JOÃO 10: 1-18 – PARTE I

O Bom Pastor
Não se sabe ao certo se este discurso foi proferido na Festa da Dedicação, no inverno (mencionada no v. 22), que pode ser interpretada como a data, não somente do que vem a seguir, mas daquilo que veio antes (e isto apoia o fato de que Cristo, nas suas palavras ali, prossegue com a metáfora das ovelhas, vv. 26,27, onde parece que aquele discurso e este ocorreram na mesma ocasião). Ou este era uma continuação da sua discussão com os fariseus, no encerramento do capítulo anterior. Os fariseus, em sua oposição a Cristo, baseavam-se no princípio de que eles eram os pastores da igreja, e que Jesus, não tendo comissão outorgada por eles, era um intruso e impostor, e, portanto, as pessoas se viam forçadas, pelo devei; a ficar do lado deles, e contra Ele. Em oposição a isto, Cristo aqui descreve quem eram os falsos pastores, e quem é o verdadeiro, deixando que eles concluíssem o que quisessem.
I – Aqui está a parábola, ou similitude, proposta (vv. 1-5). Ela foi emprestada do costume daquela nação, no cuidado com suas ovelhas. As similitudes, usadas para exemplificar as verdades divinas, devem ser toma das daquelas coisas que são mais familiares e comuns, para que as coisas de Deus não sejam obscurecidas por aquilo que deveria esclarecê-las. O prefácio a este discurso é solene: “Na verdade, na verdade vos digo” – Amém, amém. Esta veemente declaração evidencia a certeza e a importância do que Ele dizia. Nós encontramos “amém” em dobro nos louvores e nas orações da igreja, Salmos 41.13; 72.19; 89.52. Se desejarmos ter nossos améns aceitos no céu, os améns de Cristo devem prevalecer na terra. Seus améns repetidos.
1. Nesta parábola, temos:
(1) A evidência de um ladrão e salteador, que vem para fazer danos ao rebanho e prejudicar o dono, v. 1. Ele não entra pela porta, por não ter causa legítima para entrar, mas sobe por outra parte, como uma janela ou alguma brecha no muro. Como as pessoas ímpias são engenhosas para fazer o mal! Que planos elas fazem, que esforços elas empreendem, que riscos elas correm, nas suas intenções ímpias! Isto deveria nos envergonhar pela nossa preguiça e covardia no serviço a Deus.
(2) O caráter que distingue o proprietário legítimo, que tem a propriedade das ovelhas, e que cuida delas: ele “entra pela porta”, como alguém que tem autoridade, (v. 2), e vem para lhes fazer algo de bom, para ligar a que está quebrada, e fortalecer a que está enferma, Ezequiel 34.16. As ovelhas precisam dos cuidados do homem, e, em troca, são úteis a ele (1 Coríntios 9.7). Elas vestem e alimentam aqueles que as abrigam e alimentam.
(3) A entrada preparada que o pastor encontra: ”A este o porteiro abre”, v. 3. Antigamente, os currais de ovelhas ficavam situados dentro das portas externas das suas casas, para maior segurança de seus rebanhos, de modo que ninguém poderia chegar até elas diretamente, mas aqueles a quem o porteiro abrisse, ou o dono da casa desse as chaves.
(4) O cuidado que ele toma com suas ovelhas, e a provisão que faz para elas. ”As ovelhas ouvem a sua voz”, quando ele fala de maneira que lhes é familiar, quando elas vêm ao curral, como os homens fazem agora com seus cães e cavalos. E, além disto, ele “chama pelo nome às suas ovelhas”, tão exata que é a atenção que ele tem com elas, o registro que ele mantém delas. E ele as traz para fora do curral, para os pastos verdejantes. E (vv. 4,5), quando tira para fora suas ovelhas, ele não as conduz, mas (como era o costume naquele tempo) vai adiante delas, para evitar qualquer dano ou perigo que possam encontrar, e as ovelhas, acostumadas com isto, o seguem, e estão em segurança.
(5) A estranha obediência das ovelhas ao pastor: elas “conhecem a sua voz”, de modo a discernir sua vontade, segundo sua voz, e a distingui-la da de um estranho (pois o boi conhece seu possuidor, Isaías 1.3). Elas não seguirão o estranho, mas, como se suspeitando de algum mau desígnio, fugirão dele, porque não conhecem a voz dos estranhos, exceto que não é a voz do seu próprio pastor. Esta é a parábola. Nós temos a chave para entendê-la, Ezequiel 34.31: “Vós, pois, ó ovelhas minhas, ovelhas do meu pasto; homens sois, mas eu sou o vosso Deus”.
