ALIMENTO DIÁRIO

A HISTÓRIA DO CASAMENTO

DIA 22 – A HISTÓRIA DE LISA

John e eu trouxemos diferentes formas de pecado sexual e de dificuldades para o nosso casamento. Enquanto John lutava suas próprias batalhas, eu tive de lutar minha própria guerra íntima. Nunca imaginei que escolhas sexuais aparentemente despreocupadas que eu havia feito quando era uma estudante universitária de dezenove anos voltariam para confrontar minha liberdade como uma mulher recém-casada de vinte e dois anos.

Quando meus pais conversaram comigo sobre sexo pela primeira vez, eles me explicaram que o sexo estava reservado para o casamento, mas não me disseram por quê. O que lembro foi que a ênfase principal da conversa era o medo de contrair uma doença e a vergonha de ter uma gravidez fora do casamento.

O casamento dos meus pais era muito instável e parecia haver muita inconsistência entre o que eles diziam e o que de fato faziam. Um exemplo característico dessa inconsistência é o fato de que meus avós por parte de pai terem tido múltiplos casos sexuais. O conceito de pureza ou virtude nunca entrou na conversa. Segundo o que eu podia observar, parecia que o segredo era fazer o que você quisesse desde que se comportasse de forma responsável e não fosse apanhado.

Adotei essa lógica de ação durante a faculdade e a somei a um senso de moralidade que construí ao conviver com minhas amigas: eu só dormiria com pessoas a quem amasse e, além disso, faria sexo com responsabilidade. Um aspecto dessa “responsabilidade” era usar contraceptivos. Quando necessário, eu até levava algumas de minhas colegas menos responsáveis ao meu médico para que elas também pudessem adotar a pílula.

Então conheci John e, ainda no nosso primeiro encontro, ele me conduziu ao Senhor. Eu tinha vinte e um anos. Nasci de novo, fui cheia do Espírito Santo e fui curada, tudo na mesma noite. Durante a nossa conversa, eu disse algo ridículo. Fiz o comentário: “Fico feliz por nunca ter tido um comportamento imoral”.

Tenho de me perguntar por que eu disse algo tão estúpido! Não faço ideia da resposta, a não ser o fato de que eu não entendia a diferença entre moral e santo. Lembro-me de que eu pensava que dormir com pessoas que você amava era igual a ter moral. Embora eu tivesse nascido de novo, naquelas primeiras horas, minha mente estava longe de ter sido renovada.

Mais tarde, quando começamos a namorar, esperava que John tivesse esquecido o que eu dissera. Imagine meu terror quando ele me disse: “Fico muito feliz porque nós dois nos guardamos”.

Tive vontade de gritar: “Não! Aquilo era um bebê cristão ignorante e recém-nascido falando!” Foi quando descobri o quanto as consequências das minhas escolhas pessoais poderiam ser dolorosas para os outros.

Então chegou o dia em que eu soube que John ia me pedir para passar o resto da vida com ele, e eu soube que tinha de lhe contar a verdade.

Eu sentia que não merecia John e acreditava haver perdido a preciosa oportunidade de construir minha vida com um homem que amava a Deus e se importava comigo. Saí para caminhar um pouco e clamei a Deus. Eu sabia que havia sido perdoada, mas estava dominada pelo remorso que sentia das consequências das minhas escolhas sexuais.

Fui ao apartamento de John para falar com ele, mas, antes que eu pudesse confessar meu segredo vergonhoso, ele disse:

—  Você se importa se eu ler um versículo da Bíblia? Senti o desejo de compartilhá-lo com você.

Concordei, então John começou a ler:

— “Pelo que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Coríntios 5:17, AA). Sei que isso parece estranho — ele continuou —, mas senti como se Deus me falasse para dizer a você que as coisas velhas passaram. Você é inteiramente nova, e é como… uma virgem.

Pensei que fosse vomitar.

— Eu não sou virgem — eu disse. — Era isso que eu ia lhe dizer. John segurou-me pelos ombros, olhou-me nos olhos, e disse:

— Se Deus diz que você é, quem somos nós para discutir? Naquele instante, toda a minha vergonha desapareceu.

RESTAURANDO A SEXUALIDADE QUEBRADA

Ainda assim, eu havia despertado a minha sexualidade na dimensão da luxúria e não do amor. Quando entrei no casamento e quis amar, eu não sabia como fazer isso. Na minha mente, sexo era ruim. Era errado. Era proibido. Agora que estávamos casados, o sexo de repente era bom e era algo de Deus e devia ser celebrado. Eu não sabia como fazer essa transição.

Se John e eu ficávamos sozinhos, eu tinha um súbito e aterrorizante flashback de uma imagem de algum filme pornográfico horroroso que havia assistido cinco anos antes na faculdade. Ou eu me fechava sexualmente com vergonha por causa das memórias que tinha de encontros sexuais passados com um ex-namorado. Era terrível.

Quando devia ser capaz de me entregar livremente a meu marido com total abandono, eu me via amarrada ao passado. John merecia tudo de mim, e eu não conseguia ter liberdade sexual por causa das minhas violações anteriores. Eu lutava contra pensamentos e imagens impuras, comparações e vergonha. Eu lutava contra essas coisas, mas parecia que nada adiantava. Foi nesse período da minha vida que aprendi sobre o poder de quebrar os laços da alma e as maldições hereditárias.

Falamos das maldições hereditárias anteriormente neste livro. Como mencionei, havia uma história de imoralidade e infidelidade na minha linhagem, à qual eu tinha de renunciar. Mas eu também tinha de quebrar laços em minha alma criados por encontros passados para que a minha sexualidade fragmentada pudesse ser restaurada. Vamos ler um versículo que trata desse assunto:

Vocês não sabem que os seus corpos são membros de Cristo? Tomarei eu os membros de Cristo e os unirei a uma prostituta? De maneira nenhuma! Vocês não sabem que aquele que se une a uma prostituta é um corpo com ela? Pois, como está escrito: “Os dois serão uma só carne”. 1 Coríntios 6:15-16

Não estou chamando meus ex-namorados de prostitutos, mas o princípio aqui é o mesmo. Eu havia me unido a eles e sido uma só com eles, e agora eu tinha uma aliança com outro homem. A cada união e separação, minha alma havia sido fragmentada até eu não ser mais inteira – e agora, eu estava quebrada sexualmente. Quando você está quebrado sexualmente, torna-se incrivelmente difícil você se entregar completamente ao seu cônjuge, porque você não está mais completo.

Para andar em pureza e desfrutar o dom da intimidade, precisamos estar inteiros, e só Deus pode restaurar nossa integridade quando ela foi maculada. Só Deus pode restaurar a honra da nossa sexualidade onde houve violação e desonra. Só Deus pode pegar o impuro e contaminado e torná-lo santo e puro novamente. Só Deus pode nos dar uma bela coroa pelas cinzas que nós levamos a Ele.

