, triste ou no maior desespero”. Um deles é o bolo de chocolate rapidinho, “uma receita clássica, antiga, que aparece em qualquer caderno de família” (leia a receita no final desta reportagem). “Você pode misturar na mão ou no liquidificador. Pode fazer com leite, mas, se preferir, com água também funciona. Manteiga ou óleo? Com um fica mais cremoso, com o outro mais leve. Só não tem motivo para não fazer.”

O bolo de chocolate também é uma das estrelas do site recém-lançado Sobremesah, de Joyce Galvão. É tão simples, mas não menos delicioso, que sua filha, de 4 anos, faz praticamente sozinha. “Junta tudo na tigela, mistura, a gente coloca para assar e fica muito bom.”

Fazer pão também é muito simples, mas demanda tempo e há que estar muito atento às variações que o processo apresenta a cada dia, ensinou a padeira Hanny Guimarães. “É fascinante. Com farinha, água e sal você faz um pão, e ele nunca vai ser a mesma coisa. É um alimento vivo, excitante. Acho muito mais interessante comer algo que é diferente e que leva meu paladar e minha cabeça para muitos lugares do que ir ao supermercado e comprar a mesma coisa todos os dias.”

Hanny Guimarães ajudou a fundar a área de panificação do Futuro Refeitório, em São Paulo, e hoje atua na padaria do Blue Hill at Stone Barns, a uma hora de trem de Manhattan, do chef americano Dan Barber.

Ativista do movimento “do campo à mesa”, que defende o uso de ingredientes sazonais, de forma integral, cultivados nas cercanias do local de preparo e de consumo, fechou o restaurante e costurou uma nova engrenagem para dar fluxo à produção da fazenda na qual está instalado, que não para mesmo com a pandemia.

Os pães, 100% integrais, partem de grãos moídos na propriedade. Um deles, resultado de desenvolvimento genético feito em parceria com a Universidade de Washington, comprova a possibilidade de haver produtividade e sabor, a um só tempo. “Ele tem uma doçura, uma coisa meio maltada. É muito legal poder provar o sabor do grão sem que haja tanta interferência do processo (que agrega acidez aos pães de fermentação natural) no produto final.”

A equipe do Blue Hill chega a produzir 500 quilos de massa por dia neste período de isolamento, cinco vezes mais que o habitual. Os pães passaram a ser vendidos em caixas temáticas — e as farinhas da fazenda também estão disponíveis para quem quiser fazer seu próprio pão em casa.

Desde o início da reclusão, Guimarães tem notado interesse crescente e ajudado muitos amigos, remotamente, nessa missão. “Neste momento”, disse a padeira, “conhecimento é poder. A gente precisa de ferramentas para ser independente, fazer nosso próprio pão, plantar nossa própria comida.”

Para o antropólogo Stelmastchuk, que estuda a história da alimentação, o pão reúne justamente “um conjunto de experimentações e testes, de erros e acertos, de conhecimento.” Com o fim da quarentena, talvez não se faça mais pão com tanta frequência, disse a padeira, mas esse é um caminho sem volta. “Agora, as pessoas têm conhecimento, e essa é uma arma poderosa.”

Amassa que passa. 2

BOLO DE CHOCOLATE RAPIDINHO, DE HELOISA BACELLAR

Rendimento: 1 bolo grande, 10 porções

Tempo: 30 minutos (preparo), 1h30 (no total, incluindo tempo de forno e tempo para esfriar)

Grau de dificuldade: simples

 

INGREDIENTES

1 xícara (chá) de chocolate em pó (120 g)

2 xícaras (chá) de açúcar (300 g)

3 xícaras (chá) de farinha de trigo (360 g)

1 colher (sopa) de fermento em pó

½ colher (chá) de bicarbonato de sódio

200 g de manteiga em temperatura ambiente ou 1 xícara (chá) de óleo vegetal (240 ml)

4 ovos

2 xícaras (chá) de leite ou de água morna (480 ml)

Manteiga para untar

Farinha de trigo para polvilhar

 

PREPARO

Aqueça o forno a 180ºC (médio-alto).

Unte com manteiga e polvilhe com farinha uma fôrma grande para pudim ou uma assadeira também grande.

Misture o chocolate, o açúcar, a farinha, o fermento e o bicarbonato numa tigela grande. Junte a manteiga, os ovos, o leite e mexa até conseguir uma massa homogênea.

Coloque a massa na fôrma e asse por uns 40 minutos, até crescer, firmar e soltar das laterais (ao enfiar um palito no centro, ele deverá sair limpo).

Deixe esfriar, desenforme e, se for o caso, regue com a cobertura.

Deixe firmar antes de servir.

Amassa que passa. 3

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 11 DE JUNHO

gotas-de-consolo-para-a-alma

NEM SEMPRE DEUS NOS POUPA DOS PROBLEMAS

Quando passares pelas águas, eu serei contigo… (Isaias 43.2a).

 

A vida é como uma viagem. Nem sempre é calma e tranquila. Nessa jornada singramos águas revoltas, escalamos montanhas escarpadas, descemos a vales profundos, cruzamos desertos inóspitos. Deus nunca nos prometeu ausência de problemas. A vida não é indolor. Não poucas vezes, nosso corpo é surrado pela dor. As lágrimas quentes, com frequência, desabotoam dos nossos olhos como torrentes caudalosas. A doença sorrateira ou agressiva mina nosso vigor. Nessas horas, nossos joelhos ficam bambos; nossos braços, descaídos; e nossos olhos, embaçados. Muitos, movidos por uma teologia errada, se revoltam contra Deus. Não conseguem conjugar o sofrimento com o amor divino. Cobram de Deus uma intervenção e amarguram-se contra ele quando a resposta não vem. Precisamos entender que Deus nunca nos prometeu ausência de aflição. Neste mundo teremos aflição, pois nos importa entrar no reino de Deus através de muitas tribulações. Aqui há choro e dor, lágrimas e sofrimento. Aqui não é o céu. Mas aqui temos a presença consoladora de Deus. Aqui temos a promessa de que Deus nunca nos provará além de nossas forças. Aqui temos a convicção de que nossa tristeza se converterá em alegria, e nosso sofrimento, em recompensa gloriosa. Na perspectiva da eternidade, nossas tribulações aqui são leves e momentâneas. Não estamos a caminho de uma noite escura, mas de um amanhecer glorioso.

GESTÃO E CARREIRA

ATITUDES PARA MANTER A EFICÁCIA

Alto grau de eficiência e equilíbrio é o resultado que buscamos constantemente para a vida pessoal e profissional e que também esperamos encontrar nas empresas em que trabalhamos

Atitudes para manter a eficácia

Organizar, gerir, liderar, entre outras inúmeras atribuições do mundo corporativo, geram tensão e estresse, o que acaba nos desestabilizando em certos momentos. Mas diante desse cenário, será possível manter a produtividade e os resultados sem que se percam a serenidade e o controle da situação/ Como podemos agir de forma mais eficaz e enfrentar melhor os desafios do cotidiano profissional?

Antes de tudo, é necessário entender que para sobreviver aos incontáveis compromissos, à correria do dia a dia e às exigências de produtividade e prazos, é preciso de disciplina mental, comportamental e algumas atitudes que colaboram para a eficácia profissional.

Não acumular trabalho, por exemplo, é um ponto muito importante. Adiar as tarefas a serem feitas não é algo inato no ser humano, mas sim um hábito que pode ser mudado e treinado.

Mantenha a atenção no movimento ativo e construtivo que precisa ser feito. Às vezes, as pessoas adiam trabalhos que poderiam ser resolvidos em poucos minutos. Quando não temos tempo suficiente para finalizar um trabalho, precisamos nos questionar e compreender que o problema não é o tempo, mas sim algo que estamos fazendo de forma improdutiva ou que estamos deixando de fazer. Distrações variadas ou até mesmo pessoas que estão ao redor podem gerar interrupções que roubam um tempo precioso, por isso é preciso cuidado nesse aspecto.

Se permitirmos que conversas, comentários, telefonemas, celular e mensagens nos distraiam demais e tirem a atenção e o foco durante o trabalho, é necessário treinar a nossa capacidade de concentração direcionada. O sucesso e o êxito exigem uma mente ordenada, que sabe, naturalmente, concentrar a atenção na tarefa que está fazendo, que não é afetada por intervenção externa, mas mantém seus pensamentos constantemente organizados e focados por um período suficientemente longo de tempo. Isso permite fortalecer a autoconfiança, calma, clareza mental e força interior.

Pesquisa realizada pela Robert Half nos Estados Unidos, com 300 diretores de RH, revelou que uma mesa desorganizada coloca em cheque as competências e a eficácia de um colaborador. Essa é a percepção de 32% dos entrevistados pela consultoria – e eles não estão errados. Um local de trabalho coberto de papéis e materiais bloqueia a produtividade e aumenta a confusão, não só externa e concreta, mas também mental, de pensamentos, decisões e ideias. A desordem desenvolve um círculo vicioso: adiar a organização do ambiente de trabalho cria a desorganização que, por sua vez, alimenta a procrastinação e mantém a desordem.

Alguma vez já aconteceu de perder muito tempo procurando algo fora do lugar? Demora-se mais tempo procurando documentos na bagunça do que em decidir agir e organizar o que é preciso. Quem consegue organizar seu sistema e ambiente de trabalho aumenta muito a sua performance e os seus resultados.

Uma organização externa e material ajuda a criar uma organização mental e vice-versa. Porém, grande parte da energia e do tempo desperdiçados é decorrente de uma mente desorganizada, ou seja, pela falta de objetivos claros, de planejamento e de definição de prioridades.

Para evitar essa perda, mantenha o foco no planejamento e não no improviso. Às vezes, recusamos a nos programar por acreditar na ideia de que o improviso está associado à liberdade, quando, na verdade, é o contrário. Livre é quem sabe planejar, pois consegue equilibrar melhor o tempo, as exigências, tarefas e a ânsia dos prazos que se aproximam. Priorize suas atividades e tarefas, permitindo que seus próprios projetos sejam concluídos com mais eficácia. Quando nos distraímos, temos a tendência de agir de forma improdutiva. Além disso, é muito importante saber dizer não quando necessário, pois ao assumir compromissos que não são de sua competência, seu tempo e energia podem ser desperdiçados.

Uma mente organizada permite ter ação e não procrastinar, portanto treine sempre o hábito de agir. Uma vez identificados os objetivos e as soluções, é importante segui-los, e a autodisciplina é essencial para bloquear os eventuais hábitos limitantes. Não bastam os dons naturais, os talentos e potenciais, se estes não forem aperfeiçoados, direcionados e colocados a serviço de um objetivo.

Sabemos que algumas variáveis são imprevisíveis e fogem do nosso controle, mesmo fazendo todos os planejamentos possíveis. Mas, exatamente por essa razão, treinar a capacidade de planejar nos permite antecipar as consequências, prever quais resultados as ações poderão ter, e gerenciar melhor as urgências que podem aparecer. Assim, ficamos mais disciplinados e aumentamos a nossa própria realização e satisfação.

O paradoxo é que quando estamos agindo dentro desses padrões de comportamento – acumular trabalho, permitir interrupções e manter a desorganização – perdemos muito tempo e nos tornamos extremamente ocupados e atarefados, e acabamos dedicando pouco tempo e atenção para verificar e avaliar para onde estamos indo, qual a direção do nosso trabalho e da nossa vida.

Não precisamos mais enfrentar continuamente emergências, nem ficarmos esgotados trabalhando de forma confusa e improdutiva, mas podemos encontrar energia, calma interior e vontade de realizar cuidando do que realmente é importante e, assim, conquistar resultados significativos para todas as esferas da vida.

 

EDUARDO SHINYASHIKI – é palestrante, consultor organizacional, especialista em Desenvolvimento das Competências de Liderança e Preparação de Equipes. É presidente do Instituto Eduardo Shinyashiki e também escritor e autor de importantes livros como Transforme seus Sonhos em Vida (Editora Gente), sua publicação mais recente.

www.edushin.com.br

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

CRIMES CIBERNÉTICOS

Os aspectos legais e psicológicos dos ataques virtuais são temas constantemente debatidos na área do direito, da psicologia e nas ciências da computação

Crimes cibernéticos

Apesar dos debates envolvendo esse fenômeno, uma importante informação deve ser salientada no começo do artigo: ainda não existem soluções sólidas para essa problemática. Apenas como referência, estão sendo cada vez mais comuns os ataques cibernéticos com amplitude mundial.  Todos, então, são vulneráveis a esses ataques. De acordo com Kim, os crimes virtuais mostram de forma intensa que a virtualidade do ciberespaço possui uma inegável natureza coercitiva de realidade. Segundo o autor, o fato é que já somos seres virtuais, ao menos dentro dos grandes bancos de dados de corporações e governos, e cada vez mais temos o conhecimento – “a certeza de que os fenômenos são reais e possuem características específicas” –  de que o ciberespaço,  apesar de virtual, é bastante “real”. Essa afirmação do pesquisador, feita há mais de uma década, é bastante atualizada. Indubitavelmente é cada vez mais complexo delimitar onde está a fronteira entre os dois campos daquilo que pode ser considerado real ou virtual. E, sim, assim como transtornos psiquiátricos e outras temáticas estão relacionados ao campo da virtualidade, o mesmo ocorre com atos ilícitos. Estamos, então, vulneráveis a riscos de todos os tipos, desde a instalação de vírus, ataques a sites pessoais, roubo de senhas, estelionatos, entre outros.

