A TRÍADE DA LUZ
A tríade sombria da personalidade, composta por traços negativos de psicopatia, narcisismo e maquiavelismo, tem sido extensamente estudada.
A tríade negra ou sombria da personalidade foi detectada, pela primeira vez, por Delroy Paulhus e Kevin Williams, em 2002, e desde então vem sendo extensamente estudada. Essa tríade sombria consiste de três traços de personalidade, o narcisismo (intitulado auto importância), o maquiavelismo (exploração estratégica e engano) e a psicopatia (insensibilidade e cinismo). Paulhus e Williams mostraram que cada um desses traços se manifesta em um continuum, ou seja, cada um de nós tem ao menos um pouco de narcisismo, maquiavelismo e psicopatia. Esses três traços têm sido tradicionalmente estudados em populações de criminosos.
Desde o seu trabalho inicial, a pesquisa sobre o tema tem aumentado bastante a cada ano e tem contribuído para nossa compreensão do lado mais sombrio da natureza humana. No entanto, o lado positivo da personalidade tem sido pouco estudado. Somente agora surgiu a ideia de avaliar os traços que estão envolvidos com as pessoas que são amorosas de forma natural e espontânea. Haveria uma tríade iluminada da personalidade? Quais seus componentes e como medi-los?
O psicólogo positivo Scott Barry Kaufman tentou buscar respostas para essas questões e, junto com colegas de pesquisa, analisou os testes existentes da tríade sombria. A equipe criou não só uma série de itens relacionados às características opostas conceituais de cada membro da tríade negra, mas também itens que não eram simplesmente o reverso dos traços escuros, como honestidade, carinho, aceitação, ver o melhor nas pessoas e obter prazer intrínseco de fazer conexões com os outros, em vez de usar as pessoas como um meio para um fim. A análise indicou 12 itens que passaram a compor a “escala de tríade de luz”, já aplicada em milhares de pessoas de diferentes idades, gêneros, raças e etnias.
Embora não fosse esperado, emergiram três fatores principais que compõem a tríade iluminada. Esses três fatores foram chamados de kantionismo (tratar as pessoas como fins em si mesmas e não simplesmente como meios), humanismo (valorizar a dignidade e o valor de cada indivíduo) e fé na humanidade (acreditar na bondade fundamental dos seres humanos).
Os resultados do estudo indicam que a tríade de luz não é meramente o oposto da tríade sombria. A relação entre as duas tríades é apenas de cerca de 0,50, o que reforça a crença de que existe um lado sombrio e outro iluminado em cada um de nós. Quando os pesquisadores calcularam o ponto de equilíbrio entre as duas tríades, verificaram que a pontuação média do equilíbrio na população pesquisada foi de 1,3, o que indica que a pessoa média está mais para o lado da luz.
A investigação apontou que a tríade sombria estava positivamente correlacionada com ser mais jovem, ser homem, ser motivado por poder, sexo instrumental, realização e afiliação (mas não intimidade), tendo valores de auto aprimoramento, estilos de defesa imaturos, consumo conspícuo, egoísmo e concepção de seu trabalho criativo e imortalidade religiosa como caminhos para a transcendência da morte. A tríade negra estava negativamente correlacionada com a satisfação com a vida, conscienciosidade, amabilidade, valores auto transcendentes, compaixão, empatia, um ego silencioso, a crença de que os humanos são bons e a crença de que o próprio self é bom.
De forma contrastante, o padrão de correlações com a tríade de luz que foi identificado era bem diferente do da tríade sombria. A tríade de luz estava associada a ser mais velho, mulher, ter menos imprevisibilidade na infância, bem como ter níveis mais altos de religiosidade, espiritualidade, satisfação com a vida, aceitação dos outros, crença de que os outros são bons, crença de que o self é bom, compaixão, empatia, abertura à experiência, conscienciosidade, entusiasmo positivo, ter um ego silencioso e uma crença de que se pode viver através da natureza e da biossocialidade (ter filhos) depois da morte pessoal.
Indivíduos com pontuação mais alta na escala de tríade de luz também relataram mais satisfação com seus relacionamentos, competência e autonomia, níveis mais altos de estilo de apego seguro, maior auto estima, autenticidade e um senso de identidade mais forte.
Esse novo conceito de uma tríade de traços positivos pode ajudar a equilibrar as pesquisas em psicologia da personalidade e outras áreas, mostrando que não vivemos em um mundo cruel dominado por psicopatas, mas que também existe bondade na maioria da humanidade. A luz predomina sobre as trevas.
MARCO CALLEGARO – é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento, diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o Modelo do Processamento Mental (Artmed.2011).