Se sua sexualidade foi maculada por causa da imoralidade no passado (quer seja promiscuidade, pornografia unida à masturbação ou qualquer outra impureza), gostaríamos de convidá-lo mais uma vez a dedicar um tempo para uma oração de restauração. Mais uma vez, prepare-se espiritualmente antes de orar, e ore somente com seu cônjuge, com um amigo próximo, com um parceiro de oração, ou apenas com a presença do Espírito de Deus. Diga em voz alta:

Pai celestial,

Obrigado por enviar Teu Filho para sofrer a punição pelo meu pecado. Porque estou em Cristo, todas as coisas velhas passaram da minha vida. Agora todas as coisas são novas. De acordo com 2 Coríntios 5:21, Jesus levou meu pecado para que eu pudesse me tornar a Tua justiça. Isto é o que sou hoje.

Agora confesso e renuncio ao meu pecado e aos pecados de meus antepassados por todo e qualquer envolvimento em pecado sexual e por toda impureza, perversão e promiscuidade. (Tenha o cuidado de citar aqui especificamente os pecados aos quais você está renunciando. Diga-os em voz alta diante de Deus sem vergonha. Não há nada em oculto – Ele já conhece cada um deles e anseia por remover de você o peso da culpa e da vergonha. Então, quando estiver pronto, prossiga.)

Pai, toma a espada do Teu Espírito e corta todo laço sexual impuro que prenda a minha alma à alma de… (ouça o Espírito Santo e diga cada nome à medida que for ouvindo. É bem possível que os nomes possam ser de pessoas com quem você não teve relações sexuais, mas com quem você se envolveu sexual ou emocionalmente de uma maneira que deveria estar reservada ao seu cônjuge ou ao seu Salvador somente).

Depois de dizer cada nome individualmente, ore:

Pai, libera Teus anjos para recuperar os fragmentos da minha alma presos a essas pessoas. Restitui-os a mim pelo Teu Espírito para que eu possa ser íntegro, santo e separado para o Teu prazer.

Pai, renuncio à influência de toda imagem pervertida e promíscua. Perdoa-me por permitir que imagens vis e pervertidas fossem colocadas diante dos meus olhos. Faço uma aliança de acordo com o Salmo 101:3, de guardar as fontes do meu coração através da porta dos meus olhos. Não permitirei que nenhuma coisa vil esteja diante dos meus olhos. Renuncio a todo espírito impuro e ordeno que ele e sua influência saiam da minha vida.

Pai, lava-me no sangue purificador de Jesus, pois só ele tem o poder para purificar e expiar. Eu me consagro agora como Teu templo; pelo poder do Teu Santo Espírito, remove toda contaminação do espírito, da alma e da carne deste santuário. Enche-me até transbordar com a presença do Teu Espírito Santo. Abre meus olhos para ver, meus ouvidos para ouvir e meu coração para receber tudo o que tens para mim. Sou Teu. Faz a Tua obra em minha vida.

Com amor, Teu filho.

A PSIQUE E AS PSICOLOGIAS

CRIMES, TESTEMUNHOS E FALSAS RECORDAÇÕES

Podemos acreditar no relato de alguém que presencia um crime? Se a testemunha tem boa memória, tendemos a confiar em suas observações, mas os mecanismos que elaboram as lembranças pedem cautela

Jura dizer a verdade, toda a verdade, nada mais que a verdade? “Juro.” Apesar da fórmula ritual, em geral estamos dispostos a acreditar nos relatos de uma testemunha ocular com boa memória e, obviamente, desinteressada, inclusive nos detalhes relativos às roupas e ao aspecto físico da pessoa que cometeu o delito. Mas a psicologia cognitiva ensina que a mais sincera das testemunhas pode se enganar. Não se trata de uma questão de boa-fé, mas de um problema ligado aos mecanismos que elaboram as recordações.

Entre juízes e magistrados é disseminada a convicção de que a psicologia diz respeito, quase exclusivamente, aos transtornos psíquicos. A disciplina é associada ao uso de testes psicológicos ou terapias, instrumentos para diagnosticar e tratar problemas psicológicos no nível individual ou sistêmico. Assim, o psicólogo só é solicitado como especialista quando o juiz deve conhecer características da personalidade, desenvolvimento intelectual e o eventual tipo de psicopatologia do réu.

Mas, na realidade, um campo da psicologia pode dar contribuições fundamentais a certos aspectos da atividade jurídica e de investigação, como o interrogatório e o testemunho: o estudo da memória e dos processos cognitivos. Não por acaso, há duas associações científicas de psicologia e direito – uma europeia e uma americana – formadas por pesquisadores que se dedicam à interface entre psicologia e aspectos jurídicos.

Para se ter uma ideia da importância da psicologia cognitiva nessa área, basta mencionar que, nos Estados Unidos, durante a administração Bill Clinton, alguns estados modificaram a lei seguindo resultados de pesquisas realizadas no campo cognitivo-jurídico. Essas pesquisas apontaram problemas no modo pelo qual era realizado o lineup, o procedimento que tenta identificar culpados mediante a exibição de retratos ou pessoas. O típico lineup simultâneo leva à identificação de um dos indivíduos mostrados, ainda que o culpado não esteja entre eles. As falsas identificações chegam a atingir níveis muito altos, em torno de 70%.

A psicologia cognitiva é importante para avaliar os testemunhos porque estes se baseiam na memória. Compreender como funciona a memória, quando uma recordação é correta ou incompleta, errada ou inteiramente falsa, permite estabelecer se um testemunho é exato e se pode ser utilizado como prova.

Objeto de investigação dos gregos antigos e dos romanos, o estudo científico da memória só foi iniciado no final do século XIX, com Hermann Ebbinghaus. Apesar disso, seus mecanismos são bastante conhecidos, graças ao surgimento da psicologia e da neuropsicologia cognitivas. Sabemos hoje que a memória humana não é composta de um sistema único, mas de vários, parcialmente independentes. Entre os principais sistemas estão a memória “semântica”, de longa duração, que contém informações relativas aos fatos e aos conceitos, e a “episódica”, também de longo prazo. Nela estão contidos os dados sobre eventos singulares, como o local e o momento em que aconteceram. Lembrar de uma lista de palavras apresentadas uma hora atrás, de um roubo ou do rosto do culpado são tarefas da memória episódica. A parcial independência entre essas duas formas de memória foi formulada e demonstrada por Endel Tulving em uma série de pesquisas realizadas nos anos 70. Recentemente, essa tese foi confirmada por estudos neuropsicológicos sobre pacientes que sofrem de uma forma de déficit seletivo (nos quais só uma pequena área cerebral estava lesionada ou que só tinham alguns aspectos comportamentais delimitados comprometidos).

Estudos na área da psicologia e da neuropsicologia cognitivas possibilitam a compreensão do funcionamento de um dos aspectos humanos mais opacos e difíceis de observar a mente. As experimentações feitas em pessoas normais, os estudos de casos singulares de pacientes neurológicos com problemas específicos e a técnica de imageamento cerebral permitiram formar um quadro aprofundado do funcionamento da memória. Além da memória episódica e da semântica, as investigações delinearam o funcionamento de uma memória de trabalho de curta duração, de uma memória autobiográfica de longa duração, de uma memória explícita e de uma implícita.