Barbosa, Ferrari, Boery e Filho debatem que, fruto do vertiginoso desenvolvimento tecnológico do século XX, a internet gerou novas formas de relacionamento e de socialização. Essa profunda alteração nas relações humanas gerou maior rapidez de comunicação, oportunizando significativos avanços na forma como são estabelecidas as dinâmicas profissionais, comerciais, científicas, educativas e pessoais. Todas essas modificações provocam diversos benefícios econômicos e sociais, no aumento da geração e divulgação do conhecimento científico e também numa maior interação humana, ultrapassando as barreiras da distância e do tempo. Todavia, ressaltam os pesquisadores, quando mal utilizada, a internet pode resultar em invasão da privacidade, crimes virtuais, apologia a comportamentos inadequados e a atitudes preconceituosas, os quais podem gerar problemas de grande amplitude biopsicossocial, difíceis de resolver e punir; uma vez que, na internet, as informações podem ser rápidas e facilmente disseminadas e nem todos países possuem aparato legal para lidar com tais problemas, originando conflitos de ordem ética e bioética provenientes da forma como as pessoas interagem nesse novo palco de relações humanas.

Canetti, Gross, Waismel-Manor, Levanon e Cohen, estudiosos que realizaram uma pesquisa em Israel sobre os efeitos psicológicos dos ataques cibernéticos, revelam sintomas gerados por esse tipo de fenômeno aos seus alvos, dentre eles: raiva, medo, ansiedade, desconfiança e pânico moral. Em casos mais graves, os sintomas podem gerar transtorno do estresse pós-traumático, transtorno depressivo maior e ansiedade antecipatória. Todas essas consequências, de acordo com os pesquisadores, gera confusão no senso de segurança e aumento significativo nos sentimentos de vulnerabilidade. Em pesquisa desenvolvida por esses autores, participantes foram divididos em dois grupos: aqueles expostos a ciberterrorismo e o grupo que não passou por essa exposição. Os resultados eram esperados: o grupo que passou pela experiência de ataque demonstrou uma elevação significativa no nível de cortisol. Ainda de acordo com a pesquisa, a resposta ao estresse foi ativada quando o participante sofria uma experiência de exposição, acionando o senso de insegurança e vulnerabilidade, o que pode exacerbar a percepção de ataques iminentes reais. Por fim, Canetti, Gross, Waismel-Manor, Levanon e Cohen mencionam que os ataques cibernéticos não são benignos. Mesmo que não sejam causados danos físicos, a oportunidade de causar ansiedade e estresse é imensa, provocando paralelamente medo e distúrbios no dia a dia.

Certamente a internet é um campo de produção plural, desde os conhecidos benefícios como também a proliferação de temáticas como a baleia azul e ataques virtuais. Fato é que atualmente não existem limites para a expressão sintomatológica dos seres humanos e, certamente, os ataques serão cada vez mais frequentes.

 

IGOR LINS LEMOS – é doutor em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental Avançada pela Universidade de Pernambuco (UPE). É psicoterapeuta cognitivo-comportamental, palestrante e pesquisador das dependências tecnológicas. E-mail: igorlemos87@hotmail.com

EU ACHO …

FORMAS DE MORRER

Pode parecer estranho, mas viver alheio de si mesmo também é uma forma de morrer

E então ele, desesperado com o rumo que as coisas haviam tomado, avançou sobre a mulher, desferindo-lhe repetidos golpes de faca que, seguidamente, reafirmavam a dimensão de seu fracasso: como homem, como marido, como pai daquela linda família congelada nas lembranças das mídias sociais. Seria preciso apagar os indícios de sua existência, já que não seria capaz de conviver com seu peso acusatório. No derradeiro controle da realidade que o cercara, joga os dois filhos do 18º andar, atirando-se, em seguida, rumo ao final de seu sofrimento.

No apartamento, a carta deixada sobre um móvel qualquer enumera “justificativas” para o ato. Todas elas girando em torno de um fracasso profissional, uma cartada arriscada para ganhar mais (e, é claro, assumida apenas pelo “bem da família”) e um contrato mal acordado que lhe trazia revés financeiro.

A despeito do tom de folhetim, a cena acima descreve um fato real ocorrido no Rio de Janeiro há poucos anos.

A imprensa, como não poderia deixar de ser, recorre a especialistas para explicar o fato. Alguns são comedidos ao fazê-lo. Em síntese, afirmam que não é possível que se faça nenhuma análise confiável sem que se conheçam os envolvidos. Já outros, deslumbrados com seus minutos de fama, desferem um sem-número de asneiras que giram em torno de valores materialistas, pressões da sociedade de consumo e coisas do gênero. De fato, só existe uma razão que justifica a tragédia: a doença de seu protagonista que não enxergou nenhuma alternativa, nenhum outro recurso, senão o escolhido, para lidar com seus problemas. O que jamais saberemos – e que para tanto precisaríamos conhecê-lo profundamente – são as razões que o levaram ao desenvolvimento de sua doença. Contudo, uma coisa parece certa: dentro da sua confusão mental, o suicida parece realmente acreditar que seu ato se justificaria pelas razões que descreve em sua carta derradeira.

Isso posto, não estamos aqui discutindo as causas do homicídio/suicídio, mas talvez possamos analisar a justificativa deixada pelo suicida, essa sim talvez um retrato de uma sociedade doente e com indivíduos alheios a si mesmos.

Desde que nascemos somos educados para atingir o sucesso. Nossos pais, zelosos, empenham-se para isso logo nos nossos primeiros anos de vida, ao nos escolherem a melhor escola possível, o curso de inglês, o reforço de matemática, os sermões sobre a importância dos estudos. Mas, afinal de contas, o que significa o sucesso? Seria o resultado de um trabalho constante/ De dedicação a um objetivo? Muitos diriam que sim e é justamente aí que se encontra o problema.

Somos levados a crer no sucesso como sendo o resultado de algo. Uma espécie de pote de ouro no fim do arco-íris. Mas o verdadeiro sucesso é processo. Parafraseando Guimarães, eu diria que “ele se dispõe pra gente é no meio da travessia”.

A crença no sucesso (e até mesmo na felicidade) como resultado de algo facilmente leva o crente a associá-lo à simples conquista de metas e objetivos, o que traz em si algumas implicações. A primeira delas é simples: não há garantias de que possamos atingi-los. Muitas coisas podem acontecer no meio do caminho e uma delas – talvez a mais dramática de todas – seria uma vida inteira vivida com sentimento de fracasso e infelicidade por algo que não se conquistou: “Pobrezinho, morreu de enfarte a um mês da tão sonhada aposentadoria!”.

A outra implicação da crença no sucesso como resultado do cumprimento de metas é a necessidade de nos perguntarmos se nossas metas são dignas de nós. Se retratam quem somos, nossos valores mais íntimos, nossa verdade mais profunda. Aí sim entra o perigo de construirmos uma vida não simplesmente buscando o sucesso como a conquista de algo, mas de um algo estéril, destituído de nós mesmos. Nesses casos, talvez o suicídio represente o fim de alguma coisa que há muito havia morrido.

LILIAN GRAZIANO – é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consulta empresarial e cursos na área.

graziano@psicologiapositiva.com.br

OUTROS OLHARES

MATCH TÓXICO

Com bares fechados e baladas Impedidas de ocorrer devido à pandemia, traficantes intensificam a venda de drogas por aplicativos de relacionamento.

A pandemia causou quedas bruscas nos negócios e provocou novas normas de comportamento dos consumidores. Praticamente nenhum setor escapou ileso à crise, incluindo o movimento de venda de drogas. O indicador mais forte do fenômeno é o que ocorreu no maior mercado do país para os bandidos. Dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo mostram queda de 32% nas apreensões no mês de abril, comparado ao mesmo período do ano passado (2.957 registros ante 4.321). Segundo as autoridades, essa questão tem relação direta com o isolamento social, necessário durante os tempos de Covid-19. Sem a oportunidade de oferecer suas mercadorias em bares, baladas e festas, os traficantes enfrentam dificuldades. Para tentarem reduzir os prejuízos, os criminosos seguiram o exemplo de outros setores de comércio e resolveram escoar seus produtos via e­commerce. Muitos deles intensificaram a venda de drogas com aplicativos de relacionamento, tendo como consumidor final pessoas que moram em bairros centrais de grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Salvador. Na comodidade de casa, o usuário cria uma conta no app, faz o “match” com o fornecedor (tradução: entabula uma conversa produtiva movida por interesses comuns), solicita a mercadoria e o produto chega até ele levado por motoboy. “Os traficantes têm o mesmo perfil social dos clientes, ou seja, também são de classe média, e agem por conta própria, não são ligados a facções como o PCC”, afirmou um policial paulista com experiência em investigações do tipo. “Por esses canais, oferecem principalmente cocaína e ecstasy.”

Um dos aplicativos mais utilizados pelos traficantes é o Grindr, voltado para o público gay masculino, mas a polícia já flagrou bandidos usando o Tinder para negociar drogas. A abundância de anúncios quase explícitos nesses canais dá uma dimensão da popularidade atual desse tipo de e-commerce. Cientes do anonimato garantido pela internet, muitos criminosos criam perfis com nomes autoexplicativos: “Vendo TK e Key”, com as abreviações de cocaína e quetamina, anestésico de cavalo com efeitos psicoativos. Outros usam emojis para anunciar o menu disponível: bala (ecstasy), folha (maconha) e raio (cocaína e quetamina). “De março para cá, notamos um aumento significativo na venda de drogas por aplicativos, o que chamamos de “biqueira digital”, diz Tarcísio Otoni, delegado-chefe do Departamento Especializado de Narcóticos do Espírito Santo. “Quem recorre aos aplicativos para comprar drogas é gente de classe média alta e rica, que não quer sair de bairros bem localizados para adquirir entorpecentes na periferia. Ainda maus durante o isolamento social, quando há menos carros e gente na rua”, completa o policial.

A relação entre traficante e consumidor é facilitada pelo recurso da geolocalização dos aplicativos. Assim, o bandido consegue acionar sua rede para entregar a mercadoria em menos de uma hora, na maioria dos casos – e aceita pagamento em dinheiro ou cartão. O papelote de cocaína em São Paulo é comercializado por 30 reais (em dinheiro) e 35 reais (no crédito).

O preço do delivery não é cobrado em pedidos acima de quatro papelotes. Há transações mais vultosas. Cada grama da droga sintética da moda, o MDMA, varia entre 150 e 200 reais. Já o comprimido de ecstasy começa em 35 reais. Alguns traficantes mandam imagens do entorpecente aos clientes potenciais.

O trabalho de repressão a esses crimes é complexo. Para criar uma página em um aplicativo basta apenas um e-mail, na maioria das vezes. Ou seja, um mesmo bandido pode ter perfis diferentes para chamar menos atenção e dificultar o rastreamento dos endereços eletrônicos. Em 2017, após três meses de trabalho, a 4ª Divisão de Investigações sobre Entorpecentes de São Paulo identificou e prendeu onze pessoas que utilizavam o Grindr para essa finalidade. O trabalho durou três meses e contou com autorização judicial para que policiais pudessem se passar por clientes para efetuar os flagrantes. Foram presos homens e mulheres que tinham como base hotéis e flats nos Jardins e em Moema, bairros nobres de São Paulo. Em um dos endereços havia balança de precisão e centenas de saquinhos para embalar a cocaína. O desafio agora é multiplicar ações do tipo para coibir o crescente e-commerce das drogas em tempos de pandemia.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 10 DE JUNHO

FILHOS, FLECHAS NAS MÃOS DO GUERREIRO

Como flechas na mão do guerreiro, assim [são] os filhos da mocidade (Salmos 127.4).

Não criamos nossos filhos para nós mesmos. Nós os criamos para Deus. Nós os preparamos para a vida. O Salmo 127 apresenta uma sugestiva figura dos filhos: são flechas nas mãos do guerreiro. Feliz aquele que enche deles a sua aljava. Quando se pensa numa flecha, três ideias vêm à nossa mente. A primeira é que um guerreiro, antes de usar suas flechas, precisa carregá-las nos ombros. As mães carregam os filhos no ventre e os pais os carregam nos braços. Nossos filhos precisam de cuidado, proteção e amor. Precisamos temperar disciplina com encorajamento; exortação com consolo. A segunda ideia é que um guerreiro carrega suas flechas para lançá-las ao longe. Os pais não criam os filhos para si mesmos. Eles preparam os filhos para a vida. E, muitas vezes, os pais lançam os filhos para longe, a fim de responderem aos projetos de Deus. Os nossos filhos não são nossos: são de Deus e devem estar a serviço de Deus. A terceira ideia é que um guerreiro não desperdiça suas flechas. Ele as lança num alvo certo. Também os pais devem preparar os filhos para serem vasos de honra, instrumentos de bênção nas mãos de Deus. Os pais não desperdiçam os filhos. Os filhos devem ser criados com sabedoria para serem bênçãos na família, na igreja e na sociedade.

