MATEUS 25: 31 – 46 – PARTE II

O Processo do Último Julgamento
IV – O processo de julgamento em relação a cada um deles.
1. Em relação aos justos, à direita. A causa deles deve ser concluída primeiro, para que possam ser assessores com Cristo no julgamento dos pecadores, cuja desgraça será agravada quando eles virem Abraão, e Isaque, e Jacó admitidos no Reino de Deus (Lucas 13.28). Observe aqui:
(1) A glória conferida a eles. A sentença pela qual eles não somente serão absolvidos, mas também escolhidos e recompensados (v. 34): “Dirá o Rei aos que estiverem à sua direita” Aquele que era o Pastor o que evidencia a proteção e ternura com a qual Ele fará a sua averiguação, aqui é o Rei, o que evidencia a autoridade por meio da qual Ele pronunciará a sentença. Onde estiver a palavra do Rei, ali haverá poder. Há duas coisas nessa sentença:
[1] O reconhecimento dos justos como benditos do Senhor: “Vinde, benditos de meu Pai”. Em primeiro lugar, Ele os pronuncia “benditos”; e as suas palavras, de que eles são benditos, os torna abençoados. A lei os amaldiçoa pelos seus muitos abandonos de causa; mas Cristo, tendo-os redimido da maldição da lei, comprou a bênção para eles, e a colocou sobre eles. Em segundo lugar, “benditos de seu Pai”. Censurados e amaldiçoados pelo mundo, mas abençoados por Deus. Da mesma maneira como o Espírito glorifica o Filho (João 16.14), também o Filho glorifica o Pai, ao lhe entregar a salvação dos justos como um assunto de importância primordial; todas as nossas bênçãos nos lugares celestiais vindas a nós de Deus, como o pai de nosso Senhor Jesus Cristo (Efésios 1.3). Em terceiro lugar, Ele os convida para vir. Este vir é, na realidade: “Bem-vindos, dez mil vezes bem-vindos para as bênçãos do meu Pai; venham a mim, venham para estar comigo para sempre. Você que me seguiu carregando a cruz, agora caminhe comigo usando a coroa. Os benditos de meu Pai são os bem-amados da minha alma. Aqueles que estiveram a uma distância grande demais de mim; venham, agora, venham para o meu seio, venham para os meus braços, venham para o mais precioso abraço!” Oh! com que alegria isto encherá os corações dos justos nesse dia! Agora nós vamos, com ousadia, ao trono da graça, mas somente então iremos ao trono da glória; e esta palavra assegura que nos será estendido o cetro de ouro, com a certeza de que os nossos pedidos serão concedidos, mesmo que superem a metade do Reino. Agora o Espírito diz: Vinde, na palavra; e a esposa diz: Vinde, em oração; e o resultado disso é uma comunicação harmoniosa; entretanto, a perfeição da felicidade ocorrerá quando o Rei disser: Vinde.
[2] A admissão dos santos à bem-aventurança e ao Reino do Pai: “Possuí por herança o Reino que vos está preparado”.
Em primeiro lugar, a felicidade que eles terão será muito grande. Esta informação nos é dada por aquele que a conhece, pois ela lhe pertence, e Ele a reservou para aqueles que o servem.
1. E um “Reino”. Um reino é considerado como sendo a mais valiosa possessão na terra e inclui a maior riqueza e honra. Aqueles que herdam os reinos usarão todas as glórias da coroa, desfrutarão todos os prazeres da corte e comandarão os tesouros peculiares das províncias; ainda que isto seja somente uma pequena semelhança da felicidade dos santos no céu. Aqueles que aqui são pobres, prisioneiros, considerados como a escória de todas as coisas, herdarão então o Reino (Salmos 113.7; Apocalipse 2.26-27).
