MATEUS 27: 33-49 – PARTE I

A Crucificação
Temos aqui o relato da crucificação de nosso Senhor Jesus Cristo.
I – O lugar onde o nosso Senhor Jesus foi morto.
1. Eles chegaram a um lugar chamado Gólgota, bem perto de Jerusalém, provavelmente o lugar público de execução. Se Jesus tivesse uma casa em Jerusalém, é provável que, para sua maior desgraça, eles o tivessem crucificado diante de sua própria porta. Mas então, no mesmo lugar onde os criminosos eram sacrificados para cumprir a justiça do governo, o nosso Senhor Jesus foi sacrificado para cumprir a justiça de Deus. Alguns pensam que o local era chamado de lugar da caveira porque ali se situava o ossuário público, onde os ossos e crânios dos mortos eram colocados lado a lado, fora do caminho, para que as pessoas não os tocassem e fossem assim contaminadas. Ali jaziam os troféus da vitória da morte sobre multidões de filhos dos homens; mas, ao morrer, Cristo destruiu o poder da morte. Ele adicionou essa circunstância de honra à sua vitória. Ele triunfou sobre a morte, no próprio campo em que a morte reinava.
2. Ali eles o crucificaram (v. 35). Pregaram suas mãos e seus pés na cruz, e então a levantaram, com o Senhor pendurado nela; pois essa era a maneira de os romanos crucificarem. Que os nossos corações sejam tocados pelo sentimento daquela dor cortante que o nosso bendito Salvador suportou, e olhemos para aquele que foi perfurado dessa maneira, e gemeu de tanta dor. Já houve alguma dor como a dele? E, quando contemplarmos a maneira como Ele morreu, observemos o quanto Ele nos amou.
II – O tratamento bárbaro e agressivo que eles dispensaram ao Senhor. Eles competiam em sagacidade e malícia para ver quem era superior. Como se a morte, um a morte tão sofrida, não fosse ruim o suficiente, eles contribuíam para aumentar o seu amargor e terror.
1. Pela bebida que eles providenciaram para Ele, antes que fosse pregado à cruz (v. 34). Era comum oferecer um cálice de vinho temperado àqueles que seriam mortos, conforme a orientação de Salomão (Provérbios 31.6,7): “Dai bebida forte aos que perecem”; mas naquele cálice do qual Cristo estava a ponto de beber, eles misturaram vinagre e fel para torná-lo azedo e amargo. Isso significava:
(1) O pecado do homem, que é uma raiz de amargura, que dá fel e absinto (Deuteronômio 29.18). O pecador talvez o revolva sob a sua língua como uma migalha, mas para Deus é uva de fel (Deuteronômio 32.32). Foi assim para o Senhor Jesus quando Ele tomou sobre si os nossos pecados, e mais cedo ou mais tarde será assim para o próprio pecador; amargura no final da vida, mais amarga do que a morte (Eclesiastes 7.26).
(2) Representava a ira de Deus, aquele cálice que Deus Pai colocara em sua mão, um cálice amargo, sem dúvida, como a água amarga que trazia a maldição (Números 5.18). Eles lhe ofereceram essa bebida como fora literalmente previsto (Salmos 69.21). E:
[1] Ele a provou, tendo assim o pior dela, sentindo o gosto amargo em sua boca. Ele não deixou de provai· o cálice da amargura, quando estava expiando toda a nossa predileção pecaminosa pelo fruto proibido. Ele estava provando a morte em todo o seu amargor.
[2] Ele não a beberia, pois não queria ter o melhor dela; o Senhor Jesus não queria ter nenhum narcótico par a diminuir a sua sensação de dor, pois Ele morreria de um modo que sentisse a morte em toda a sua força. Ele tinha uma grande obra a fazer como o nosso Sumo Sacerdote em seu esforço agonizante.