GESTÃO E CARREIRA

VACINA CONTRA A CRISE

Raia Drogasil, maior rede farmacêutica do País, cresce em faturamento durante pandemia, mantém plano de inaugurar 240 lojas em 2020 e coloca R$ 25 milhões em ações de combate à covid-19.

Pouco mais de uma década depois de o italiano João Baptista Raia (1879–1956) inaugurar sua primeira farmácia – numa época em que a palavra ainda era grafada com “ph” –, em 1905, na cidade de Araraquara (SP), o mundo foi impactado pela pandemia da gripe espanhola. O imigrante europeu que se tornou farmacêutico no Brasil manteve seu estabelecimento em pleno funcionamento e começou, logo em seguida, o processo de expansão da marca. Mais de um século depois, em meio à pandemia do novo coronavírus, que já contaminou quase 600 mil pessoas no Brasil e causou mais de 32 mil mortes no País – até a quinta-feira 4 –, a companhia Raia Drogasil parece demonstrar a mesma resiliência do seu fundador. Em meio à crise, a companhia cresce em vendas e vê sua participação líder no mercado brasileiro subir 1,1%, nos primeiros três meses de 2020, em relação ao mesmo período do ano passado, de 12,7% para 13,8%. Como era de se esperar no setor farmacêutico, o isolamento social em boa parte dos estados brasileiros a partir da segunda quinzena de março definitivamente não fez mal à companhia.

Os números, que já eram sólidos, cresceram no mesmo ritmo em que a preocupação e a busca por medicação aumentavam. No primeiro trimestre deste ano, ainda quase integralmente fora do impacto da pandemia, a companhia registrou faturamento de R$ 5,2 bilhões, alta de 25,3% em relação aos R$ 4,15 bilhões dos primeiros três meses de 2019. No lucro líquido, o salto foi maior. Foram R$ 152,7 milhões de janeiro a março, 44,8% acima do que foi obtido no período do ano passado, com R$ 105,5 milhões. A Raia Drogasil fechou 2019 com faturamento de R$ 18,4 bilhões.

O crescimento nos três meses de 2020 foi impulsionado pelo aumento significativo nas vendas nos dias anteriores ao início da quarentena, em um caminho parecido ao percebido pelo segmento supermercadista. Do montante, 46,4% vieram de medicamentos e produtos de venda livre, isentos de prescrição e fora do balcão. No item, estão incluídas as vendas de álcool gel, um dos poucos produtos oferecidos pela rede que registraram falta em um curto período. Os genéricos, por sua vez, tiveram alta de 30%, e os itens de perfumaria, de 14,4%. “A gente percebeu um movimento muito maior de clientes dos dias 10 a 23 de março, quando houve procura por analgésicos, de antitérmicos e de uso crônico, como uma espécie de estoque em casa”, diz o CEO da Raia Drogasil, Marcílio Pousada.

O mesmo movimento também foi percebido por todo o segmento. Dados da empresa de inteligência de mercado IQVIA, cedidos pela Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), mostram que as vendas nas quase 80 mil farmácias espalhadas pelo País renderam R$ 124,7 bilhões, entre maio de 2019 e abril de 2020, já sob reflexo nos últimos 45 dias do isolamento. O aumento foi de 8,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, quando a receita chegou a R$ 115,2 bilhões. O crescimento também ocorreu em número de produtos vendidos, entre medicamentos e itens de higiene pessoal e perfumaria. Foram 6,2 milhões de unidades, entre maio do ano passado e abril deste ano, contra 5,8 milhões nos doze meses anteriores.

Farmácias em cidades do interior do Brasil, onde os números de casos de Covid-19 são geralmente menores do que nas regiões metropolitanas, também registraram forte crescimento no período. A Farmarcas, rede associativa que reúne 11 pequenas e médias redes farmacêuticas, registrou crescimento de 27% em abril, comparado ao mesmo mês do ano passado. O grupo faturou R$ 3,26 bilhões, levando-se em conta os dados de maio de 2019 a abril deste ano. “A pandemia pouco afetou nossa projeção de crescimento. Hoje, temos 1.239 lojas no Brasil e devemos inaugurar pelo menos mais 100 até o final deste ano”, diz o presidente da Farmarcas, Edison Tamascia. A previsão inicial era de chegar a 1,4 mil farmácias em 2020. “Ser uma rede do interior nos beneficiou. Muitas lojas estão na periferia dessas cidades”, destaca.

O crescimento do setor também ocorreu no e-commerce da Raia Drogasil, que disparou neste ano, com 213% de aumento, levando-se em conta também os números da Drogaria Onofre, adquirida pelo grupo em 2019. A alta nas vendas on-line das farmácias da rede fez com que a fatia do digital no faturamento da companhia aumentasse de 2,3%, no quarto trimestre de 2019, para 2,7%, no trimestre seguinte. O crescimento nas plataformas foi acompanhado por uma aproximação com o público-alvo das drogarias. E, em uma espécie de volta à farmácia do passado, no estilo ‘farmacêutico de família’, a rede mirou nos serviços de comunicação com o consumidor, como a entrega de produtos pelos próprios funcionários da loja a uma distância de até 300 metros da residência do cliente. “Muitas ações foram antecipadas por causa da pandemia. Esse novo momento fez com que aumentasse o volume de vendas e modificasse o hábito do cliente. E reagimos bem”, diz Marcílio Pousada. Ele destaca que, no mês passado, a rede pasou a comercializar testes rápidos para detectar a Covid-19.

“É muito importante oferecer serviços farmacêuticos, além da venda de remédios, para poder ajudar a cuidar da saúde primária desse consumidor”, afirma o presidente da companhia. “É um pouco do resgate da farmácia do passado.” Das 2.107 lojas presentes em 23 estados, 95% não sofreram nenhuma alteração de funcionamento em virtude do isolamento social causado pela pandemia. Os outros 5% correspondem a unidades localizadas em shoppings, que precisaram fechar as portas. A quarentena também não modificou o planejamento da companhia de inaugurar 240 lojas no País ainda neste ano, mesmo que num ritmo mais cadenciado do que o previsto no fim da temporada 2019. Nos primeiros três meses, foram abertas trinta e nove unidades. Para cumprir a meta, a empresa terá de entregar outras 201 lojas em nove meses.

Toda a mobilidade mostrada pela empresa ajuda a refletir em seu valor de mercado. No dia 24 de março, quando a quarentena no estado de São Paulo teve início, o papel da Raia Drogasil na B3 valia R$ 108,04. Na terça-feira 2, alcançou R$ 113,37, alta de 4,9% no período. Relatório produzido no fim de abril pelo analista de varejo Pedro Fagundes, da XP Inc., mostra recomendação neutra para as ações. “Conforme as restrições relacionadas ao período de quarentena são gradualmente flexibilizadas, será importante acompanhar a evolução do fluxo de pessoas não só nas ruas e lojas, mas também nos próprios hospitais privados”, diz o analista no texto.

REAJUSTES

No fim de março, o governo federal editou a Medida Provisória 933, para adiar por 60 dias o reajuste anual do valor dos remédios, que deveria entrar em vigor no dia 1º de abril. Vencido o prazo, a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) permitiu o aumento de até 5,21% nos preços. A autorização foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União (DOU) da segunda-feira 1º. O Senado, no entanto, aprovou, na terça-feira 2, projeto de lei que congela preços de remédios por dois meses e de planos de saúde por quatro meses. O CEO da Abrafarma, Sérgio Mena Barreto, diz ser necessário o reajuste nesse momento principalmente por conta do aumento de custos. “A associação apoiou o adiamento por dois meses, mas esse reajuste é necessário. Há casos em que o transporte do princípio ativo aumentou em 20 vezes por causa da dificuldade de logística”, diz o dirigente. “Sem essa correção, é possível que comece a faltar alguns produtos.”

E é justamente a hidroxicloroquina, que, mesmo sem eficácia comprovada, ainda é considerada pelo governo federal alternativa para combater a Covid-19 – contrariando recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) –, que ainda registra falta nas farmácias brasileiras. Ocorre que o remédio é usado por 100 mil pessoas que têm lúpus, artrite ou malária.

Em março, houve enorme procura pelo medicamento e os estoques restantes foram requisitados por estados e municípios. “O princípio ativo vem da Índia. Com a alta na demanda, os valores dispararam”, diz o presidente-executivo da Abrafarma. “Estamos ao menos garantindo a quantidade para quem compra regularmente.”

Reflexos negativos para o setor preocupam, mas ainda não impactam a empresa. Com mais de 42 mil funcionários, a Raia Drogasil manteve os colaboradores e ainda ampliou o quadro desde o início da crise sanitária, com mais 2 mil para substituir os que entraram em licença e os que tiveram de se afastar por fazer parte do grupo de risco do novo coronavírus. Desde o início da crise, os funcionários passaram a ter o serviço de telemedicina do Hospital Israelita Albert Einstein. O CEO Marcílio Pousada diz que foram destinados R$ 25 milhões em ações de combate ao novo coronavírus no Brasil, por meio da doação de recursos para 50 hospitais filantrópicos em pequenas e médias cidades, média de R$ 500 mil para cada, além de 10 mil caixas de medicamentos à rede pública do estado de São Paulo, R$ 500 mil para a compra de cestas básicas e 100 mil máscaras para a Prefeitura de Belém. Para o executivo, a pandemia vai trazer, de forma definitiva, um aumento no cuidado com a saúde. Ele acredita num cenário de união de esforços, mesmo que tardia, entre as autoridades políticas, pelo menos no período em que os estados começam a pensar na retomada, ainda que com avanço de casos. “Com mais colaboração, o País sairá mais forte”, diz. “E tenho certeza de que toda a classe política vai ter o bom senso de fazer o melhor para os brasileiros.”

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

O QUE VOCÊ VAI SER QUANDO CRESCER?

Visto por muitos como fonte de sofrimento, o trabalho possui estreita ligação com a felicidade. existiriam, então, profissões mais “felizes”?

Dia desses me dirigiram uma pergunta interessante: Existem profissões mais felizes que outras? Podemos analisar essa pergunta de várias maneiras. Comecemos (é claro) pela mais otimista. Tal questão estabelece o pressuposto de que felicidade e trabalho sejam conciliáveis, o que por si só representa para mim um alívio, acostumada que estou a uma Psicologia anacrônica que insiste em discutir a mais valia. É sempre bom lembrar que, apesar de também poder ser utilizado como forma de exploração, o trabalho é, antes de tudo, uma forma de autorrealização. Além disso, às demandas geradas pelo mundo do trabalho devemos boa parte de nossas conquistas pessoais, tais como a disciplina, a responsabilidade, o convívio com o outro, a tolerância etc.

O trabalho nos desafia e, ao fazê-lo, nos torna seres humanos melhores. Dessa forma, vale dizer que uma outra implicação da pergunta inicial seria a existência de uma conexão entre a felicidade e aquilo que fazemos de nossas vidas, o que faz todo sentido, uma vez que somos o exato produto de nossas escolhas.

O questionamento sobre a existência ou não de profissões mais felizes demonstra também um crescente interesse das pessoas pelo tema da satisfação no trabalho, o que parece corroborar a afirmação de Seligman de que nossa economia estaria mudando rapidamente “de uma economia de dinheiro para uma economia de satisfação”. O problema ocorre quando a opção pela satisfação entra em choque com a concepção vigente acerca do sucesso. Reféns de uma educação voltada para o “ter”, crescemos acreditando no sucesso como prosperidade financeira e, fundamentados por essa crença, muitas vezes nos perdemos na trajetória de nossas carreiras. Nesse sentido, ao discutir o sucesso, o psicólogo Viktor Frankl parece bastante atual. Diz ele: “O sucesso, assim como a felicidade, não pode ser perseguido; ele deve acontecer, e só tem lugar como efeito colateral de uma dedicação pessoal a uma causa maior que a pessoa, ou como subproduto da rendição pessoal a outro ser. A felicidade deve acontecer naturalmente, e o mesmo ocorre com o sucesso; vocês precisam deixá-lo acontecer não se preocupando com ele. Quero que vocês escutem o que a sua consciência diz que devem fazer e coloquem-no em prática da melhor maneira possível. E então vocês verão a longo prazo – estou dizendo: a longo prazo! – o sucesso vai persegui-los, precisamente porque vocês esqueceram de pensar nele”.

É aí então que chegamos ao que chamo de premissa equivocada da pergunta inicial sobre a possibilidade da existência de profissões mais felizes, que é a de que a felicidade estaria em algo externo ao próprio indivíduo, tal como uma profissão que seria mais ou menos feliz per se.

