O PROCESSO PSICOSSOMÁTICO DO CÂNCER
Transtornos como estresse, depressão, perda do sentido da vida, individualismo e consumismo ganham um papel mais frequente na sociedade moderna e todos esses fatores levam à desarmonia e desencadeiam a doença
Ao entrar na realidade da doença do câncer, muitas perguntas surgem, tais como: como o conteúdo do câncer se manifesta? Qual seria a sua origem? Hoje, essa doença tem ocupado e preocupado grande parte da população. Desde pesquisadores da área, médicos a leigos e pessoas com o devido sintoma. O que se percebe é o número crescente de casos. Apesar dos avanços na área, ainda não se conseguiu uma cura definitiva dessa realidade assustadora.
A humanidade na atualidade está passando por vários transtornos. Estresse, depressão, a perda do sentido da vida, individualismo, consumismo e o descartável. Todas essas realidades levam à desarmonia do humano, desencadeando a doença.
O artigo pretende levantar a discussão de uma verdade tão atual e silenciosa como é o câncer. Diante de sua natureza destrutiva, o humano encontra-se sem saída, no vazio de sua existência. Esse sintoma tem uma linguagem e um conteúdo manifesto que necessita ser decifrado e entendido.
A Psicanálise busca um novo entendimento para essa realidade. Olha para a doença para buscar aquilo que está escondido e latente. Ao investigar a sua história, se defronta com o fato de que esse sintoma necessita de um impulso para se manifestar sobre o organismo humano. A atitude analítica surge como ponto de partida frente a essa verdade.
CONTEÚDO MANIFESTO
A doença psicossomática do câncer tem seu simbolismo e sua linguagem, os quais se manifestam de maneira autodestrutiva no organismo humano. O sintoma do câncer, muitas vezes, nasce de uma realidade de sofrimento, dor, ódio, os quais a pessoa inconscientemente introduziu em sua vida. Como um sinal de que algo não está bem, como afirma Rüdiger Dahlke, “o sintoma é um sinal que atrai a atenção, o interesse e a energia, pondo simultaneamente em risco o fluxo natural dos processos”.
A medicina tem estudado e pesquisado muito diante dessa realidade. No entanto, não se tem chegado à raiz do problema. O que realmente acontece para que o câncer possa se manifestar? Ou, ainda, o que torna essa doença tão fatal? Partindo dessa verdade, Dahlke diz que “a doença é um estado do ser humano que indica que, na sua consciência, ela não está mais em ordem, ou seja, sua consciência registra desarmonia”.
Ao faltar a consciência, o sintoma do câncer começa a se manifestar. A pessoa, na realidade, dá vida e existência para ele. Para o psicanalista Salézio Plácido Pereira, “toda doença, indiretamente, tem uma função simbólica para representar um desejo inconsciente, o corpo é a expressão das sequelas e cicatrizes adquiridas durante a sua existência”.
Nesse caso, o câncer, que em sua essência necessitou da falta de algo para se manifestar. Esse algo foi introduzido pela própria pessoa que a criou, quando lhe faltou a consciência. Assim, podemos entender que ele se manifesta no organismo humano quando a consciência está em falta. Nessa falta, o que se concretiza são as raízes autodestrutivas do câncer. Esse sintoma psicossomático desencadeia uma reação no organismo aniquilando com tudo o que gera a vida.
Não tendo consciência disso, a pessoa vai se apagando, se autodestruindo. No entanto, quando se toma consciência deste, se abre a possibilidade de se livrar dessa realidade de doença e morte.
ORIGEM DO CÂNCER
Freud, ao estudar os primórdios da Psicanálise, descobriu que os sintomas se manifestam no conteúdo latente. Isto é, aquilo que está guardado e escondido, que ainda não chegou à consciência. O sintoma expressa uma linguagem própria e única, aquilo que está faltando. Ao mergulhar no conteúdo do câncer, depara-se sobre a realidade da sua origem. De que modo e como este se manifesta?
A medicina realiza um diagnóstico sob a etiologia naquilo que já se manifestou, esquecendo-se de entrar no conteúdo emocional de sua origem. A Psicanálise, porém, procura olhar para essa realidade escondida e latente. Quando alimenta-se uma vida de estresse, raiva, depressão, desamor e solidão, o caminho poderá ser a criação de um câncer. Para Bolzan, “tanto a saúde quanto o amor são pilares muito fortes na sustentação do instinto de vida, enquanto que a doença e o ódio são fundações consolidadas no instinto de morte”. Todos esses processos vão introduzir-se no organismo humano, causando alguma alteração em algum órgão.
Quando existem as emoções de raiva e ódio, todo o organismo vai receber essa informação; assim, cada órgão vai sofrer com esse impacto. Não existindo consciência, o sintoma do câncer começa a se manifestar.
Jung usou o termo sombra para designar todos os termos rejeitados, isto é, aquilo que se rejeita tende a se transformar em sombra. “A sombra é o maior perigo para as pessoas, pois elas a têm sem conhecê-la e sem saber que existe”.
A sombra se manifesta mediante a uma realidade que foi rejeitada pela pessoa. O que faz adoecer é a sombra, ir ao encontro da mesma é o processo da cura. Quando se tem consciência daquilo que foi rejeitado, o sintoma começa a perder força sobre o organismo.
EMOÇÕES E PULSÃO
A Psicanálise procura fazer uma interpretação diante da realidade do câncer. Ao mergulhar no sintoma, busca aquilo que está latente e escondido, para fazer com que se traga à consciência. Os sintomas são recursos que o inconsciente utiliza para manifestar o seu desejo, isto é, denuncia aquilo que a pessoa rejeitou. Para Pereira, “a Psicanálise que estuda a dimensão inconsciente da expressão das emoções e pulsões, o sintoma é a manifestação de uma energia recalcada ou reprimida”.