2. Pela partilha de suas vestes (v. 35). Quando eles o pregaram à cruz, arrancaram as suas vestes, pelo menos a parte de cima; pois, pelo pecado, ficamos nus, para nossa vergonha, e dessa maneira Ele comprou para nós trajes brancos para nos cobrirmos. Se formos, a qualquer tempo, despidos por Cristo de nossos consolos, suportemos isso pacientemente; Ele foi despido por nossa causa. Os inimigos podem tirar as nossas roupas, mas não podem nos privar de nossos melhores confortos; eles não podem tomar de nós as vestes de louvor. As roupas daqueles que são executados são o pagamento dos carrascos: quatro soldados foram utilizados para crucificar a Cristo, e eles devem, cada um, ter uma parte. A sua veste superior, se dividida, não seria útil para nenhum deles, e por isso resolveram lançar sortes sobre ela.
(1) Alguns pensam que a veste era tão fina e rica que valia a pena lutar por ela; mas isso pode não estar de acordo com a pobreza que Cristo aparentava.
(2) Talvez eles tivessem ouvido sobre aqueles que haviam sido curados ao tocar a orla de sua roupa, e a considerassem valiosa devido a alguma virtude “mágica” nela existente. Ou ainda (3) Eles esperavam conseguir dinheiro de seus amigos por uma relíquia sagrada como essa. Ou
(4) Por escárnio, eles pareciam lhe atribuir o valor das roupas de um rei. Ou
(5) Por diversão. Para passar. o tempo enquanto aguardavam a sua morte, eles jogavam dados pelas roupas; mas, quaisquer que fossem os seus desígnios, a Palavra de Deus é, nesse fato, cumprida. Em um famoso salmo, de cujas primeiras palavras Cristo fez uso do alto da cruz, está escrito: “Repartem entre si as minhas vestes e lançam sortes sobre a minha túnica” (Salmos 22.18). Isto nunca aconteceu a Davi, mas parece antes de tudo uma palavra direcionada a Cristo, de quem Davi falava em espírito. Então, essa parte da humilhação na cruz termina; pois parece ter sido por deliberação e conhecimento prévio de Deus. Cristo se despiu de suas glórias, para dividi-las entre nós.
Eles agora se sentaram e o vigiaram (v. 36). Os príncipes dos sacerdotes foram cuidadosos, sem dúvida, ao colocarem essa guarda, a fim de evitar que o povo, de quem eles ainda tinham muito medo, pudesse se revoltar e resgatá-lo. Mas a Providência assim o determinou, para que aqueles que foram designados para vigiá-lo, com isso se tornassem testemunhas irrepreensíveis dele. Tiveram a oportunidade de ver e ouvir aquilo que arrancou deles esta nobre confissão (v. 54): “Verdadeiramente, este era o Filho de Deus”.
3. Pelo título colocado sobre a sua cabeça (v. 37). Era comum justificar o julgamento público e humilhar ainda mais os malfeitores que eram executados, não apenas colocando um arauto à frente deles para anunciar, mas um manuscrito acima da cabeça deles para informar o crime pelo qual eles sofriam; assim, colocaram sobre a cabeça de Cristo, por escrito, a acusação contra Ele, para avisar ao público porque Ele fora condenado: “Este é Jesus, o Rei dos Judeus”. Isto, eles planejaram para sua vergonha, mas Deus desconsiderou tanto isso, que até mesmo a acusação contra Ele contribuiu para a sua glória. Pois:
(1) Nela não havia nenhum crime alegado contra Ele. Não estava escrito que Ele era um pretenso Salvador ou um Rei usurpador, embora eles pensassem assim (João 19.21); mas: Este é Jesus, o Salvador; com certeza, isso não era um crime. E a expressão “Este é o Rei dos Judeus” também não é um crime; pois eles esperavam que o Messias fosse assim. Dessa forma, o Senhor Jesus não cometeu nenhuma transgressão, nem mesmo contra os seus próprios inimigos, que estavam na posição de juízes. Ao contrário,
(2) Aqui estava uma verdade, muito gloriosa declarada a respeito dele, de que Ele é Jesus, o Rei dos judeus, aquele Rei que os judeus esperavam e a quem deviam ter e submetido; de modo que a acusação contra Ele corresponde a isto: que Ele era o verdadeiro Messias e o Salvador do mundo. Aqui vemos algo parecido com o caso de Balaão, quando foi enviado para amaldiçoar Israel, porém os abençoou completamente por três vezes (Números 24.10), pois Pilatos, em vez de acusar a Cristo como criminoso, o proclamou Rei por três vezes em três inscrições. Desse modo, Deus faz com que os homens sirvam aos seus propósitos, muito mais do que aos propósitos deles.