Esses sistemas são permeáveis entre si, os conteúdos e processos de um informam os conteúdos e processos dos outros. A interação entre as memórias episódica e semântica é crucial para o testemunho. Envolvendo a recordação de um ou mais eventos específicos, um testemunho recorre à memória episódica e segue suas regras de funcionamento. Várias pesquisas demonstraram, porém, como o conteúdo dessa memória é influenciado por elementos presentes na memória semântica e como os conhecimentos gerais estão ativos no momento em que se assiste à cena ou se tenta recordá-la.

Na literatura científica, há exemplos interessantes que mostram como a ativação do conteúdo da memória semântica influi e modifica o conteúdo da memória episódica. Quando um estudante universitário é instado a recordar as notas que recebeu nos exames de meio de semestre, em geral lembra das mais altas ou mais baixas, dependendo da nota final obtida. Se a nota final for alta, as intermediárias recordadas serão maiores que na realidade o foram, se for baixa, serão recordadas notas menores que as efetivamente obtidas no meio do semestre.

Um efeito similar, embora mais extremo, foi descoberto por uma pesquisa recente sobre a memória autobiográfica. Os participantes foram informados que, no ano em que nasceram, várias maternidades tinham música nos berçários. A informação, apesar de falsa, teve o efeito de fazê-los “recordar” a música. Fenômenos como esse se devem ao fato de que, no momento da recordação, os dados mais recentes da memória são os mais facilmente ativados. Estes interagem e passam a fazer parte do conteúdo da memória episódica ou autobiográfica, produzindo modificações relevantes na recordação originária, como no caso das notas, ou criam lembranças inexistentes, como no caso da música no berçário.

Tais resultados sugerem que a memória não é comparável a um filme ou a uma sequência de fotografias, que poderiam ser reproduzidas e revistas à vontade e sem que seus conteúdos sofressem qualquer alteração. A memória não é reprodutiva. Ao contrário, está articulada a uma série complexa de processos – entre os quais aqueles relativos à atenção e à percepção, cujo papel é preponderante – mediante os quais informações são codificadas de modo fragmentário e distribuídas em várias áreas do cérebro. O hipocampo parece ser responsável pelos processos de codificação. Algumas áreas do lobo parietal e temporal seriam decisivas na representação de informações a longo prazo. Caberia ao lobo frontal planificar e  organizar os processos ativos no momento da codificação e da recordação.

A informação codificada, portanto, jamais será a cópia exata do que foi visto ou do que ocorreu. A recuperação efetuada pela memória pode ser o resultado de processos de reconstrução, que reativam e criam informações de natureza episódica e semântica relevantes para o que se deseja lembrar. Essas informações são integradas entre si e a “recordação” é o resultado final dessa integração.

Assim, no momento em que se testemunha um assalto, o fato não é codificado como se fosse uma cena coerente e completa em si mesma. Codifica-se, sim, o fato de que um assalto está ocorrendo, processo que ativa na memória semântica as informações relativas ao que ocorre normalmente durante um evento desse tipo. Além disso, são codificados elementos dispersos relativos ao lugar, aos objetos e às pessoas, mas nem tudo é registrado, e muita coisa se perde. Se houver uma arma, por exemplo, a atenção será concentrada nela e suas características provavelmente serão codificadas de forma clara (no que se conhece como weapon effect), em detrimento de outros elementos, sobre os quais a atenção não se detém. Muitas vezes a testemunha sabe reconhecer perfeitamente a arma do delito, mas não consegue identificar quem a segurava, ainda que o lineup seja conduzido de forma correta.

A informação codificada permitirá à pessoa recordar que presenciou um assalto, reconhecer a arma e, talvez, identificar outros elementos da cena. Mas jamais será possível extrair da memória a recordação completa da cena, como se fosse um filme. Dado que a memória é sempre reconstitutiva, ainda que em graus variáveis, uma testemunha nunca terá o relato exato do ocorrido.

Outro aspecto importante é que o próprio ato de rememorar pode modificar o conteúdo daquilo que se recorda e que será lembrado mais uma vez. Pesquisas recentes demonstram como a lembrança de um elemento reforça sua representação na memória, inibindo e enfraquecendo gradualmente a representação de outros elementos.

Um exemplo claro da interação entre as memórias episódica e semântica é a influência exercida por estereótipos e preconceitos sobre a lembrança episódica. Um estereótipo é uma forma de conhecimento, ou melhor, de convicção, estruturada de forma rígida e, portanto, dificilmente modificável, mesmo que sejam apresentadas informações contrárias a ela. A presença de estereótipos em nossa consciência está vinculada à tendência de nosso sistema cognitivo, em particular aos processos de raciocínio, de privilegiar a rapidez e a eficiência, sacrificando às vezes a precisão ou a verdade.

Nos Estados Unidos é comum entre brancos o preconceito de que os jovens negros são criminosos. Quando há um delito, costuma-se deduzir que o infrator seja negro. Suponhamos que uma pessoa branca presencie um assalto e vislumbre o culpado. Se ela compartilhar do preconceito, este será ativado de modo quase automático na memória no momento em que assistir à cena ou quando tentar recordá-la. O conteúdo do preconceito contaminará assim a lembrança que se tem do ladrão. Ao prestar depoimento, ela provavelmente “recordará” um infrator negro e jovem, ainda que não o tenha visto de forma clara.

A recordação de um negro no papel de ladrão não é um sinal de má-fé ou de confusão mental, mas produto da ativação inconsciente de informações prévias. Esse procedimento de acesso aos dados contidos na memória semântica e sua interferência nas informações da memória episódica é responsável também por outras formas de recordações equivocadas (e, portanto, de depoimentos errados).

Vimos até aqui, que oconteúdo de um testemunho depende da codificação e da recordação e que um papel importante é desempenhado nesses processos pela interação entre os conteúdos das memórias semântica e episódica. Mas o conhecimento que a testemunha possui não é o único fator que pode modificar a recordação. Uma importante fonte de alteração é a informação verbal fornecida durante ou após um interrogatório ou uma entrevista investigativa. Descobriu-se, por exemplo, que se os interrogatórios contêm perguntas que sugerem a resposta ou apresentam versões incorretas dos fatos, novos conteúdos podem ser incorporados na recordação do evento original (missinformation effect). Isso torna problemático decidir se o testemunho é verdadeiro ou não. Falar de pessoas ou objetos que não estavam presentes na cena originária determina um significativo aumento na recordação deles, como se de fato tivessem participado. Sugestões sutis, como a substituição de um artigo indefinido por um definido (“era o homem” em vez de “era um homem”), são capazes de alterar substancialmente a lembrança: é mais provável que as pessoas se lembrem da presença de um homem quando o artigo é definido. Esse efeito é criado pelas informações ativadas automaticamente na memória. Perguntar “era um homem” não fornece dados precisos, ao passo que indagar “era o homem/ativa a ideia de que um homem estava de qualquer forma presente, e a sua presença é codificada na memória.