Talvez nesse ponto devamos substituir a clássica pergunta “o que você vai ser quando crescer?” por algo do tipo “como você vai ser quando crescer”? Isso porque, ao questionarmos nossos filhos sobre o que deverão ser, talvez estejamos lhes ensinando, equivocada e subliminarmente, que existem profissões melhores do que outras e nos fechando para o fato de que uma pessoa pode atingir o verdadeiro sucesso (leia-se felicidade) por meio de uma dezena de profissões diferentes, desde que por meio delas encontre meios de expressar o seu melhor, deixando no mundo a sua marca individual como ser humano.

Vale lembrar também que, com o aumento da expectativa de vida, costuma-se falar hoje sobre múltiplas carreiras. Portanto, como você vai ser quando crescer? Quando partir para a segunda, terceira ou mesmo quarta carreira? Lembre-se de que se hoje para nós a medida do sucesso parece vir de uma comparação constante entre o nosso modelo de iphone ou de carro com o do nosso vizinho, acreditar na felicidade no trabalho como resultado da maneira com que nos relacionamos com ele talvez nos faça enxergar que, como dizia Hemingway, “não há nobreza em ser superior ao próximo. Nobreza é ser superior ao que você já foi”.

LILIAN GRAZIANO é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área.

graziano@psicologiapositiva.com.br

EU ACHO …

O PODER LIMITADO DA RAZÃO

O desastre mundial no combate à dependência química pode ser considerado um retrato da nossa insistência em reduzir a importância do afeto como agente de mudança, colocando-o à sombra do intelecto

A sofisticada capacidade de buscar justificativas lógicas para tudo o que acontece dentro e fora de nós não é, ao contrário do que parece, a protagonista das nossas decisões. A verdade é que as razões que arquitetam os por vezes com tanta engenhosidade têm pouca influência sobre a forma como vivemos – dos hábitos e tarefas que executamos até as pessoas das quais nos aproximamos. A consciência nem tem acesso à maior parte do que está sendo processado em nosso cérebro e é ali, nesse universo desconhecido da nossa identidade, que são feitas as escolhas que moldam a vida. É dali que surgem o que chamamos de insights, ali que nascem as paixões, que se forma o senso de conexão e pertencimento e tudo o que consideramos produto da intuição. Isso explica porque as melhores ideias são aquelas que dão a impressão de que nos encontraram, chegaram a nós – e não o contrário. Não raramente, a forma como respondemos a situações emocionalmente muito significativas causa o mesmo estranhamento.

Não nos conhecemos tão bem quanto pensamos e os desafios da convivência social e suas inevitáveis falhas de comunicação nos enviam constantes pistas desse fato. Para que possamos nos entender melhor é preciso redefinir o conceito de “conhecer”, conforme conclui o neurocientista David Eagleman em incógnito as Vidas Secretas do Cérebro. “O autoconhecimento requer agora entender que o você consciente só ocupa uma salinha na mansão do cérebro e que ele tem pouco controle sobre a realidade que você constrói. A invocação ‘conhece-te a ti mesmo’ precisa ser considerada de novas maneiras “, avalia.

A sensação de ter o controle absoluto dos próprios atos e reações pode trazer segurança em alguns momentos, mas ser um peso esmagador em outros, pois vem com carga de responsabilidade e culpa. Não apenas somos pouco compreensivos com relação às próprias fraquezas ou falhas: dificilmente interpretamos os comportamentos dos outros como resultado de fatores que ficam fora do campo do intelecto.

Como já verificou o neurocientista português Antônio Damásio, somos incapazes de tomar qualquer tipo de decisão sem antes consultarmos nosso campo emocional. E nossas emoções são extremamente suscetíveis aos mais variados fatores, momentâneos ou enraizados: carências plantadas ainda na infância, dificuldades, alterações hormonais, cansaço, falta de sono, problemas de saúde e todos os tipos de medos influenciam profundamente a forma como agimos, pensamos e nos relacionamos.

“Sentimentos, juntamente com as emoções de onde eles surgiram, não são um luxo supérfluo. Eles servem como guias internos e nos ajudam a comunicar sinais que também servem de guias aos outros. Não são intangíveis nem elusivos. De forma contrária à opinião científica, são tão cognitivos quanto outras percepções”, escreveu Damásio em seu fantástico O Erro de Descartes.

Ao investigar pessoas com danos no sistema límbico, onde as emoções são geradas, ele percebeu nelas uma incapacidade de fazer até as mais simples escolhas. A imparcialidade em qualquer tipo de julgamento, portanto, é sempre suspeita, e até o mais racional dos seres humanos é refém de suas emoções, mesmo que escondidas timidamente sob o manto da razão. Por isso, armar embates contra o intelecto, ao superestimar sua capacidade de controlar o comportamento, em algumas circunstâncias pode ser muito ineficaz. Um bom exemplo disso está na dificuldade de mudarmos alguns comportamentos, tendo a razão nos convencido de que é o que deve ser feito. Não nos falta o conhecimento de argumentos lógicos que suportem a mudança, nem quem tente nos influenciar usando racionalidade. Mas a lógica, apesar de impressionar, é pouco motivadora quando o que se busca é um movimento profundo. Dentro desse desafio, encontram-se vícios de todos os tipos – das condenadas dependências químicas às inevitáveis e mais aceitas dependências emocionais. Seja qual for a forma que assumem, elas surgem da mesma necessidade, que é a busca por vínculos. Portanto, se o comportamento nasce e reside na via emocional, é somente por meio dessa via que pode ser alterado.

Para exercer uma ação transformadora na vida de alguém é preciso buscar conexão afetiva antes de oferecer qualquer solução baseada na razão. Isso se constrói pela forma como nos comunicamos. Uma comunicação eficaz atinge positivamente o campo emocional em um nível subconsciente – algo muito mais poderoso que a supervalorizada comunicação verbal. O amor e a empatia não se transmitem apenas com palavras. Elas têm seu papel e podem assegurá-los, mas pertencem ao universo limitado e questionável da razão.

O desastre mundial no combate à dependência química pode ser considerado um retrato da nossa insistência em reduzir a importância do afeto como agente de mudança, colocando­ o à sombra do intelecto. Lutamos usando palavras e castigos como armas e, quando o método falha, promovemos o isolamento dos desobedientes. E o vínculo com as drogas, na falta de outros significativos, torna-se ainda mais necessário.

Aos poucos, a discussão sobre o que o vício de fato representa está se distanciando do preconceito e oferecendo soluções mais humanas e eficazes. O caso de Portugal é um exemplo disso: diante da evidente ineficiência dos tratamentos tradicionais, que partem de um julgamento moral, o país tomou a inédita iniciativa de descriminalizar o uso de todas as drogas. A questão passou a ser tratada como um problema emocional e de saúde. A penalização foi convertida para a ações motivadoras, com a atuação, em casos mais graves, de profissionais da saúde mental e assistentes sociais. Quinze anos depois, podemos dizer que o resultado foi um sucesso.

Os índices de reincidência e uso contínuo de drogas caíram de forma inédita e os casos de morte por overdose foram reduzidos drasticamente.

No Brasil, a conquista recente no tratamento da dependência foi a liberação, pela Anvisa, da importação e uso da Ibogaína, uma substância psicodélica retirada da raiz de uma espécie de arbusto africano. Até hoje não se encontrou forma mais eficaz de livrar alguém de algum vício. Enquanto centros de recuperação alcançam êxito próximo do zero no abandono definitivo às drogas, o uso da planta oferece, em um a única sessão, um a taxa de 70% de chance de recuperação. A substância promove alterações químicas no cérebro favoráveis à mudança, mas seu grande êxito está em manter o paciente livre do vício – o que pode ser explicado por sua profunda ação psicológica.

A droga permite o acesso a memórias e a todas as emoções encobertas pela capa impermeável da lucidez. Atua no nível em que as verdadeiras transformações ocorrem, como uma sessão intensiva da mais eficaz das terapias – aquela que age onde a lógica não chega e promove percepções que não cabem em palavras.

MICHELE MULLER – é especialista em Neurociências e Neuropsicologia da Educação. Pesquisa e cria ferramentas para o desenvolvimento da linguagem. É autora do blog www.leituraesentido.blogspot.com

OUTROS OLHARES

TENSÃO NO CÁRCERE

O aumento da contaminação por Covid-19 nos presídios torna ainda mais dramática a situação do sistema, que já sofre com superlotação e estruturas insalubres

Se não bastasse o rastro de milhares de mortes que a Covid-19 vem produzindo diariamente no país, a pandemia começa a desenhar outra tragédia dentro das prisões. Nas últimas semanas, o novo coronavírus passou a se alastrar com mais velocidade pelas celas superlotadas, aumentando a tensão em um ambiente já muito conturbado por guerras entre facções e várias epidemias, como a tuberculose. Obtivemos o levantamento mais recente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que quantificou o ritmo da evolução do problema. A partir de 1º de maio, os casos de contaminação entre os detentos saltaram de 243 para 1 406, o equivalente à evolução de 478% em apenas quatro semanas. No mesmo período, os registros da doença cresceram 475% entre os policiais penais. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), 38 presos morreram até agora. Da parte dos servidores, foram 36, conforme a contagem da Federação Nacional Sindical dos Servidores Penitenciários. Considerando-se que o Brasil tem a terceira maior população carcerária do planeta (770 000, de acordo com o último Censo), a possibilidade de a situação sair do controle é real — e assustadora. Efeitos colaterais da crise já começam a aparecer no sistema na forma de aumento de tentativas de fugas e de rebeliões.

O quadro é tão preocupante que o CNJ pediu aos tribunais na semana passada um levantamento quinzenal mais aprofundado sobre a condição da doença nos cárceres. Para se ter uma ideia, na última vistoria que fez no presídio de Monte Cristo, em Roraima, em fevereiro, o presidente da Coordenação de Acompanhamento do Sistema Carcerário da OAB, Everaldo Patriota, deparou com presos bebendo água do mesmo cano de chuveiro e com celas para quatro pessoas com dezesseis detentos amontoados. “É evidente que é uma situação explosiva”, diz o advogado. No sistema prisional, o maior foco de contaminação se concentra no Complexo da Papuda, em Brasília, que tem 681 casos confirmados de Covid-19 — 584 detentos e 97 policiais. Não por coincidência é a penitenciária que mais faz testes no Brasil. Em 17 de maio, morreu vítima da enfermidade o primeiro policial penal que trabalhava na Papuda, Francisco de Souza, de 45 anos. Por mais de uma semana, ele dividira um quarto de enfermagem no Hospital Regional da Asa Norte com o preso Álvaro Sousa, 32, que também era da Papuda e faleceu três dias depois.

A primeira medida de proteção específica para o sistema em meio à pandemia foi tomada em março, com a proibição das visitas de familiares, estendida também a advogados em vinte estados. Ela revelou-se insuficiente para deter o avanço do problema. Até o mais protegido e isolado dos presídios não passou ileso. A Penitenciária Federal em Brasília, que abriga de líderes do PCC (Marcola) a mafiosos italianos (Nicola Assisi), registrou a primeira ocorrência de Covid-19 em suas dependências no último dia 19. O detento, que não teve a identidade revelada, havia acabado de ser transferido de Pernambuco já infectado pelo coronavírus. O estado vem enfrentando distúrbios nas cadeias como o de 18 de maio, quando houve uma tentativa frustrada de resgate de um chefão do Comando Vermelho da Penitenciária de Itaquitinga (PE). Cinco bandidos armados trocaram tiros com os policiais na porta do presídio, mas fugiram de lá deixando pelo caminho uma escada e uma mala cheia de explosivos. Manaus, no Amazonas, em colapso por causa da doença, também vive problema semelhante.

Com uma situação que remete a um barril de pólvora, o Brasil corre o risco de repetir os exemplos de Itália e Colômbia, que viram eclodir dezenas de rebeliões simultâneas durante a pandemia. O temor de quem está atrás das grades por aqui é cada vez maior. “A população carcerária sabe exatamente o tamanho do problema que está sendo enfrentado lá fora”, afirma Nivaldo Restivo, o secretário de Administração Penitenciária de São Paulo, estado que computou o maior número de detentos mortos até o momento (doze). Alguns relatos dão conta de que líderes do PCC em São Paulo chegaram a vetar a entrada de guardas sem máscara em pavilhões e suspenderam os ônibus que transportavam os parentes aos presídios, antes de o governo proibir as visitas. Em um país no qual o crime organizado já domina boa parte da vida dentro das penitenciárias, só faltava mesmo essas gangues assumir as ações contra a Covid-19 por não haver uma presença mais efetiva do Estado no sistema. Seria o fundo do poço.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 09 DE JUNHO

TERAPIA POR MEIO DA PALAVRA

A lei do SENHOR é perfeita e restaura a alma (Salmos 19.7a).

