MATEUS 24: 4 – 31 – PARTE III

Predições Terríveis
V – O Senhor prediz a pregação do Evangelho a todo o mundo (v. 14). “Este evangelho do Reino será pregado em todo o mundo… e então virá o fim”. Observe aqui:
1. Ele é chamado de Evangelho do Reino, porque ele revela o reino da graça, que leva ao reino da glória; ele estabelece o reino de Cristo neste mundo; e nos assegura o outro mundo.
2. Este Evangelho, mais cedo ou mais tarde, deverá ser pregado em todo o mundo, a todas as criaturas, e todas as nações deverão ser ensinadas por ele; pois é nele que Cristo se mostra como a “salvação até aos confins da terra”. Para este fim, o dom de línguas era “as primícias do Espírito”.
3. O Evangelho será pregado “em testemunho a todas as gentes”; ou seja, ele é a declaração fiel do pensamento e da vontade de Deus a respeito do dever que Deus exige de um homem, e da recompensa que o homem pode esperar de Deus. É um “testemunho” (1 João 5.11) para aqueles que creem, de que eles serão salvos, e contra aqueles que persistem na incredulidade, de que serão condenados. Veja Marcos 16.16. Mas como esta verdade é mostrada aqui?
(1) Aqui está sugerido que era necessário que todo o mundo que se conhecia na época ouvisse a pregação do Evangelho, ou pelo menos ouvisse falar dele, antes da destruição de Jerusalém; isto era necessário para que a instituição do Antigo Testamento não se dissolvesse completamente até que o Novo Testamento estivesse bem estabelecido, tivesse uma base considerável, e começasse a formar uma imagem. Nesse contexto, era melhor que houvesse um grupo que buscasse a Deus, mesmo que de uma forma corrompida e degenerada, do que não haver ninguém que o fizesse. Dentro de quarenta anos depois da morte de Cristo, a “voz” do Evangelho tinha chegado aos confins do mundo (Romanos 10.18). O apóstolo Paulo pregou integralmente o Evangelho “desde Jerusalém e arredores até ao Ilírico”; e os outros apóstolos não foram ociosos; a perseguição dos santos em Jerusalém ajudou a dispersá-los, de modo que eles foram a todos os lugares, anunciando o Evangelho (Atos 8.1-4). E quando as notícias do Redentor alcançassem todas as partes do mundo, então o fim da nação judaica ocorre ria. Assim, aquilo que eles pensavam evitar, condenando Jesus à morte, foi precisamente o que procuraram.
Todos creram nele, e, vieram os romanos, e tiraram o seu lugar e a sua nação (João 11.48). Paulo disse que o Evangelho estava em “todo o mundo”, e havia sido “pregado a toda criatura ” (Colossenses 1.6-23).
(2) Da mesma maneira, está sugerido que mesmo em tempos de tentação, dificuldades e perseguição, o Evangelho do rei no será pregado e propagado, e irá abrir o seu caminho em meio à maior oposição. Embora os inimigos da igreja se acalorem, e o amor de muitos dos seus amigos esfrie, ainda assim o Evangelho será pregado. E mesmo então, quando muitos caírem pela espada e pelo fogo, e muitos agirem malvadamente, e forem corrompidos por adulações, aqueles que realmente conhecem ao seu Deus serão fortalecidos para realizar as maiores proezas, instruindo a muitos (veja Daniel 11.32,33; e veja um exemplo em Filipenses 1.12-14).
