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SOBRE O FEMINISMO

Movimentos emancipacionistas são questionados por cumplicidade à ordem neoliberal

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A força do movimento feminista é uma característica da década atual. As passeatas e manifestações em defesa das mulheres e contra a violência sexual, o coro unido do “Não é não”, a dissonância política provocada pelo grito “Ele não” e as marchas em Brasília – seja contra a falocracia comandada por Eduardo Cunha na Câmara dos Deputados ou contra a ação antiambientalista da bancada ruralista – são demonstrações inequívocas disso. De certa maneira, ecoam movimentos contestadores que surgiram desde 2008, como os protestos do acampamento “Occupy Wall Street” nos Estados Unidos, as grandes manifestações na Índia contra o estupro e as passeatas gigantescas na Argentina em defesa do direito ao aborto. No campo intelectual, pesquisadoras mundo afora se debruçaram na busca por respostas a questões complexas: que resultados as antigas feministas conseguiram e quão adequados eles foram para as necessidades da mulher? Que mudanças foram trazidas globalmente para alterar relações injustas de gênero? O poder masculino na esfera pública ruiu na mesma velocidade que na esfera doméstica ou se transferiu de um polo para outro?

Não são poucos os estudos a apontar que os avanços na igualdade de gênero têm andado de mãos dadas com o crescimento da desigualdade socioeconômica pelo mundo. Há quem questione a cumplicidade do feminismo tradicional com a dita ordem neoliberal, elencando pressões econômicas que pioram as relações sexuais e de gênero. Tais estudos indicam questões ainda mais complexas: com que eficácia o assédio sexual pode ser enfrentado se outras inseguranças relacionadas não são abordadas? Que aspectos dos velhos feminismos devem ser desafiados? Os novos feminismos replicam estruturas patriarcais ou rompem com elas?

A britânica Susan Watkins, editora da revista New Left Review, publicou um longo ensaio em que analisa as principais conquistas do feminismo global nos últimos 25 anos. Disse que, sem dúvida, o maior ganho foi um notável avanço de conhecimento, com a expansão da coleta de dados, estudos de campo e análise comparativa.

“A mudança social concreta atribuível à agenda feminista global, entretanto, tem sido menor e está em grande parte concentrada no topo da pirâmide social. O mais significativo tem sido o aumento de mulheres jovens no ensino superior, em parte devido à expansão dos sistemas universitários na China, no Oriente Médio e na América Latina. No plano político, a proporção total de mulheres nos parlamentos nacionais aumentou de 12% em 1997 para 24% em 2017, com alguns dos maiores aumentos na América Latina (53% na Bolívia); a eficiência com que essas gestões femininas representam os interesses das mulheres, uma vez eleitas, é outra questão”, analisou.

Watkins mostrou que a mortalidade materna caiu e o ritmo da alfabetização das mulheres aumentou. O nível de pobreza melhorou, em grande parte graças à China, mas a taxa de desnutrição aumentou entre as mulheres pobres na Índia após 1995. Na média, a igualdade econômica tem sido em grande parte um processo de “homens em declínio”, em razão da crise econômica. “À medida que o salário dos homens caía e a mentalidade de provedor da família se corroía, as mulheres cujo trabalho já havia se somado ao do marido se tornaram, geralmente, grandes provedoras em condições de estresse econômico generalizado”, apontou Atkins.

A pressão de ONGs por leis para criminalizar a violência doméstica teve algum sucesso, mas com resultados contraditórios. No Brasil, a Lei Maria da Penha, de 2006, determinou a prisão para agressores de mulheres e encarregou autoridades regionais de criar tribunais especiais para investigar as denúncias. Feministas que monitoraram a implementação da lei relatam uma queda no número de ataques registrados, pois as mulheres hesitam em ver seu marido preso, o que traria consequências potencialmente desastrosas para as finanças da família, ainda mais sem qualquer assistência econômica do Estado para si mesmas.

As situações abusivas contra a mulher vão desde salários menores, passam pela divisão do trabalho doméstico e pelo abandono das gestantes e se ampliam para a sociabilidade por meio de relações desiguais e abusivas que desembocam na desumanização da mulher, afirmou Esther Solano, doutora em ciências sociais e professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo.

