NOVAS CONFIGURAÇÕES FAMILIARES
Até algumas décadas atrás era quase impensável aceitar como conceito de família senão aquele que definia um grupo social formado por um casal, ou seja pai, mãe e seus filhos

A Lei do Divórcio, que em 1977 consagrou a dissolução do vínculo matrimonial, mudou também algumas das bases consagradas anteriormente, como o regime de comunhão de bens e a adoção facultativa do nome do marido pela esposa. A consagração da igualdade, o reconhecimento da existência de outras estruturas de convívio, a liberdade de reconhecer filhos nascidos fora do casamento trouxeram profundas e irreversíveis transformações na família, já não identificada pelo casamento, mas pelo vínculo afetivo.
A cada dia surgem, no mundo todo, novas expressões que procuram identificar da melhor forma as famílias resultantes da pluralidade das relações parentais decorrentes de divórcios, novas uniões e separações.
Antigamente, os casais e as famílias geralmente se afastavam definitivamente após o divórcio, reconhecidamente uma ruptura de grandes proporções, mesmo quando havia consenso. Mas hoje existe maior tendência para superar embates pessoais e agregar os membros das famílias em constantes reagrupamentos, tendo em vista a compreensão do papel do outro na vida dos filhos, a necessidade de superar lutos relativos a perdas afetivas e materiais pós- separações e de construir uma vida mais pautada na realidade e na aceitação não preconceituosa. Um passo à frente na construção de lares mais harmoniosos afetivos, dos quais todos precisam.
Um exemplo das dificuldades vivenciadas em outras décadas era a situação que enfrentavam as crianças nascida de pais que não eram oficialmente casados, os solteiros ou desquitados, que chegavam a não ser aceitas em grande escolas e afastadas do convívio de coleguinhas e amigos cujos pais, por um questão de preconceito, não permitia essa aproximação. Temia-se o “mau exemplo”, os “costumes liberais” e outras tantas expressões eram utilizadas para hostilizar e afastar aquelas crianças e jovens cujos pais não seguiam as normas sociais vigentes.
Hoje, 42 anos depois, grande parte da sociedade renovou o conceito tradicional de família, o divórcio ocorre com larga aceitação social e novos casamentos foram criando situações antes raras e até outras inusitadas, pela mudança de costumes e superação de preconceitos.
Foram surgindo novos modelo de família, que inclusive ultrapassa o modelo tradicional do casamento tradicional, para abranger um amplo espectro de possibilidades que vão da união de pessoas de mesmo sexo, pessoas que decidem permanecer sem vínculo matrimonial etc.
A adoção de crianças sem qualquer laço sanguíneo e de filhos vindos de antigas uniões também acabou por se tornar constante: são muitos novos tios, avós, primos que acabam por fazer crescer o núcleo familiar e que se tornam mais evidentes em datas festivas, mas que no dia a dia se adaptam a novas formas de convivência harmoniosa, com mais ou menos facilidade.
As uniões que não têm como objetivo a criação de filhos, como as de mães lésbicas e pais homossexuais, famílias monoparentais criadas a partir do desejo de ter e criar um filho de modo independente, levaram ao surgimento de um quadro que o mundo ocidental e as novas gerações, principalmente, aceitam, mas ainda há pouco entendimento.
Famílias “mosaico” que se formam pela reunião de filhos que cada um traz do casamento anterior são cada dia mais comuns. Mas é importante que cada casal reflita sobre a forma de conduzir essa situação em que, é preciso conviver não apenas com os filhos do parceiro atual, mas com a mãe e o pai dessas crianças, para construir um lar harmonioso.
O tempo sempre ajuda a ajustar comportamentos reativos, comuns nos primeiros tempos de adaptação, quando é preciso receber novos irmãos, que afinal são meros desconhecidos com quem terão que dividir espaço, coisas e atenção. Além disso, há os ciúmes, o apego ao pai ou mãe que não pertence a essa nova família, a saudade de sua vida antiga, a necessidade de se adaptar a novas regras, que podem retardar a assimilação da nova configuração familiar.
Uma questão que está mais próxima das discussões atuais é a dos casais homoafetivos, que cada vez mais optam por criar seus filhos biológicos trazidos de outros casamentos e por adoção.
Nos EUA, país que tem estatísticas sólidas sobre o assunto, mais de 1 milhão de casais gays criam mais de 2 milhões de crianças. E cada vez mais casais gays optam por criar filhos.
No Brasil, onde mais de 60 mil casais gays vivem numa união estável (reconhecida perante a lei em 2011), a história é mais recente e ainda gera muitas dúvidas infundadas. Aliás, foi apenas após 1988, quando entrou em vigor a atual Constituição Federal, que o casamento heterossexual deixou de ser a única forma admissível de formação da família.
Seja qual conformação adote, a família é um núcleo indispensável ao desenvolvimento sadio das crianças: “monoparental”, “mosaico”, formada por casal hetero ou homossexual, sempre que tiver como base os laços afetivos, a vontade de partilhar, o cuidar e o educar, esse núcleo humano será urna família e vai enriquecer e melhorar a qualidade de vida da sociedade como um todo.
MARIA IRENE MALUF – é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É autora de artigos e publicações nacionais e internacionais. Coordena curso de especialização em Neuroaprendizagem.
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