(3) O que, aparentemente, se pretende aqui é dar a entender que o fim do mundo ocorrerá quando o Evangelho tiver realizado o seu trabalho no mundo, e não antes disso. O Evangelho será pregado, e a palavra será transmitida, mesmo depois que vocês estiverem mortos; para que todas as nações, sejam as primeiras ou as últimas, possam apreciar ou recusar o Evangelho; e “então virá o fim”, quando o reino ser á entregue a Deus Pai, quando o mistério de Deus será concluído, o corpo espiritual será completado, e as nações forem convertidas e salvas, ou condenadas e silenciadas pelo Evangelho. Então virá o fim, de que Ele tinha falado anteriormente (vv. 6,7), não antes, não até que estes conselhos intermediários se cumpram. O mundo permanecerá enquanto existir algum dos eleitos de Deus que não tiver sido chamado; mas quando estiverem todos reunidos, ele se incendiará imediatamente.
VI – Ele prediz, mais particularmente, a destruição que viria sobre o povo dos judeus, a sua cidade, o seu Templo e a sua nação (v. 15ss.). Aqui Jesus chega mais perto de responder às perguntas dos discípulos sobre a destruição do Templo, e o que Ele disse aqui será útil para eles, tanto para o seu comportamento quanto para o seu consolo, referindo-se àquele grande evento. Ele descreve os diversos estágios daquela calamidade, como é usual em uma guerra.
1. Os romanos trarão “a abominação da desolação” ao “lugar santo” (v. 15). Considere que:
(1) Alguns entendem que uma imagem, ou estátua, colocada no Templo por alguns dos governantes romanos, e que era muito ofensiva aos judeus, os levou a se rebelarem, e desta maneira trouxe a desolação sobre eles. A imagem de Júpiter (um dos deuses do Olimpo), que Antíoco mandou colocar sobre o altar de Deus, é chamada A abominação da desolação, a mesma palavra usada aqui pelo historiador (1 Macabeus 1.54). Desde o cativeiro na Babilônia, nada era, nem poderia ser, mais desagradável para os judeus do que uma imagem no lugar santo, como se pode perceber pela poderosa oposição que eles fizeram quando Calígula se ofereceu para colocar a sua estátua ali, o que teria tido consequências fatais, se não tivesse sido evitado, e a questão apaziguada, pelo comportamento de Petrônio. No entanto, Herodes colocou a imagem de uma águia sobre a porta do Templo e, dizem alguns, a estátua de Tito foi colocada dentro do Templo.
(2) Outros preferem explicar isso com o trecho paralelo (Lucas 21.20): “quando virdes Jerusalém cercada de exércitos”. Jerusalém era a cidade santa, Canaã era a terra santa, e o monte Moriá, que está próximo de Jerusalém, pela sua proximidade com o Templo, era, de uma maneira especial, considerado solo sagrado; o exército romano estava acampado na região ao redor de Jerusalém, e isto teria sido a abominação que produziu a desolação. A terra de um inimigo é considerada como “a terra de que te enfadas” (Isaias 7.16), de modo que um exército inimigo, para um povo fraco, mas voluntarioso, pode perfeitamente ser chamado de abominação. Diz-se que isto se refere a Daniel, que falou mais claramente do Messias e do seu reino que qualquer outro dos profetas do Antigo Testamento. Ele fala de uma “abominação desoladora”, o que seria feito por Antíoco (Daniel 11.31; 12.11), mas isto a que se refere o nosso Salvador nós temos na mensagem trazida pelo anjo (Daniel 9.27) do que aconteceria no final de setenta semanas, muito tempo depois da anterior; pois com o aumento das abominações, ou, como diz a anotação na margem, com os exércitos abomináveis (o que esclarece a profecia), Ele trará a desolação. Exércitos de idólatras podem ser chamados de exércitos abomináveis; e alguns pensam que os tumultos, insurreições, facções e sedições abomináveis, na cidade e no Templo, podem, pelo menos, ser interpretados como parte da abominação causando desolação. Cristo lembra aos discípulos a profecia de Daniel, para que eles possam ver como a destruição da sua cidade e do seu Templo foi mencionada no Antigo Testamento, o que confirmaria a sua predição e, ao mesmo tempo, removeria a ira da sua profecia. Da mesma maneira, eles poderiam, a partir de então, começar a contar o tempo logo depois da morte do Messias, o príncipe. O pecado cometido quando os judeus o rejeitaram e a certeza da destruição são uma desolação determinada. Assim como Cristo, pelos seus preceitos, confirmou a lei, também pelas suas predições Ele confirmou as profecias do Antigo Testamento, e isto será útil para a comparação de ambas.