São comuns os interrogatórios realizados de forma incorreta ou os procedimentos de investigação em que são apresentados fatos e dados, sobre os quais a testemunha nada falou, como se fossem verdadeiros. O resultado de casos registrados e analisados é sempre o mesmo: a testemunha acaba por aceitar os conteúdos sugeridos e, com o tempo, passa a considerá-los parte da recordação do evento originário. O fenômeno é evidente sobretudo nos interrogatórios e nas entrevistas investigativas realizadas com crianças. Quando os inspetores sugerem informações, elas inicialmente negam, mas depois cedem às insistências e aceitam o que lhes é dito.

Além disso, a pressão da conversa durante a entrevista também pode levar as pessoas a criar falsas recordações. Não é difícil encontrar casos em que a testemunha é instada a afirmar falsidades, insistindo-se quando ela nega e estimulando-a, de modo mais ou menos explícito, a descrever o fato como se este tivesse realmente ocorrido.

Um exemplo que gosto de citar é o do suposto abuso sexual sofrido por uma menina. O psicólogo que conduzia a entrevista solicitou que esta fosse filmada. A menina recusou, mas o psicólogo insistiu e ela por fim aceitou a presença de uma câmera, prosseguindo seu relato e informando quem teria sido e como se chamava a pessoa que abusara dela. Essas informações foram repetidas pela menina em várias investigações, após meses e anos.

O estudo mais recente sobre o tema demonstra que, uma vez induzidas a falar e por vezes a inventar detalhes falsos sobre um fato não ocorrido, um percentual elevado de crianças recorda, após muito tempo, do conteúdo dos próprios relatos, como se fossem parte de experiências realmente vividas, e só de forma hesitante conseguem distinguir a realidade da fantasia. Em suma, o conteúdo da narrativa pode se tornar realidade. Um fenômeno similar também foi observado entre adultos, mas no caso das crianças os percentuais foram altíssimos. Mais de 80% afirmam que o conteúdo do narrado durante a conversa era parte do evento vivido.

Infelizmente, os processos responsáveis por tais erros são latentes e escapam à consciência dos indivíduos, seja dos que formulam as perguntas, seja dos que devem responder. Assim, uma testemunha pode, de boa-fé, relatar coisas que não são verdadeiras e modificar bastante o conteúdo dos episódios que narra.

Vimos como o conteúdo da recordação de um evento ao qual se assistiu pode ser alterado. Nesses casos, porém, são modificadas apenas partes da recordação de um fato que, de qualquer forma, ocorreu e foi testemunhado pela pessoa.

Mas, durante a década passada, as pesquisas demonstraram como é relativamente fácil ocorrer a criação de lembranças inteiramente falsas.

A partir de um estudo realizado em 1995 pela equipe de Elizabeth Loftus várias pesquisas mostraram como as pessoas criam recordações autobiográficas falsas. Em um desses estudos, universitários foram informados de que, quando crianças, haviam se perdido em um centro comercial, algo que, de fato, não ocorrera. Para dar mais peso, o episódio era contado a eles por um irmão ou irmã mais velhos, devidamente instruídos pelos pesquisadores. Um certo número de estudantes, após ouvir o relato, disse “recordar’ o evento, enriquecendo-o com detalhes e elementos novos. Essas recordações eram verdadeiras ou falsas. Provavelmente falsas, já que, segundo a família, essas pessoas jamais haviam se perdido num centro comercial.

Como uma pessoa pode recordar eventos que jamais ocorreram? Uma pesquisa recente que realizei com alguns colegas mostra que o simples ato de imaginar um evento pode levar à criação de lembranças autobiográficas falsas. Solicitamos que estudantes imaginassem ou lessem sobre dois acontecimentos. Um destes era um fato comum: ir ao dentista para extrair um dente. O outro, um evento que jamais poderia ter ocorrido aos pesquisados, a extração de um fragmento da pele do dedo mínimo feita por uma enfermeira, procedimento inexistente no país dos participantes. Os estudantes foram então solicitados a fechar os olhos e imaginar a si mesmos aos 6 anos, quando estavam no dentista ou no consultório médico. Deveriam imaginar a cena com detalhes: pessoas que os acompanhavam, roupas, cores, conversas, o tempo transcorrido e o que haviam sentido e pensado naqueles momentos.

Os resultados foram impressionantes. O processo imaginativo, que durava menos de dez minutos, levou muitos deles a aumentar significativamente a certeza que tinham dos eventos, e não só no que se refere à extração do dente, que pode ter lhes acontecido, mas também à remoção da pele, que, como sabemos, é falsa. Cerca de 25% afirmaram lembrar da intervenção no dedo. A imaginação ´permitiu que criassem uma lembrança relativamente completa, ainda que incorreta, de um evento que jamais ocorreu. As falsas lembranças, além disso, eram detalhadas e difíceis de distinguir das verdadeiras. Ouvimos, por exemplo, relatos como este: A escada era cinza, os degraus reluziam. A enfermeira era alta e loira. Ela pegou em minha mão, mas não senti nada. Minha mãe me comprou balas, pois eu me comportei bem”.

A importância da imaginação já havia sido enfatizada por outros pesquisadores. Seu papel pode ser explicado fazendo-se referência, de um lado, a seus efeitos sobre a memória, de outro, ao fenômeno do chamado “monitoramento da fonte de informação”(source monitoring). Há muito se estudam as imagens mentais, e hoje algumas de suas características são relativamente bem conhecidas. Sabemos, em particular, que elas têm aspectos de natureza representativa e funcional em parte similares aos da percepção, isto é, ao conteúdo mental derivado de um ato de percepção visual. Simplificando processos que são na realidade muito complexos, pode-se dizer que o fato devermos uma xícara envolve a criação de uma imagem mental do objeto. Durante certo tempo, a representação conserva algumas de suas características físicas, como cor, luminosidade, e detalhes.

Em geral, para sabermos se a xícara criada na mente é fruto da imaginação ou foi mesmo vista, empregamos uma série de processos de natureza metacognitiva (mecanismos de avaliação relativos aos processos cognitivos), por meio dos quais as características da xícara mental” são confrontadas com as características de uma imagem mental e com as de uma percepção. Essa série de processos metacognitivos é definida como source monitoring, já que permite distinguir a fonte da qual provém a informação que se tem na mente. Imagens mentais detalhadas e vívidas podem enganar os processos de source monitoring e levar a confundir algumas representações mentais com objetos vistos de fato. “Enganos” similares impedem às vezes sabemos se a cena que se tem em mente foi vivida ou sonhada.

A imaginação não é o único meio de criação de falsas recordações autobiográficas. A intervenção de outras pessoas (terapeutas, parentes, entrevistadores) pode levar uma pessoa a acreditar que viveu certo acontecimento e, em seguida, recordá-lo, ainda que isso não seja verdade. Alguns estudos mostram como a interpretação dos sonhos ou a hipnose levam alguém a acreditar que viveu um fato e a desenvolver a lembrança correspondente a ele.