4. Pelos seus companheiros de sofrimento (v. 38). Havia dois ladrões crucificados com Ele, ao mesmo tempo e no mesmo lugar e sob a mesma guarda; dois assaltantes de estrada ou salteadores, é o significado correto da palavra no texto original. É provável que aquele fosse o dia designado como o dia das execuções; e por isso, eles apressaram o processo de Cristo pela manhã, para que o tivessem pronto para ser executado com os criminosos. Alguns pensam que Pilatos determinou que as coisas fossem feitas desse modo, para que o ato de justiça da execução desses dois ladrões pudesse reparar a injustiça que ele praticou ao condenar a Cristo. Outros, que os judeus o planejaram, para aumentar a ignomínia dos sofrimentos do nosso Senhor Jesus; seja como for, as Escrituras foram cumpridas aqui (Isaias 53.12): “Ele foi contado com os transgressores”.
(1) Ser crucificado com eles era uma vergonha para Jesus. Embora, enquanto vivo, ficasse separado dos pecadores, na morte eles não foram separados, mas Ele foi obrigado a compartilhar com os mais baixos malfeitores os seus flagelos, como se Ele tivesse sido um parceiro em seus pecados; pois Ele se fez pecado por nós e tomou para si a semelhança da carne pecaminosa. Ele foi, em sua morte, contado entre os transgressores e compartilhou o seu destino com os perversos para que nós, em nossa morte, possamos ser contados entre os santos e ter o nosso destino entre os escolhidos.
(2) Era uma vergonha adicional que fosse crucificado entre os dois, como se Ele tivesse sido o pior dos três, o principal malfeitor; pois, entre três, o meio é o lugar reservado ao chefe. Cada detalhe foi planejado para a sua desonra, como se o grande Salvador fosse, de todos, o maior pecador. Foram, também, concebidos para contrariá-lo e embaraçá-lo, em seus últimos momentos, os gritos, os gemidos e as blasfêmias desses malfeitores, que, provavelmente, fizeram uma gritaria terrível quando foram pregados na cruz. Mas, nesse caso, tudo isso comoveria o próprio Cristo, pois Ele estava presenciando os sofrimentos dos pecadores, e estava padecendo pela salvação deles. Alguns apóstolos de Cristo foram, mais tarde, crucificados – como, por exemplo, Pedro e André-, mas nenhum deles foi crucificado junto com Ele, para que não parecesse que eles tivessem compartilhado com Ele o pagamento do pecado do homem, bem como a compra da vida eterna e da glória. Por isso, Ele foi crucificado entre dois malfeito res que não poderiam contribuir de forma alguma para a dignidade de sua morte. Jesus Cristo, e só Ele, levou os nossos pecados sobre o seu próprio corpo.
5. Pelas blasfêmias e insultos com os quais eles o oprimiram quando estava pendurado na cruz. Porém, não está escrito que eles tenham lançado acusações contra os ladrões que foram crucificados com o Senhor: Seria de se pensar que, quando o pregaram na cruz, tivessem feito o pior possível, e que a maldade tivesse se dissipado: sem dúvida, se um criminoso for colocado no pelourinho ou levado em uma carroça, por ser uma punição inferior à morte, isto geralmente é acompanhado de tais expressões de maus tratos; mas um homem moribundo, mesmo um homem infame, deve ser tratado com compaixão. É uma vingança insaciável, sem dúvida, aquela que não pode ser saciada nem mesmo com a morte, e uma morte tão notável. Mas, para completar a humilhação de nosso Senhor Jesus, e para mostrar que enquanto estava morrendo Ele carregava a iniquidade, Ele foi, então, oprimido com acusações. E, pelo que parece, nenhum de seus amigos, que há alguns dias gritavam “Hosana” para Ele, foi visto ousando mostrar algum respeito por Ele.