Tendo sido feita referência a uma profecia, que normalmente é obscura, Cristo insere este lembrete: “Quem lê, que entenda”. Aquele que lê a profecia de Daniel, compreenda que ela deverá se cumprir então, dentro de pouco tempo, na destruição de Jerusalém. Observe que aqueles que leem as Escrituras, devem se esforçar para entendê-las, caso contrário a sua leitura terá pouco propósito. Nós não podemos utilizar aquilo que não compreendemos. Veja João 5.39; Atos 8.30. O anjo que trouxe esta profecia a Daniel o estimulou para que a conhecesse e entendesse (Daniel 9.25). E nós não devemos perder a esperança de entender, nem mesmo as profecias obscuras; a maior profecia do Novo Testamento é chamada de “revelação”, e não de segredo. Agora as coisas reveladas pertencem a nós; portanto, elas devem ser investigadas com humildade e diligência. Também podemos compreender não apenas as Escrituras que falam dessas coisas, mas pelas Escrituras devemos compreender os tempos (1 Crônicas 12.32). Observemos e prestemos atenção; assim alguns interpretam isso. Que nos asseguremos de que, apesar das esperanças vãs com as quais as pessoas iludidas se alimentam, os exércitos abomináveis trarão desolação.
2. Os meios de preservação que os homens sérios deveriam empregar (vv. 16,20): “Os que estiverem na Judéia, que fujam”. A conclusão é que não existe outra maneira de se salvar, exceto fugir. Nós podemos interpretar isto:
(1) Como uma predição da própria ruína – que ela seria impossível de evitar; que seria impossível, mesmo para os corações mais corajosos, resistir a ela, ou lutar contra ela. Eles devem recorrer à última opção, sair do caminho. Isto indica aquilo em que Jeremias tanto insistia, embora em vão, quando Jerusalém estava sitiada pelos caldeus, que seria inútil resistir, mas que seria prudente render-se e capitular; assim também Cristo aqui, para mostrar o quanto seria inútil resistir a isso, convida todos a seguir o seu conselho.
(2) Nós podemos interpretar isso como uma orientação aos seguidores de Cristo quanto ao que fazer, o que não significa uma aliança com aqueles que lutaram e guerrearam contra os romanos pela preservação da sua cidade e nação, somente para que pudessem consumir a riqueza de ambas nos seus desejos (pois o apóstolo se refere a essa mesma questão – as lutas dos judeus contra o poder romano, alguns anos antes da sua destruição final, Tiago 4.1-3). Mas que eles concordem com o que foi dito, e que saiam rapidamente da cidade e do país, como se estivessem abandonando um cavalo que está caindo ou um navio naufragando, como Ló saiu de Sodoma e como Israel deixou as tendas de Datâ e Abirão. Ele lhes mostra:
[1] Para onde deveriam fugir ao sair da Judéia: “para os montes”. Não os montes ao redor de Jerusalém, mas aqueles nos lugares distantes, que lhes serviriam de abrigo, não tanto pela sua resistência, mas pelo seu isolamento. Está dito que Israel se dispersará pelos montes (2 Crônicas 18.16; veja também Hebreus 11.38). Haveria maior segurança entre os covis dos leões, e os montes dos leopardos, do que entre os sediciosos judeus ou os furiosos romanos. Note que em tempos de perigo iminente, não apenas é lícito, mas também é nosso dever, procurar a nossa própria preservação por todos os meios bons e honestos, e se Deus nos abre uma porta, nós devemos usá-la para escapar, do contrário não estaremos confiando em Deus, mas tentando-o. Pode haver uma ocasião em que mesmo aqueles que estão na Judéia, onde Deus é conhecido e o se u nome também, precisem fugir para os montes; e desde que nós saiamos somente do caminho do perigo, e não do caminho do dever, nós podemos confiar que Deus proverá um refúgio para os seus desterrados (Isaias 16.4,5). Em tempos de calamidade pública, quando fica claro que não temos utilidade em casa e podemos estar mais seguros em outro lugar, a Providência nos convida a fugir. Aquele que fugir poderá lutar outra vez.
