TRANSTORNO BIPOLAR NA INFÂNCIA
Conheça essa patologia, que desperta uma série de dúvidas, inclusive nos profissionais da área de saúde, e suas possibilidades de tratamento, bem como a maneira de fazer o diagnóstico correto.
Será possível afirmar que uma criança apresente o diagnóstico de transtorno bipolar? Compreender acerca dessa patologia pode ajudar pais e/ou cuidadores a não negligenciarem a necessidade de busca por tratamento. De fato, o diagnóstico correto, e consequentemente, o tratamento adequado na infância podem ocasionar melhora do prognóstico na vida adulta.
CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS
Um grande número de pessoas, inclusive profissionais da área de saúde, ainda apresentam dúvidas acerca do que é o transtorno bipolar (TB). Trata-se de uma doença grave, crônica e recorrente, com prevalência estimada em torno de 4% quando engloba suas apresentações clássicas e também subsindrômicas, que são formas mais leves do transtorno. Muito frequentemente a doença se manifesta no final da adolescência e início da vida adulta. No entanto, alguns pacientes experimentam seu primeiro episódio na infância e na adolescência. A prevalência em jovens abaixo de 18 anos é aproximadamente 2%.
O TB é caracterizado por oscilações patológicas do humor, que envolvem episódios de mania ou hipomania e depressão. A mania é um estado em que os indivíduos apresentam irritabilidade, humor expansivo, euforia, autoestima elevada, além do aumento desproporcional e persistente da atividade ou da energia. Na mania, ainda, o indivíduo pode ser inadequado, fazer brincadeiras excessivas, ter desinibição e hipersexualidade. Entretanto, quando esses sintomas são apresentados de forma mais leve, não tão grave e o indivíduo não se põe em risco, considera-se o episódio como hipomania. Na fase de depressão, os portadores de TB apresentam humor rebaixado e perda do interesse ou prazer, dentre outros sintomas como baixa autoestima, isolamento e sentimento de culpa. De fato, não é em todos os momentos da vida que os portadores de TB apresentam esses estados patológicos, eles também podem apresentar o estado de eutimia, isto é, em remissão sintomatológica, em que a doença não fica aparente.
Erroneamente, o senso comum, por vezes, entende o TB como uma simples e repentina alteração do humor. Qualquer pessoa pode apresentar mudanças de humor e isso não significa que seja TB. O diagnóstico preciso deve ser feito por um psiquiatra e inclui análise dos sintomas, seu tempo de duração e o grau de prejuízo para a vida do indivíduo. No passado existia menor conhecimento sobre o TB e o diagnóstico era difícil, levando anos para ser dado corretamente. Todavia, mais recentemente o aumento de estudos sobre a doença proporcionou maior entendimento sobre o transtorno. Nem sempre o transtorno é identificado com facilidade, principalmente quando se trata de uma criança. Nesse sentido, para que o diagnóstico não seja realizado de maneira incorreta é importante preparo do profissional, escuta apurada sobre a história do paciente e avaliação cuidadosa dos seus sintomas.
Durante os últimos 20 anos, uma série de estudos científicos foi realizada acerca do diagnóstico do TB na infância. Existe um crescimento que tem criado controvérsias, gerando preocupação e, então, surge uma questão: o diagnóstico é realizado adequadamente? Todavia, entre 50% e 60% dos adultos com o diagnóstico bem-feito referem que o primeiro episódio foi aos 19 anos e 15 % a 28% experimentaram o primeiro episódio por volta dos 13 anos. Assim, é válido ressaltar que o TB na infância e adolescência não é tão raro quanto se imaginava anteriormente.
DSM-5
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), os critérios para TB na infância são os mesmos que no adulto. Quando uma criança apresenta evidências claras de mania ou hipomania que não são atribuídas ao uso de substâncias de medicamentos ou outra condição médica, o diagnóstico de TB deve ser considerado. O TB tipo I requer a ocorrência de pelo menos um episódio de mania, enquanto o tipo II envolve um episódio depressivo e também um ou mais episódios de hipomania.
Além disso, o DSM inclui uma categoria diagnóstica para outra especificidade de TB e relacionado a transtornos que se caracterizam com os sintomas subsindrômicos e não se adequam aos critérios diagnósticos de TB tipo I e II, mas ainda pode gerar prejuízos de no mínimo 2 ou 3 dias (American Psychiatry Association, 2013).