(1) O povo que passava o insultava. Seu sofrimento extremo e paciência exemplar nessa condição, não os modificava nem os fazia demonstrar piedade; mas aqueles que, por sua gritaria, o conduziram a isso, agora pensavam se justificar através de suas acusações, como se houvessem pra ticado o bem ao condená-lo. Eles o insultavam: eles disseram blasfêmias contra Ele; e eram blasfêmias no sentido mais exato, pois estavam falando com maldade daquele que não considerava crime o fato de ser igual a Deus. Considere agora:
[1] As pessoas que o insultavam; aqueles que passavam, os viajantes que seguiam ao longo da estrada, e era uma grande estrada, que ia de Jerusalém a Gibeão. Elas estavam dominadas pelos preconceitos contra Ele, pelos relatos e clamores das pessoas dominadas pelos sacerdotes da religião judaica. Ter urna boa opinião a respeito das pessoas e das coisas que são depreciadas e criticadas em todo lugar é algo difícil, e requer mais dedicação e determinação do que aquelas com que geralmente nos deparamos. Todos tendem a repetir o que diz a maioria, e atirar uma pedra contra aquilo cuja reputação é ruim.
[2] O gesto que usaram, em desrespeito a Ele, meneando a cabeça; isso indicava o triunfo deles através da sua degradação, e os seus insultos contra Ele (Isaias 37.22; Jeremias 18.16; Lamentações 2.15). A linguagem era: “Eia, sus, alma nossa (Salmos 35.25). Desse modo, eles insultavam aquele que era o Salvador de seu país, assim como os filisteus fizeram com Sansão, o destruidor de seu país. Esse mesmo gesto fora profetizado (Salmos 22.7): “Eles meneiam a cabeça para mim”. E também o Salmo 109.25.
[3] Os insultos e os escárnios que eles disseram. Estes são registrados aqui.
Em primeiro lugar, eles o censuraram quanto à destruição do Templo. Embora os próprios juízes tivessem percebido que o que Ele dissera fora distorcido (como entendemos em Marcos 14.59), ainda assim eles habilmente espalharam entre o povo, para induzir ao ódio contra Ele, que era seu objetivo destruir o Templo; nada inflamaria mais o povo contra alguém. E essa não foi a única vez em que os inimigos de Cristo haviam se dado ao trabalho de fazerem os outros pensarem dessa forma sobre a religião e o povo de Deus, cuja acusação eles próprios sabiam ser falsa e injusta: “‘Tu que destróis o templo’, aquela estrutura enorme e poderosa, usa esse poder para descer agora da cruz, remove esses pregos e salva-te a ti mesmo; se tens o poder que apregoas, esta é a hora adequada para manifestá-lo e demonstrá-lo; pois espera-se que todo homem faça o máximo que puder para salvar a si mesmo”. Isso transformou a cruz de Cristo em um tremendo obstáculo para os judeus; eles a consideraram inconsistente com o poder do Messias. Ele foi crucificado em fraqueza (2 Coríntios 13.4); assim lhes parecia. Mas, sem dúvida, o Cristo crucificado é o Poder de Deus.
Em segundo lugar, eles o censuraram por dizer que era o Filho de Deus: “Se és o Filho de Deus, desce da cruz”. Agora eles usam as palavras do Diabo, aquelas com as quais ele tentou o Senhor no deserto (cap. 4.3,6), e repetem a mesma agressão: “Se és o Filho de Deus”. Eles pensam que Ele deve provar agora que é o Filho de Deus ou nunca o fará; eles esqueceram de que Ele o havia provado pelos milagres que realizou, e, particularmente, ainda o faria ressuscitando dos mortos. Eles se recusavam a esperar pela prova completa, a sua própria ressurreição, a qual o Senhor Jesus havia tantas vezes mencionado. Se eles tivessem percebido realmente que Ele estava dizendo que iria ressuscitar, a humilhação da cruz teria sido antecipada. Este tipo de atitude resulta ele julgar as coisas pelos seus aspectos atuais, sem a de vida lembrança do que se passou e uma paciente espera pelo que pode acontecer no futuro.