2. É um Reino “preparado”. A felicidade deve ser grande, porque é o produto dos conselhos divinos. Observe que há uma grande preparação produzida para o entretenimento dos santos no Reino da glória. O Pai o designou a eles em seus pensamentos de amor, e proporcionou-o a eles na grandeza de sua sabedoria e podei: O Filho conseguiu-o para eles, e Ele entra primeiro para preparar o lugar (João 14.2). E o bendito Espírito Santo, ao prepará-los para o Reino, está, na verdade, preparando-o para eles.
1. Está preparado para eles. Isto revela:
(1) A adequação dessa felicidade. Ela está, em todos os pontos, adaptada à natureza da alma, e à nova natureza de uma alma santificada.
(2) A posse e o interesse que eles têm nele. Ele está preparado intencionalmente para eles; não somente para aqueles que são como vocês, mas para vocês, que são chamados por seus próprios nomes; para vocês, pessoal e particularmente, que foram escolhidos para a salvação pela santificação.
2. Está preparado “desde a fundação do mundo”. Esta felicidade foi designada para os santos, e eles para ela, “antes dos tempos dos séculos”, e por toda eternidade (Efésios 1.4). O fim, que é executado por último, é o primeiro na intenção. A Infinita Sabedoria tem um objetivo na glorificação eterna dos santos, desde a primeira fundação da criação: “Porque tudo isso é por amor de vós” (2 Coríntios 4.15). Ou isto, denota a preparação do lugar para essa felicidade, que será o assento e a morada dos benditos, que está preparado desde o início da obra da criação (Genesis 1.1). Ali, no céu dos céus, as estrelas da alva cantavam juntas alegremente, enquanto era criada a fundação da terra (Jó 38.4-7).
Em segundo lugar, a maneira pela qual eles tomarão posse é muito interessante: eles deverão vir e herdá-lo. Aquilo que recebemos por herança não foi conseguido por nossa aquisição, mas meramente, como os advogados expressam, por um ato de Deus. É Deus que nos faz herdeiros, herdeiros dos céus. Nós alcançamos a herança em virtude da nossa condição de filhos, da nossa adoção; se somos filhos, então somos herdeiros. Um título que se recebe por herança é o título mais doce e mais seguro; e neste caso, ele se refere à possessão na terra de Canaã, que era transferida por herança, e não seria alienada além do ano do Jubileu. Por essa razão, a herança divina é irrevogável e inalienável. Os santos neste mundo são como os herdeiros quando meninos: estão sob os cuidados de tutores e curadores até ao tempo determinado pelo pai (Gálatas 4.1-2); e então lhes será dada a completa possessão daquilo a que agora, por meio da graça, eles têm direito. “Vinde”, e possuí-o por herança.
(2) A razão para isso (vv. 35,36): “Porque tive fome, e destes-me de comer”. Nós não podemos, portanto, deduzir que quaisquer boas palavras nossas merecem a felicidade do céu, por qualquer valor ou excelência intrínseca que haja nelas. A nossa generosidade se estende não a Deus, mas está claro que Jesus Cristo irá julgar o mundo pelas mesmas regras pelas quais Ele o governa, e, sendo assim, irá recompensar aqueles que foram obedientes à lei; e será feita menção à sua obediência, não como seu título, mas como sua evidência de um interesse em Cristo, e no seu resgate. Essa felicidade será concedida aos crentes obedientes, não sobre uma estimativa de mérito, o que pressupõe uma proporção entre a obra e a recompensa, mas com base na promessa de Deus, comprada por Jesus Cristo, e o seu benefício assegurado sob certas condições e limitações. A compra e a promessa é que dão o direito; a obediência é apenas a qualificação da pessoa em questão. Pode-se dizer que uma propriedade é obtida mediante uma condição por meio de cessão ou testamento, quando a condição se concretiza em conformidade com a verdadeira intenção do doador ou de quem fez o testamento, tornando-se absoluta; e então, embora o direito esteja baseado exclusivamente na cessão ou no testamento, ainda assim a concretização da condição deve ser dada em evidência, e é isto o que ocorre aqui; pois Cristo é o Autor da salvação eterna, que só é dada àqueles que o obedecem, e que pacientemente continuam procedendo bem.