Embora os critérios diagnósticos em adultos e crianças sejam semelhantes, identificar mania na infância é um desafio. Torna-se difícil, pois as crianças, em geral, apresentam mais flutuações e labilidade de humor que os adultos. Durante a avaliação dos sintomas nas crianças, os profissionais devem conhecer acerca do desenvolvimento e saber reconhecer o que faz parte da idade adequada de cada criança.
Nesse sentido, é possível considerar quais os sintomas que não são apropriados para a idade. Portanto, considera-se normal que a criança até 10 anos fique excitada no parque. Contudo, se isso acontece em outros contextos, muitas vezes, de uma forma inadequada, como na igreja e na sala de aula é possível existir um quadro de mania.
Geralmente, um início mais precoce está relacionado à uma doença mais grave, caracterizada com um número maior de sintomas e comorbidades. Ademais, quando a manifestação do TB ocorre em fases iniciais do desenvolvimento, familiares e cuidadores apresentam resistência em aceitar o diagnóstico e colaborar com o tratamento adequado. Nesse sentido, o atraso no tratamento pode provocar ainda mais prejuízos para o portador. Alguns estudos pontuaram que, comparado com o TB de início da vida adulta, o TB na infância está associado a um curso de doença mais severo, alto nível de resistência a tratamento, alto risco de abuso de substância e suicidalidade, assim como resultados psicossociais pobres.
O curso do TB pode sofrer grande variação entre os indivíduos. No entanto, é comum e frequente a presença de problemas escolares e profissionais, baixa satisfação com a vida, assim como dificuldades com relacionamentos interpessoais. Alguns estudos mostram que portadores de TB apresentam menor qualidade de vida (QV) do que controles saudáveis, mesmo quando estão eutímicos.
Além disso, a literatura aponta que o TB é uma doença potencialmente letal. Existem estimativas de que 25% a 50% dos pacientes com TB vão tentar suicídio pelo menos uma vez na vida, e 15% a 19% vão cometer o suicídio.
No que se refere à infância, estudos apontam que o TB nessa fase provoca nível mais baixo de QV do que outras doenças clínicas e mentais. Desse modo, o baixo nível de QV e a suicidalidade estão associados a pior funcionamento familiar. Ao passo que o funcionamento familiar precário e a baixa QV contribuem para a suicidalidade.
Diferentemente do TB no adulto, o TB na infância pode apresentar características similares a alguns outros transtornos da infância, como: transtorno de comportamento disruptivo, transtorno de déficit da atenção com hiperatividade (TDAH), transtorno de desregulação do humor e/ou transtorno invasivo do desenvolvimento. Uma vez que existem falhas em discriminar essas patologias, é possível que o diagnóstico e o tratamento sejam realizados de forma inadequada, o que dificulta um prognóstico favorável na vida adulta.
PATOLOGIA SOLITÁRIA?
Com efeito, alguns estudos demonstram que pacientes com TB apresentam apoio social insatisfatório e baixo nível de apoio social comparados com controles saudáveis. Isso indica os prejuízos sociais que podem ocorrer devido ao TB. Talvez isso aconteça, pois, os portadores de TB frequentemente reagem de maneira impulsiva e agressiva.
Nesse sentido, afastam familiares e recebem menos manifestações de compaixão, amor, diversão e alegria. Além disso, o estigma da doença possivelmente contribui para ausência de pessoas no dia a dia desses pacientes, o que pode proporcionar pior prognóstico no TB.
Algumas pesquisas sugerem que o ambiente familiar é um fator que influencia o curso do TB. Infelizmente, é comum nas famílias de um paciente com TB o surgimento de emoções expressas que dizem respeito a presença de criticismo, hostilidade e emoções desagradáveis nos relacionamentos familiares.
Muitas vezes, são emoções expressas: comprometem a comunicação e prejudicam a resolução de problemas, provocando distanciamento entre os familiares e baixo apoio social.