Em meio a desigualdades estruturais, inserem-se casos específicos de acusações de violência sexual, como o que envolve o astro do futebol Neymar Jr. e a modelo Najila Trindade. “Criou-se uma espécie de circo social, em que todos querem acusar e dar opinião sem ter nada para falar realmente”, disse Solano. “Ficou claro que ainda temos um machismo muito grande tanto por grupos de direita quanto de esquerda, o que pudemos ver por meio de mensagens nas redes. Vimos homens que se dizem progressistas não agirem como tal ao incriminar a mulher por princípio.”

Nos últimos anos, é dada cada vez mais atenção à ocorrência de estupro e agressão sexual, especialmente entre grupos jovens. Conversas sobre o que significa o consentimento e iniciativas de exposição pública de agressores levaram ao que alguns chamam de “epidemia de agressão”.

Solano vê na questão uma discussão de classe óbvia. “Se o suposto estuprador tivesse sido um jovem negro periférico, teria sido abandonado. Como é um personagem televisivo, famoso e rico, ele ganha muito mais autoridade em sua negativa.”

A pesquisadora apontou que as estatísticas demonstram que o número de falsas acusações de estupro é baixíssimo quando comparado aos estupros reais e à enorme quantidade de estupros subnotificados. “Impressiona como a mulher, ainda assim, já é considerada culpada, mesmo sem ter passado pelo devido processo legal. Fica claro que mais uma vez, ainda que tenhamos consciência de que a violência contra a mulher no Brasil é algo escandaloso, as pessoas preferem linchá­la em vez de ficar em silêncio e aguardar o resultado de toda a análise legal.”

A cultura política das novas campanhas contra o estupro difere em aspectos importantes do feminismo radical mais antigo.

As ideias de trauma pessoal substituíram as noções estruturais de dominância masculina e subordinação feminina; o assunto não é mais “mulheres como uma classe”, mas “eu”. As abordagens altamente legalistas, destacando a regulamentação punitiva, escoaram em campanhas no modelo #MeToo. “Tal estratégia resultou na aceitação de qualquer acusação como de fato de boa-fé, no foco na penalização pós-fato dos homens e na punição espetacular de alguns como um dissuasor para todos”, criticou Susan Watkins no artigo da New Left Review.

De acordo com ela, dentro desse enquadramento, a presunção de culpa e a punição desproporcionada para delitos menores podem ser características positivas, uma vez que têm um maior efeito dissuasor. A isso foi adicionada a nova prática de julgamento pelas redes sociais, que abandonou qualquer noção de audiência justa, concluiu Watkins. O resultado foi que a tentativa de solidariedade feminina on-line dos testemunhos #MeToo foi muitas vezes posta de lado por campanhas contra celebridades, pondo em ação uma norma: “Se acusado, culpado é”. Os homens expostos muitas vezes gritavam mais alto contra essas denúncias, talvez calculando que o ataque era a melhor forma de defesa. Nos casos mais grotescos, reminiscentes dos tempos do comando de caça aos comunistas, os fanáticos começaram a extirpar obras do cânone artístico com base em relatos anônimos e insubstituíveis de terceiros.

“Será necessário dizer que a luta por um julgamento justo dos acusadores, em sistemas judiciais historicamente enviesados contra mulheres e pessoas de cor, não deveria impedir um julgamento justo dos acusados? Além disso, uma política feminista eficaz sobre o assédio precisa reconhecer sua paisagem diferenciada, variando horizontalmente, ao longo do ciclo de vida, e verticalmente, em diferentes situações sociais, de classe e raciais”, reclamou Watkins.

O movimento em torno do #MeToo tem sido o mais conservador da nova safra, disse ela. “Parece ter feito pouco para a elaboração de uma análise que abordasse as condições favoráveis para o assédio sexual – incluindo trabalho precário, estereótipos de gênero racializados e status de migrante criminalizado – e de uma forma para escapar da violência do parceiro íntimo. O feminismo mainstream corre o risco de afirmar, em vez de desafiar, o statu quo socioeconômico”.

Autor: Vocacionados

Sou evangélico, casado, presbítero, professor, palestrante, tenho 4 filhos sendo 02 homens (Rafael e Rodrigo) e 2 mulheres (Jéssica e Emanuelle), sou um profundo estudioso das escrituras e de tudo o que se relacione ao Criador.

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