As boas obras aqui mencionadas são aquelas normalmente chamadas de caridade aos pobres. Muitos estarão à sua direita, porém nunca tiveram como alimentar quem tinha fome, ou vestir quem estava nu, mas foram, eles mesmos, alimentados e vestidos pela caridade de outros. Um exemplo de obediência sincera é colocado para os demais, ensinando nos que, de modo geral, a fé que trabalha através do amor é tudo em todos no cristianismo. “Mostra-me a tua fé pelas tuas obras”, e nada será abundante para uma prestação de contas futura, exceto os frutos da justiça em uma boa conduta agora. As boas obras aqui descritas implicam em três coisas, que devem ser encontradas em todos os que são salvos.
[1) A renúncia de si mesmo, e o desprezo pelo mundo. Considerar as coisas do mundo não traz bons resultados que nos permitam fazer o bem com elas. E aqueles que não possuem os recursos para fazer o bem, devem exibir a mesma disposição, sendo pobres, satisfeitos e alegres. Aqueles que são mortificados para as coisas da terra são aptos a morar no céu.
[2) O amor pelos nossos irmãos; o que é o segundo grande mandamento, o cumprimento da lei, e um excelente preparativo para o mundo em que reina o amor eterno. Nós devemos dar evidências desse amor pela nossa disposição em fazer o bem, e transmitir o Evangelho; os bons desejos não são nada além de zombarias, sem as boas obras (Tiago 2.15,16; 1 João 3.17). Aqueles que não têm o que dar, devem mostrar a mesma disposição de alguma outra maneira.
[3) Uma consideração respeitosa por Jesus Cristo, através da fé. O que é aqui recompensado é a ajuda aos pobres, por amor a Cristo, e conforme a sua orientação. Isso confere uma excelência à boa obra, uma vez que através dela nós servimos ao Senhor Jesus, e isto se aplica tanto àqueles que realizam essa obra para viver quanto àqueles que ajudam a conservar vivas outras pessoas. Veja Efésios 6.5-7. As boas obras que serão aceitas são aquelas feitas em nome do Senhor Jesus (Colossenses 3.17).
“Tive fome,” isto é, meus discípulos e seguidores tiveram fome, seja pelas perseguições dos inimigos por eles fazerem o bem, ou pelas dispensações comuns da Providência; pois, nessas coisas, há um único fato para os justos e para os pecadores: E destes de comer a eles. Observe, em primeiro lugar, que a Providência ordena e dispõe as circunstâncias do seu povo neste mundo de variadas maneiras, de modo que enquanto alguns têm condições de propiciar ajuda, outros necessitam dela. Não é novidade para aqueles que se alimentam com as guloseimas do céu ter fome e sede, e lhes faltar o alimento cotidiano; para aqueles que se sentem à vontade como se estivessem em casa quando estão em Deus, ser estrangeiros em terra alheia; para aqueles que se revestiram de Cristo, necessitar de roupas para se manterem aquecidos; para aqueles que têm almas saudáveis, ter corpos enfermos; e para aqueles que estão na prisão, que Cristo os tenha feito livres. Em segundo lugar, as obras de caridade e beneficência, conforme a nossa capacidade, são necessárias para a salvação; e elas serão ainda mais importantes no julgamento do grande Dia do que normalmente se imagina; elas devem ser as evidências do nosso amor, e da submissão que confessamos em relação ao Evangelho de Cristo (2 Coríntios 9.13). Mas aqueles que não mostram misericórdia, serão julgados sem misericórdia.
Esta razão é modesta mente questionada pelos justos, mas é o próprio Juiz que a explica.
