EM BUSCA DE UM EQUILÍBRIO
É notória a crescente violência e agressividade no convívio social. Os seres humanos estão sem ponderação em todas as suas relações na atualidade

Não aguentamos mais ligar a televisão e nos deparar com uma reportagem sobre uma pessoa que, diante de uma situação qualquer, perdeu o equilíbrio. Há pouco tempo, na capital paranaense, um sujeito, cansado de tentar trocar urna máquina de lavar que apresentava defeitos, levou o eletrodoméstico para a frente da loja e, numa crise de total descontrole, destruiu a máquina a machadadas.
Cenas como estas se tornam cada vez mais comuns nas cidades. Vemos isso nas filas de supermercados, bancos e nas diversas situações da vida – pessoas, supostamente cansadas de esperar ou de cobrar por algo, perdem a cabeça e partem para agressões verbais, físicas e psicológicas.
Nas redes sociais o problema é ainda maior, pois há quem acredite estar incógnito diante das pessoas e, nesse caso, os critérios de agressão são de selvageria absoluta. Mas, diante de tantas constatações, nos perguntamos: O mundo está louco? As pessoas estão perdendo o equilíbrio?
De fato, presenciamos hoje cenas de agressão como em nenhuma outra época da era moderna. Sabemos das guerras, das barbáries e dos massacres humanos, isso é fato. Mas me refiro aqui à violência e agressividade do convívio social, das relações diárias entre os pares, seres humanos. Nunca houve tantos casos de violência e agressividade contra a mulher – feminicídio – como os que estamos vendo. Crianças e idosos padecem das mesmas condições e isso está claro em todos os números de saúde pública. O pai não dá conta do filho e o agride. A filha não dá conta da mãe e a agride e quem é agredido aprende a agredir. Assim o ciclo vai se ampliando e nós vamos construindo uma sociedade baseada na selvageria. Falta, de fato, coerência, equilíbrio e ponderação nas relações humanas da atualidade.
Poderíamos pensar ainda que o número de doentes mentais tem aumentado, isso também é fato. O uso de drogas potencializa o aumento desse quadro. Novas drogas, como ketamina ou special k, droga sintética de fabricação caseira a partir de um anestésico, geralmente usado por veterinários em cavalos, surgida há pouco tempo, tem ganhado espaço. Pessoas que têm uma dependência de droga são menos capazes de suportar, perceber, argumentar e dialogar. As drogas lícitas também têm aumentado. O uso de Ritalina, por exemplo, explodiu nos últimos 10 anos, no Brasil. Os medicamentos para controle de ansiedade também. E tudo isso funciona apenas como termômetro de que o ser humano está perdendo seu equilíbrio e esses “produtos” todos estão a serviço desta perda.
Alguns ainda creditam esse aumento dos quadros agressivos ao desmonte dos valores familiares e sociais – isso também procede. Se eu não tenho a percepção de que o outro tem seu espaço exatamente como eu tenho ou quero, ficam mesmo legitimadas a violência e a agressividade diante do conflito, e estes valores humanos de partilha, solidariedade, coletividade começam numa família, se ela não existe, onde começariam tais valores?
Por fim não posso deixar de lembrar aqui que há ainda o estresse, fator também preponderante nas cenas de agressão que vemos acontecer. Resumindo, todos esses quadros mostram a conclusão de que é urgente repensar as questões de violência e agressividade que permeiam nossa sociedade neste momento. Segundo a Psicanálise, a histeria é uma manifestação sintomática que faz parte da neurose. É marcada por uma atitude exagerada e escandalosa. A pessoa tem reações emocionais que beiram o teatral, são capazes de converter conflitos psíquicos em problemas físicos. O neurótico se mostra doente. É um convencimento alheio e de si mesmo que legitima, para o neurótico, o impulso de cometer a agressão – “Eu bati porque…”. Porém o mundo não é habitado apenas por neuróticos.
Tirando as questões patológicas da compreensão, porque elas necessitam de apoio médico e de programas governamentais para o combate, as questões que aqui muito me deixam apreensivo giram em torno da nossa postura diante do mundo. Se cada um de nós ao encontrar uma situação conflitante, ou em desacordo com o que pensamos, partir ligeiramente e diretamente para a violência física e também psicológica.
Nós precisamos reaprender as regras básicas para lidar com as boas e velhas frustrações. Uma criança não consegue viver com um não dado pelo pai diante do desejo dela de um novo celular. Assim como adultos não conseguem lidar com a frustração de não poder comprar o sapato, o carro ou a viagem que tanto desejavam e, assim, vamos de grupo em grupo observando o volume dos frustrados e pouco resolvidos cada vez aumentar mais. Par a conseguir reestabelecer o equilíbrio pessoal e social se faz urgente um exercício de resiliência e de busca por processos que nos façam lidar melhor com todas as frustrações normais e necessárias da vida.
Prof. Dr. GERALDO PEÇANHA DE ALMEIDA é psicanalista, educador e escritor. Autor de mais de 70 livros, dentre eles: Em Busca da Paz Interior, No Coração da Mente Livre, Meditações para Começar o Dia e Felicidade Sempre Viva. Fundador e diretor do Projeto Coração de Pólen – Centro de Tratamento, Estudo e Pesquisa na Área de Saúde Mental, em Curitiba.
Você precisa fazer login para comentar.