Para estudar o efeito da técnica hipnótica da regressão sobre a memória autobiográfica, Nicholas P. Spanos e colaboradores solicitaram aos seus pesquisados que retrocedessem no tempo até os primeiros meses de vida. Nesse ponto, foram instados a visualizar o brinquedo colorido suspenso em seu berço. Após esse procedimento, cerca de 30% diziam recordar do brinquedo, descrevendo-o com detalhes. As pessoas do grupo de controle, que não foram instadas a visualizar o brinquedo, não eram capazes de recorda-lo.

Estes exemplos sugerem que é relativamente fácil criar falsas recordações autobiográficas. E de fato é. Mas a maioria das pesquisas sobre o tema revelou que cerca de 25% a 30% dos participantes criam uma recordação falsa, enquanto os outros parecem relativamente imunes. Esse dado, por um lado, suscita a pergunta, quais são as características dos indivíduos que criam lembranças falsas e em que se distinguem dos outros? Por outro, indica que a criação de recordações autobiográficas falsas ocasionadas pela intervenção externa não é a norma. Não se trata, porém, de uma exceção, já que o percentual envolve cerca de um terço da população investigada, o que não é pouco

Vale notar que o percentual citado refere-se à criação de recordações falsas de natureza autobiográfica, isto é, de situações em que a pessoa recorda como teriam ocorrido fatos que na verdade jamais aconteceram, ao menos no período de tempo especificado. Mas vimos que as pessoas também criam lembranças falsas na memória episódica não autobiográfica. O exemplo mais simples e claro é o da recordação de uma lista de palavras como sonho -noite – travesseiro – cansaço – cama, todas associadas à uma palavra ausente da lista: “sono”. Ora, os vários experimentos realizados com essa técnica confirmaram que a palavra sono é, em geral (até 80% dos casos, recordada como se tivesse sido apresentada. Isso indica como o fato de recordar coisas que não ocorreram pode ser um fenômeno muito difuso, que não se limita a um percentual relativamente baixo da população.

Parece razoável perguntar se, dada a facilidade com que criamos recordações erradas ou falsas, é possível acreditarem um testemunho. Seria digno de um furo jornalístico dizer que  não, mas nosso propósito não é esse.

Os fenômenos bizarros que descrevemos, segundo os quais um indivíduo pode, de boa-fé, recordar eventos jamais ocorridos, suscitam reflexão e sugerem prudência na avaliação da veracidade do relato de uma testemunha. Cabe notar, porém, que a memória humana é exata o suficiente para permitir ao homem sobreviver num mundo e numa sociedade complexas. A memória, em geral, é um instrumento no qual, com razão, confiamos no dia a dia.

A testemunha muitas vezes recorda de modo relativamente preciso alguns aspectos do que ocorreu. Mas a memória, num depoimento, não é formada apenas por conteúdos esquemáticos e dados de base. Trata-se de uma memória de detalhes, às vezes minuciosos (“O senhor lembra se o chapéu do ladrão tinha aba?), e essa memória pode ser mais facilmente manipulada que a memória cotidiana. É preciso, pois, extrema cautela.

OUTROS OLHARES

A DIFÍCIL DECISÃO DE ENVELHECER

A longevidade foi a grande promessa da Modernidade. O que fazer agora?

“Acho que decidiu envelhecer.” A frase perdida lá pelo meio do livro A ridícula ideia de nunca mais te ver, o mais recente da escritora espanhola Rosa Montero, surpreende o leitor. Sobretudo aquele interessado no tema da longevidade. O texto de estilo indefinível é um relato sobre o luto baseado ou transpassado nos diários da cientista Marie Curie (1867-1934) e ora se faz de biografia. ora de romance, ora de reportagem, mas sempre de maneira potente.

A conclusão de Montero sobre sua personagem torna impossível apagar da cabeça um monte de perguntas filosóficas que insistem em andar atrás da falsa ingenuidade da frase. A tal “decisão” de Curie, conta a escritora, teria sido tomada depois de a cientista, única mulher vencedora de dois prêmios Nobel, viver um dos anos mais difíceis de sua vida.

Curie ficou repentinamente viúva de Pierre, atropelado por uma carruagem; enfrentou um linchamento público sob a acusação de ser o pivô do fim do casamento de seu novo companheiro, um ex-aluno bem mais jovem; lutou contra o machismo da academia sueca para receber, ela mesma, seu prémio, subindo em um palco reservado exclusivamente aos homens. “Estava destruída”, conclui Montero em um momento biógrafa. No ano seguinte, Curie, sempre segundo a romancista, voltou a ficar de pé. “Mas de alguma maneira nunca mais foi a mesma.” Eis outra frase reveladora da ideia do envelhecer. Pelo menos no início do século passado.

O que terá mudado? Nas últimas semanas, um exército de internautas pelo mundo todo –    com perdão da redundância – decidiu envelhecer. Saíram colocando fotos e mais fotos em um aplicativo e, em fração de segundos, estava tomada a tal da “decisão”. Simples assim. Só que não. Curie que o diga. Naquele ano de 1913, Albert Einstein (1879- 1955) disse que ela parecia “fria como um peixe”. Montero o reprova: “Mal sabia ele que estava vendo apenas a capa endurecida pela intempérie de um núcleo de lava”.  O mergulho dos internautas no túnel do aplicativo remete à mesma frieza. Ilusão. Einstein deixou-se impressionar por uma senhora ativa a fazer ciência de ponta em seu laboratório a despeito das desgraças da vida.

As representações gratificantes da velhice, no entanto, são dúbias. Ao mesmo tempo que ajudam a desconstruir os estereótipos, o preconceito ou o idosismo (minha tradução de ageism, a discriminação etária), ampliam o risco de a sociedade alimentar o processo de “reprivatização da velhice”, um termo já clássico na literatura das ciências sociais, cunhado em 1999 pela antropóloga Guita Grim Debert.

Assim como se entra em um aplicativo e enruga-se voluntariamente o rosto e branqueiam- se os cabelos, vive-se o perigo de atribuir a uma “decisão” do indivíduo aquilo que é coletivo, construído socialmente, e fazer a velhice desaparecer do leque de preocupações sociais. Cada um poderia tomar a “decisão” de maneira unilateral, a seu tempo e de forma fria. Sempre sem dor. E quem a toma sem precauções ou na hora errada, sublinha Debert, é julgado pela sociedade e condenado por ter sido negligente.

Faz tempo que essa falsa “decisão” é objeto de reflexão de pensadores. Em 2007, a Presse Universitaires de France (PUF) publicou um livro de professores e pesquisadores do envelhecimento com a coincidente indagação: Quand est-ce que je vieillis? (Quando é que eu envelheço?, em tradução livre). O ponto de interrogação no fim do título incomoda tanto quanto aquele torturante band-aid no calcanhar da música de Aldir Blanc. Claro, bem antes, tivemos Cícero (106 a. C- 43 a.C.) a nos alertar que “somente os idiotas se lamentam de envelhecer”. E tivemos Sêneca (4 a.C. – 65 d.C.) a convencer Paulino de que mais importante do que ocupar um alto cargo ou acumular riqueza era estudar filosofia. Por que? Porque a vida é breve.