1. Ela é questionada pelos justos (w. 37-39). Não como se eles se recusassem a herdar o reino, ou se envergonhassem das suas boas obras. ou não tivessem o testemunho da consciência em relação a si mesmos; mas:
(1) As expressões são alegóricas, com o objetivo de apresentar e gravar essas grandes verdades, de que Cristo tem uma grande consideração pelas obras de caridade, e se agrada especialmente pela generosidade demonstrada ao seu povo, em seu nome. Ou:
(2) Elas evidenciam a humilde admiração dos santos glorificados ao encontrar obras tão pobres e sem valor, como são as suas, tão grandemente celebradas e ricamente recompensadas: “Senhor, quando te vimos com fome e te demos de comer?” Observe que as almas que têm graça são capazes de pensar humildemente sobre as suas próprias boas obras, especialmente como sendo indignas de serem comparadas com a glória que há de ser revelada. Longe disso está o estado de espírito daqueles que disseram: “Por que jejuamos nós, e tu não atentas para isso?” (Isaias 58.3). Os santos no céu perguntarão a si mesmos o que os levou para lá, e se admirarão de que Deus considere tanto a eles, como aos seus serviços. Natanael deve ter chegado a corar ao ouvir o elogio que Cristo lhe fez: “De onde me conheces tu?” (João 1.47,48). Veja Efésios 3.20. ‘”Quando te vimos com fome?’ Nós vimos os pobres, em sofrimento, muitas vezes; mas quando foi que te vimos assim?” Observe que Cristo está mais entre nós do que pensamos que Ele está. Na verdade, o Senhor está neste lugar, pela sua Palavra, pelas suas ordenanças, pelos seus ministros, pelo seu Espírito, sim, e pelos seus pobres, e nós não sabemos disso: “Te vi eu estando tu debaixo da figueira” (João 1.48).
2. Ela é explicada pelo próprio Juiz (v. 40): “Quando o fizestes a um destes meus pequeninos irmãos, a mim o fizestes”. As boas obras dos santos, quando apresenta das no grande Dia:
(1) Serão todas lembradas; e nem uma das menores delas será ignorada, nem um copo de água fria.
(2) Elas serão interpretadas da melhor maneira, e com o melhor significado que lhes puder ser atribuído. Assim como Cristo faz o melhor das fraquezas dos santos, Ele também faz o máximo dos seus serviços.
Nós vemos as recompensas que Cristo tem para aqueles que alimentam os que têm fome, e que vestem os que estão nus. Mas o que será do pobre devoto que não tem recursos para fazer isso? Eles ficarão do lado de fora? Não:
[1] Cristo os reconhecerá, até mesmo o menor deles, como seus irmãos. Ele não se envergonhará, nem pensará que possa ser alguma depreciação para si mesmo, chamá-los de irmãos (Hebreus 2.11). Mesmo nos pícaros da sua glória, Ele não deixará de reconhecer esses seus parentes pobres; Lázaro está ali, no seu seio, como um amigo, como um irmão. É assim que Ele os confessará (cap. 10.32).
[2] Ele irá interpretar a gentileza feita aos pobres como tendo sido feita a si mesmo: “A mim o fizestes”. Observe que Cristo abraça a causa do seu povo, e se interessa pelo que interessa a eles, e se considera recebido, amado, e aceito neles. Se o próprio Cristo estivesse entre nós, na pobreza, com que presteza o ajudaríamos? Na prisão, com que frequência nós o visitaríamos? Nós estamos prontos para invejar a honra que tinham aqueles que o serviam com as suas fazendas (Lucas 8.3)? Onde estiverem santos pobres e ministros pobres, ali Cristo estará, pronto para receber neles a nossa bondade, e ela será levada em conta.
3. Aqui está o processo relacionado aos pecadores, aqueles que estão à esquerda. E quanto a isso, nós temos:
(1) A condenação que eles recebem (v. 41). Será uma desgraça estar colocado à esquerda; mas isto não é o pior de tudo. Ele dirá a eles: “Apartai-vos de mim, malditos”. Cada uma dessas palavras transmite terror, como o terror que trouxe a trombeta no monte Sinai, cada vez mais forte, cada inflexão mais e mais dolorosa, e sem nenhum consolo.