Ao interpretar esses sintomas, leva a pessoa a entender e compreender o que realmente aconteceu para que o câncer pudesse se manifestar. Para curar uma ferida emocional, é necessário que se tome consciência da realidade dela. Assim, acontece o mesmo com o sintoma do câncer. Ao tomar consciência deste, ao levar a busca do desejo de vida e não de morte, se cria a possibilidade da cura. Uma cura que acontece de maneira gradual, na qual, em análise, o paciente vai ouvindo e entendendo as suas dores.
Na verdade, aquilo que não se consegue expressar por palavras aparece como sintoma. Quanto mais se guardam mágoas, ódio e raiva… são essas emoções que poderão desencadear o sintoma do câncer. Por isso que toda manifestação dele não é fruto do acaso, mas sim de um método que se criou para a sua origem. Quanto mais olharmos para a realidade, nas quais o amor, o afeto e a alegria são o motor imóvel da existência, mais o humano terá uma visão diferente de si próprio.
O ENFOQUE DA PSICANÁLISE
É no corpo físico que se manifestam os desajustes daquilo que não está bem. Por isso, ao entrar na realidade do câncer, se percebem esse desequilíbrio e desarmonia, que se introjetam sobre o organismo. É no corpo humano que se manifestam as emoções autodestrutivas, ódio, raiva, medo e angústia, que desenvolvem um processo destrutivo, causando, nesse caso, o câncer.
Ao desejar a vida, estão se desejando a biofilia, o amor, a felicidade e a saúde. Ao desejar a morte, se desejam a necrofilia, raiva, inveja, revolta, ódio e a doença. Estes desencadeiam uma reação negativa em cada órgão do corpo. Para Chris Griscom, “não somos apenas um organismo físico concreto. Somos uma tapeçaria viva e dinâmica de diversos corpos entrelaçados para facilitar uma integração de realidades experienciais, sensoriais e dedutivas muito complexas. São os corpos físicos, mental, espiritual e emocional”.
A somatização das doenças no corpo, especialmente o câncer, está condicionada a diversos fatores, tais como modo de vida, estresse, solidão, raiva, ódio, inveja e depressão; são realidades que poderão condicionar o sintoma do câncer. Por isso que “a doença se manifesta nessa circunstância, porque não está havendo o equilíbrio e harmonia no eixo energético do pensar, sentir e agir”.
Como a Psicanálise poderá tratar a doença do câncer? Quando o paciente na clínica vem com esse sintoma, o primeiro passo é buscar a sua origem. O que se quer firmar é que, para desencadear a doença, necessitaram-se de um impulso e um método, este criado inconscientemente pela pessoa. Assim, ao mergulhar nessa realidade, na qual ela se predispuser a fazer um trabalho profundo e buscar no seu inconsciente os motivos que a levaram a criar essa doença, com certeza vai realizar o processo de harmonia e equilíbrio de sua energia psíquica.
Partindo dessa verdade, Maria Margarida M. J. de Carvalho afirma que, “segundo Hunghes (1987), o câncer provavelmente não tem uma única causa, mas uma etiologia multifatorial, isto é, vários fatores precisam operar juntos na mesma pessoa para produzir a doença”.
Assim, é possível entender que o sintoma do câncer necessita de muitos fatores para que possa se manifestar. Como um processo psicossomático, introduz um desejo autodestrutivo sobre o organismo, causando, com isso, o desequilíbrio.
DESARMONIA
A doença se manifesta quando o humano perde a harmonia. Mas que harmonia? Essa desarmonia seria quando não se tem consciência de si e de sua própria realidade. Quando a consciência está em falta, o sintoma começa a se manifestar. O que equivale é a sua realidade, na qual se elabora um método para criar uma doença. Segundo Dahlke, “essa doença se manifesta no corpo como um sintoma. Então, o que se tem é a comprovação de que algo nos falta. Falta consciência, e, portanto, tem-se o sintoma”.
DEPRESSÃO
A depressão, muitas vezes, é confundida com uma tristeza profunda. No entanto, quando o sentimento de tristeza se torna intenso, dura períodos longos e interfere decisivamente na vida cotidiana da pessoa, este é o sinal para a procura de ajuda profissional. A depressão já é o mais comum dos transtornos mentais, embora seja tratável. A Organização Mundial da Saúde calcula que, em vinte anos, a depressão ocupará o segundo lugar no ranking dos males que mais matam.
O CAMINHO DA CURA INTRAPSÍQUICA
Conhecer a veracidade do sintoma do câncer é trilhar um caminho na busca da cura intrapsíquica, isto é, quando o paciente escuta a própria dor, entende e conhece o sintoma. Para que o mesmo possa se manifestar, necessita de um método que a própria pessoa inconscientemente assimilou na essência de cada emoção e pulsão: O que se quer afirmar é que o câncer é um impulso autodestrutivo que nasceu mediante uma emoção que não foi elaborada. Ao conhecer a sua história, o câncer se torna menos agressivo; assim, quando existe a resistência, provoca uma pressão maior levando à proliferação dele. O câncer é um processo que necessita de um trauma emocional para se manifestar. Nesses últimos anos o mundo vem mudando rapidamente. A ciência, a tecnologia, a web e o mundo virtual vêm ganhando cada vez mais espaço. Nessa conjuntura de transformações abruptas e repentinas o humano permanece desorientado. Nesse horizonte de possibilidades, a Psicanálise surge como uma voz e um alerta para a reflexão profunda sobre a doença do câncer, que cresce de maneira apavorante. Não obstante, o desenvolvimento e o cultivo integral do humano partem, antes de tudo, da busca da saúde psíquica-física-emocional, que seja a chave para o contato consigo mesmo e com o Outro.
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