[2] A pressa que eles devem ter (vv. 17,18). A vida estará em perigo, em perigo iminente, o açoite surgirá de repente, e, portanto, “quem estiver sobre o telhado”, quando soar o alarme, “não desça a tirar alguma coisa de sua casa”, para cuidar das suas coisas, mas desça o mais rapidamente possível, para fugir; e também “quem estiver no campo”, encontre o caminho mais acertado para fugir imediatamente, e não “não volte atrás a buscar as suas vestes”, ou para tirar coisa alguma de sua casa, por dois motivos. Em primeiro lugar, porque o tempo que ele perderia para empacotar as suas coisas iria atrasar a sua fuga. Observe que quando a morte está à porta, atrasos são perigosos. Isto foi recomendado a Ló: “Não olhes para trás de ti”. Aqueles que estão convencidos da infelicidade de uma condição de pecado, e da destruição que os espera nessa condição, e, consequentemente, da necessidade de fugir em direção a Cristo, devem se apressar, para que, depois de todas essas convicções, eles não pereçam eternamente por causa de atrasos. Em segundo lugar, porque carregar as suas vestes, e outras coisas de valor, iria sobrecarregá-lo, e obstruir a sua fuga. Os sírios, na sua fuga, lançaram fora suas vestes (2 Reis 7.15). Numa ocasião como esta, nós devemos dar graças se as nossas vidas forem poupadas, ainda que não possamos salvar nada do que é nosso (Jeremias 45.4,5). Pois “a vida é mais do que o mantimento” (cap. 6.25). Aqueles que carregam menos coisas, têm a fuga mais segura. Aquele que viaja sem dinheiro não tem nada a perder para os ladrões. Foi para os seus próprios discípulos que Cristo recomendou que deixassem a sua casa e as suas roupas, pois eles tinham uma morada no céu, tinham um tesouro ali, e roupas duráveis, que o inimigo não lhes poderia roubar. Eu levo comigo tudo o que tenho, disse Bias, o filósofo, na sua fuga, de mãos vazias. Aquele que tem a graça no seu coração a leva consigo, mesmo quando despojado de tudo.
Aqueles a quem Cristo disse isso não viveram para ver esse dia funesto, nenhum dos doze, exceto João, e apenas ele; eles não precisaram se esconder nos montes (Cristo os escondeu no céu), mas eles deixaram a orientação aos seus sucessores na fé, que a obedeceram, e ela foi útil para eles; pois quando os cristãos de Jerusalém e da Judéia viram a destruição que se aproximava, todos fugiram para uma cidade chamada Pella, no outro lado do rio Jordão, onde ficaram em segurança; de modo que, entre os muitos milhares que pereceram na destruição de Jerusalém, não havia nenhum cristão. Veja Eusébio, Eclesiástica. História, liv. 3, cap. 5. Assim “o avisado vê o mal, e esconde-se” (Provérbios 22.3; Hebreus 11.7). Este aviso não foi mantido em segredo. O Evangelho de Mateus foi publicado muito tempo antes da destruição, para que outros pudessem se beneficiar dessa orientação; mas aqueles que pereceram por não crerem nisso, tornaram-se um exemplo daqueles que perecerão eternamente por causa da sua descrença nas advertências que Cristo expressou a respeito da ira futura.