[1] Estar tão próximo de Cristo representava alguma satisfação, embora sob o seu olhar reprovador; mas isto já não mais será permitido: “Apartai-vos de mim”. Neste mundo, eles sempre foram chamados para ir a Cristo, para ir até a vida e o repouso, mas se recusaram a ouvir os seus convites; por isso, justamente, eles recebem a ordem de afastar-se de Cristo, pois não vieram a Ele. ”Apartem-se de mim, a Fonte de todo o bem, de mim, o Salvador, e, portanto, de toda a esperança de salvação. Eu nunca mais terei nada a dizer a vocês, nunca mais terei nada a ver com vocês”. Aqui, na terra, eles disseram ao Todo-Poderoso: Aparta-te de nós. Mas ali. Ele selecionará os enganos deles, e lhes dirá: ”Apartai-vos de mim”. Observe que afastar-se de Cristo é algo tão ruim, que pode ser considerado o inferno dos infernos.
[2] Se eles devem se afastar; e afastar-se de Cristo, eles não poderiam receber uma bênção na despedida, uma palavra gentil e misericordiosa, pelo menos? Não. ”Apartai- vos… malditos”. Aqueles que não vieram a Cristo para herdar uma bênção, devem afastar-se dele sob o peso de uma maldição, aquela maldição da lei que recai sobre todos os que a infringem (Gálatas 3.10). Como eles gostavam de amaldiçoar, ela também virá sobre eles. Observe que os justos são chamados “benditos de meu Pai”; entretanto, o fato de eles serem benditos se deve pura mente à graça de Deus e à sua bênção, mas os pecadores, aqui, são chamados somente de “malditos”, pois a sua condenação vem deles mesmos. Deus os vendeu? Não, eles mesmos se venderam, e se colocaram sob a maldição (Isaias 50.1).
[3] Se eles devem partir, e partir com uma maldição, eles não podem ir a algum lugar de paz e repouso? Já não será desgraça suficiente para eles lamentar a sua perda? Não. Há uma punição dos sentidos, além da perda; eles devem se afastar para ir para o fogo, para um tormento tão terrível como fogo o é para o corpo, e muito mais. Est e fogo é a ira do Deus eterno, prendendo-se às almas e às consciências culpadas dos pecadores, que se tornaram combustíveis para ele. O nosso Deus é um fogo consumidor, e os pecadores caem imediatamente nas suas mãos (Hebreus 10.31; Romanos 2.8,9).
[4] Se é necessário ir para o fogo, não pode ser um fogo leve ou brando? Não, é um fogo “preparado”; um tormento ordenado “desde ontem” (Isaias 30.33). A condenação dos pecadores frequentemente é mencionada como um ato de poder divino. Ele tem o poder de lançar no inferno. Nos vasos da ira, Ele torna conhecido o seu poder; isto é uma “eterna perdição, ante a face do Senhor e a glória do seu poder”. Nela, se verá o que um Deus provocado pode fazer para tornar uma criatura provocadora miserável.
[5] Se é ao fogo, a um fogo preparado: Oh!, Que seja apenas de curta duração, que eles apenas passem através do fogo. Não. O fogo da ira de Deus será um fogo eterno; um fogo que, prendendo-se às almas imortais, e atacando-as, nunca poderá se extinguir por falta de combustível; e, queimando e ardendo pela ira de um Deus imortal, nunca poderá se extinguir, por não ser soprado ou atiçado; e, estando excluídas para sempre as correntezas da misericórdia e da graça, não existe nada que extinga este fogo. Se uma gota de água é negada para esfriar a língua, baldes de água nunca serão concedidos para extinguir esta chama.