2. Observemos, a partir desta parábola, que:
(1) Os bons homens são adequadamente comparados a ovelhas. Os homens, sendo criaturas dependentes do seu Criador, são chamados de ovelhas do seu pasto. Os bons homens, sendo criaturas inexperientes, têm as boas qualidades das ovelhas, são inofensivos e inocentes como as ovelhas; são dóceis e tranquilos, sem fazer ruí dos; são pacientes como as ovelhas, sob a mão do tosquiador ou do açougueiro. Elas são úteis e proveitosas, domáveis e obedientes ao pastor, sociáveis entre si, além de serem muito usadas nos sacrifícios.
(2) A igreja de Deus no mundo é um curral de ovelhas, no qual são reunidos os filhos de Deus que estavam dispersos por todas as partes (cap. 11.52), e no qual elas são unidas e incorporadas. É uma boa malhada, Ezequiel 34.14. Veja Miquéias 2.12. Este curral é bem fortificado, pois o próprio Deus é como um muro de fogo ao seu redor, Zacarias 2.5.
(3) Este curral está muito exposto a ladrões e salteadores; sedutores ardilosos que pervertem e enganam, e cruéis perseguidores que destroem e devoram; lobos cruéis (Atos 20.29); ladrões que rouba riam o rebanho de Cristo, para sacrificá-lo aos demônios, ou roubariam o alimento das ovelhas, para que morressem pela falta de alimento; “lobos vestidos como ovelhas”, Mateus 7.15.
(4) O grande Pastor do rebanho cuida maravilhosamente do rebanho, e de tudo o que pertence às ovelhas. Deus é o grande Pastor, Salmos 23.1. Ele conhece os que são seus, e os chama pelo nome, marca-os para si, e os leva para pastagens bem regadas. O Senhor faz com que descansem e se alimentem ali, fala com eles de uma forma consoladora, protege-os pela sua providência, guia-os pelo seu Espírito e pela sua Palavra, e vai adiante deles, para colocá-los no caminho dos seus passos.
(5) Os pastores auxiliares, que são encarregados de alimentar o rebanho de Deus, devem ser cuidadosos e fiéis no desempenho desta tarefa. Os magistrados devem defendê-los, além de proteger e promover todos os seus interesses seculares. Os ministros devem servi-los nos seus interesses espirituais, devem alimentar suas almas com a Palavra de Deus fielmente aberta e aplicada, e com ordenanças do Evangelho devidamente administradas, supervisionando-os. Eles devem entrar pela porta de uma ordenação regular, e a estes o porteiro abrirá. O Espírito de Cristo irá colocar diante deles uma porta aberta, lhes dará autoridade na igreja e confiança no seu seio. Eles devem conhecer os membros dos seus rebanhos pelo nome, e cuidar deles. Devem levá-los aos pastos das ordenanças públicas, presidi-los, ser sua boca diante de Deus, e a boca de Deus para eles. E nos seus costumes, devem ser exemplos para os crentes.
(6) Aqueles que são verdadeiramente as ovelhas de Cristo serão muito obedientes ao seu Pastor, e muito prudentes e tímidos com estranhos.
[1] Eles seguem seu Pastor, pois conhecem sua voz, tendo um ouvido que discerne, e um coração obediente.
[2] Eles fogem de um estranho, e temem segui-lo, porque não conhecem sua voz. E perigoso seguir àqueles em quem não discernimos a voz de Cristo, e que nos afastariam da fé nele, levando-nos a fantasias a respeito dele. E aqueles que sentiram o poder e a eficácia das verdades divinas sobre suas almas, que têm o sabor e o prazer delas, têm uma sagacidade maravilhosa para descobrir os vilões de Satanás, e também para discernir entre o bem e o mal.
II – A ignorância dos judeus quanto ao objetivo e ao significado deste discurso (v. 6): “Jesus disse-lhes esta parábola”, estas palavras figuradas, mas sábias, elegantes e instrutivas, “mas eles não entenderam o que era que lhes dizia”, não perceberam a quem El e se referia quando falou dos ladrões e salteadores, e do Bom Pastor. O fato de muitos ouvirem as palavras de Cristo e não as compreenderem, porque não desejam compreender, e porque as interpretam mal, consiste no pecado e na vergonha deles. Eles não conhecem, nem provam, as coisas, e por isto não compreendem as parábolas e comparações com as quais elas são exemplificadas. Os fariseus tinham um grande orgulho do seu próprio conhecimento, e não podiam suportar que ele fosse questionado, mas não tinham percepção suficiente para compreender as coisas de que Jesus falava. Elas estavam acima da sua capacidade. Aqueles que pretendem ter mais conhecimento são, frequentemente, os mais ignorantes nas coisas de Deus.
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