[3] Para quem esta ocasião seria difícil (v. 19): ”Ai das grávidas e das que amamentarem naqueles dias!” As palavras proferidas por Cristo, por ocasião da sua morte, se referem a esse mesmo evento (Lucas 23.29): “Porque eis que hão de vir dias em que dirão: Bem-aventuradas as estéreis, e os ventres que não geraram, e os peitos que não amamentaram!” Bem-aventurados aqueles que não têm filhos, para não verem o assassinato deles; todavia, mais infelizes são aquelas cujos ventres estão gerando, e que estão amamentando: elas, entre todas as outras, são as que estarão na situação mais melancólica. Em primeiro lugar, a fome seria mais grave e lamentável para elas, quando vissem a língua do que mama pegada pela sede na boca, e elas mesmas seriam mais cruéis que avestruzes no deserto (Lamentações 4.3,4). Em segundo lugar, a espada seria mais terrível para elas, por estar em uma mão que seria movida por algo pior que a fúria brutal. Seria um parto terrível, quando as mulheres grávidas viessem a ser cortadas ao meio pelo conquistador enfurecido (2 Reis 15.16; Oseias 13.16; Amós 1.13), ou as crianças fossem levadas ao matador (Oseias 9.13). Em terceiro lugar, a fuga seria também mais aflitiva para elas. As mulheres grávidas não podem se apressar, nem percorrer grandes distâncias; a criança que amamenta não pode ficar para trás, ou, se pudesse: “Pode uma mulher esquecer-se tanto do filho… que se não compadeça dele?” Se a criança for levada, ela retarda a fuga da mãe, e assim arrisca a vida dela, e corre o perigo da fuga de Mefibosete, que ficou coxo devido a uma queda que sofreu durante a fuga da sua ama (2 Samuel 4.4).
[4] O que eles deveriam pedir em oração naquela ocasião: “Orai para que a vossa fuga não aconteça no inverno nem no sábado” (v. 20). Observe que, em geral, é conveniente que os discípulos de Cristo, em tempos de problemas e calamidades, estejam em oração, pois isto é um bálsamo para todas as feridas; nenhuma ocasião deixará de ser apropriada, mas será especialmente apropriada quando eles sofrerem aflições de todos os lados. Não existe remédio, mas você deve fugir; a orientação já é pública e é um decreto, para que Deus não seja tentado a afastar a sua ira, nem mesmo que Noé, Daniel e Jó estejam diante dele. Isto deve bastar para nós, não falemos mais no assunto, mas nos esforcemos para fazer o melhor; e mesmo que não consigamos, pela fé, orar para que não sejamos forçados a fugir ainda assim devemos orar para que as circunstâncias da fuga sejam ordenadas graciosamente, para que, embora o cálice não possa ser afastado de nós, os prejuízos do juízo possam ser reduzidos. Observe que Deus dispõe das circunstâncias dos eventos, e isto, de uma maneira ou de outra, algumas vezes provoca uma grande alteração. Por isso, os nossos olhos devem estar sempre voltados a Ele. O fato de Cristo os convidar a orar a favor disso dá a entender o seu propósito de conceder-lhes tal coisa; e numa calamidade geral, nós não devemos negligenciar uma gentileza circunstancial, mas considerar e reconhecer que a situação poderia ter sido pior. Cristo sugere ainda aos seus discípulos que orem por si mesmos, e por seus amigos, para que, se eles forem forçados a fugir, possam fazê-lo na época mais conveniente. Observe que quando se espera problemas a uma grande distância, é bom ter de antemão um estoque de orações. Os discípulos devem orar, em primeiro lugar, para que a sua fuga, se for a vontade de Deus, não aconteça no inverno, quando os dias são curtos, o tempo, frio, as