(2) Os príncipes dos sacerdotes e os escribas, os administradores da sinagoga judaica, os anciãos e os governantes o ridicularizaram (v. 41). Eles não pensaram que era suficiente convidar a multidão para fazê-lo, mas deram a Cristo a desonra, e a si mesmos, a diversão, reprovando-o em seus corações. Eles deviam estar no Templo em sua devoção, pois era o primeiro dia da festa dos pães asmos, quando deveria haver uma santa convocação (Levíticos 23.7); mas estavam aqui, em um lugar de execução, expelindo seu veneno contra o Senhor Jesus. Quão abaixo da grandeza e da seriedade de seu caráter estava isso! Podia qualquer outra coisa levá-los a se tornarem mais desprezíveis e baixos diante do povo? Podia-se pensar que, embora não temessem a Deus nem respeitassem o homem, ainda assim a prudência deveria lhes ter ensinado, sim, àqueles que tiveram uma grande participação na morte de Cristo, a se manter em o quanto pudessem nos bastidores e ficarem o menos possível à vista; mas nenhuma atitude má é tão ruim a ponto de a malícia não poder se agarrar a ela. Eles foram assim tão baixos, a ponto de causar um grande desgosto a Cristo. E será que devemos temer a aparente humilhaão ao nos juntarmos às multidões para glorificar ao Senhor, dizendo: “Se isto é ser vil, ele boa vontade me humilharei ainda mais?”.
Duas coisas pelas quais os sacerdotes e os anciãos tentaram censurá-lo.
[1] Disseram que Ele não podia salvar a si mesmo (v. 42). Ele havia sido ofendido anteriormente em seu ministério profético e real, e agora, em seu ministério sacerdotal, como o Salvador. Em primeiro lugar, eles tinham como certo que Ele não podia salvar a si mesmo, e por isso não tinha o poder que alegava ter, quando, na verdade, o Senhor Jesus não se livraria da morte porque morreria para nos salvar. Eles deviam supor: “Ele salvou a outros, portanto poderia salvar a si mesmo. E, se não o faz, é por alguma boa razão”. Mas, em segundo lugar, eles desejavam insinuar que, como Ele, agora, não salvava a si mesmo, toda a sua pretensão de salvar a outros nada mais era do que simulação e ilusão, e era algo que nunca, de fato, fora feito, embora a veracidade de seus milagres fosse demonstrada e estivesse além de qualquer contestação. Em terceiro lugar, eles o repreenderam por afirmar ser o Rei de Israel. Eles sonhavam com a pompa e o poder exterior do Messias, e por isso consideravam a cruz como algo completamente incompatível com o Rei de Israel e inconsistente com tal personagem. Muitas pessoas gostariam do Rei de Israel se Ele descesse da cruz, se eles pudessem ter o reinado dele sem a tribulação pela qual eles devem passar. Mas a questão está resolvida; se não há cruz, não há Cristo, nem coroa. Aqueles que reinariam com Ele, deveriam aceitar sofrer com Ele, pois Cristo e a sua cruz estão ligados um ao outro neste mundo. Em quarto lugar, eles o desafiaram a descer da cruz. E o que seria de nós, então, e da obra da nossa redenção e salvação? Se Ele tivesse sido incitado a descer da cruz por essas zombarias, deixando assim a sua missão incompleta, nós estaríamos arruinados para sempre. Mas o seu amor e resolução imutáveis o colocaram acima dessa tentação, e fortaleceram-no contra ela, de forma que Ele não foi mal- sucedido e nem desanimou. Em quinto lugar, eles prometeram que, se Ele descesse da cruz, eles acreditariam nele. Que Ele lhes dê essa prova de que é o Messias, e eles confessarão que Ele o é. Anteriormente, quando eles exigiram um sinal, Ele lhes disse que o sinal que lhes daria seria não a sua descida da cruz, mas algo que seria uma amostra maior do seu poder: ressuscitar dentre os mortos, algo que não tiveram a paciência de aguardar por dois ou três dias. Se o Senhor tivesse descido da cruz, eles poderiam utilizar o mesmo argumento que usaram quando Ele ressuscitou, dizendo que os seus discípulos vieram à noite e roubaram o seu corpo, ou pode riam dizer que os soldados haviam trapaceado ao pregá-lo na cruz. Mas prometer que acreditaríamos se tivéssemos tais e tais condições e motivos ele fé, conforme condições determinadas por nós mesmos, quando não aproveitamos os desígnios ele Deus, não é apenas um exemplo grosseiro ela falsidade de nossos corações, mas o triste refúgio, ou melhor, subterfúgio, ele uma obstina da infidelidade destruidora.
