JOÃO 11: 1-16 – PARTE II

A morte de Lázaro
IV – A conversa que Ele teve com seus discípulos quando estava prestes a ir visitar seus amigos em Betânia, vv. 7-16. A conversa é tão descontraída e familiar, que nos permite compreender o que Cristo disse: “Tenho-vos chamado amigos”. Ele fala sobre duas coisas: sobre os perigos que Ele corria e sobre a morte de Lázaro.
1. Os perigos que Ele corria ao ir para a Judéia, vv. 7-10.
(1) Aqui está o aviso que Cristo deu aos seus discípulos sobre seu propósito de ir à Judéia, em direção a Jerusalém. Seus discípulos eram os homens do seu conselho, e a eles Ele disse (v. 7): “‘Vamos outra vez para a Judéia’, embora os habitantes da Judeia não mereçam um favor como este”. Assim, Cristo repete as ofertas da sua misericórdia àqueles que sempre as rejeitavam. Isto pode ser considerado:
[1] Como um objetivo da sua bondade aos seus amigos em Betânia, cujo sofrimento, e todas as circunstâncias que o agravavam, Ele conhecia muito bem, embora não lhe tivesse vindo nenhuma outra mensagem, pois Ele estava presente no espírito, embora ausente no corpo. Quando Ele soube que os sofrimentos tinham chegado ao extremo, quando o irmão e as irmãs tinham dado e recebido o último adeus, “agora”, disse Ele, “vamos outra vez para a Judéia”. Cristo se manifestará para favorecer seu povo quando for chegada a hora, sim, a hora indicada, para favorecê-lo. E a hora mais difícil é normalmente a hora indicada, quando nossa esperança está perdida e nós estamos despedaçados. “Sabereis que eu sou o Senhor, quando eu abrir as vossas sepulturas”, Ezequiel 37.11,13. Nas profundezas da aflição, deixemos que estas preciosas palavras nos mantenham afastados das profundezas do desespero. O ponto extremo do homem é a oportunidade de Deus, Jehovah-jireh. Ou:
[2] Como uma prova para a coragem dos discípulos, se eles se aventurariam a segui-lo até lá. Eles haviam sido, recentemente, atemorizados por um atentado contra a vida do seu Mestre, o que eles consideraram como um atentado também contra suas próprias vidas. Ir para a Judéia, que recentemente tinha sido tão perigosa para eles, era uma expressão que os colocava à prova. Mas Cristo não disse: “Vão vocês para a Judéia, e Eu vou ficar e me abrigar aqui”. Não, Ele disse: “Vamos”. Observe que Cristo nunca conduz seu povo a nenhum perigo, mas o acompanha nele, e está com ele quando ele caminha pelo vale da sombra da morte.
(2) A objeção dos discípulos contra esta viagem (v. 8): “Rabi, ainda agora os judeus procuravam apedrejar-te, e tornas para lá?” Aqui:
[1] Eles o lembram do perigo que tinha passado ali há pouco tempo. Os discípulos de Cristo conseguem fazer dos sofrimentos um problema muito maior do que é para seu Mestre, e se lembrar das ofensas por mais tempo. Ele tinha suportado a ofensa, para Ele ela estava acabada e esquecida, mas seus discípulos não tinham podido esquecê-la. Ultimamente, agora, como se tivesse acontecido neste mesmo dia, “os judeus procuravam apedrejar-te”. Embora já tivessem se passado pelo menos dois meses, a lembrança do medo estava bastante vívida em suas mentes.