[6] Se eles precisam ser condenados a tal condição de desgraça interminável, pelo menos eles não podem ter alguma boa companhia ali? Não, ninguém, exceto “o diabo e seus anjos”, seus inimigos declarados, que ajudaram a levá-los a esta infelicidade, e irão vencê-los. Eles serviram ao diabo enquanto viveram, e por isso são justamente condenados a estar onde ele está, assim como aqueles que serviram a Cristo são levados para estar com Ele onde Ele está. É terrível estar em uma casa assombrada por demônios. O que será, então, a companhia deles para sempre? Em primeiro lugar, observe aqui que Cristo sugere que existe alguém que é o príncipe dos demônios, o líder da rebelião, e que o resto deles são os seus anjos, seus mensageiros, com cujo auxílio ele sustenta o seu reino. Cristo e os seus anjos, naquele dia, irão triunfar sobre o dragão e os seus anjos (Apocalipse 12.7,8). Em segundo lugar, está dito que a fogueira está preparada, não necessariamente para os maus, como o reino está preparado para os justos; mas ela, originalmente, se destinava apenas “para o diabo e os seus anjos”. Se os pecadores se associarem com Satanás, tolerando os seus desejos, eles poderão agradecer a si mesmos se compartilharem essa desgraça que foi preparada tanto para Satanás como para os seus colaboradores. A respeito disso, Calvino observa que por isso está dito que o tormento dos condenados está “preparado para o diabo e seus anjos”, para extirpar toda a esperança de escapar a ele. O diabo e os seus anjos já estão feitos prisioneiros no seu covil, e será que os vermes da terra pensam em escapar?
(2) O motivo dessa condenação. Os julgamentos de Deus são todos justos, e Ele será justificado neles. Ele é o próprio Juiz, e por isso, “os céus anunciarão a sua justiça”.
Considere que:
[1] Tudo aquilo de que são acusados, e em que se baseia a condenação, é de omissão. Assim como antes, o servo foi condenado, não por gastar o seu talento, mas por enterrá-lo, também aqui. Ele não diz: “Eu tive fome e sede, pois vocês tomaram de mim o meu alimento e a minha bebida; Eu fui um estrangeiro, por que vocês me expulsaram; Eu estava nu, porque vocês me despiram; na prisão, porque vocês me colocaram ali”, mas: “Quando Eu estava passando por estas aflições. vocês foram tão egoístas, ficaram tão absorvidos na sua própria tranquilidade e no seu próprio prazer, se preocuparam tanto com o seu trabalho e estavam tão pouco dispostos a se separar do seu dinheiro, que vocês não ministraram, como poderiam ter feito, para o meu alívio e socorro. Vocês foram como aqueles amantes dos prazeres, que estavam em tranquilidade em Sião, e não se afligiram ‘pela quebra de José'” (Amós 6.4-6). Observe que as omissões são a ruína de milhares de pessoas.
[2] É a omissão de obras de caridade aos pobres. Eles não são condenados por omitir os seus sacrifícios e holocaustos (eles faziam isso abundantemente, Salmos 50.8), mas por omitir as questões mais importantes da lei, “o juízo, a misericórdia e a fé”. Os amonitas e moabitas não podiam entrar no santuário, porque não saíram para receber a Israel “com pão e água” (Deuteronômio 23.3,4). Observe que a falta de caridade aos pobres é um pecado condenável. Se não formos levados às obras de caridade com a esperança de recompensa, que sejamos influenciados pelo temor da punição, pois aqueles que não mostrarem misericórdia, serão julgados sem misericórdia. Jesus não diz: “Eu estava enfermo, e não me curastes; na prisão, e não me libertastes” (talvez isto fosse mais do que eles poderiam fazer), mas: “Vós ‘não me visitantes’, o que poderieis ter feito”. Note que os pecadores serão conde nados naquele grande Dia pela omissão daquele bem que eles podiam fazer. Mas se a condenação dos não-caridosos era tão terrível, quanto mais intolerável será a condenação dos cruéis, a condenação dos perseguido res! O motivo para essa condenação é:
Em primeiro lugar, a objeção dos prisioneiros (v. 44): “Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede?” Os pecadores condenados, embora não tenham nenhuma defesa que os justifique, em vão irão oferecer desculpas. Agora:
1. A forma do seu apelo evidencia a sua precipitação atual. Eles falaram claramente, como homens apressados: “Quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu”? Eles não se importam em repetir a acusação, como se estivessem conscientes da sua própria culpa, e fossem incapazes de suportar o terror do julgamento. Também não terão tempo para insistir com apelos tão frívolos; pois tudo isso é apenas (como dizemos) “brincar com a corte”.