[2] Disseram que Deus, o seu Pai, não o salvaria (v. 43). Ele confiou em Deus, quer dizer, Ele assim o fingiu; pois disse: “Sou o Filho ele Deus”. Aqueles que chamam a Deus ele Pai, e a si mesmos ele seus filhos, estão declarando a sua confiança nele (Salmos 9.10). Agora eles sugerem que Ele apenas decepcionou a si mesmo e a outros, ao se mostrar como sendo tão querido pelos céus; pois, se Ele fosse o Filho de Deus (como os amigos ele Jó argumentaram a respeito dele), não teria sido abandonado à mercê ele todo esse sofrimento, e muito menos mantido nele. Isto era uma espada em seus ossos, como Davi se queixa em uma condição semelhante (Salmos 42.10); e era uma espada de dois gumes, pois foi planejado, em primeiro lugar, para difamá-lo e fazer os espectadores pensarem que Ele era um impostor; como se as suas declarações ele que era o Filho de Deus estivessem agora efetivamente desmentidas. Em segundo lugar, para aterrorizá-lo e fazê-lo desconfiar e perder a esperança do amor e do poder de seu Pai; o que, alguns pensam, era o que Ele temia, zelosamente, orando para que não ocorresse e que fosse livre dela (Hebreus 5.7). Davi se queixou mais dos esforços de seus perseguidores para abalar a sua fé e afastá-lo de sua esperança em Deus do que das suas tentativas de afastá-lo do seu trono e do seu reino. As afirmações deles eram: “Não há salvação para ele em Deus” (Salmos 3.2) e “Deus o desamparou” (Salmos 71.11). Nisso e em outras coisas, ele tipificou a Cristo. Nessa famosa profecia a respeito de Cristo, Davi menciona as palavras que foram ditas por seus inimigos (Salmos 22.8). Ele confiava que o Senhor o libertaria. Certamente, esses sacerdotes e escribas haviam-se esquecido elos seus Salmos, caso contrário, não teriam usado as mesmas palavras de uma forma tão exata, para responder ao tipo e á profecia: mas as Escrituras devem ser cumpridas.
(3) Para completar o vitupério, os ladrões que também foram crucificados com Ele não apenas não foram insultados como Ele foi, como se tivessem sido santos quando comparados com Ele, mas, sendo seus companheiros de sofrimento, juntaram-se aos seus acusadores e lhe proferiam insultos face a face. Um deles chegou a dizer: “Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo e a nós (Lucas 23.39). Seria de se pensar que, de todas as pessoas, esse ladrão tinha menos motivos e deveria ter se preocupado menos em provocar ou ridicularizar a Cristo. Companheiros de sofrimento, ainda que por motivos diferentes, geralmente se solidarizam um com o outro; e poucos, a despeito do que tenham feito anteriormente, gastarão o seu último suspiro com insultos. Mas parece que as maiores mortificações do corpo e as repreensões mais humilhantes da Providência de Deus não mortificarão, por si mesmas, as corrupções da alma, nem conterão as iniquidades dos perversos, sem a graça de Deus.
Bem, desse modo, tendo o nosso Senhor Jesus tomado para si o encargo de satisfazer a justiça divina pelo mal que o pecado fez no tocante à honra de Deus, Ele o fez sofrendo em sua honra. E Ele o fez não apenas negando a si mesmo o que lhe era devido por ser o Filho de Deus, mas se submetendo à pior indignidade que poderia ser feita ao pior dos homens; porque Ele foi feito pecado por nós. Ele se tornou, assim, uma maldição por nós, para que possamos suportar com mais facilidade as situações mais difíceis, como, por exemplo, se formos acusados injustamente de todo tipo de iniquidade, por amor à justiça.
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