Mas agora a vida é longa. Ao menos na promessa da longevidade, a grande revolução ou a grande conquista da Modernidade. Ah, a modernidade! Prometera-nos tanta coisa. Liberdade, democracia, bem-estar, e deixou muito a dever com sua ideia de progresso. Mas uma coisa terá sido cumprida. Nos deu uma vida mais longa. A tecnologia aplicada à medicina prolonga – até quando? – a expectativa de vida. O que mudou com a longevidade? Muitas coisas. Com uma exceção, segundo os filósofos franceses Eric Deschavanne e Pierre-Henri Tavoillot em Philosophie des dges de ln vie (Filosofia das idades da vida, em tradução livre): a idade como o critério irremovível na identidade legal. Escrevem eles: “podemos mudar de aparência, de nome, de nacionalidade e até mesmo de sexo, mas não de idade”. Talvez.

Essa assertiva de Deschavanne e Tavoillot é inquestionável no aspecto normativo, obviamente. Mas, se a modernidade falhou em vários aspectos, a Pós-Modernidade, se encarada como sua contendora, teria ganho um ponto ao afirmar o desaparecimento ou a compressão do espaço e do tempo. Como disse Paul Virílio (1932-2018), as duas referências sucumbiram como dimensões significativas do pensamento e da ação humanos. Se passamos a habitar ”o globo” e estamos “on-line”, em qualidade vivemos? Quando envelhecemos?

Em Economie du vieillissement (Economia do envelhecimento, em tradução livre), o economista Grégory Ponthiére, da Paris School of Economics, nos oferece uma alternativa bastante relevante. Vivenciamos o deslocamento da idade segundo ele, para o campo econômico. No século XXI, a humanidade vive uma perigosa exacerbação de uma definição da idade pela funcionalidade, produtividade ou status socio- econômico do indivíduo. Nessa perspectiva, a velhice pode chegar a qualquer momento?

A gerontologia – o estudo do envelhecimento – sempre trabalhou com a idade cronológica e a idade biológica em sua ardorosa tentativa de descolar velhice e doença. A velhice, de acordo com esse entendimento, é um processo biopsicossocial, o resultado de um ciclo de vida e o momento no qual desagua tudo o que foi acumulado neste percurso jamais preciso, como nos disse Fernando Pessoa.  No entanto, quando reforçamos nessa interpretação o pilar socioeconômico, o resultado é desafiador – ou desesperador neste século XXI.  Existem várias velhices!

Vivemos mais e melhor. E isso vale, relativamente, para todas as classes sociais em comparação com as gerações anteriores. A economia contemporânea, todavia, assumiu uma hegemonia como determinante da idade do indivíduo deste século, e o fato de isso ocorrer justamente quando o mundo envelhece é algo opressor. Segundo Ponthiére, além das idades biológica e cronológica, temos uma idade econômica. Essa última, ainda pouquíssimo explorada, passa a influenciar as outras duas. A economia esvazia qualquer poder de decisão e pode até devolver o indivíduo a um conceito de idade que pensamos superado pela modernidade, no qual a velhice precisava ser ocultada dos olhos alheios.

A velhice, como e sabe, era invisível. (Era?) Apenas os povos tribais valorizavam seus velhos e o conhecimento adquirido. A partir da ascensão de uma certa estética humana, o envelhecimento foi escondido, pois era um sinal de perda de poder. Os monarcas absolutistas envelheciam escondidos, a ponto de despertarem dúvidas sobre a data exata de sua morte. Era o refúgio aos aposentos, daí a palavra aposentadoria. Uma decisão difícil.

William Shakespeare (1564-1616) explorou o dilema em Rei Lear, curiosamente, baseado na primeira tragédia inglesa de inspiração senequiana. O intento de Lear era, como diz na cena inicial, “livrar nossa velhice de cuidados”. Calculou mal. Ou teria, já naquela época, tomado sua decisão sem considerar uma idade econômica? Desleixou o parentesco de direitos e deveres. Foi vítima da quebra do pacto de solidariedade intergeracional. A tempestade lembrou-lhe que o envelhecer é, por natureza, um fato social. Jamais poderá ser algo privado.

Se é assim, e se é tão difícil para os indivíduos, que o diga para a sociedade. Quando a sociedade decide envelhecer? Eis a questão para o Brasil. As estatísticas sobre o envelhecimento da população são públicas e conhecidas, entretanto agimos como um ingênuo Lear a vislumbrar apenas a parte de maior interesse egoístico ou ganancioso, sem nos darmos conta da complexidade do todo. Goneril e Regan, as filhas ingratas, estão a nossa espreita.

A questão que se coloca é menos a de o Brasil envelhecer antes de ficar rico, como se repete à exaustão, ou a velocidade de nosso envelhecimento – embora esse seja um ponto importante -, mas, sim, em qual economia estamos envelhecendo. Os países ricos desfrutaram da economia desenvolvimentista do pós-Segunda Guerra Mundial, endividaram-se em condições generosas no Plano Marshall – sobretudo os europeus ocidentais -, modernizaram seus parques industriais importando petróleo do Oriente Médio a preços irrisórios, praticaram o protecionismo espalhando subsídios agrícolas durante décadas. Em 1955, o barril bruto de petróleo custava USS 1,93 e, em janeiro de 1971, continuava a custar apenas USS 2,18. Em termos reais, observou o historiador Tony Judt (1948-2010), o petróleo nesse período glorioso do capitalismo tomou-se inacreditavelmente mais barato, desafiando a lei da oferta e da procura.

Esse é apenas um resumo do quadro econômico que permitiu aos países ricos viverem um interstício do capitalismo chamado Trinta Anos Gloriosos (1945-1975), o de mais prolongado crescimento econômico mundial em tempos de paz. Nesse período, os países ricos construíram seus campeões nacionais, reforçaram suas universidades e seus sistemas de ensino e, principalmente, ergueram o chamado Estado de Bem-Estar Social, que vai, até hoje, muito além da Previdência social. Decidiram, eles sim, envelhecer.

Depois dos anos 70, com os dois choques do petróleo a ampliar a vulnerabilidade da economia americana já cambaleante devido aos gastos na Guerra do Vietnã, tudo mudou na economia global. O presidente do Banco Central Paul Volcker reagiu à ameaça de inflação com uma pancada nas taxas básicas de juros. É o chamado “golpe de 1979”. O capital financeiro assumiu a hegemonia definitiva sobre a vida de todos nós. Mas o mundo rico já estava velho. A decisão de envelhecer – lembre-se de Marie Curie! – éirreversível. Assim como o indivíduo nunca mais será o mesmo, as sociedades também não.

O envelhecimento das populações alterou de maneira categórica a geopolítica global. E está estabelecendo uma nova corrida entre os países. Se na Guerra Fria era a corrida armamentista, agora é a “corrida populacional”. Os países ricos pagaram com duas guerras mundiais em seus territórios o preço da construção do Estado de Bem-Estar Social. Jamais assistirão à economia capitalista do século XXI destruir e o patrimônio, esse “seguro coletivo” em nome da paz, de braços cruzados.

