A ESTREITA RELAÇÃO ENTRE HUMOR E COMIDA
O “comer emocional”, embasado na necessidade de aplacar algum desconforto ou a dificuldade de lidar com sentimentos – ainda que positivos – é um risco para a saúde física. Neurocientistas ensinam alguns “truques” para evitar essa armadilha.
A fome talvez seja a sensação que mais nos confunda: tristeza, cansaço ou mesmo felicidade frequentemente nos impulsionam a buscar algo para mastigar. A maior parte das pessoas só não deseja comer quando está doente, fazendo exercícios físicos ou dormindo. O problema é que quando estamos estressados, tendemos a fazer escolhas alimentares imprudentes. E talvez a maioria das pessoas não consiga controlar rigorosamente a relação entre humor e comida, mas entender essa proximidade pode ser muito importante.
Historicamente, cientistas têm analisado como os estados “negativos” de humor nos levam a comer em excesso. O que parece uma “comida reconfortante” pode ser vista por psicólogos como uma “alimentação emocional”. Os pesquisadores tentam entender esse processo que nos faz recorrer a alimentos calóricos e gordurosos quando estamos angustiados, como mostra um artigo publicado no periódico Psycosomatic Medicine. Já os pesquisadores N. Rose, S. Koperski e B.A. Golomb comprovaram que, quando estão deprimidos, homens e mulheres comem mais chocolate do que nos momentos em que se sentem felizes. Infelizmente, fartar-se de guloseimas nem sempre traz conforto, principalmente quando se instala a culpa. Sob estresse, temos dificuldade até em discernir se certa comida é saudável, como mostra o artigo Oral perceptions of fat and taste stimuliare modulated by affect and mood induction, publicado na PLoS ONE. Por essa razão, não é de admirar que o “comer emocional” aumente o risco de obesidade e outros problemas de saúde ligados à alimentação incorreta.
E embora as emoções negativas estejam associadas à prática de alimentar-se em excesso, muita gente exagera na comida quando está feliz. Na verdade, é tão fácil comer em excesso na alegria quanto na tristeza. Embora este último estado possa aumentar o desejo de comer chocolate, é mais provável que alguém consuma mais batatas fritas e amendoim torrado quando está animado. O fato é que a felicidade pode reduzir as inibições diante de um pacote de Doritos. No entanto, nem todas as pessoas comem da mesma maneira em resposta às emoções – em razão de características pessoais, aspectos culturais e experiências de vida os comedores emocionais são mais propensos a esse comportamento.
Evidentemente, não queremos nos privar de sentir emoções, mesmo negativas, nem queremos deixar de ingerir os nutrientes de que precisamos. Porém, se você é um comedor emocional, pode tomar algumas atitudes para não agarrar uma barra de chocolate toda vez que ficar com os olhos marejados. Lembre-se da sua tendência para usar os alimentos como apoio, não faça a comida de lenitivo e busque outras fontes de conforto: os amigos, a família, o exercício físico, um bom livro, um banho relaxante, o passeio com o cachorro. Além da comida, o que lhe parece um agrado? Quando esticar a mão para a barra de chocolate, pergunte: “Estou realmente com fome de comida? Existe outra coisa que possa me trazer satisfação nesse momento? O que mais poderia preencher meu vazio?”.
Os “comedores emocionais” devem limitar o acesso aos alimentos que desejam quando estão emotivos. Ou seja, se você não mantiver em casa as comidas que compensam suas carências, será mais difícil consegui-las quando as emoções estiverem à flor da pele. Afinal, se você estiver disposto a ir até o mercado para comprar algum alimento, talvez realmente precise daquele reconforto. São muitos os alimentos que realmente não precisamos ter em casa: batatas fritas, doces, biscoitos, sorvete. A solução, nesse caso, é simples, afirmam os psicólogos comportamentais: não compre aquilo que não consegue deixar de comer ou que consome abusivamente quando tem determinado humor. Não se trata, obviamente, de nunca comer aquilo que nos traz conforto psicológico. Apenas é importante reservar esses alimentos para ocasiões especiais ou para quando realmente “precisamos” deles – e mesmo nessas situações é recomendável ingeri-los com moderação. Vale a pena tomar um sorvete com a família no final da semana ou, de vez em quando, comprar seu biscoito favorito no caminho de volta do trabalho depois de um dia longo e frustrante. Apenas é conveniente ser prudente com relação a quanto consome e tentar perceber o que realmente deseja. É um biscoito ou um colinho?
Segundo algumas pesquisas, os alimentos que nos reconfortam são, em parte, resultado de preferências adquiridas. Nossa experiência passada nos ensinou a pensar em um pote de sorvete como uma gratificação e uma fonte de amparo emocional. Teoricamente, poderíamos considerar qualquer alimento como um alívio para as angústias. Por exemplo, no Ocidente as mulheres tendem a compensar as carências emocionais com chocolate, mas em lugares onde o chocolate é mais escasso, nossas congêneres anseiam por outros tipos de doces. Portanto, o nosso alimento reconfortante depende dos recursos do ambiente ao nosso redor. Podemos não ser capazes de mudar a cultura nas qual estamos inseridos assumir a responsabilidade pelo “ambiente alimentar” de nossas casas e assim mudar nossa tendência a desejar certos alimentos na presença de determinadas emoções.
Fonte: Revista Mente e Cérebro – Edição 300
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