estradas, sujas, e, portanto, a viagem será muito desconfortável, especialmente para famílias inteiras. Paulo apressa Timóteo par a vir vê-lo antes do inverno (2 Timóteo 4.21). Note que embora o bem-estar do corpo não deva ser levado em conta acima de tudo, ele deve ser devidamente considerado. Embora devamos tomar o que Deus nos envia, e quando Ele envia, nós devemos orar contra inconveniências para o corpo, e somos incentivados a fazer isso, pois “o Senhor é para o corpo”. Em segundo lugar, par a que a fuga não ocorra num sábado. Não no sábado judaico, por que viajar nesse dia seria ofensivo àqueles que estavam irados com os discípulos por colherem as espigas nesse dia. Não no sábado cristão, porque ser forçado a viajar nesse dia seria uma tristeza para um cristão. Isto sugere o desígnio de Cristo, de que um descanso semanal fosse observado pela sua igreja depois da pregação do Evangelho a todo o mundo. Não sabemos de nenhum dos rituais da igreja judaica, que eram puramente cerimoniais, sobre o qual Cristo tenha expressado qualquer preocupação, porque eles seriam todos abolidos; mas o Senhor frequentemente expressava uma preocupação pelo sábado. Isto sugere, da mesma maneira, que o sábado, basicamente, deve ser observado como um dia de descanso de viagens e do trabalho terreno; mas que, de acordo com a sua própria explicação do quarto mandamento, obras necessárias eram lícitas no sábado, como essa, de fugir de um inimigo para salvar a própria vida. Se não fosse lícito, Ele teria dito: “Aconteça o que acontecer, não fujam no sábado, mas permaneçam, ainda que morram por causa disso”. Nós não devemos cometer o menor pecado para escapar ao maior problema. Mas isto sugere, da mesma maneira, que é muito desagradável que um bom homem seja privado de qualquer obra de necessidade por causa do serviço solene e da adoração a Deus. Nós devemos orar para que possamos ter “sábados” tranquilos e despreocupados, não tendo nenhum outro trabalho no dia que consagramos à oração e à adoração ao Senhor. Assim poderemos nos preocupar com o Senhor, sem distrações. Era desejável, se eles tivessem que fugir, que pudessem ter o benefício e o consolo de um sábado para ajudá-los a suportar as suas cargas. Fugir no inverno é incômodo para o corpo, mas fugir no sábado é incômodo para a alma; ainda mais quando alguém se lembra dos dias passados, como no Salmo 42.4.
3. Os grandes problemas que se seguiriam imediatamente (v. 21): “Haverá, então, grande aflição”; então, quando a medida da iniquidade está completa; então, quando os servos de Deus estão selados e protegidos, então vem os problemas. Nada pode ser feito contra Sodoma até que Ló tenha chegado a Zoar, e então podemos procurar fogo e enxofre imediatamente. “Haverá, então, grande aflição”. Grande, realmente, quando dentro da cidade as pragas e a fome se enfureceram, e (pior do que qualquer coisa) houve facção e divisão, de modo que a espada de cada homem estava contra o seu companheiro. Foi então, e ali, que as mãos das mulheres desprezíveis esfolaram os seus próprios filhos. Fora da cidade, estava o exército romano, pronto para engoli-los, com uma ira especial contra eles, não somente como judeus, mas como judeus rebeldes. A guerra foi o único dos três julgamentos dolorosos de que Davi foi isento. Mas seria isso o que destruiria os judeus. E houve fome e pestes extremas, além da guerra. A obra History of the Wars of the Jews (História das Guerras dos Judeus), de Josefo, contém mais passagens trágicas do que, talvez, qualquer outra história.