Quem financiará o envelhecimento de quem? No século passado, a grande fonte de financiamento do bem-estar foi o petróleo barato. Essa riqueza natural ainda está em cena, mas outras fontes precisam ser exploradas alhures. O “seguro coletivo” dos países do Hemisfério Norte ainda é portentoso, embora sob risco.

O Brasil, além do petróleo, tem outras duas fontes econômicas almejadas na geopolítica do envelhecimento: a Amazônia e o sistema de Previdência por repartição. As novas caravelas já partiram para além-mar. O objetivo nessa corrida é o de sempre. Elas vêm explorar a riqueza alheia, desta vez, não mais para sustentar a construção de grandes catedrais de ouro, mas para manter a maior delas, o Estado de Bem-Estar Social. Os países ricos sabem que nenhuma Cordélia virá salvá-los em meio à tempestade.

O Brasil precisa tomar essa decisão difícil de envelhecer. Envelhecer de verdade. Não o envelhecimento fake do aplicativo. Isso implica, antes de mais nada, fazer valer o que está no papel, o marco normativo da Política Nacional do Idoso (Lei 8.842/1994) e do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003). Mas, principalmente, o país precisa enxergar o fenômeno do envelhecimento muito além da Previdência, onde o tema, sempre com lentes fiscalistas, está confinado faz tempo.

Além da defesa de suas principais riquezas, o Brasil necessita agir para que a sociedade, o Estado e os indivíduos assumam seus papéis na difícil tarefa de envelhecer. Aliás, tal como está escrito no artigo 230 da Constituição Federal. O maior risco, neste momento, é o envelhecimento populacional ser um fator a mais a acentuar a desigualdade social. Uma interpretação da dinâmica demográfica apenas con1 lentes fiscalistas, indubitavelmente, resultará nesse desastre.

Os países ricos, a despeito do desafio de emprestarem sustentabilidade a seus sistemas de seguridade social, já perceberam o envelhecimento como a grande transformação econômica do século. Se por um lado a transição demográfica implica custos, por outro gera riqueza. O investimento em educação epesquisa na área do envelhecimento aparece nos documentos oficiais da União Europeia como prioridade. De 2014 a 2018, apenas o Projeto Horizon 2020 investiu €2 bilhões na área do envelhecimento, recursos somados ao orçamento dos países e das agências de fomento à pesquisa e ao desenvolvimento.

O objetivo dessas pesquisas é dominar outra área emergente, a gerontecnologia, a tecnologia para os cuidados de longa duração de pessoas idosas. Esses produtos de alto valor agregado constituem uma parte importante daquilo que é denominado “economia da longevidade”, um filão de (re)industrialização dos países ricos a partir de uma nova cesta de consumo das famílias – com menos crianças e mais idosos. Os países ricos estão preocupados em construir um complexo industrial da saúde e do cuidado. Solidariedade, ecologia e tecnologia formam a tríade-chave quando uma sociedade decide envelhecer bem. Deschavanne e Tavoillot falam da necessidade de emergência de um “Estado solidário”, enquanto o sociólogo Serge Guérin prefere um “Estado acompanhante”. O envelhecimento transforma o meio ambiente: o uso de recursos naturais e o consumo de energia são diferenciados nos domicílios com mais idosos. A tecnologia amplia, ainda mais, seu poder de intermediação no cuidado cotidiano e nas atividades básicas e instrumentais da vida, principalmente com seu impacto no mundo do trabalho.

A decisão de envelhecer implica promover a saúde, a educação ao longo de toda a vida, a adaptação das cidades, a adaptação das moradias, as boas condições de trabalho, a segurança alimentar. Não adianta confinar o tema apenas na Previdência. O perfil epidemiológico do Brasil, por sinal, assume o contorno de uma sociedade envelhecida, com ampliação de doenças crônicas, no entanto sem perder o aspecto de jovem, isto é, insistindo ainda em doenças bacterianas.

A educação na pré-escola, como destaca a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), é o período mais fundamental para o bom envelhecimento e para uma força de trabalho produtiva. É preciso preparar a capacidade cognitiva para uma vida mais longa e para um mercado de trabalho no qual as habilidades perdem valor cada vez mais rápido devido ao avanço tecnológico. Na faixa entre 55 e 64 anos, mostra o IBGE, daqueles que ingressaram no ensino superior, apenas 13% terminaram, e 21% têm ensino superior incompleto.

Quando falamos de envelhecimento populacional, estamos falando de redução do quantum de força de trabalho. Se a solução apontada ê o prolongamento do tempo laboral, a saúde torna-se uma barreira. É curioso assistir ao debate sobre sustentabilidade do sistema de Previdência descolado das condições de trabalho e da saúde no trabalho. Um dado: 9% dos idosos não consomem a dose diária mínima de vitamina D. A obesidade, um problema social, atinge 20% da população. Estudar eestar apto a novas aprendizagens depois dos 50 anos depende de exercício físico, pegar sol e ter uma alimentação saudável. Se estivermos negligenciando esses fatores, estamos desperdiçando vidas e encurtando a idade econômica da população.

A mudança do perfil epidemiológico dos trabalhadores brasileiros tem elevado o número de aposentadorias por invalidez. De 1992 a 2017, passou de 64 mil para 211 mil. As pesquisadoras do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Ana Amélia Camarano, Daniele Fernandes e Solange Kanso questionam: a saída precoce do mercado de trabalho, tão apontada no debate da reforma da Previdência, é uma consequência do custo de oportunidade do aspecto normativo ou um sinal de uma ampla discriminação com as pessoas idosas, sobretudo asde menor escolaridade, pele preta e piores condições de saúde? Se a resposta for a segunda opção, o Brasil ainda está longe de tomar a difícil decisão de envelhecer.

JORGE FELIX – jornalista, professor, doutor de gerontologia da Universidade de São Paulo e comentarista de longevidade do Bem-Estar (Rede Globo) Lançará o livro Economia da longevidade (Ed. 106 Ideias)

GESTÃO E CARREIRA

DO ZERO AO BILHÃO

Nunca uma startup da América Latina levantou tanto investimento em tão pouco tempo quanto o aplicativo colombiano de entregas Rappi. Agora, ele quer crescer ainda mais depressa

Existem poucas empresas de tecnologia no mundo que já levantaram mais de 1 bilhão de dólares com fundos de capital de risco em apenas uma rodada de investimentos. Até mesmo no Vale do Silício, onde não falta dinheiro para financiar desde aplicativos de paquera até fabricantes de carros autônomos, é raro encontrar startups que tenham arrecadado tamanho volume de recursos. Nas poucas ocasiões em que isso ocorreu, as empresas tornaram-se candidatas naturais a liderar a “próxima revolução” da tecnologia. Foi assim com o aplicativo de transporte Uber, com a empresa de escritórios compartilhados WeWork e com o site de hospedagem Airbnb. A nova empresa a entrar para essa lista de privilegiados é a Rappi, um aplicativo de entregas criado há três anos e nove meses por empreendedores colombianos e que cresce como poucas vezes se viu na América Latina.

