ESQUEÇA O QUE APRENDEU SOBRE MILLENNIALS E XERS
Quem tem filhos pequenos já notou: o cenário muda muito em dois anos com a I.A., vamos lidar não com gerações, e sim com indivíduos
O conceito de gerações, como o usamos hoje, vem de uma série de estudos de sociólogos e filósofos que escreveram sobre o tema nas primeiras décadas do século 20. Em especial Karl Mannheim, com um artigo intitulado O Problema das Gerações, publicado em 1928.
Embora na época se considerasse que uma geração tinha um ciclo de 30 anos, Mannheim deixa claro que o determinante do período não é a questão cronológica, mas sim a homogeneidade das influências externas no indivíduo. Segundo ele, mais importante do que nascer num mesmo período é a possibilidade de presenciar os mesmos acontecimentos e processar as experiências de forma semelhante.
Naquela época, os períodos entre grandes transformações eram bem mais longos do que hoje. Enquanto o telefone levou 70 anos para atingir 90% da população, a TV colorida levou 20 anos e o celular, menos de dez. Enquanto a internet levou quatro anos para atingir milhões de usuários, o Facebook levou dois anos, o YouTube, dez meses e o Pokémon Go, 19 dias. As curvas de adoção de novas tecnologias se tornam cada vez agressivas, e isso significa que as influências externas estão mudando o tempo todo.
Se as influências mudam com velocidade crescente, isso significa que uma criança de 10 anos hoje está exposta a um ambiente muito diferente do que outra criança estará daqui a dois ou três anos, ao chegar à mesma idade. Tem sentido falarmos em uma geração a cada 20 ou 30 anos?
Quem tem filhos pequenos sabe bem o que estou afirmando. Até as escolas se transformam e precisam se atar a um mundo que evolui muito rapidamente. Vive uma era em que as experiências se tornam mais personalizadas. Com o uso cada vez mais imenso de inteligência artificial, isso vai aumentar. Com a computação quântica vai dar outro salto.
A inteligência artificial vai permitir que as difere pessoais. de personalidade, background, gostos e preferências sejam valorizadas numa dimensão nunca a vista. Os aplicativos serão únicos, e cada usuário vai viver experiências especificas. Isso estará em constante mutação, numa evolução ditada pelo consumidor. Imagine entrar numa loja de roupas, identificar-se na tela do espelho e imediatamente começar a se ver vestido com uma série de roupas sugeridas pelo algoritmo do varejista, que leva em consideração seu histórico de compras, suas curtidas nas redes sociais, as pessoas que você segue, seus influenciadores e amigos. Essa tecnologia já existe hoje, num centro de inovação da varejista japonesa de roupas Uniqlo, em Tóquio. É muito diference da experiência a que estamos acostumados. Mas é muito provável que em pouco tempo se dissemine por todo o varejo. O que vai mudar o layout das lojas, o perfil e a quantidade dos seus funcionários, o tempo que passamos dentro das lojas, além de outras consequências desconhecidas que só veremos na prática. O espaço de tempo paro a adoção de uma tecnologia como essa será muito curto comparado ao conceito de uma geração. E uma tecnologia como essa muda o comportamento das pessoas de forma significativa. É provável que período de, digamos, cinco anos após sua implementação, outras inovações causem outros impactos no comportamento do consumidor. Pessoas com pequenas diferenças de idade terão sofrido influências externas muito diferentes. Ainda serão da mesma geração?
As crianças de até 10 anos hoje já têm uma dificuldade muito grande de entender o conceito de televisão como seus pais a concebem. Mas ainda poderão compreender como era usado esse dispositivo, com muita explicação. Uma criança que hoje tem 5 anos, entretanto, quando chegar aos 10, terá uma capacidade de compreensão mais limitada do mesmo conceito. O esforço de abstração precisará ser imenso. Porque, em cinco anos, muita coisa tem mudado no entretenimento.
Se você estava pensando que o ambiente de negócios ganhou uma complexidade adicional por dar voz a mais gerações no ambiente de trabalho ao mesmo tempo com comportamentos muito diferentes, dou-lhe uma boa e uma má notícia: a boa é que, ao esquecer o conceito de gerações, você deixa de se preocupar com os estereótipos (aplicados às gerações X, Y. Z…) e de pensar pela ótica de tribos ao definir políticas de atração e estímulo de talentos, e de melhoria do ambiente de trabalho. A má notícia é que a complexidade leva à granularidade. Não estamos falando de quatro ou cinco grupos, e sim de diversidade real. Vamos lidar não com gerações, e sim com indivíduos.
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