Por vezes, os portadores têm a percepção distorcida como “as pessoas não gostam de mim”, “ninguém me dá atenção” e “ninguém me entende”. Eles exibem maiores níveis de autocrítica, por conta disso se apresentam hostis e têm postura distante diante das pessoas, mesmo estando em redução sintomatológica. Dessa maneira, existe a tendência ao baixo acolhimento e receptividade dos indivíduos que convivem com ela, independentemente dos esforços que as pessoas em sua volta exibem para fazer o melhor, crenças relacionadas a não aceitação são presentes. De fato, lidar com uma doença crônica é complicado, e o efeito disso consiste em emoções desagradáveis e estratégias de enfrentamento negativas e mal adaptativas, não apenas nos pacientes, mas também nessas famílias. É relevante que os familiares compreendam a enorme dificuldade associada ao TB e o impacto da doença na vida desses indivíduos. Isso ajuda a alcançar o resultado satisfatório do tratamento.
CORRENDO CONTRA O TEMPO
Diante de tantos prejuízos, o TB necessita de acompanhamento com profissionais especializados e a formulação de um plano de tratamento adequado. É de extrema importância, o acompanhamento com o psiquiatra, pois principal foco de tratamento dessa patologia, a primeira escolha é a farmacoterapia. Esta geralmente é eficaz e estabiliza o humor. Contudo, não é o suficiente para restaurar a funcionalidade e Q.V da maioria dos indivíduos com TB. Nesse sentido, as intervenções psicossociais contribuem na adesão ao tratamento, prevenindo a recaída, além de darem suporte aos pacientes e suas famílias para lidarem melhor com a doença. A busca por estratégias não farmacológicas pode aumentar a eficácia do tratamento e reduzir os impactos negativos na sua vida.
No que se refere às terapias não medicamentosas, evidências positivas são encontradas na literatura acerca da terapia cognitiva comportamental (TCC) para pacientes com TB I, considerando que é um adjuvante favorável da farmacoterapia no tratamento do TB. Os estudos mostram que a TCC é efetiva na redução de recaídas, melhorando sintomas depressivos, severidade da mania e funcionamento psicossocial.
A TCC envolve uma série de técnicas que tem função de reduzir sintomas e proporcionar melhor funcionamento do indivíduo na sua vida diária. Para o acesso das crianças, é necessária a adequação da linguagem. A criatividade e a escolha de técnicas adequadas podem ajudar no processo de engajar a criança.
DEPOIS DA TEMPESTADE
O TB na infância e adolescência é mais comum do que se pensava anteriormente e carrega um risco considerável de trazer resultados pobres a longo prazo. Desse modo, exige uma responsabilidade grande dos profissionais de reconhecerem precocemente o transtorno e iniciar o tratamento seguro e eficaz. Além do tratamento medicamentoso, são de grande importância as intervenções psicossociais. Dentre elas, encontra-se a TCC, que inclui uma série de técnicas que pode auxiliar a criança e sua família no manejo do transtorno, alcançando uma melhor QV e bem-estar.
ARCO-ÍRIS DE PAIS
Transtorno Bipolar (TB) e uma doença neurotóxica, em que episódios de mania ou depressão ao O arco-íris surge quando o sol ilumina a umidade suspensa no ar após uma chuva. Os pais precisam transformar- se em arco íris para os filhos, trazendo um aumento da auto- eficácia em lidar com o transtorno. O TB I tem um impacto direto e profundo na família, alterando sua vida. É importante construir um modelo integrador de terapia focada na família. Alguns pontos importantes a serem trabalhados:
AUTOESTIMA – O que os pais dizem e como eles agem vai fazer diferença no desenvolvimento. Evitar críticas, fazer elogios reforçando comportamentos adequados, pontos fortes e talentos. Demonstrar respeito pelo esforço aumenta a autoestima.
REGULACÃO EMOCIONAL – Manter as emoções em nível controlável implementando estratégias de enfrentamento adaptativas. Perceber previamente, interferir tentar equilibrar as emoções.
COMUNICAÇÃO EFETIVA – Por meio das diferentes formas de comunicação, os vínculos afetivos são constituídos. O diálogo é uma forma de interação que exige sensibilidade e disponibilidade. Demonstração de interesse mantém aberto esse canal.
ORGANIZAÇÃO DA ROTINA – Assumir compromisso de construir uma rotina previsível, pois gera estabilidade e segurança. Ter horários estabelecidos é sinônimo de ordem. Instruções diretas – Regras precisam estar claras e serem consistentes.