Depois de falar acerca da revelação natural, Davi passa a tratar da revelação especial. A criação revela o poder de Deus, enquanto a Palavra fala sobre seu amor. A criação é uma revelação dirigida aos olhos, enquanto a Palavra é a revelação dirigida aos ouvidos. Depois de declarar que a lei do Senhor é perfeita, fiel, reta, pura, límpida e verdadeira, Davi acrescenta que a Palavra é mais desejável que o ouro e mais doce que o mel. Há grande recompensa em obedecer à Palavra. Ela tem predicados excelentes e uma ação eficaz. Restaura a alma, dá sabedoria aos símplices, alegra o coração, ilumina os olhos e permanece para sempre. Quando examinamos a Palavra, a Palavra nos examina. Quando mergulhamos em sua mensagem, ela nos diagnostica. A Palavra nos traz entendimento, pois ilumina nossos olhos. A Palavra nos traz cura, pois restaura nossa alma. A Palavra nos traz discernimento, pois dá sabedoria aos símplices. A Palavra nos traz contentamento, pois alegra o coração. A Palavra nos traz segurança, pois permanece para sempre. Encontramos na Palavra de Deus uma fonte de vida, pois as palavras de Deus são espírito e vida. Encontramos na Palavra de Deus um tesouro inesgotável, pois ela é melhor que muito ouro depurado. Encontramos na Palavra de Deus uma mesa farta com finas iguarias, pois o seu sabor é melhor do que o mel e o destilar dos favos. Você tem-se alimentado da Palavra?

GESTÃO E CARREIRA

OS MILLENNIALS, OS CENTENNIALS E AS AÇÕES

Atualmente, 10% das pessoas que aplicam na Bolsa de Valores têm entre 16 e 25 anos

O mercado de ações está cada vez mais conhecido entre os brasileiros e os diferentes perfis de grupos sociais. O fácil acesso à informação e a “desbancarização” são fatores que podem estar influenciando o acesso de diferentes pessoas a este ‘segmento’ econômico. Apenas na B3 (Bolsa de Valores), jovens de 16 a 25 anos já representam 10% do total de investidores que aplicam seus recursos na bolsa.

Até janeiro deste ano a B3 já contabilizava 1.803.745 investidores ativos no País. O número, quando comparado com o ano anterior, representa aumento de 8,90% quando a Bolsa tinha 1.6810.33 pessoas na ativa. Desse total, 164.729 são jovens entre 16 e 25 anos. Embora o número de investidores que inclui duas gerações (Y, ou millennials, e Z, ou centennials) não seja expressivo, estima-se que há dois anos menos de 18 mil pessoas dessa faixa etária investiam em ações ou em renda variável.

O aumento na quantidade de pessoas no mercado de ações deve-se, segundo especialistas, a facilidade do acesso às informações. De acordo com o assessor de investimentos Jorge Hadade Filho, além desse fator, os avanços tecnológicos acabam despertando a curiosidade nos jovens sobre mercado financeiro, produtos de investimentos e a famosa desbancarização, como é chamado o processo de descentralização dos bancos tradicionais.

“Na maioria das vezes eles [os jovens] estão à procura de produtos de investimentos além da famosa poupança, que era a mais conhecida na época dos avós e dos pais. Essa busca por informação vem principalmente da internet, por proporcionar acesso dinâmico, rápido e a qualquer instante, característica dos consumidores da geração Z”, afirmou Jorge Hadade Filho, da WFlow Investimentos-XP Investimentos, de São José dos Campos.

Aos 17 anos, o estudante do segundo ano do ensino médio Daniel Folco já conseguiu obter até R$ 9 mil por dia em uma de suas aplicações. Desde fevereiro de 2019, o jovem trabalha como trader, uma pessoa que normalmente compra e vende instrumentos financeiros, como ações e títulos. Basicamente, Folco ganha dinheiro através de investimentos que faz sobre o dólar e o euro, assim ele consegue obter lucros em cima da porcentagem das duas moedas. A curiosidade sobre o mercado de ações surgiu pelo perfil do jovem, que gosta de assuntos voltados ao marketing e vendas. Quando questionado sobre o motivo pelo qual o fez apostar nesse mundo de investimentos, Daniel dispara: “Dinheiro é sim um dos motivos, mas não o principal. A principal razão é a liberdade financeira e a realização de meus sonhos”, diz.

No início, o estudante tinha a meta de ganhar R$ 10 por dia e, então, começou a aplicar o valor mínimo de R$ 2. Aos poucos a quantia obtida com as ‘apostas’ feitas por ele foi aumentando e, hoje, Daniel Folco tem o sonho de criar a própria empresa e produzir cantores de funk. Tudo com o dinheiro que consegue através dos investimentos.

“Não tive uma vida fácil, sou filho de pais separados, já passei por diversas dificuldades financeiras e afetivas. Desenvolvi depressão, que se agravou ao longo de 2018, e se não fosse pelo meu cunhado eu não teria tido essas conquistas. Agora meu foco é poder comprar um imóvel, ter um carro e sucesso em meus projetos. Estou pensando em abrir algum negócio e também produzir MC”, relatou.

Mas antes de investir é importante que as pessoas tenham planejamento, conforme explica o assessor de investimentos Jorge Hadade Filho. De acordo com o especialista, antes de qualquer decisão deve-se ter claramente uma divisão entre o dinheiro de curto, médio e longo prazo, que seriam correspondentes a sonhos, desejos e projetos pessoais.

“Depois disso, a pessoa deve verificar as opções de investimentos que estejam mais adequadas ao seu perfil, de acordo com o momento e a realidade em que ela vive. Bolsa de valores, por exemplo, pode não ser a melhor opção para pessoas com perfil conservador ou para quem não tenha uma reserva de emergência, que são os recursos suficientes para cobrir despesas não planejadas, como uma manutenção de carro ou plano de saúde”, ressaltou.

Ainda segundo Haddad, outro detalhe importante é saber diferenciar oportunidades de investimentos regulamentados no Brasil, das pirâmides financeiras que prometem altos ganhos em curto espaço de tempo. A melhor dica financeira em longo prazo, segundo ele, é nunca perder dinheiro.

“Por isso é importante ter auxílio de um profissional da área financeira que entenda a fundo o perfil de investidor e possa adequar gradativamente os tipos de investimentos disponíveis no mercado aos objetivos pessoais de quem busca por isso”, concluiu.

ANTES DE COMEÇAR A INVESTIR

Quando o assunto é dinheiro muitas pessoas se interessam em saber como é possível obter lucros menos convencionais para além da poupança em bancos tradicionais. Mas como indica os especialistas, o conhecimento sobre o mercado financeiro é fundamental para quem pretende conseguir uma liquidez maior.

Segundo Tatiane Silva, sócia da Manhattan Investimentos – XP Investimentos, de São José dos Campos, investir no conhecimento sobre finanças e quais produtos a pessoa pretende focar é o primeiro passo e uma das dicas mais preciosas, pois, assim, o futuro investidor terá mais noção do que está fazendo.

Uma vez que o jovem busca informação sobre o assunto ele deve, segundo a especialista, definir qual a corretora pretende abrir uma conta. Atualmente, existem diversas corretoras no mercado e a maioria está alinhada com o perfil de público, como por exemplo, as instituições que oferecem serviços em aplicativos.

“Como o patrimônio desse jovem ainda é pequeno, os custos que ele terá em operações acabam sendo menores porque ele terá uma taxa de corretagem zero. E isso não faz com que ele dilua os lucros que ele adquiriu com esses custos. Por isso é importante se informar sobre os perfis das corretoras existentes no mercado e entender qual o público de cada uma, pois a corretora que tiver um perfil mais jovem vai se encaixar perfeitamente na demanda desse tipo de investidor”, explicou Tatiane Silva.

A formação de reserva, de acordo com a assessora de investimentos, é outro fator importante dentro da estratégia de investimento financeiro. Normalmente, o ideal é que o jovem poupe de seis meses a um ano do total de seus gastos fixos para que assim ele consiga acessar o mercado de ações mais arrojado (veja abaixo um exemplo de economia).

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

CASAIS NO DIVÃ

Na clínica psicanalítica, separações são mais comuns e fáceis frente ao empenho em reconstruir um relacionamento. Atenção a sutis detalhes e possibilidades podem conferir qualidade às relações

É provável que os talentos cognitivos específicos de cada sexo tenham surgido por se revelar vantajosos no curso da evolução. Assim, a especialização, princípio básico do desenvolvimento biológico, fez com que homens e mulheres não compartilhassem os mesmos dons, mas desenvolvessem talentos igualmente valiosos. As mulheres são mais elegantes com as palavras e têm maior capacidade de empatia. Os homens, ao contrário, dão importância aos símbolos de status, preferem a cerveja à conversa, mas em compensação consultam com maior facilidade os guias de ruas. Muitos desses traços; considerados específicos, não expressam senão preconceitos. Outros, no entanto, fundamentam-se em sólidas bases científicas.

É verdade que a família nuclear está sofrendo radicais transformações em relação ao número crescente de casamentos, seguidos de descasamentos e recasamentos, criando uma nova composição familiar em função dos filhos que cada novo cônjuge traz para o novo lar. Passa a existir uma mudança nos papéis conferidos aos cônjuges, de forma que os lugares ocupados se sobreponham ou até invertam, e tudo é encarado com muita naturalidade, acabando com o relacionamento.

Na sociedade moderna os problemas se agravam pelo conceito predominante sobre o casamento. Numa época na qual o divórcio era raro e, geralmente condenado pela sociedade, é provável que os casais tivessem mais inclinação para resolver suas diferenças. Hoje, porém, ao contrário, a separação dos cônjuges é coisa comum e disseminou-se bastante a ideia de que o divórcio pode ser sempre utilizado como um meio de fuga, caso os conflitos conjugais se agravem demasiadamente. Deve­ se lembrar que o conflito conjugal é, quase sempre, um sintoma de algo mais profundo, tal como egoísmo, falta de amor, falta de perdão, ira, amargura, problemas de comunicação, ansiedade, abuso sexual, bebedice, sentimentos de inferioridade, entre outros.

Então, torna-se prático pensar em respostas fáceis diante do caos em que nos encontramos. Hoje, a posição de um relacionamento é tomada com uma irresponsabilidade sem limites, sendo mais fácil separar do que reconstruir, ou seja, é melhor cada um ir para o seu lado, dividindo os bens meio a meio. Ao mesmo tempo, em poucos dias, os indivíduos são capazes de estabelecer uma outra relação, sem nenhum constrangimento.

A DINÂMICA DA PSICANÁLISE

A Psicanálise é a filha da neurologia, a parte da medicina preocupada com os transtornos do funcionamento do cérebro humano, ciência que estuda tudo aquilo que escapa à consciência espontânea e refletida, os processos psíquicos que não podemos invocar voluntariamente, ou seja, faz parte do inconsciente tudo o que quebra a continuidade lógica dos pensamentos cotidianos: lapsos, atos falhos; sonhos, esquecimentos.

Sigmund Freud também tinha uma família, e obviamente precisava relacionar-se. Por isso, sua base teve grande importância na revolução intelectual que ele iniciou, mudando a forma de entendermos as relações humanas. Em sua época, tais estudos e pesquisas foram considerados insanos, especialmente porque seu objeto de estudo era a sexualidade, que servia de fundamento para o surgimento das neuroses.

Para Freud, a vida sexual começa logo após o nascimento. Não está ligada aos genitais, mas à obtenção de prazer nas diferentes zonas do corpo. Urna criança que se alimenta estaria experimentando uma satisfação sexual na concepção freudiana. Se naquela época ele encontrou resistência, hoje, o sexo, a pornografia, o erotismo e as orgias estão inseridos no dia-a-dia, gerando uma visão prematura de algo que baqueia as bases de um relacionamento e da família.

A família sempre será a base da sociedade e principalmente de um relacionamento. Quem não tem uma família estruturada, provavelmente enfrentará dificuldades, já que o ser humano é impulsionado pelos sentimentos e não avalia os valores da lógica, da compreensão e da limitação do indivíduo que está em foco. Ao contrário, é atraído pelo sexo, pela boa qualidade de vida, por aquilo que pode conquistar ou receber neste “negócio” chamado relacionamento.

No atendimento a casais detecta-se grande dificuldade nas pessoas em conseguirem interpretar aquilo que o outro apresenta; percebo que não há um investimento real para sustentar tal relacionamento, não há pesquisa para saber se o caminho está certo ou não e, no entanto, o dia-a-dia passa a ser um nutriente para que a relação seja reforçada em teorias superficiais, pautada mais em ter do que em ser.

Se neste momento puder lembrar de algo muito bom que lhe aconteceu, provavelmente não será no campo do ter e, sim, no do ser. Podemos lembrar coisas boas que o ter nos proporcionou como, por exemplo, uma bela casa, um bom carro, boas roupas e outros bens materiais, mas o que realmente irá nos emocionar serão as lembranças do nascimento do filho, do dia do casamento, da restauração de nossa saúde, uma surpresa no dia do aniversário e outras situações similares.

Sem perceber, atraímos para os relacionamentos atitudes que comprometem sua estrutura. Inconscientemente existe um forte motor gerador desta angústia social; isso porque existe uma crescente necessidade de “exitismo”, ou seja, desde criança o sujeito está programado pela família e pela sociedade para ser bem sucedido, e parte para uma interminável busca por êxitos, que o deixa em constante sobressalto de vir a cumprir estas expectativas, que carrega nos ombros e na mente.