[2] Eles se admiram que Ele vá para lá de novo. “Você vai favorecer, com sua presença, aqueles que o expulsaram da sua região?” Os métodos de Cristo para ignorar ofensas estão acima dos nossos. “Você irá se expor em meio a um povo que está tão desesperadamente enfurecido contra você? Irá de novo para lá, quando ali foi tão maltratado?” Aqui eles mostravam grande preocupação com a segurança do seu Mestre, do mesmo modo que Pedro, quando disse: “Senhor, tem compaixão de ti”. Se Cristo estivesse disposto a evitar sofrimentos, Ele não precisaria de amigos que o persuadissem a fazê-lo, mas teria aberto sua boca para o Senhor, e Ele não desejou, Ele não poderia, retroceder. Mas enquanto os discípulos mostram uma preocupação pela segurança de Jesus, eles revelam, ao mesmo tempo, em primeiro lugar, uma falta de confiança no seu poder, como se Ele não pudesse proteger a si mesmo e a eles agora na Judéia tão bem como já tinha feito anteriormente. Teria seu poder diminuído? Quando nós cuidamos dos interesses da igreja e do reino de Cristo no mundo, nós devemos ficar satisfeitos com a sabedoria e o poder do Senhor Jesus, que sabe como proteger um rebanho de ovelhas em meio a um bando de lobos. Em segundo lugar, um temor secreto de que eles mesmos sofressem, pois eles podem contar com isto, se Ele sofrer. Nas ocasiões em que nossos interesses particulares coincidem com os públicos, nós somos capazes de julgar que zelamos pelo Senhor dos exércitos, quando, na verdade, estamos zelando somente pela nossa própria riqueza, credibilidade, comodidade e segurança, e buscando nossas próprias coisas, sob o pretexto de buscar as coisas de Cristo. Portanto, nós precisamos fazer uma distinção entre nossos princípios.
A resposta de Cristo a esta objeção (vv. 9,10):
“Não há doze horas no dia?” Os judeus dividiam o dia em doze horas, e, segundo alguns comentaristas, faziam suas horas mais longas ou mais curtas conforme eram os dias, de modo que uma hora, para eles, era equivalente a um doze avos do tempo entre sol e sol. Ou, estando muito mais ao sul do que nós, seus dias eram aproximadamente doze horas mais longos que os nossos. A Providência divina nos deu a luz do dia para trabalhar, e a estende durante um período adequado, e, ao longo do ano inteiro, cada país tem o mesmo período de luz de dia quanto de noite, e ainda mais, se computarmos os crepúsculos. A vida de um homem é um dia. Este dia é dividido em diversas idades, condições e oportunidades, como em horas mais curtas ou mais longas, como Deus indicou. Esta consideração nos deve fazer não somente muito ocupados quanto ao trabalho da vida (se houvesse doze horas no dia, cada uma delas deveria estar tomada por trabalho, e nenhuma delas, desperdiçada), mas também muito à vontade quanto aos perigos da vida. Nosso dia deve ser prolongado até que nosso trabalho esteja feito, e nosso testemunho, concluído. Isto Cristo aplica ao seu caso, e mostra por que Ele deve ir à Judéia, porque Ele tinha uma ordem clara de ir. Para explicar isto:
[1] Ele mostra o consolo e a satisfação que um homem tem, na sua propriamente, enquanto se mantém no caminho do seu dever, como é prescrito, de maneira geral, pela Palavra de Deus, e particularmente determinado pela providência de Deus: “Se alguém andar de dia, não tropeça”, isto é, se um homem se mantiver ao lado do seu dever, e se preocupar com ele, e colocar a vontade de Deus antes da sua, como regra, com um respeito imparcial a todos os mandamentos de Deus, ele não hesitará na sua própria mente, mas, andando corretamente, anda com segurança e com uma santa confiança. Como aquele que anda de dia não tropeça, mas prossegue firmemente e alegremente no seu caminho, porque vê a luz deste mundo, e, por ela, vê seu caminho à sua frente, assim um bom homem, sem nenhum outro tipo de segurança, nem objetivos sinistros, confia na Palavra de Deus como sua regra, e tem, como seu objetivo, que o Senhor Deus seja glorificado. Isto ocorre porque ele vê estas duas grandes luzes, e conserva seus olhos fixos nelas. Desta maneira, ele tem um guia fiel em todas as suas dúvidas, e um cuidado poderoso em todos os seus perigos, Gálatas 6.4; Salmos 119.6. Onde quer que Cristo fosse, Ele andava de dia, e também nós deveremos fazê-lo, se seguirmos seus passos.