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS – Ajudar a promover alternativas para resolução de problemas.
INCENTIVOS CONSTANTES – Necessidade de aumento de verbalizações positivas, palavras e frases de incentivos e apoio. Ajuda no desenvolvimento de autoconfiança.
SOCIABILIDADE – Promover relações sociais saudáveis e ajustadas. Planejando, favorecendo e mediando esse processo.
ALERTA NA “PREVISÃO”
Pontos importantes para a avaliação diagnóstica do transtorno bipolar na infância, estar alerta para os sinais da mania ou hipomania nos pacientes jovens, apresentados como depressão, transtorno de déficit de atenção, hiperatividade, ansiedade ou instabilidade, incluir informantes confiáveis, como professores e pais, quando estiver fazendo as entrevistas diagnósticas: ser familiarizar com a variedade das apresentações dos sintomas da mania em grupos de idades diferentes, grandiosidade; fuga de ideias, participação em atividades de forma inadequada, fala rápida, forçada e sem sentido, excesso de brincadeiras ou simpatia, euforia ou entusiasmo e distúrbio do sono ou menos sono do que é necessário. Esses dados foram retirados do artigo Finding & Chang, de 2018
SEXTO NO RANKING
Assim como em adultos, o transtorno bipolar provoca um imenso impacto negativo em pessoas jovens, sendo considerada a sexta causa de incapacidade entre pessoas de 10 a 24 anos em todo o mundo
FERRAMENTAS PRATICAS
SUGESTOES DE TÉCNICAS PARA CRIANÇAS COM TRANSTORNO BIPOLAR
Previsão do Tempo. Entendendo a Bipolaridade Infantil – é um livro infantil que retrata de forma lúdica o transtorno e aborda de forma lúdica uma série de técnicas que a criança e seus familiares podem usar lidar com a bipolaridade infantil.
Trabalhando metaforicamente com o “tempo” associado às características do animal porco-espinho, descreve a psicologia e identifica a sintomatologia de forma clara e leve, facilitando a compreensão por parte da criança e de sua família. De forma orientada com o profissional a criança adquire estratégias de manejo.
É “TEMPO” DE APREN0ER!
Identificação, reconhecimento da sintomatologia e problemas associados. Nomeamos esse processo de psicoeducação do Transtorno, papel importante para o paciente
COMO ESTA O SEU TEMPO HOJE?
Auto monitoramento emocional que é avaliação sistemática do humor através do reconhecimento e registro. Promove a autoconsciência e fornece dados para o terapeuta conduzir análises mais funcionais delimitando objetivos de intervenção.
EM BUSCA DE UM “TEMPO” ESTAVEL
Modificar cognições através da reestruturação cognitiva. Enfatizando a mudança e substituição de pensamentos distorcidos e construir gradualmente uma nova base de pensamentos adaptativos.
POR OUE SOLTO ESPINHOS?
Identificação dos gatilhos (situações) que provocam as tempestades emocionais. Com ajuda do Registro Diário de Pensamento (RDP) São percebidas as variáveis que controlam os comportamentos, permitindo o autoconhecimento e possíveis mudanças.
É TEMPESTADE, O OUE FAZER?
Como proposta de distrações, instalar respostas de enfrentamento eficazes. Redirecionar a atenção e focalizar eventos externos, para alivio imediato.
“DEPOIS DA TEMPESTADE, VEM A CALMARIA”
Inserção de técnicas de relaxamento, que facilitam a redução de sintomas.
- Relaxamento respiratório/diafragmático: Relaxamento muscular progressivo ou relaxamento mental
PROTEGENDO-ME DA TEMPESTADE
Estabelecimento de um suporte social e familiar, listar pessoas que podem ajudar efetivamente no momento de crise, como rede de apoio.
CHUVA DE IDEIAS PARA RESOLVER O PROBLEMA
Modificar hábitos não adaptativos, com a resolução de problemas. Emergir uma quantidade de respostas alternativas (chuva de ideias) para lidar com uma situação possibilitando a escolha de respostas adequadas na tomada de decisão.
ESPINHOS DE PROTEÇÃO
Trabalhar com foco do aumento da autoestima reforçando os pontos fortes.
COMO ESTÁ O TEMPO? O QUE VOU USAR HOJE?
Cartões de enfrentamento, ajuda na construção
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