N0s últimos 30 ou 40 anos, sociólogos, pedagogos e psicólogos atribuíram a culpa à socialização, isto é, à influência dos modelos que à criança encontra em seu ambiente. Segundo opinião amplamente aceita, pais e adultos em geral inculcam nos pequenos estereótipos de conduta e; com isso, desde o princípio dirigem seu comportamento segundo os caminhos trilhados no passado. Assim, o dominante comportamento agressivo dos meninos seria simplesmente produto da educação – uma antecipação das futuras exigências da vida militar ou da sobrevivência no selvagem mundo dos negócios, onde são justamente os homens que dão o tom.

CONFLITO UNIVERSAL

Há alguns anos, um grupo de pesquisadores entrevistou indivíduos que haviam procurado ajuda para algum tipo de problema. Cerca de 20% dos problemas estavam ligados às “dificuldades de ajuste pessoal”, 12% dos aconselhados tinha problemas de relacionamento com os filhos, mas uma enorme faixa, cerca de 42%, afirmam que as dificuldades estavam centralizadas no casamento.

O conflito no lar é quase universal. Antes do casamento, as pessoas que se amam tendem a enfatizar suas semelhanças e negligenciar suas diferenças. Existe a crença de que “o nosso amor será diferente”, mas as tensões crescem e aparecem quando duas pessoas vindas de ambientes diversos e com personalidades diferentes, começam a viver juntas na mais íntima de todas as relações humanas. Os esforços mútuos para ajustar-se, disposição para transigir e a experiência de aprender como solucionar conflitos, tudo isso ajuda os casais a conviverem e moldarem um casamento cheio de amor e funcionando relativamente bem.

DIFERENÇAS SEXUAIS

A sexualidade da mulher tende a relacionar-se com seu ciclo menstrual, enquanto a do homem é praticamente constante. O hormônio masculino, testosterona, é um dos principais fatores que estimulam o desejo sexual no homem, através da pornografia, nudez feminina, variedade sexual, roupas íntimas e disponibilidade da mulher. Já ela é mais estimulada por apelos não sexuais, como palavras românticas, compromisso, comunicação e intimidade. A mulher sente-se em grande parte atraída pela personalidade masculina, enquanto eles são mais estimulados pelo que veem. O homem também é menos discriminador em relação às pessoas por quem sente atração física.

Enquanto ele precisa de pouco ou nenhum preparo para o sexo, a mulher, no geral, necessita de horas de preparação emocional e mental. O tratamento rude, ou abusivo, pode facilmente anular seu desejo de intimidade sexual durante dias seguidos. Quando o marido esmaga as emoções da mulher, ela muitas vezes sente repulsa pelos avanços dele. Muitas afirmaram sentir-se como verdadeiras prostitutas quando forçadas a fazer amor enquanto ainda estão ressentidas com o parceiro. O homem talvez não tenha ideia desses sentimentos quando força a mulher a fazer sexo, e estas diferenças surgem no casamento gerando vários conflitos conjugais.

Desde o início, a mulher sabe desenvolver melhor uma relação cheia de amor. Devido a sua sensibilidade, tem mais consideração pelos sentimentos do marido e mais entusiasmo para criar um relacionamento significativo em vários níveis; isto é, ela sabe como construir algo mais do que uma maratona sexual; quer, ao mesmo tempo, ser amante, amiga, admiradora, dona de casa e companheira apreciada. O homem, por outro lado, não tem geralmente a intuição sobre como o relacionamento deveria ser. Ele não sabe como encorajar, amar e tratar a esposa de uma forma que satisfaça suas mais profundas necessidades. Sabendo que não possui uma compreensão dessas áreas vitais através da intuição, ele precisa se apoiar apenas nos conhecimentos e habilidades adquiridos antes do casamento.

COMPREENSÃO É ARTE

Acredito veementemente que, embora as pesquisas apontem para inúmeras diferenças entre homens e mulheres, é possível estabelecer uma linha de relacionamento que seja eficaz e ao mesmo tempo possa unir dois seres tão diferentes. É possível ter uma vida conjugal feliz tomando, em contrapartida, o respeito e a disposição.de estar em constante processo de transformação não somente em nome do outro, mas para o próprio crescimento pessoal, porque a partir do momento que se consegue respeitar o outro, aumenta a capacidade de compreender, perceber, entender e ouvir. O que se observa hoje nos relacionamentos conjugais é o triste quadro de “eu não vou ceder”, e não se trata de ceder ou não, mas, sim, de compreender, pois esta é a arte de se viver um relacionamento saudável com qualquer ser humano. É um processo de reeducação do querer, pois ao continuar fazendo o que sempre foi feito, continua-se obtendo o que sempre se obteve.

É um mito, porém, pensar que um casal poderá superar seus conflitos sem nenhuma intervenção. E é trágico quando ambos negam sistematicamente qualquer tipo de ajuda. Você não pode mudar o que você não pode mudar, mas é possível mudar a sua percepção. A psicoterapia pode não só conduzir a uma mudança de conduta, mas também levar a uma nova fase de redescoberta do prazer de estar com o outro. É o teste quase que definitivo sobre a indecisão – ou certeza – dos sentimentos perante o parceiro, sejam positivos ou negativos. Apenas deve-se ter cuidado para que a psicoterapia não seja uma desculpa para o fim de um relacionamento. Se uma das partes não está disposta a carregar o ônus do outro, fica fácil colocar a culpa no terapeuta. 

EU ACHO …

UM DIA A CONTA CHEGA

O grande romancista francês Balzac declarou que “por trás de cada grande fortuna existe um grande crime”. É inegável que os Estados Unidos têm desfrutado de uma riqueza e fartura sem precedentes na história. Mas nós, americanos, precisamos reconhecer que nossa prosperidade está fundamentada numa perversidade histórica, a escravidão, e que nunca vamos conseguir livrar-nos das consequências desse pecado original.

Escrevo estas palavras com confrontos entre policiais e populares estourando em 140 cidades americanas e algumas grandes metrópoles, inclusive Nova York e a capital, Washington, em chamas, baixo toque de recolher e com tanques nas ruas – tudo isso em reação à morte de um homem negro sem arma, George Floyd, asfixiado por um policial branco em Minnesota. Aconteceu na noite de 25 de maio, coincidentemente num feriado dedicado à memória dos 750 mil mortos em nossa Guerra Civil de 1861-1865, travada para extirpar a escravidão e incorporar o negro como cidadão com direitos plenos.

Em vez disso, o mundo assistiu ao vídeo de Floyd – com o policial ajoelhado em seu pescoço durante quase nove minutos – arfando, engasgando e finalmente gritando “Não consigo respirar!”. A mesma frase foi pronunciada por Eric Garner, um camelô negro detido por vender cigarros ilegalmente em Nova York e estrangulado por outro policial branco em 2014. Naquele ano, o jovem negro Michael Brown foi morto a tiros por policiais em St Louis e um policial branco em Cleveland fuzilou um menino negro de 12 anos, Tamir Rice, dois segundos depois de chegar a um parque onde a criança ostentava uma arma de brinquedo. A lista nunca termina.

Quando Barack Obama foi eleito presidente em 2008, eu acreditava que sua vitória podia ajudar a cumprir com as promessas de igualdade racial feitas depois da Guerra Civil 150 anos antes. Engano meu. A ascensão de um negro à Casa Branca apenas incentivou os racistas em nossa sociedade a serem ainda mais audaciosos. Eles questionaram desde o primeiro dia a legitimidade do governo dele, com Donald Trump na liderança. Proliferaram os desenhos animados retratando Obama como macaco e também a lenda de que ele tinha nascido na África. Para os racistas, todo negro é um sub-humano, a perda de um imóvel queimado por manifestantes irados vale mais do que a vida de um negro, e a melhor maneira de lidar com protestos contra abusos de negros pela polícia é com abusos ainda mais violentos.

Quando o primeiro navio negreiro chegou à Virgínia, a escravidão já existia havia um século no Brasil. Cerca de 500 mil africanos foram transportados aos Estados Unidos, enquanto 4 milhões chegaram ao Brasil. Lincoln emancipou os escravos em 1863, 25 anos antes da Lei Áurea. Nos Estados Unidos, a escravidão foi um fenômeno limitado por lei aos estados do sul; no Brasil, foi nacional. Apenas 13,4% dos americanos tem ascendência africana, enquanto a maioria dos brasileiros são negros, mulatos ou pardos.

Não é apenas o contexto histórico que assemelha nossos países. O Brasil praticou a miscigenação e celebrou os elementos africanos de sua cultura bem antes dos Estados Unidos. Mas nós temos nosso Tamir Rice, e vocês têm seu caso João Pedro. Policiais racistas rápidos demais no gatilho, idem. Presidentes incompetentes que desprezam negros e outras minorias raciais e tentam desqualificar qualquer questionamento como obra de “terroristas”, também. Em ambos os países, o negro ganha menos, morre mais jovem e sai da escola antes.

São as sequelas da escravidão, e não sei como remediá-las. A religião nos ensina que não se pode escapar do pecado original. Mesmo assim, temos o dever moral de aliviar o sofrimento e a injustiça, e isso explica as grandes multidões nas ruas americanas. Em todos esses casos de negros mortos, os policiais foram absolvidos. Um tímido primeiro passo em direção à justiça racial seria a condenação do policial que assassinou George Floyd.

Nestes dias de angústia, fico pensando num livro do escritor negro americano James Baldwin, The fire next time, de 1963. O título vem de um hino negro tradicional: Deus deu a Noé o sinal do arco-íris/Não mais será água, na próxima, as chamas. Aqui, a próxima já chegou, com sua conta pesada. Vocês tiveram mais sorte. Mas até quando?

**LARRY ROHTER – é jornalista e escritor, ex- correspondente do New York Times no Brasil e autor de Rondon, uma biografia.

OUTROS OLHARES

ABRIGO SOBRE RODAS

O carro particular, artigo constantemente ameaçado pela economia compartilhada, parece ter ganho sobrevida durante a pandemia – e mesmo depois dela

Nos anos 1970, o engenheiro austríaco Hermann Knoflacher, da Universidade de Viena, lançou um conceito que batizou de Gehzeug, neologismo do idioma alemão que pode ser traduzido como “andamóvel”. Ele montou uma estrutura oca com as proporções de um carro de passeio e se pôs sentado, circulando pelas calçadas, no centro do retângulo vazio, como se estivesse ao volante do automóvel imaginário. O experimento de Knoflacher visava a criticar o espaço ocupado pelos veículos motorizados nas cidades. A ideia iconoclasta foi celebrada.

Com certo atraso, é verdade, muita gente passou a compartilhar o ponto de vista do provocador austríaco e, nos últimos tempos, era cada vez maior o número de pessoas que escolhiam abandonar o carro como a forma preferencial de locomoção em favor de outros meios de transporte, coletivos ou compartilhados. Mas então, como em diversos setores da sociedade, veio a pandemia do coronavírus. E, de repente, o corpulento retângulo de metal movido (em sua grande maioria) a combustíveis fósseis voltou a ser uma alternativa interessante, uma boa saída.

As determinações de distanciamento social fizeram do automóvel particular uma redoma segura, uma espécie de abrigo sobre rodas. Ele nos mantém isolados uns dos outros, permite retomar certos hábitos cotidianos e, por que não, aliviar a ansiedade por passar tanto tempo em confinamento dentro de casa, entre quatro paredes. Não é à toa, portanto, que certos modismos do passado ganharam força nos últimos meses, no Brasil e no mundo. Um deles, que parecia abandonado de vez, é o do cinema drive-in, criado nos Estados Unidos dos anos 1920, os “anos loucos”.

Hoje, na Europa, as pistas dos aeroportos ociosos e espaços descampados tornaram-se salas de exibição ou casa de espetáculos a céu aberto. Pessoas sozinhas, casais e famílias puderam, enfim, rever filmes em telas gigantes ou acompanhar apresentações musicais de dentro de seus carros. No Brasil, a ideia já encontrou eco em metrópoles como Rio e Brasília. Em São Paulo, o Allianz Parque, estádio do Palmeiras, anunciou que a partir deste mês abrirá suas portas para sessões de cinema no estilo drive-in com capacidade para 280 veículos – aos palmeirenses, um aviso: o gramado é sintético e não deve ser prejudicado pelo entra e sai motorizado.

Outro conceito batido das grandes metrópoles ganhou nova roupagem durante o ápice da pandemia. O sistema drive-thru, que há até pouco tempo servia apenas para matar a fome, passou a contemplar não apenas serviços, mas outros tipos de eventos sociais. Hoje existe drive-thru de formatura escolar, de aniversário, de chá de bebê.

Em Curitiba, o padre Reginaldo Manzotti, responsável pelo Santuário Nossa Senhora de Guadalupe, na capital paranaense, decidiu atender ao pedido dos fiéis e passou a promover o rito da eucaristia a quem passava em frente à igreja. “Com as missas privadas, sem público, as pessoas ficaram sedentas por Deus”, afirma Manzotti, um dos mais populares párocos católicos do país (tem 3 milhões de seguidores no Instagram). Em três domingos do mês passado, das 9 da manhã ao meio-dia, Manzotti ofereceu a comunhão a cerca de 4.600 pessoas que passaram de carro. Ele deve repetir o serviço espiritual no dia de Corpus Christi. “Com segurança, pude acalmar pessoas doentes, com sonda, idosos. Fiquei muito emocionado”, diz.