[2] Ele mostra a dor e o perigo em que está um homem que não anda de acordo com esta regra (v. 10): “Se andar de noite, tropeça”, isto é, se um homem andar segundo seu coração e seguindo a visão dos seus olhos, e de acordo com o curso deste mundo, se consultar seus motivos carnais mais do que a vontade e a glória de Deus, cai em tentações e armadilhas, está sujeito a grandes desconfortos e temerosas apreensões, o sonido de uma folha movida o perseguirá, e ele fugirá sem ninguém o perseguir, enquanto um homem correto ri-se do brandir da lança, e não teme a invasão de dez mil. Veja Isaías 33.14-16. Ele tropeça, porque nele não há luz, pois a luz em nós é para nossas ações morais aquilo que a luz à nossa volta é para nossas ações naturais. Ele não tem um bom princípio. Ele não é sincero. Seu objetivo é mau. Assim, Cristo não somente justifica seu propósito de ir para a Judéia, como também incentiva seus discípulos a irem com Ele e não temerem nenhum mal.
2. A morte de Lázaro aqui é comentada entre Cristo e seus discípulos, vv. 11-16, onde temos:
(1) A notícia que Cristo dá aos seus discípulos da morte de Lázaro, e uma indicação de que seu trabalho na Judéia seria cuidar dele, v. 11. Depois de ter preparado seus discípulos para esta perigosa marcha adentro de uma região inimiga, Ele lhes dá:
[1] Pleno conhecimento da morte de Lázaro, embora Ele não tivesse recebido tal notícia: “Lázaro, o nosso amigo, dorme”. Veja aqui como Cristo se refere a um crente e à morte de um crente:
Em primeiro lugar, Ele se refere ao crente como seu amigo: “Lázaro, o nosso amigo”. Observe:
1. Existe um concerto de amizade entre Cristo e os crentes, uma afeição amistosa e uma comunhão que nosso Senhor Jesus irá reconhecer. Ele não se envergonhará deste lindo relacionamento. “Com os sinceros está o seu segredo”.
2. Aqueles a quem Cristo se alegra por reconhecer como seus amigos devem ser considerados como amigos por todos os discípulos. Cristo fala de Lázaro como um amigo comum a todos: “Nosso amigo”.
3. A morte, em si, não rompe o laço de amizade entre Cristo e um crente. Lázaro está morto, mas continua sendo “nosso amigo”.
Em segundo lugar, Ele se refere à morte de um crente como um sono: ele “dorme”. É bom chamar a morte com tais nomes e títulos, de modo a ajudar-nos a torná-la mais familiar e menos formidável para nós. A morte de Lázaro era, em um sentido peculiar, um sono, como aquele da filha de Jairo, porque ele seria ressuscitado rapidamente. E uma vez que nós temos a certeza de que vamos ressuscitar, no final, por que isto deveria fazer uma grande diferença? E por que a esperança desta ressurreição à vida eterna não deveria nos fazer deixar o corpo e morrer tão facilmente como quando despimos nossas roupas e vamos dormir? Um bom cristão, quando morre, apenas dorme: ele descansa dos trabalhos do dia terminado, e se revigora para a manhã seguinte. Na verdade, aqui a morte tem a vantagem do sono. O sono é apenas o parêntesis, mas a morte é o final das nossas preocupações e do nosso trabalho. A alma não dorme, mas fica mais ativa. Porém o corpo dorme, sem nenhuma agitação, sem nenhum tempo, sem perturbação ou distúrbios. O sepulcro do ímpio é uma prisão, e os lençóis do seu sepulcro são como as algemas de um criminoso destinado à execução, mas para o crente fiel é uma cama, e todas as suas faixas são como os suaves e felpudos laços de um sono tranquilo. Embora o corpo esteja corrompido, ele ressuscitará na manhã seguinte, como se nunca tivesse visto corrupção. Ele apenas despe nossas roupas para que sejam consertadas e adornadas para o dia das bodas, o dia da coroação, no qual devemos ressuscitar. Veja Isaías 57.2; 1 Tessalonicenses 4.14. Os gregos chamavam seus sepulcros de dormitórios.
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