No fim de abril, o conglomerado japonês Softbank — que tem investimentos em uma série de empresas de tecnologia, incluindo a Uber — revelou ter feito um aporte de 1 bilhão de dólares na Rappi. Metade dos recursos veio do Vision Fund, fundo da empresa japonesa destinado a apostas de longo prazo no setor de tecnologia. A outra metade teve origem no Innovation Fund, fundo de 5 bilhões de dólares criado recentemente também pelo Softbank para investir em startups latino-americanas. Mas a realidade é que o investimento total levantado pela Rappi é maior do que o anunciado. Ele soma 1,2 bilhão de dólares (aproximadamente 4,8 bilhões de reais). Os 200 milhões de dólares adicionais foram aplicados pelos fundos de capital de risco que já tinham participação no aplicativo de entregas, entre eles os americanos Sequoia Capital, Andreessen Horowitz e Tiger Global, além do DST Global, fundo de origem russa. Esses fundos são alguns dos principais investidores por trás das maiores empresas de tecnologia do planeta.

Com a nova rodada de investimentos — a quarta da Rappi —, o volume total já levantado pela empresa subiu para 1,7 bilhão de dólares. É um feito sem precedentes para uma empresa de tecnologia da América Latina em tão pouco tempo de existência. “Para mim, não faz muito sentido que a América Latina, com um mercado tão grande, com mais de 640 milhões de pessoas, uma economia equivalente à metade da China, um PIB per capita quatro ou cinco vezes mais alto do que o da Índia, não receba mais investimentos as- sim. A gente espera que a Rappi seja parte de uma mudança desse cenário”, diz Sebastian Mejía, de 34 anos, um dos fundadores da Rappi, em sua primeira entrevista depois do novo investimento. Mejía fundou a empresa com os sócios Simón Borrero, presidente executivo, e Felipe Villamarin, responsável pela área de tecnologia. Os três já tinham uma startup que oferecia uma ferramenta digital para que os supermercados criassem suas lojas on-line, chamada Grability. Daí para desenvolver a Rappi foi um pulo.

O que tem atraído o interesse de investidores pela Rappi e por outras startups de entregas ao redor do mundo é a combinação entre uma mudança de comportamento do consumidor e o avanço das novas tecnologias. Nas grandes cidades, como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, as pessoas buscam cada vez mais conveniência e usam seus smartphones para resolver as tarefas no dia a dia. A Rappi aposta nisso. O aplicativo de entregas per- mite não só pedir uma pizza ou outra opção de comida em casa ou no trabalho, assim como os concorrentes iFood e Uber Eats, mas também um leque crescente de produtos — compras de supermercado, itens de farmácia, fraldas para bebês, bebidas alcoólicas, ração para animais etc. Outros serviços também estão disponíveis, como despachar encomendas ou pedir a entrega de dinheiro em espécie. Num dos pedidos mais inusitados já feitos, segundo Mejía, um usuário chegou a encomendar a entrega de uma iguana pela Rappi.

Assim como as pessoas passaram a usar aplicativos de táxi ou de carro particular, a expectativa é que cada vez mais consumidores passem a fazer compras cotidianas sob encomenda. Nos Estados Unidos, o número de consumidores que utilizam aplicativos para fazer compras de supermercado e mantimentos deverá passar de 18 milhões em 2018 para 30 milhões em 2022, na estimativa da consultoria eMarketer. No Brasil e na América Latina, os números são mais modestos, mas o crescimento segue a mesma tendência. A Rappi tem hoje 6,5 milhões de usuários nos sete países em que atua (Brasil, México, Argentina, Chile, Colômbia, Peru e Uruguai), que fizeram cerca de 70 milhões de pedidos nos últimos 12 meses. O Brasil, onde a empresa desembarcou em 2017 e está presente em 20 cidades, já é responsável por, aproximadamente, 35% das vendas. O volume de entregas no país tem crescido 30% ao mês, segundo os executivos da startup. A expectativa é que o novo investimento ajude a acelerar a expansão nas cidades onde a empresa já atua e também nos demais municípios do país com mais de 400 000 habitantes.

SUPERMERCADO EM CASA

Nem sempre é mais prático e rápido fazer uma compra de supermercado num aplicativo, pois a entrega pode levar horas até chegar em casa, dependendo do volume. Mas, por causa do trânsito e da vida cor- rida nas cidades, cada vez mais pessoas vêm se acostumando com essa ideia. No ano passado, as vendas de alimentos e bebidas pela internet estiveram entre as que mais cresceram, de acordo com a consultoria Ebit, uma das principais fontes de dados sobre as vendas na internet no Brasil. A categoria ainda é incipiente, mas tem ganhado participação no comércio eletrônico, um setor que, ao todo, deverá movimentar mais de 61 bilhões de reais neste ano no país. É de olho nesse mercado que varejistas como o Grupo Pão de Açúcar, dono das redes Extra, Pão de Açúcar e Assaí, tem apostado em soluções digitais. Além de permitir realizar compras pela internet, hoje é possível fazer o pagamento pelo aplicativo da empresa. Em algumas lojas da rede Pão de Açúcar também dá para escolher os produtos pessoalmente e pedir para que sejam entregues em casa. Já os usuários que não querem ir ao supermercado têm a opção de fazer o pedido pelo aplicativo James Delivery, uma startup concorrente da Rappi comprada pelo Pão de Açúcar no ano passado. Antes disponível apenas em Curitiba, a James Delivery começou a fazer entregas em São Paulo em maio.

Segundo uma fonte ouvida, o Grupo Pão de Açúcar preferiu apostar na própria startup porque viu a atividade da Rappi como parte do negócio central da companhia, já que todo o conhecimento sobre os hábitos de compra dos consumidores acaba ficando com o aplicativo. “É como se o supermercado virasse um mero fornecedor da Rappi”, diz a fonte. Um risco, porém, é perder vendas por estar fora do aplicativo. Outros varejistas, como o grupo Carrefour, preferem investir na parceria com a Rappi, adaptando as lojas para atender os pedidos feitos pelo aplicativo e enviar as compras por meio de seus entregadores.

As entregas de compras de supermercado já são a segunda maior categoria da Rappi, depois do atendimento a pedidos de restaurantes. Mas é essa última área que a Rappi deseja expandir nos próximos meses. Mejía, o cofundador, afirma que a startup deve implementar uma estratégia agressiva para integrar mais restaurantes em sua plataforma. É uma briga que deve esquentar o já aquecido mercado de entrega de comida pela internet. Só o aplicativo iFood atende 50.000 restaurantes, tem 9 milhões de usuários e processa quase 11 milhões de pedidos por mês. Já o Uber Eats tem crescido no Brasil fazendo promoções agressivas para atrair usuários. Como se pode ver, a briga entre as empresas para entregar a pizza em sua casa — ou sua compra de supermercado — nunca foi tão emocionante.

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O uso de aplicativos de entrega de compras de supermercado e comida deve crescer nos Estados Unidos

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