(1) Foi uma desolação incomparável, “como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem tampouco haverá jamais”. Muitas cidades e reinos foram de solados, mas nenhum com uma desolação como essa. Os pecadores ousados não devem pensar que Deus fez o pior que podia fazer. Ele pode aquecer a fornalha sete vezes e ainda outras sete vezes mais quente, e o fará, quando vir abominações maiores e ainda maiores. Os romanos, quando destruíram Jerusalém, estavam destituídos da honra e da virtude dos seus ancestrais, o que tornou as suas vitórias mais fáceis de serem obtidas. E a determinação e teimosia dos próprios judeus contribuíram muito para o aumento da tribulação. Não é de admirar que a destruição de Jerusalém tenha sido uma destruição sem paralelos, quando o pecado de Jerusalém foi um pecado sem paralelos – a crucificação de Cristo por eles. Quanto mais próximo alguém está de Deus, em profissão de fé e privilégios, maior e mais grave será o julgamento divino sobre tal pessoa, se usar mal os seus privilégios, e for falso à sua profissão de fé (Amós 3.2).
(2) Foi uma desolação que, se continuasse por muito tempo, seria intolerável, de modo que “nenhuma carne se salvaria” (v. 22). A morte chegaria tão triunfante, de tantas maneiras funestas, e com tantos ajudantes, que não haveria como escapar, mas, em algum momento, todos seriam mortos. Aquele que escapasse a uma espada, cairia por outra (Isaias 24.17,18). A estimativa que Josefo faz daqueles que foram mortos em diversos lugares soma mais de dois milhões de pessoas. “Nenhuma carne se salvaria”. Ele não diz: ” Nenhuma alma se salvaria”, pois a destruição da carne pode ser “para que o espírito seja salvo no Dia do Senhor Jesus”. Mas a vida temporal será sacrificada com tal profusão, que se poderia pensar que, se isto durasse algum tempo, o fim seria completo.
Mas há uma palavra de consolo em meio a todo este terror – que, “por causa dos escolhidos, serão abreviados aqueles dias”, não significa menos do que Deus tinha determinado (pois “o que está determinado será derramado sobre o assolador”, Daniel 9.27), porém menos do que Ele poderia ter decretado, se Ele tivesse lidado com eles de acordo com os seus pecados. Menos do que o inimigo teria desejado, pois ele teria eliminado a todos, se Deus, que o usa para servir aos seus próprios objetivos, não tivesse contido a sua ira. Menos do que teria imaginado alguém que julga de acordo com as probabilidades humanas. Observe que:
[1] Em tempos de calamidade geral, Deus manifesta o seu favor aos eleitos remanescentes; as suas joias, que Ele então irá reunir; o seu tesouro particular, que Ele irá proteger, quando os restos forem abandonados aos espoliadores.
[2] A abreviação das calamidades é uma benignidade que Deus frequentemente concede para o bem dos eleitos. Em vez de reclamar que as nossas aflições duram tanto tempo, se nós levarmos em consideração nossos defeitos, veremos motivos para sermos gratos porque elas não duram para sempre; quando as coisas estão ruins para nós, é conveniente que digamos: “Bendito seja Deus, porque não são piores. Bendito seja Deus, porque isto não é uma desgraça infernal, interminável e irremediável”. Foi uma igreja aflita que disse: ”As misericórdias do Senhor são a causa de não sermos consumidos”, e isto ocorre para o bem dos eleitos, para que o seu espírito não caia antes deles (se Ele desejasse combater para sempre), e para que eles não sejam tentados a oferecer as suas mãos, se não o seu coração, à iniquidade.
E então vem o aviso repetido, que já foi apresentado antes, de tomar cuidado para não se deixar enganar por falsos Cristas e falsos profetas (v. 23ss.), que lhes pro meteriam a libertação, como os profetas mentirosos da época de Jeremias (Jeremias 14.13; 23.16,17; 27.16; 28.2), mas os iludiriam. Os tempos de grande tribulação são tempos de grandes tentações, e por isso nós precisamos dobrar a nossa guarda. Se disserem: “Eis que o Cristo está aqui ou ali”, e irá nos libertar dos romanos, “não lhe deis crédito”, isto são apenas palavras. Tal libertação não deve ser esperada, e tampouco tal libertador.
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