E quando a pandemia passar, o que será do automóvel de passeio? Para muitos especialistas no setor, mesmo depois de viabilizada uma vacina contra o novo coronavírus, muitos daqueles que não viam o carro particular como uma prioridade podem recorrer a ele novamente como um meio mais seguro para a saúde. De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos em trinta países, entre eles o Brasil, 30% dos entrevistados estão mais propensos a comprar um automóvel depois da crise da Covid-19. “Não creio que a retomada do interesse pelo carro particular seja um fenômeno passageiro”, disse Giulio Salomone, vice­ presidente da consultoria Capgemini. “O verbo pode não ser mais comprar, mas haverá uma evolução do uso do automóvel.” Ricardo Bacellar, líder do setor automotivo da KPMG, também aponta para essa expectativa. “O uso do carro está relacionado com a oferta de mobilidade de uma determinada região. Mesmo em uma grande metrópole como São Paulo, onde há vários meios de se locomover, as pessoas podem voltar ao carro particular em razão da crise sanitária pela qual passamos”, diz. O automóvel, que parecia fadado ao colapso, ganhou sobrevida.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 08 DE JUNHO

UM SINAL DO FAVOR DE DEUS

Mostra-me um sinal do teu favor… (Salmos 86. 17a).

Davi está passando por um vale profundo. Aflito e necessitado, encharcado de tristeza, era dominado por grande angústia. Sua alma estava cercada pelos poderes da morte. Os soberbos levantavam-se contra ele. Um bando de violentos, que desprezava a Deus, atentava contra sua vida. Nessa situação de opressão e perseguição, Davi se volta para Deus em oração, proclamando misericórdia. Davi pede livramento e socorro. É nesse contexto que Davi roga ao Senhor: Mostra-me um sinal do teu favor. Há momentos na vida em que as circunstâncias conspiram contra a nossa fé. Mesmo cientes de que Deus é poderoso para nos livrar, não vemos nenhuma evidência desse livramento. É como se estivéssemos dentro de um nevoeiro escuro. Os inimigos se fortalecem e sentimo-nos ameaçados por perigos que vêm de fora e por angústias que vêm de dentro. Nessas horas, precisamos também de um sinal do favor de Deus. Precisamos de uma prova de que Deus está no controle da situação, e em tempo oportuno, nos dará o livramento. Talvez você também já tenha feito essa oração de Davi. Talvez você também já tenha passado ou até esteja passando por essa noite tenebrosa de dor e medo. Saiba que seu Deus é compassivo. Ele é grande em força e poder e jamais irá desamparar ou entregar você ao alvitre de seus inimigos. Não se desespere, espere em Deus! Não se entregue ao desespero, ore a Deus! Não se renda à incredulidade, peça a Deus um sinal do seu favor!

GESTÃO E CARREIRA

BRANDING PESSOAL

Ter reconhecimento e ser lembrado fazem toda diferença no plano competitivo que vivemos. Mesmo que uma pessoa não queira imprimir sua marca, causa efeitos positivos ou negativos em sua apresentação

O mundo está se tornando cada vez mais uniforme. É fato a facilidade com que a informação circula pelas redes sociais ofertando, em sua timeline, milhares de imagens por dia de pessoas oriundas de várias partes do mundo com culturas diferentes e, ao mesmo tempo, muito parecidas umas com as outras.

Dificilmente podemos memorizar uma pessoa pelas roupas que vestem, pelo tipo de corte de cabelo ou ainda acessórios que ostentam. Afinal, tudo está muito igual. Somente algumas poucas culturas orientais, povos que ainda resistem à globalização, mantêm um estilo particular de se apresentar ao planeta. Muitas vezes, essas assinaturas culturais são apenas para um público espectador pagante, turistas na maior parte.

Assim, a identidade pessoal se funde em um universo de calças jeans, blazers e tênis descolados. Para ter uma aderência em um nicho de mercado – entendendo “mercado” como seu público-alvo em seu universo laboral –, é necessário imprimir uma marca pessoal, um estilo próprio e que possa tornar essa pessoa em algo distinguível no cenário geral.

Lembrando sempre que: a primeira impressão é a que fica. É importante que o profissional saiba se apresentar de acordo com as expectativas que deseja criar em seu futuro possível networking. Mesmo pessoas que já estão inseridas e com boa visibilidade, colhendo resultados positivos de uma boa imagem, também devem investir em uma possível melhora na criação de seu branding pessoal. De fato, nem se trata de um processo de alto custo, apenas de boas e sensatas escolhas.

Um exemplo é a forma como as pessoas são chamadas. Nem sempre o nome próprio de uma pessoa é o mais reconhecido pela comunidade. A própria estruturação do nome de trabalho faz muita diferença. Observe as pessoas que não utilizam o primeiro nome, ou fazem uma conjugação entre o primeiro nome e algum sobrenome, ou utilizam apenas o sobrenome. Como isso impacta na percepção de cada um?

Como você gostaria de ser chamado e por quê? Esse é o primeiro movimento para a criação de sua marca própria registrada no cartão de visitas ou no crachá que ostenta. Pensar nisso por alguns minutos pode mudar muita coisa na valoração que você pode imprimir no ambiente. Algumas pessoas se apossam de nomes que nem estão de fato na carteira de identidade e usam como uma real marca. Um exemplo é o empresário Carlos Wizard Martins, referência no mundo das franquias e autor de vários livros de empreendedorismo. Será que esse é o nome registrado pelos pais ou foi adaptado após o sucesso de sua grande rede de cursos de inglês?

Sua marca pessoal, muito antes da embalagem final (roupas), é definida pelo cabedal linguístico que se utiliza: as expressões e palavras mais marcantes. Não se trata de inventar jargões ou novas expressões, mas de ter uma estrutura de conteúdo coerente com o impacto que deseja causar. Apresentar um cuidado em usar um linguajar apropriado e saber como, quando e onde exercer uma boa mudança verbal é estratégico na formação do seu branding.

Um detalhe que não pode ser negligenciado é a linguagem não verbal que vai abranger um vasto campo de signos e sinais, tais como:

1- GESTOS E POSTURAS: muitos devem ser evitados a fim de evitar uma imagem negativa;

2- ACESSÓRIOS E MAQUIAGEM: é prioritário que o ambiente seja estudado antes para que uma adequação possa ser feita.

3- ROUPAS: é necessário que o perfil da indumentária seja equivalente ao esperado de alguém que se proponha a se apresentar como representante de algum setor do conhecimento. Dentre os aspectos que, para a grande maioria das pessoas, passa totalmente desapercebido estão os calçados. De nada vale uma pessoa que está muito bem vestida se apresenta os sapatos sujos ou desgastados.

Uma instituição de ensino superior de representação nacional, por exemplo, exige em seu manual de conduta que todos os professores de pós-graduação usem blazers para serem diferenciados dos professores de graduação. Espera-se, portanto, que os alunos tenham mais respeito e admiração por professores que usem blazers. O mesmo se aplica às professoras que devem usar blazers ou tailleurs.

De maneira diferente, a sociedade possui uma visão preconcebida de outros tipos de autoridades do saber. Espera-se que um gênio da computação use calças jeans desbotadas e uma camiseta de algodão na cor cinza. Que um médico sempre use, onde quer que vá, um estetoscópio no ombro e uma modelo profissional se equilibre em um salto alto de 15 cm.

São estereótipos, sem dúvida, e muitas vezes caricatos. Mas guardam em si uma certa valência que pode ser aproveitada para quem deseja ser notado e deixar sua marca registrada, pessoal, nas pessoas que toca no dia a dia. Basta, para isso, ter bom senso e saber equalizar todas as possibilidades sem se apoiar totalmente em apenas uma das vertentes.

A culpa não é do preconceito, é da cultura instalada ao longo da construção de nossa história. Ter atenção ao perfil de marca pessoal que estamos divulgando com a nossa presença em determinados ambientes pode criar feedbacks que irão determinar, no futuro, a prosperidade ou a ruína de quem idealizamos ser como profissionais.

JOÃO OLIVEIRA é Doutor em Saúde Pública, psicólogo e diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros estão: Relacionamento em Crise: Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora).

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

QUESTÕES MAL RESOLVIDAS

Gravidez é uma situação que, se não for bem trabalhada entre o casal, pode trazer problemas sérios de relacionamento, principalmente se a decisão for tomada com o objetivo de resolução de conflitos já existentes

A ideia de casal perfeito, família perfeita é algo muito comum na cultura ocidental. Dessa forma, assim que se decida pela relação conjugal, casamento, morar juntos, ou qualquer outra expressão que se use para designar convivência em casal, o pressuposto é que “devem ter filhos”. Toda pressão social sobre casais, independentemente da orientação sexual, é a de que uma união gera frutos. Para alguns casais iniciam-se as transformações em seu status social.

Alguns casais desejam ter filhos e acreditam que, mesmo não vivendo bem a conjugalidade, investem nos filhos como sendo a possibilidade de resolução de conflitos, e a energia que necessitam para enfrentar problemas no casamento, que são dificuldades anteriores à escolha de ter ou não ter filhos. Problemas todos têm, a vida toda. É preciso saber administrá-los. Contudo, nem todo casal tem energia, disposição e vontade de olhar para elas e administrá-las. Então, se não houver por parte do casal dedicação para solucionar ou reconhecer quais são as diferenças individuais, é possível que surjam problemas que ciclicamente virão à tona em novas situações de estresse.

Reconhecer as formas inadequadas de relacionar conjugalmente, pelo casal, sempre é o caminho de solucionar os problemas. Sabe-se da ideia romântica de casamento e os pensamentos mágicos de que os problemas se solucionarão com a convivência e intimidade, mas, na realidade, é aí que mora o perigo e um enorme engano. A imensa maioria das pessoas não está preparada para reconhecer os próprios problemas, diferenças e dificuldades no relacionamento afetivo\conjugal.

A gravidez, ou a questão da paternidade e maternidade, não é algo que a maioria do casal converse de maneira clara. Existem casais em que o sonho de ambos é ter filhos e construir família. Nesses casos, não há conflito. No entanto, há outros casais em que um deseja ter filhos e o outro não tem planos ou desejo de tê-los. Na grande maioria das vezes, nada disso é discutido efetivamente para saber se devem continuar juntos com todas as diferenças. Outros pontos importantes são quantos ter e quando, em que momento da vida.

GRAVIDEZ PLANEJADA

O panorama geral do buscar a gravidez já pode ser um aspecto problemático para o casal. Se o ter filho não for um plano comum aos dois, a busca da gravidez já traz o primeiro desconforto: objetivos distintos no casal. Ao se casar em cerimônias religiosas, geralmente ele já é alertado, relembrado e consignado a procriar como função religiosa dessa união. Esse momento apenas reforça o projeto que o mundo ao redor impõe a todos desde criança, e sempre relembrando aos pequenos de que crescerão, casar-se-ão e terão filhos. Para muitas pessoas apenas esse mecanismo já será suficiente para o desejo de gravidez na vida adulta.

Além das tão faladas questões hormonais vivenciadas pela mulher, provocando mudanças importantes de humor, descontroles de impulso e mal-estares físicos em vários momentos da gravidez, há aspectos psicológicos, emocionais, relacionais para considerar. São eles:

INTIMIDADE FÍSICA DO CASAL – muitas mulheres mostram-se exageradamente preocupadas com a forma do corpo e a possibilidade (percebida como certeza) de que serão rejeitadas. Olham-se ao espelho e percebem-se gordas, inviáveis de serem desejadas pelo marido. Ela se rejeita, tem certeza de que o marido a rejeitará durante toda a gravidez, e será cada vez pior, quanto mais passe o tempo até o parto. Mas serão essas mulheres que evitarão o contato físico do marido. E a consequência para ele é também afastar-se, o que “confirmará” para a mulher que o marido não a deseja. Uma grande confusão com falta de comunicação nesses casais. Fora aquela justificativa falsa, mas utilizada por muitos casais: o sexo fará mal ao bebê. E isso é expresso por pessoas de cultura e educação formal altas.

SEXO – com as justificativas mais variadas, cada um no casal poderá deixar de buscar sexo. Ansiedades e receios irracionais afastam-nos da busca de atividades sexuais, assim como emoções negativas advindas de outras dificuldades do casal durante a gravidez. Nos primeiros meses há justificativas de que a náusea impede o sexo, depois é a barriga crescendo, depois é a barriga grande; é não receber atenção numa condição tão importante, é não ter ajuda quando outros desejos alimentares aparecem, desconsiderações.

DEPRESSÃO PRÉ-NATAL – as mudanças de humor ao longo dos meses de gravidez, uma vez mais drásticas podem conduzir a quadros depressivos. Afinal, o crescer da percepção de falta de controle sobre o corpo que se alie a pensamentos negativos pode ser importante e decisivo nessa fase. Esses quadros diminuem a comunicação entre os cônjuges, com o marido não compreendendo o que se passa, até vendo que deveria ser o contrário, pois, afinal, terão a criança desejada. A insatisfação no casal é o principal preditor de sintomas psicológicos para a depressão pré-parto. Um bom relacionamento de casal protege contra certos estressores. Depressão perinatal é pouco reconhecida por profissionais de saúde por estes estarem focados na saúde física da mulher e do feto.