2. A questão do seu apelo evidencia a sua antiga falta de consideração com aquilo que deveriam ter sabido, mas não souberam até que fosse tarde demais. Aqueles que tinham desprezado e per seguido os cristãos pobres, não reconheceram que tinham desprezado e perseguido a Cristo. Não, eles nunca pretenderam nenhuma afronta a Ele, nem esperavam que um problema tão grande surgisse disso. Eles imaginaram que era apenas um grupo de pessoas pobres, fracas, enfermas e desprezíveis, que faziam mais barulho do que era necessário sobre o Evangelho, e por isso eles as desprezavam. Mas aqueles que fazem isso virão a saber, seja no dia da sua conversão, como foi o caso de Paulo, ou da sua condenação, como é o caso desses, que era Jesus que eles perseguiam. E se eles dizem: “Eis que o não sabemos; porventura, aquele que pondera os corações não o considerará?” (Provérbios 24.11,12).
Em segundo lugar, é justificada pelo Juiz, que irá condenar todos os ímpios por todas as duras palavras proferidas contra Ele, quando falam daqueles que são seus (Judas 15). Ele segue a sua regra (v. 45): “Quando a um destes pequeninos o não fizestes, não o fizestes a mim”. Observe que aquilo que é feito contra os fiéis discípulos e seguidores de Cristo, até mesmo o menor deles, o Senhor assume como tendo sido feito contra si mesmo. Ele é reprovado e perseguido na pessoa deles, pois eles são reprovados e per seguidos por amor a Ele, e Ele se aflige por todas as aflições que eles sofrem. Aquele que os toca, toca nele, em uma parte não menos sensível que a menina dos seus olhos.
Por fim, aqui essas duas sentenças são executadas (v.46). A execução é a vida da lei, e Cristo irá se certificar de que seja feita de acordo com a sentença.
1. Os pecadores serão conduzidos à punição eterna. A sentença será, então, executada rapidamente, e não existe adiamento, não há tempo para se solicitar uma revisão da sentença. A execução dos pecadores é mencionada primeiro; pois primeiro é juntado e queimado o joio. Observe que:
(1) A punição dos pecadores, no estado futuro, será uma punição eterna, pois este estado será uma situação inalterável. Não se pode pensar que os pecadores poderiam modificar as suas próprias naturezas. Deus não daria a sua graça para modificá-los, uma vez que neste mundo o Dia da Graça foi mal utilizado, eles resistiram ao Espírito da graça, e os meios da graça foram frustrados e utilizados de forma abusiva.
(2) Os pecadores serão obrigados a sofrer aquela punição. Não irão voluntariamente. Não. Eles serão levados da luz às trevas; mas isso evidencia uma irresistível convicção de culpa e um desespero final por misericórdia.
2. Os justos serão levados à vida eterna, isto é, eles herdarão o Reino (v.34). Observe que:
(1) O céu é vida, é só felicidade. A vida da alma resulta da sua união com Deus, por meio da mediação de Jesus Cristo, assim como a vida do corpo resulta da sua união com a alma, por meio do espírito que Deus nos deu. A vida celestial consiste em ver o Senhor Deus e desfrutar a sua presença, em perfeita conformidade com Ele, e em uma comunhão imediata e ininterrupta com Ele.
(2) É a vida eterna. Não existe morte que dê fim à própria vida, nem velhice para dar fim ao seu conforto, nem tristeza para amargurá-la. Assim, a vida e a morte, o bem e o mal, a bênção e a maldição, estão diante de nós, para que possamos escolher o nosso caminho. E assim será o nosso fim. Até o pagão tinha alguma noção dessas diferentes condições de bem e mal, no mundo por vir.
Você precisa fazer login para comentar.