JAMAIS DESISTIR
Saber parar no momento certo, de algo que nos custa mais investimento do que poderemos obter de retorno, pode evitar desgaste e sofrimento desnecessários
Somos condicionados, desde novos, de que não devemos desistir jamais de nossos sonhos, e isso acaba por criar uma modelagem que se expande em todas as direções de nossas estratégias comportamentais e projetos pessoais. Porém, se tornar obsessivo por algo que não apresenta resultados práticos, por mais que possamos injetar energia ou recursos financeiros, apenas para não demonstrar à sociedade que fracassamos em algo, ou, por orgulho próprio de não se sentir comprometido totalmente, pode levar ao esgotamento físico e mental. Isso não vai trazer desfecho positivo no projeto em curso e, pior ainda, criará estruturas de defesa que vão prejudicar o ingresso futuro em qualquer outro perfil de investimento.
A história está cheia de exemplos de pessoas que usaram a expressão “Não desista nunca” e obtiveram, ao final, êxito em suas conquistas. A verdade é que não há espaço, nos livros e mitos, para quem soube investir energia em projetos mais viáveis abandonando outros que só iriam lhe causar desgaste físico e emocional.
Como base de apoio a essa crença popular temos o célebre discurso de Winston Churchill, proferido em 4 de junho de 1940, na Câmara dos Comuns, onde, com uma boa e poética estruturação verbal, reafirma o compromisso de lutar até o fim, em qualquer lugar que fosse necessário e jamais desistir, jamais se render.
Motivador, o discurso de Churchill é utilizado regularmente em palestras corporativas como exemplo de persistência e luta. Ocorre que, naquele momento histórico, a única possibilidade de sobrevivência, diante de uma Europa cheia de campos de concentração, era lutar ou morrer. Era a Segunda Guerra Mundial, algo monstruoso tirando a vida de milhões de pessoas. Não havia outra alternativa.
Como exemplo contrário temos o projeto do avião supersônico Concorde, mais rápido que a velocidade de rotação da Terra, sendo ele capaz de decolar após o pôr do sol de Londres e chegar em Nova York ainda de dia. Quando seu projeto bilionário, iniciado em 1962 por meio de um consórcio franco-britânico, estava gerando as primeiras unidades (apenas 20 foram fabricadas) já era previsto que jamais seria possível obter o retorno do investimento. Mas o pensamento era que desistir seria o mesmo que perder todo o dinheiro gasto, então o plano prosseguiu mesmo sabendo-se que não ocorreria um sucesso comercial devido ao alto custo operacional das aeronaves.
Em 2003 O Concorde, finalmente, foi retirado dos céus.
A NASA, agência espacial americana, é outro exemplo de projetos que não deveriam sair do papel. Os famosos cinco ônibus espaciais, os spaces shuttles, projetados para colocar satélites em órbita tinham um custo operacional altíssimo em comparação à mesma atividade feita pelos russos com o projeto Soyuz. O alto custo e os dois acidentes destruíram as naves Challenger e Columbia, tirando a vida de 14 astronautas, pôs fim ao projeto em 2011. Hoje, por um valor infinitamente menor, as soyuz russas são as únicas naves espaciais que servem a Estação Espacial Internacional, levando astronautas e mantimentos de forma rotineira sem nenhum acidente fatal desde 1971.
Claro que não há muita divulgação quando, na indústria, projetos sabia- mente fracassados são levados até as últimas consequências apenas para, teoricamente, não se perder o que já foi investido. Gigantes como a Sony também enfrentaram grandes prejuízos apenas para levar, até o fim, uma ideia já percebida como fracassada. Você se recorda do gigantesco Toca Disco Laser da Sony? Ou, pequenino Mini Disc Sony?
Também sabemos a mitológica história que a Coca-Cola só vendeu 25 galões em 1887, seu primeiro ano de atividade. Mas o que não contam é que somente em 1893 surge de verdade a marca Coca–Cola, e que a empresa distribuiu milhares de unidades por vários anos em cinemas e escolas até consolidar a marca de uma vez por todas.
A questão é que você pode desistir, sim! Pode escolher outro projeto, ou investimento de afeto que lhe proporcione um resultado melhor em sua vida pessoal/profissional. Saber prospectar o futuro é o que diferencia as pessoas com maior ou menor capacidade intelectiva.
Pessoas mais inteligentes são capazes de fazer uma viagem mental ao futuro e ir além dos cálculos matemáticos e desenhos em pranchetas, vislumbrar as possibilidades e conferir com o mercado-alvo se as projeções podem ser, realmente, validadas. Ter uma ideia fixa, sem alterações de rumos, de certo pode levar ao fracasso e à desilusão no mundo corporativo e, muito mais vezes, no universo dos relacionamentos sociais/pessoais.
Benjamin Franklin costumava dizer que devemos sempre nos preparar para o pior e, caso o melhor ocorresse, seria uma grata surpresa. Muitas pessoas podem ficar cegas a uma dessas possibilidades e só se guiar pela outra. Alguns podem focar apenas no fracasso, outros só no sucesso. Os dois estão errados.
Saber balancear as possibilidades de resultados possíveis na mente, se lançar na busca de soluções de forma aprofundada e investir naquilo que apresenta as melhores condições de retorno é ser, antes de tudo, o empreendedor de sucesso antecipado.
Não é vergonha alguma pular no oceano, deixando um navio naufragado, quando sabe que é capaz de nadar mar afora, com os próprios braços e pernas.
JOÃO OLIVEIRA – é Doutor em Saúde Pública, psicólogo e diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros estão: Relacionamento em Crise: Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; Jogos para Gestão de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente Humana: Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora).
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