A REJEIÇÃO AO MARIDO – com a gravidez, todos à volta dão atenção à mulher. Esse é o momento em que o homem se sente rejeitado, colocado de lado, sem função por meses, ao menos os últimos seis, quando a gravidez foi socialmente anunciada. Muitos desenvolverão um ciúme e se mostrarão muito ressentidos com esses meses de alienação conjugal. Casais que não se planejaram para que a vida conjugal ocorresse de modo confortável tendem a reforçar mais as situações negativas.

FALTA DE COMUNICAÇÃO E COMPREENSÕES MÚTUAS – homens e mulheres percebem a gravidez de modo diferente e cada qual deseja ser o centro de atenções, e ser como eram antes de se iniciar essa busca de procriarem. Ser diferente não é ruim, o problema é não saber como lidar com essas diferenças, atacando-se e defendendo-se como estando em diferentes direções e não num casamento. As habilidades de comunicação e a ansiedade durante a gravidez estão muito associadas por ser a satisfação marital conectada com ambos fatores. Claro que existem discussões se a satisfação conjugal é produzida ou produz melhor comunicação do casal.

QUESTÕES FINANCEIRAS – embora sempre se escute que “onde comem dois, comem três”, isso não funciona assim. Ter uma criança exige planejamento financeiro por cerca de duas décadas, ao menos. Muitas vezes a discussão sairá do racional necessário para o desejo emocional de terem filhos. Os casais percebem que precisarão de um quarto para a criança, fraldas, comida, médico. Imediatamente ao conhecimento da gravidez deverá acontecer uma série de providências para o nascimento.

NOVOS APARATOS SOCIAIS

O momento histórico atual conduz à busca de saúde e não à evitação de problemas. Novas formas de instituições sociais de saúde virão para compreender a gravidez e considerar o casal como importante, não só para a gravidez e o futuro bebê. O casal preexiste e continuará a existir após o nascimento (!?). As instituições de saúde têm tido aparições nesse sentido há décadas, mas somente existe atuação positiva esporádica e quando os problemas se tornaram maiores e mais aparentes.

Ainda vivemos para cuidar da gravidez. Ainda não agimos sobre o casal para que essa unidade seja beneficiada, e, assim sendo, beneficie a gravidez e o bebê a nascer. Ainda não atuamos sobre o bem-estar conjugal e a vida e saúde sexuais para maior satisfação do casal, enquanto casal. No entanto, devemos buscar transformações para que se possa fazer diferente.

EU ACHO …

QUEM VÊ LIKE NÃO VÊ CORAÇÃO

Desde o dia 17 de julho de 2019, não é mais possível ver o número das curtidas das pessoas e marcas que o usuário segue dentro do Instagram. Ainda é possível acompanhar o número das curtidas pelo dono da conta ou pelo desktop, por qualquer um.

Tal decisão foi tomada após revelação, em estudo da Royal Society for Public Health, sobre a influência das redes sociais na saúde mental dos jovens, principal público e usuários das mesmas. Cerca de 1.500 jovens, entre 14 e 24 anos foram entrevistados, com o objetivo de identificar o impacto causado por algumas plataformas de mídia social em relação à saúde e bem-estar. De longe, o Instagram foi o mais citado como tóxico nesse sentido, se destacando como causador de problemas como ansiedade, baixa autoestima, perda de identidade e imagem corporal. Com o impacto maior entre as mulheres mais jovens, a comparação entre as “celebridades”, com fotos super produzidas, filtros e retocadas ao extremo, identificou-se o disparo de gatilhos para ansiedade e depressão nesse público. Outro motivo alegado foi de que estaria incentivando o bullying, já que a competição de número de curtidas entre os mais jovens estaria dando origem a variadas situações do tipo dentro da rede social. Alguns alegam que o objetivo é estimular o impulsionamento dos posts comprando a mídia do próprio Instagram, ao invés de “fazenda” de likes e seguidores, comercializadas dentro da própria plataforma.

Enfim, independente dos motivos, após iniciar os testes no Canadá, expandiram para o Brasil e mais seis países, não sendo, ainda, uma decisão definitiva da rede de imagens e vídeos do Mark Zuckerberg. Para o mercado de influenciadores e vaidades em geral, houve um certo protesto, inclusive com postagens de prints e imagens de alguns desses influenciadores com os números de curtidas em suas postagens. De modo geral, muitos receberam bem a decisão do Instagram, pois alegaram que já vinham não utilizando apenas as métricas de curtidas como sucesso dos posts, destacando que, finalmente, o conteúdo seria o foco, não as curtidas.

MAS COMO ISSO AFETA O VAREJO?

Como empresa que contrata influenciadores para fazer divulgação da marca ou produto, utilizando como métrica as curtidas, vai ser bem impactado. Mas, adianto que está fazendo algo bem errado, já que acredito que ações desse tipo “queimam” recursos e, às vezes, a própria marca. Agora, quanto à utilizar os influenciadores e métricas de engajamento, que garantam conversões, leads e com relatórios detalhados das ações, muitas vezes com agências profissionais, departamentos de marketing engajados e acompanhando toda a ação, a mudança não vai impactar em absolutamente quase nada. Pelo contrário, irá estimular ainda mais o conteúdo de qualidade. Redes sociais, como diz o nome, são voltadas para o relacionamento e, mesmo sendo uma marca, é necessário e praticamente imperativo se relacionar com os seguidores. Se as postagens eram voltadas para as curtidas, há uma relação de uma via só, e não adianta ter milhões de seguidores, milhões de curtidas e zero de engajamento. Basta lembrar o caso de uma famosa influencer, que possuía quase três milhões de seguidores, fez um contrato com uma marca e, condicionada a vender um número ínfimo de produtos com sua campanha, não conseguiu atingir a meta, e acabou não tendo seu contrato renovado. E teve que explicar como não conseguiu vender dezenas de produtos, já que tinha milhões de fãs e curtidas. Aparentemente, o caminho a seguir é o de se mostrar interessante aos seus seguidores e estimulá-los a interagir. Fazendo esse trabalho, as vendas, leads e aumento de seguidores virão, inclusive com mais curtidas, mas sem mostrar ao mundo.

No fim, verá a satisfação de que o bom trabalho está sendo feito.

MARCOS BONILHA – é especialista em e-commerce, marketplace e elaboração de conteúdo, possui a carreira focada na comunicação e marketing digital. É pós-graduado em Gestão de Negócios na ESPM, com atuação em empresas como Polishop, Porto Seguro e Totvs.

OUTROS OLHARES

POR QUE FIZEMOS TUDO ERRADO?

Apesar de ter sido afetado pela pandemia bem depois dos países europeus, o Brasil não se preparou corretamente: ignorou as medidas de isolamento social, minimizou a necessidade de testes e se tornou um dos maiores epicentros mundiais do coronavírus

O Brasil deixou de ser o país da esperança e se tornou o país da decepção. Apesar de contar com a vantagem de ser alvo do novo coronavírus tardiamente em relação a outros países da Ásia e da Europa, o enfrentamento da pandemia foi e continua sendo inadequado. Graças a uma sucessão de erros, somos hoje a segunda nação com o maior número de contágios no mundo e a quarta com o maior número de mortes. Até a quarta-feira, 3, chegamos a 587 mil infectados, atrás apenas dos EUA, e 32.602 mortos, quase ultrapassando a Itália, que soma 33.601 vítimas. A cada período, recordes fúnebres são batidos pelo próprio País: na semana passada, foram 1.262 mortes em 24 horas. Estudos mostram que estamos longe do pico do número de infectados, ou seja, a curva continuará a subir.

Da frase que o presidente da República, Jair Bolsonaro, adora proclamar, “o Brasil é um país maravilhoso que tem tudo para dar certo”, falta a parte final: o Brasil tinha mesmo tudo para dar certo, mas graças à uma série de erros de gestão, não deu. São vários os motivos que tornaram o país um dos principais epicentros mundiais do novo coronavírus. Uma delas, certamente, é a guerra política entre presidente, prefeitos e governadores, o que se traduziu em um mar de notícias falsas espalhadas pelas redes sociais e grupos de WhatsApp. “As pessoas ficaram inseguras e em pânico com informações equivocadas. Usa máscara ou não usa? Devemos tomar vitamina D, cloroquina? Foram encaminhadas muitas inverdades, sobretudo sobre o risco da transmissão da doença”, diz o infectologista Sergio Cimerman, diretor científico da Sociedade Brasileira de Infectologia.

FALTA DE CONTROLE

Não há melhor arma que a ciência para enfrentar uma crise sanitária, mas justamente essa ideia básica parece rejeitada pelo governo, vide ataques a universidades, cortes a financiamentos de pesquisas e a demissão de dois ministros da Saúde com conhecimento técnico para lidar com o problema. Em meio à desinformação, o isolamento social, única arma comprovadamente eficaz contra o vírus, foi por água abaixo. Mesmo sem chegar a ser adequadamente implantado, já está sendo flexibilizado. Dados da startup InLoco apontam que, nesse início de junho, o índice de isolamento está abaixo de 50%. No final de maio, em meio ao crescimento da curva de contaminação, foi registrado o maior número de pessoas nas ruas desde o início da pandemia. Os discursos de Bolsonaro, que promovem aglomerações, são um entrave para a efetividade da medida, mas governadores e prefeitos também deixam a desejar. Na cidade de São Paulo, o rodízio de carros “pares e ímpares” instituído pelo prefeito Bruno Covas foi inadequado: tirou carros da rua, mas lotou o transporte público. Na semana passada, o prefeito Marcelo Crivella, do Rio de Janeiro, liberou as ruas para os camelôs sem nenhum estudo que justificasse a medida. Nos aeroportos do País a situação não é melhor. Fontes relataram que viagens realizadas recentemente não tiveram qualquer tratamento especial. Além de voos com lotação máxima, muitas companhias aéreas e aeroportos não estão aplicando qualquer medida de segurança, como medição de temperatura ou entrevistas com os passageiros. No carnaval, quando já se sabia que o vírus estava se propagando pelo mundo, as cidades registraram recordes no número de foliões: Olinda e Recife, em Pernambuco, e Salvador, na Bahia, entre outras, receberam milhões de turistas. A situação não é mais animadora quando falamos de equipamentos de proteção individual para as equipes de saúde e, principalmente, de testes: a demora para disponibilizar o diagnóstico na rede pública, bem como a falta de máscaras, agravou a disseminação da doença. O Brasil, país que tinha tudo para dar certo, seguiu na direção contrária. Os índices negativos apenas comprovam que nos tornamos uma nação incapaz de se preparar corretamente para essa pandemia.

ALIMENTO DIÁRIO

GOTAS DE CONSOLO PARA A ALMA

DIA 07 DE JUNHO

GETSÊMANI, A BATALHA DECISIVA

Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; o espírito, na verdade, está pronto, mas a carne é fraca (Mateus 26.41).

O Getsêmani é um jardim que fica no sopé do monte das Oliveiras. Significa “prensa de azeite”. Era um lugar conhecido e frequentado por Cristo. Na noite em que foi traído, Jesus se dirigiu a esse jardim com os discípulos e ali enfrentou uma luta de sangrento suor. Foi a mais decisiva batalha que se travou na história. Ali os destinos da humanidade estavam em jogo. A alma do Filho de Deus estava angustiada até a morte. Os horrores do inferno bafejavam sobre ele. A cruz e seu suplício indescritível estavam à sua frente. O Criador do universo estava prestes a ser entregue nas mãos dos pecadores. Aquele que é bendito estava prestes a ser escarnecido e cuspido pelos homens. Nesse momento, Jesus avança pelo interior do jardim para orar ao Pai. Sua oração foi intensa, agônica e regada de lágrimas. No Getsêmani, Jesus enfrentou o drama da solidão. Algumas coisas Jesus disse à multidão; outras apenas aos discípulos. Mas, quando suou sangue, estava inteiramente só. No Getsêmani, Jesus enfrentou o drama da tristeza. Jesus não ficou angustiado apenas por causa do sofrimento físico, mas sobretudo porque, sendo santo, se fez pecado; e, sendo bendito, foi feito maldição. No Getsêmani, Jesus lidou com a rendição. Jesus suou sangue não para fugir da vontade do Pai, mas para fazer a vontade do Pai. Finalmente, no Getsêmani, Jesus recebeu o consolo do Pai, por meio de um anjo. Por isso, saiu vitorioso dessa batalha e caminhou para a cruz como um rei caminha para a coroação.

GESTÃO E CARREIRA

AMOR EM TEMPOS DE CORONA

Em dias de isolamento social, empresas dos mais diferentes setores usam a criatividade para levar seus produtos às casas dos apaixonados. Tem de pipoca gourmet a artigos de beleza de grife internacional, passando por sorvetes, bebidas, jantar romântico…